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Thiollier, Armando Penteado, Martinho Prado e Oscar Rodrigues Alves, da Comissão
de Patrocínio da Semana de Arte Moderna (Fabris, 1994, p. 139).
Mário de Andrade, para quem “o fautor verdadeiro da Semana de Arte Moderna
foi Paulo Prado” (1978a, p. 235.), relembra o misto de mundanismo, política e arte,
característico da “sociabilidade modernista”, em conferência comemorativa de vinte
anos da Semana:
Havia o salão da avenida Higienópolis que era o mais selecionado. Tinha pro
pretexto o almoço dominical, maravilha de comida lusobrasileira. Ainda aí a
conversa era estritamente intelectual, mas variava mais e se alargava. Paulo
Prado, com seu pessimismo fecundo e o seu realismo, convertia sempre o
assunto das livres elocubrações artísticas aos problemas da realidade
brasileira. [...].
E houve o salão da rua Duque de Caxias, que foi o maior, o mais
verdadeiramente salão. As reuniões semanais eram à tarde, também às terças-
feiras. E isso foi a causa das reuniões noturnas do mesmo dia irem
esmorecendo na rua Lopes Chaves [endereço de Mário]. A sociedade da rua
Duque de Caxias era mais numerosa e variegada. Só em certas festas
especiais, no salão moderno construído nos jardins e decorado por Lasar
Segall, o grupo se tornava mais coeso. Também aí o culto da tradição era
firme, dentro do maior modernismo. A cozinha, de cunho afro-brasileiro,
aparecia em almoços e jantares perfeitíssimos de composição. E conto entre
minhas maiores venturas admirar essa mulher excepcional que foi Dona
Olívia Guedes Penteado. A sua discrição, o tato e a autoridade prodigiosos
com que ela soube dirigir, manter, corrigir essa multidão heterogênea que se
chegava a ela, atraída pelo seu prestígio, artistas, políticos, ricaços, cabotinos,
foi incomparável [...].
O último em data desses salões paulistas foi o da alameda Barão de
Piracicaba, congregado em torno da pintora Tarsila.
Não tinha dia fixo mas as festas eram quase semanais. [...]. Mas dos três
salões aristocráticos, Tarsila conseguiu dar ao dela uma significação de maior
independência, de comodidade. Nos outros dois, por maior que fosse o
liberalismo dos que os dirigiam, havia tal imponência de riqueza e tradição
no ambiente, que não era possível nunca evitar um tal ou qual
constrangimento. No de Tarsila jamais sentimos isso. O mais gostoso dos
nossos salões aristocráticos. (ibidem, pp. 239-240.).
Com o relativo afastamento que o intervalo de vinte anos lhe permitia, o poeta ainda
observava:
Todo esse tempo destruidor do movimento modernista foi pra nós tempo de
festa, de cultivo imoderado do prazer. E si tamanha festança diminuiu por
certo nossa capacidade de produção e serenidade criadora, ninguém pode
imaginar como nos divertimos. Salões, festivais, bailes célebres, semanas
passadas em grupo em fazendas opulentas, semanas-santas pelas cidades
velhas de Minas, viagens ao Amazonas, pelo Nordeste, chegadas à Baía,
passeios constantes ao passado paulista, Sorocaba, Parnaíba, Itu...
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[...].
Doutrinários, na ebriez de mil e uma teorias, salvando o Brasil, inventando o
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Este misto festivo de turismo e pesquisa histórico-estética, muito contribuiu para a elaboração poética
do livro Pau-Brasil de Oswald. Abordaremos este ponto no próximo capítulo.