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Leitura na alfabetização
PAINEL 19
sora, nesse momento, também é uma ouvinte
atenta e compartilha, juntamente com as crian-
ças, a “Hora da história”.
Os alunos vivenciam leituras, testemu-
nhando o leitor como autor, ouvem as palavras
com sons e gestos diferentes dos da professo-
ra e de seus amigos.
O objetivo da professora Ana Maria, com
seus alunos de 3
a
série, além de despertar o gos-
to pela leitura, de promover a escuta atenta,
ouvir diferentes pessoas da comunidade conhe-
cidas ou desconhecidas das crianças, para que
elas aprendam os diferentes modos de ler, tam-
bém motiva as crianças com idade avançada a
prosseguir em seus estudos para aprender a ler
e escrever de maneira diferente das que já fo-
ram por elas vivenciadas.
Como justificativa, a professora diz que há
diferentes maneiras de ouvir ou ler um texto, e
a escolha do livro a ser lido não é feita ao acaso:
é socialmente aceitável, tanto para o leitor,
como para o público. A compreensão da fun-
ção social da escrita só pode ocorrer se a crian-
ça tem múltiplas oportunidades de interagir
com diversos tipos de suportes de textos, pro-
duzidos em diferentes situações discursivas.
A partir do conceito formado, a professora
de 2ª série, Fabíola, da EMEIF do bairro da
Varginha, zona rural, investiu para conquistar
sua turma, no intuito de alfabetizá-la. Apostou
na leitura. Levou para sua sala revistas, jornais,
livros. Entre os livros apresentados, o que mais
chamou a atenção das crianças foi Matilda, de
Road Dahl. A classe ouviu atentamente cada
palavra do livro. Empolgada com a turminha
que falava e escrevia sobre a história lida, a pro-
fessora levou o filme de mesmo nome. As cri-
anças puderam fazer um paralelo entre o texto
escrito e o filme, relatando que nem tudo o que
estava escrito passou no filme e vice-versa. De-
ram opiniões a respeito do livro e do vídeo. No
momento, o que mais marcou foi a fala de uma
aluna: “Gostei muito do vídeo, mas gostei mes-
mo foi de ouvir a professora lendo a história,
porque, enquanto eu ouvia, parecia que eu es-
tava dentro da história. Eu ‘senti’ a história”.
As crianças puderam falar e expressar-se livre-
mente, escrever sobre o livro e o filme, porque a pro-
fessora não ficou apenas cumprindo uma função
burocrática. Ela propôs um momento prazeroso e
significativo, em que seus alunos tiveram a oportu-
nidade de testar as suas hipóteses, de começar a
entender que a ação de ler e escrever segue um
mesmo caminho, possibilitando-lhes, por um mo-
mento, verem-se como escritores e leitores.
Sabe-se hoje que só é possível aprender a
ler, lendo, e a escrever, escrevendo. Portanto, a
linguagem concebida como atividade e meio de
interação deverá ser considerada em uso em
situações concretas e significativas. E como ela
se manifesta sob a forma de textos (orais e es-
critos), eles serão tomados como unidades do
ensino de língua, destacadas suas funções,
especificidades, seus modos de construção, os
portadores (ou suportes) em que aparecem etc.
Como uma criança aprende a ler? Ou é pos-
sível ler sem saber ler? Muitos são os que fazem
tais perguntas. Ainda há muita dúvida em rela-
ção à segunda questão.
O trabalho que a professora Vera, da EMEIF
Valter Aliberti Júnior, faz com sua turma de Pré,
não responde objetivamente às dúvidas, porém,
faz a professora refletir sobre a sua prática, le-
vando-a a acreditar, sim, e a provar que é pos-
sível ler mesmo sem saber, trabalhando com
folheto de propaganda, por exemplo, de prefe-
rência um que não seja do conhecimento da
criança, mas pertença ao seu mundo. A classe,
usando das estratégias de leitura, além da boa
intervenção da professora, vai identificando o
conteúdo do suporte de texto. Os alunos vão
reconhecendo o valor dos números dentro do
contexto social (telefone, endereço, peso, me-
didas etc.); identificam as letras dos nomes e,
aos poucos, os pequenos conseguem fazer aqui-
lo que parecia impossível: a leitura.
O que há por trás da ação da professora é o
fato de ela acreditar que é possível, sim, ler
mesmo sem saber e, que, avaliando, observan-
do, com conhecimento é possível saber como a
criança aprende a ler.
Conceber um ato de leitura em que são dadas
as oportunidades de acionar as estratégias de lei-
tura determina um acionar pedagógico particu-
lar, que, por certo, não vai consistir em “ensinar
as letras” e os sons correspondentes, mas, sim, em
oferecer às crianças situações que estimulem a
antecipar, inferir, decodificar e avaliar.