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AINEL AINEL
AINEL AINEL
AINEL
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PROJETO PEDAGÓGICO:
POR QUÊ, QUANDO E COMO –
EDUCAÇÃO INFANTIL
Cristina Mara da Silva Corrêa e Delba Rejania Santos
Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib
Sônia Regina da Silva Souza
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A partir da segunda metade do século XX, foi
preciso repensar o atendimento institucional às
crianças de 0 a 6 anos, em razão de alguns fatos,
tais como: a incorporação das mulheres de clas-
se média no mercado de trabalho, o crescimen-
to rápido e desordenado das grandes cidades e
a falta de espaço para brincadeiras de crianças
nesses grandes centros. No Brasil, após o regi-
me militar, o atendimento às crianças pequenas
é pensado como uma necessidade para crian-
ças carentes, numa atitude especialmente com-
pensatória. A partir dessa concepção, ganharam
incentivo do governo as entidades filantrópicas
que atendiam as crianças em regime basicamen-
te assistencialista.
Na década de 1970, as teorias de privação
cultural contribuíram para explicações sim-
plistas da marginalidade das camadas sociais
mais pobres, reforçando, assim, o caráter
assistencialista e compensatório das propos-
tas de atendimento às crianças pequenas,
oriundas de camadas sociais desfavorecidas.
Por causa desse contexto, as propostas de
trabalho, tanto para as crianças em creche,
como para as em pré-escolas públicas, cen-
travam-se basicamente nos cuidados higiêni-
cos e alimentares. Paralelamente a isso, hou-
ve alguma ampliação do atendimento pré-es-
colar privado não baseado nas mesmas con-
cepções daquelas orientadoras das institui-
ções públicas. Assim, as propostas de uma
educação voltada para a criatividade, a socia-
lização e o desenvolvimento infantil orienta-
vam quase que exclusivamente as condutas
para o atendimento das crianças de classes
sociais favorecidas. E eram propostas que se
pautavam por estudos e pesquisas da psicolo-
gia do desenvolvimento, bem como por novas
estratégias pedagógicas.
Considerações sobre a organização
do Projeto Educacional
na Creche Central da USP
Cristina Mara da Silva Corrêa e Delba Rejania Santos
Creche USP/SP
Também, durante esse período, os movimen-
tos populares ganharam expressão como meca-
nismos de pressão política. Uma das reivindica-
ções presentes nesses movimentos referia-se à
creche como um direito do trabalhador. Foi nes-
se cenário que o movimento de luta por creches
ganhou força dentro da Universidade de São Pau-
lo, iniciado por um grupo de mães funcionárias.
Em 1982, foi inaugurada a primeira das quatro
creches existentes hoje na universidade. Desde
a sua criação, a creche teve como pressuposto o
trabalho centrado na criança e nas relações fa-
mília/creche, criança/criança, adultos/crianças.
Com o objetivo de promover o desenvolvi-
mento afetivo, físico e intelectual das crianças,
a creche da USP foi planejada como espaço de
interação e respeito à criança e à família, con-
siderando os direitos destas à atenção de qua-
lidade, que conjugava o cuidado e a Educação.
O espaço físico foi construído e organizado
para atender às necessidades das crianças, num
ambiente agradável e aconchegante. Outra ca-
racterística dessa creche sempre foi a hetero-
geneidade da população, com vagas destinadas
a funcionários, docentes e alunos da universi-
dade. Além disso, sempre foi função da creche
acolher investigações de pesquisa de alunos
matriculados nos cursos de graduação e pós-
graduação das diversas faculdades.
Um aspecto igualmente importante, desde
a implantação da primeira creche, foi a defesa
do livre acesso dos pais ao ambiente da insti-
tuição, o que se evidencia na proposta de aco-
lhimento/inserção da criança, feita sempre
com a presença dos pais ou de adultos signifi-
cativos para os pequenos. No que diz respeito
à formação da equipe de trabalho, atuam des-
de o início, dentro das creches, profissionais
de Saúde, Nutrição, Psicologia e Pedagogia.
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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
Mesmo tendo sido organizada dessa manei-
ra, nos primeiros anos de atuação, notava-se que
o trabalho acabava por acontecer de forma que o
atendimento às necessidades das crianças, prin-
cipalmente os cuidados, eram os que orientavam
a rotina na creche, sendo que os trabalhos desti-
nados às atividades pedagógicas ocorriam, na
maioria das vezes, sem intencionalidade. As for-
mações do grupo de funcionários aconteciam es-
poradicamente e participavam delas somente as
educadoras, na época denominadas recrea-
cionistas, segundo a carreira da universidade. Em
geral, as discussões se concentravam nas relações
com as crianças, em casos individuais ou nas ca-
racterísticas de uma determinada faixa etária.
Apesar de não existir um espaço para pla-
nejar e registrar o trabalho desenvolvido com
as crianças, alguns educadores, por iniciativa
própria, cultivavam o hábito de trocar expe-
riências e informações a respeito do trabalho
e da rotina do grupo ao qual pertenciam,
usando para isso os momentos de sono das
crianças ou mesmo momentos fora de seu
horário de trabalho.
Com a ampliação da creche e o início do
atendimento a crianças maiores de três anos,
sentiu-se a necessidade de organizar o traba-
lho. Muitas dúvidas foram surgindo, e, com
elas, veio a necessidade de um projeto edu-
cacional que pudesse interligar as diferentes
áreas que atuavam na creche, bem como da
definição de uma política de formação de to-
dos os sujeitos implicados na educação das
crianças. Além disso, parecia necessária uma
organização equilibrada da rotina, que tradu-
zisse melhor a concepção de criança, Educa-
ção e família já presente na creche.
No momento em que se deu a estruturação
do projeto educacional, levaram-se em conta o
compromisso da instituição com a formação in-
tegral da criança de 0 a 6 anos, o número de ho-
ras que elas passam na instituição e quantos
anos ficariam ali. A partir dessas considerações,
foi necessário algo que organizasse o tempo, o
espaço, as necessidades quanto aos cuidados
das crianças e as ações que identificavam a cre-
che como espaço educativo.
O atendimento em horário integral impli-
ca a responsabilidade pelo desenvolvimento
dos cuidados e da aprendizagem, integrando-
se, assim, as áreas de Saúde e Nutrição. Tor-
nou-se também necessária a seleção dos con-
teúdos a serem trabalhados com o objetivo de
garantir experiências diversificadas a todas as
crianças que freqüentam a instituição. A for-
ma como foi estruturada a rotina reflete a con-
cepção que se tem da criança, como ser capaz
e competente, e do educador, como profissio-
nal capacitado para intermediar as relações
entre as crianças e destas com o conhecimen-
to. Além disso, garantia-se o direito de acesso
ao conhecimento. A rotina tem como objetivo
oferecer às crianças um equilíbrio entre ativi-
dades dirigidas, brincadeiras, higiene, alimen-
tação e tem como intenção garantir a interação
das crianças do grande grupo (todas as crian-
ças do módulo) no pequeno grupo (cada um
dos quatro grupos de um módulo) e a integra-
ção de faixas etárias diferentes.
Várias ações deram formato ao projeto
educacional. Uma delas foi a implementação
do que se chamou Estudo da Realidade (ER),
que, na época, compreendia discussões a res-
peito das necessidades identificadas no coti-
diano do trabalho, no que dizia respeito tan-
to às suas organizações práticas, como às
interfaces entre os diversos grupos da insti-
tuição. Durante o tempo em que foi realiza-
do, o Estudo da Realidade permitiu identifi-
car essas necessidades e propor encaminha-
mentos, garantindo a participação coletiva na
organização do trabalho. A partir de então, o
entendimento sobre o trabalho com crianças
pequenas ficou mais claro para todos os seg-
mentos da creche.
Uma das conseqüências dessas discussões
foi a organização de metas de trabalho ao lon-
go dos anos, entre as quais está a formação
de um espaço de conversa entre educadores
e grupos de apoio. Surge, então, o projeto de
Oficinas, desenvolvido com os grupos de lim-
peza, cozinha e lactário, que tinha como pro-
posta não somente a confecção de materiais
e brinquedos, mas um espaço para a forma-
ção desses funcionários. Durante os traba-
lhos, havia troca de experiências, discussões
sobre o desenvolvimento infantil, bem como
o resgate da memória desse grupo em relação
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às suas brincadeiras de infância, que podiam
depois ser transmitidas às crianças.
Assim, a construção do projeto educacio-
nal foi um processo coletivo e o Estudo da
Realidade, ou seja, o levantamento de dis-
cussões com a comunidade da creche, para
elaborar, discutir e desenvolver esse proje-
to, foi um grande aliado. O tempo para a for-
mação dos educadores foi uma das condições
apontadas, tendo sido implementado ao lon-
go dos anos.
Em razão do horário de atendimento às
crianças, existe troca de turnos de educado-
res entre os períodos da manhã e da tarde, e o
planejamento das atividades é feito em con-
junto entre as equipes desses dois turnos. A
formação dos educadores acontece durante
reuniões semanais e mensais. Atualmente, a
rotina está organizada em momentos de co-
letivo dirigido (ateliês) e de coletivo livre (pá-
tio), pequenos grupos (atividades dirigidas
em sala com a mesma faixa etária), alimenta-
ção, sono e higiene. O eixo condutor dessa
rotina é a interação, garantindo o contato das
crianças entre diversas faixas etárias e da cre-
che com as famílias.
Os ateliês são organizados com diferentes
propostas, que acontecem nos horários de en-
trada (manhã e início da tarde) e saída da cre-
che. Seus objetivos são a interação, a coope-
ração e a livre escolha das crianças. Além dis-
so, favorecem a recepção das crianças, pois
são propostas oferecidas pelo educador, mas
não dirigidas por ele, o que permite que ele
fique atento à circulação das crianças e dis-
ponível para a recepção das famílias, tanto na
chegada quanto na finalização das atividades.
No momento de coletivo livre, as crianças de
diversas faixas etárias brincam no pátio. Du-
rante esse período, há revezamento de lanche
das educadoras e a troca e higiene das crian-
ças. A presença de um número mínimo de
educadores no pátio deve permitir que eles
possam interagir com as crianças, bem como
observá-las em suas brincadeiras. Durante o
pequeno grupo, acontecem as atividades
dirigidas pelo educador e planejadas previa-
mente para cada faixa etária. São desenvolvi-
dos, aqui, os projetos e as atividades seqüen-
ciadas, considerando as diversas áreas do co-
nhecimento, bem como os objetivos de tra-
balho para cada faixa etária.
Consideramos que a estruturação da roti-
na foi um dos eixos importantes para o de-
senvolvimento do projeto educacional na cre-
che, pois trouxe equilíbrio entre as atividades
propostas e o entendimento de seus signifi-
cados, considerando nossa concepção de
Educação. Vale dizer que a forma como está
organizada a rotina não é estática, está sem-
pre em constante avaliação e sujeita a mudan-
ças. Exemplo disso foi a alteração, há poucos
anos, do momento de sono, que antes era ofe-
recido a todas as crianças, sem opção de es-
colha. Entendemos, ao longo de discussões,
que o sono não era uma necessidade de todas
as crianças, o que gerou a possibilidade de
ofertas diferentes. Atualmente, há na creche
o que chamamos de descanso, com espaços
organizados para o sono ou para brincadei-
ras tranqüilas.
O processo de estruturação do projeto
educacional ocorreu nos diferentes segmen-
tos da creche, resultado de um trabalho cole-
tivo. Agora, temos diferentes espaços organi-
zados para diálogo, discussões, planejamen-
to e construção desse trabalho.
Bibliografia
DUTOIT, R. A.
A formação do educador de creche na dinâ-
mica da construção do projeto educacional.
1995. Tese
(Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação,
Universidade de São Paulo, São Paulo.
OLIVEIRA, Z. M. R.
Para o educador de creche.
Ribeirão
Preto: USP/INEP/MEC, 1991.
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Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
Introdução
Fundada em 1972, a Escola Balão Vermelho
tem como marca o exercício da reflexão sobre a
sua prática, o que lhe proporciona um ganho
muito significativo na melhoria de seu ensino,
na medida em que antigas certezas do fazer pe-
dagógico podem ser flexibilizadas e dar lugar a
novas formas. E é investindo na formação de seus
educadores, promovendo encontros e congres-
sos de ação pedagógica e estabelecendo um
constante diálogo com outros saberes, tanto
acadêmicos quanto de outras instâncias, que a
escola vem conseguindo realizar esse processo.
Como parte desse trabalho reflexivo, a esco-
la reuniu seus educadores, no início do ano de
1994, para discutir a respeito da necessidade de
tornar seus alunos ainda mais participativos no
processo de aprendizagem, desde o planejamen-
to. Apoiados, naquele momento, nos estudos de
Josette Jolibert, deu-se início ao que podemos
chamar de “Pedagogia de Projetos.
Após seis anos de prática e de reflexão apoia-
da em discussões sustentadas por estudiosos,
como Fernando Hernández, Sacristán, entre ou-
tros, em 1998, o novo desafio que nos envolveu
foi delimitar diretrizes curriculares para a escola
e explicitá-las melhor aos alunos, pais e educa-
dores. A necessidade veio da prática com proje-
tos. Desde que a escola assumiu essa pedagogia,
muitas mudanças e escolhas foram sendo feitas.
Após quatro anos de percurso, já era possível to-
mar distância e buscar os eixos que estavam ori-
entando o trabalho naquele momento.
Atualmente, a escola vem prosseguindo seu
trabalho com projetos, porém numa concepção
Do formal ao cultural:
a experiência da Escola Balão
Vermelho com os Projetos de Trabalho
*
Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib
Escola Balão Vermelho/MG
cada vez mais ampla de seu significado. Enten-
demos que, mais do que ensinar os conteúdos
das disciplinas, a escola é um espaço de cultura
viva, que acolhe toda a diversidade de relações
presentes na realidade em que está inserida. As-
sim, trabalhar por projetos, hoje, mais que uma
opção metodológica, é uma postura assumida na
forma de conceber e concretizar a Educação,
numa nova possibilidade de organização do es-
paço e do tempo escolares.
Com a intenção de promover essa nova or-
ganização, reestruturamos a forma de agrupar as
crianças, de coordenar o trabalho pedagógico, de
facilitar a formação dos educadores, bem como
a reflexão contínua sobre os eixos curriculares
que nos orientam.
Dessa maneira, passamos a agrupar nossos
alunos por ciclos de formação, cada um deles
com dois anos de duração. Tomamos essa deci-
são em 1996, por acreditarmos que o processo
de formação exige um tempo maior e mais flexí-
vel que aquele induzido pela organização dos
estudos por série.
Organizamos as atividades escolares por
meio dos projetos de trabalho coletivos, proje-
tos individuais e módulos de aprendizagem. Essa
organização do trabalho tem garantido a possi-
bilidade de abordagens globalizadas dos diferen-
tes conteúdos e a participação ativa das crian-
ças no seu processo de aprendizagem.
Para esse contexto, modificamos, também,
nossa forma de organização do trabalho da equi-
pe pedagógica, buscando torná-la ainda mais co-
letiva. A experiência atual conta com a coordena-
ção de ciclos, que atua juntamente com a direção
pedagógica da escola. Essa função é ocupada, a
* Texto elaborado por Alessandra Latalisa de Sá e Ana Cristina Coura Cheib, em agosto de 2001.
200
cada seis meses, por um professor da escola, que
é eleito por seus companheiros do ciclo. Assim,
acreditamos atender melhor às necessidades de
formação e de reflexão sobre o trabalho realiza-
do. Estão previstos, ainda, assessorias e grupos de
trabalho para atender às necessidades de forma-
ção e de reflexão sobre o trabalho realizado.
Nossos atuais eixos curriculares buscam
definir as dimensões de formação dos edu-
candos que estamos priorizando. Esses eixos
curriculares se estendem da Educação Infantil
à Educação Fundamental e são, também, refe-
rências para a avaliação do processo e do ren-
dimento do trabalho. Como tais, eles não são
estáticos e podem ser reformulados a partir da
experiência vivida.
Os eixos curriculares são os seguintes:
• tratamento da informação;
• diversidade cultural;
• inserção na vida da cidade;
• experiências culturais e artísticas;
• instrumentalização para o estudo.
Entre as muitas práticas realizadas nessa
perspectiva, escolhemos relatar o “Projeto Lixo
– trabalho que envolveu toda a comunidade es-
colar e seu entorno na busca da construção de
uma nova atitude no que diz respeito ao trata-
mento dado ao lixo. A partir da proposta pelos
educadores de reflexões a esse respeito, as cri-
anças puderam identificar a necessidade de en-
tendimento da relação entre coleta seletiva e
reciclagem/reaproveitamento de materiais. Vi-
sando resolver o problema levantado, os educa-
dores instrumentalizaram as crianças, organi-
zando com elas estratégias de pesquisa e propos-
tas de ação que poderiam mobilizar a comuni-
dade para a necessidade de se atentar para essa
importante questão ambiental.
Esse projeto foi realizado no primeiro semes-
tre do ano letivo de 2001, na escola Balão Ver-
melho, pelas turmas da Educação Infantil, com
crianças entre 5 e 7 anos de idade. Ele será, aqui,
relatado por meio de um recorte do trabalho
desenvolvido em uma das turmas, com 19 cri-
anças entre 5 e 6 anos de idade.
É indiscutível, nos dias atuais, a necessidade
de uma intervenção direta da escola na forma-
ção de sujeitos capazes de se relacionarem com
o meio ambiente, buscando sempre a aquisição
de conhecimento, de valores, de atitude, de com-
promisso e de habilidade necessários para a pro-
teção e melhoria do meio ambiente; a criação de
novos padrões de conduta orientados para a pre-
servação e melhoria da qualidade do meio am-
biente” (MEC, 1991: 7).
Por esse motivo, já há algum tempo a escola
vinha investindo na colocação de lixeiras para a
coleta seletiva e, mais recentemente, aderiu ao
projeto Circuito Ambiental, que é uma parceria
da agência de promoção Asas Produções” com
a Associação dos Catadores de Papel, Papelão e
de Material Reaproveitável (Asmare).
1
No entanto, o trabalho que vínhamos fazen-
do em torno da conscientização da necessidade
da coleta seletiva não vinha sendo suficiente para
que, efetivamente, ocorresse a coleta. Foi a par-
tir dessa constatação que o grupo de professo-
ras decidiu realizar um projeto durante o 1
o
se-
mestre de 2001, em que esse tema pudesse ser
trabalhado.
Portanto, a intenção do nosso grupo era ini-
ciar um processo de mudança de atitude com a
comunidade escolar e seu entorno, no que diz
respeito ao tratamento dado ao lixo na escola e
nas residências. Pretendíamos que as crianças:
• conhecessem o que é o trabalho de coleta sele-
tiva e reciclagem;
• estabelecessem a relação entre a coleta seleti-
va e a reciclagem;
• desenvolvessem boas estratégias para viabilizar
a coleta seletiva, tanto na escola quanto em suas
residências;
• conectassem o problema” do tratamento que
tem sido dado ao “lixo” com uma esfera mais
ampla, relacionada à preservação do meio am-
biente e a formas de sobrevivência;
• tivessem um papel de multiplicador, divulgando
1
O projeto conta com a participação de diversas escolas, que receberam, cada uma delas, um contêiner para a coleta seletiva de lixo. O lixo
é enviado à Asmare, onde são feitas tanto a triagem e a posterior venda de material, quanto a reciclagem de uma parte dele. Estima-se que
mais 200 famílias se beneficiaram com o trabalho gerado pelo aumento da quantidade de material coletado.
200
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
a necessidade da coleta seletiva e compartilhan-
do o conhecimento adquirido durante o projeto
com a comunidade escolar e extra-escolar.
A partir dessa decisão, cada professora de-
senvolveu o trabalho com sua turma. Durante
todo o percurso, tivemos vários encontros em
que foram discutidas as estratégias de interven-
ção no processo de conscientização das crian-
ças sobre o tratamento do lixo, oportunidades
em que cada uma de nós compartilhava o mate-
rial utilizado no estudo e os avanços que a tur-
ma havia realizado.
Problematização
O primeiro momento do projeto foi uma con-
versa com as crianças. Nessa conversa, fiz uma
série de perguntas às crianças a fim de saber
quais informações elas tinham a respeito do
tema (coleta seletiva e reciclagem do lixo).
Constatei que muitas delas tinham algumas
informações, principalmente no que diz respei-
to à reciclagem, que, segundo elas, “é transfor-
mar coisa velha em nova. No entanto, quando
questionadas sobre a coleta seletiva, todas re-
velaram nunca a haver feito. Também, quando
perguntei sobre o objetivo daquele coletor que
havia na escola, todas disseram que era para se-
parar o lixo, mas quando insisti perguntando
para que” separá-lo, nenhuma delas estabele-
ceu conexão com a reciclagem.
Então, ao final dessa primeira conversa, in-
formei às crianças que aquele lixo coletado na
escola era destinado à Asmare e propus que es-
tudássemos sobre o “lixo, pois percebia que elas
poderiam compreender melhor por que se faz
coleta seletiva e o que é a reciclagem.
Organização do projeto
Num segundo momento com as crianças,
retomei a conversa inicial e propus que, para re-
alizarmos o nosso projeto, organizássemos uma
lista com tudo aquilo que não poderíamos es-
quecer de fazer. Durante a confecção da lista,
tanto eu quanto as crianças apresentamos suges-
tões e discutimos a importância de cada ação.
A lista, que foi afixada no mural e serviu como
referência durante todo o percurso, tinha os se-
guintes itens:
• estudar a reciclagem;
• marcar um dia para trazer lixo de casa;
• colocar duas lixeiras na sala;
• assistir ao filme da Asmare;
• visitar a Asmare;
• aprender a reciclar;
• contar o que aprendemos para outras pessoas.
O desenvolvimento do projeto
A partir de agora, relatarei cada um dos itens
da lista como momentos importantes no decor-
rer do projeto, fazendo uma abordagem das es-
tratégias utilizadas para tratamento da questão
com as crianças e da relação delas com a pro-
posta curricular da escola.
Reciclagem
Questionadas sobre as coisas novas” nas
quais se transformavam as “velhas” na recicla-
gem, as crianças informaram que viravam brin-
quedos. Então, informei-lhes que diferentes
materiais, quando reciclados, eram matéria-pri-
ma para diferentes produtos, e que alguns livros
contavam isso.
A essa altura, outra professora, com sua tur-
ma, já havia solicitado à bibliotecária da escola
que separasse todo o material relativo a “lixo
disponível na biblioteca.
2
De posse desse material, separei, com a par-
ticipação das crianças, aqueles livros que trata-
vam da reciclagem de diferentes materiais: plás-
tico, papel, metal, vidro. Combinei com elas que
leríamos cada um deles e anotaríamos as infor-
mações relativas ao destino dos materiais, no
processo de reciclagem.
As informações anotadas foram também afi-
xadas no mural. Esse estudo, além de esclarecer o
destino de cada material, informou às crianças a
diferença entre reciclagem e reaproveitamento.
2
Esse material permaneceu disponível na biblioteca (separado em uma caixa) para todas as turmas envolvidas com o projeto.
202
Instrumentalizar as crianças para o estudo e
o tratamento dado às informações
3
foram pon-
tos abordados nesse momento do projeto, em
que trabalhei, com as crianças, estratégias de
busca e seleção de informação, bem como de seu
armazenamento para futuras recorrências.
Marcar dia para trazer lixo de casa
Faz parte da cultura da escola a elaboração,
por turma, de um calendário semanal, em que são
registradas as principais atividades de cada dia.
Um destes é o dia do brinquedo” – dia escolhido
pela turma e no qual cada criança pode levar para
a escola um brinquedo de casa. Estabelecendo
uma relação com esse dia, propus às crianças a
escolha de um dia para trazer lixo de casa.
Para que os pais pudessem ajudar as crian-
ças e compartilhassem da nossa empreitada,
sugeri que lhes escrevêssemos um bilhete. Nele,
além de falar sobre a importância da coleta sele-
tiva, seria necessário informar o dia em que o
lixo deveria ser levado à escola.
Em conversa com outra professora envolvida
no projeto, ela me informou sobre a estratégia de
sugerir aos pais que tivessem duas lixeiras em
casa: uma para os recicláveis (estes deveriam ser
lavados antes de colocados na lixeira)
4
e outra para
os não-recicláveis. A sacola com os recicláveis se-
ria levada para a escola, e as crianças se encarre-
gariam de fazer a triagem para as respectivas par-
tes do contêiner. Contei às crianças a idéia e es-
crevemos essa sugestão em nosso bilhete aos
pais. E ressaltei para as crianças a importância do
uso de um instrumento adequado (no caso, o bi-
lhete) para conseguirmos atingir o nosso objeti-
vo: que os pais pudessem, de fato, ajudá-las.
Colocar duas lixeiras na sala
Sugeri que também levassem para o contêiner
o lixo produzido em nossa sala. Para isso, ele não
poderia estar todo misturado nem sujo. A primei-
ra proposta foi de uma lixeira para plástico e outra
para papel, por serem os materiais mais utilizados
por nós. No entanto, ficamos sem ter onde colocar
o não-reciclável. Após alguns dias de incômodo,
fui até a sala de outra professora, que havia feito
da seguinte forma: uma lixeira para os recicláveis
e outra para os não-recicláveis (como na sugestão
feita aos pais). Levei as crianças até a outra sala para
verem a boa idéia que tiveram e fizemos o mesmo
em nossa sala. Diariamente, ao final da aula, uma
criança leva o lixo até o contêiner.
Assistir ao filme da Asmare
Ao organizarmos o roteiro com as principais
ações do projeto, contei às crianças sobre a pos-
sibilidade de irmos até a Asmare, onde podería-
mos ver o que, de fato, se fazia lá.
O filme, com uma matéria sobre a fundação
da associação e o trabalho realizado por ela, fa-
zia parte da nossa caixa na biblioteca. Propus às
crianças que assistissem ao filme para conhece-
rem o lugar aonde iriam e entenderem como ele
funcionava, preparando-se para a visita. Ao pla-
nejar a aula, assisti ao filme e programei saltos
(das partes que continham longas entrevistas) e
paradas (para chamar a atenção das crianças
sobre algum detalhe ou antecipar o que veriam
na cena seguinte). Essa estratégia foi usada vi-
sando à maior adequação daquele material para
o uso com crianças.
Assistir a esse filme colocou as crianças di-
ante de uma realidade muito diferente
5
daquela
na qual vivem e, além disso, explicitou, de uma
forma contundente, o caráter solidário da ação
de separar o lixo para que este, levado à Asmare,
fosse fonte de trabalho para aquelas famílias li-
gadas à associação.
A partir dessa constatação pelas crianças,
procurei trabalhar com elas a importância das
atividades realizadas na Asmare para a preser-
3
Ambos os pontos são parte do currículo da escola, estruturado a partir de cinco eixos: experiências culturais e artísticas, instrumentalização
para o estudo, diversidade cultural, tratamento da informação e relação cidade–escola.
4
Nos livros em que estudamos, as crianças obtiveram a informação de que todo material a ser reciclado ou reaproveitado deveria ser lavado,
já que a sujeira poderia danificá-lo (mofo, ferrugem), inviabilizando seu aproveitamento.
5
Em nosso currículo, esse ponto tem relação com a diversidade cultural, em que procuramos trabalhar a construção de uma identidade tanto
a partir do contraste com o diferente, quanto do reconhecimento desse diferente e do respeito a ele.
202
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
vação do meio ambiente. Portanto, não eram
apenas elas que ajudavam a Asmare, mas o tra-
balho feito lá ajudava a todos nós, na medida que
dava um tratamento adequado ao lixo, evitando
seu acúmulo e o desperdício de matéria-prima.
A esse respeito, havia lido para elas uma repor-
tagem da “Folhinha” do jornal Folha de S.Paulo,
afirmando que, a cada dia, produzíamos mais
lixo e o planeta continua do mesmo tamanho;
portanto, se isso continuar assim, um dia o pla-
neta estará completamente coberto de lixo.
Visita à Asmare
Permanecemos por duas horas nas depen-
dências da Asmare. Nossa visita foi monitorada
por uma das pessoas que trabalhavam com a tri-
agem do material coletado.
Mais do que ao assistir ao filme, as crianças
se surpreenderam com aquelas pessoas traba-
lhando em meio a montanhas de material.
Janete, a monitora da visita, explicou todo o pro-
cesso de triagem, além de mostrar a reciclagem
do papel, o reaproveitamento da madeira e a loja
onde a produção era vendida.
Enquanto nos mostrava o espaço e falava
sobre o trabalho lá realizado, a monitora chama-
va a atenção das crianças para o quanto era bom
poder trabalhar ali, e contou-lhes sobre um
“lixão” que havia visitado, onde as pessoas vi-
viam catando lixo no meio da sujeira.
Registrei a visita com fotografias. No dia se-
guinte, já com as fotos na mão, reconstruí, com
as crianças, o percurso da visita e as informações
que tínhamos obtido lá.
O processo que utilizei foi o seguinte: mos-
trava a fotografia, e as crianças se lembravam,
com a minha ajuda (por meio de perguntas e
comentários do que eu própria me lembrava),
do que tinha sido fotografado e do que a Janete
havia dito sobre aquele lugar ou aquela tarefa
específica.
Esse registro (fotografias acompanhadas de
texto) foi afixado na parede externa à sala para que
outras turmas pudessem conhecer o trabalho da
Asmare. O texto também foi digitado e distribuí-
do para as crianças, para que fosse guardado em
uma pasta com outros registros do projeto.
É necessário ressaltar que esse momento do
projeto tem relação com outro eixo curricular: a
relação cidade–escola, em que é revelada a nossa
intenção de levar as crianças ao reconhecimento
da possibilidade de inter-relação entre a escola e
outras tantas instituições e espaços da cidade. Por-
tanto, é importante, para nós, que as crianças te-
nham oportunidade de aprender a reconhecer
outros espaços, além da escola, como possíveis
fontes para a construção do conhecimento.
Aprender a reciclar
Na Asmare, ao conhecer o lugar onde era fei-
ta a reciclagem do papel, as crianças puderam
observar todo o processo de reciclagem e acom-
panhar as explicações de uma das pessoas que
lá trabalhavam.
Para o registro da explicação, foi feita uma es-
crita no formato de receita, e esta foi anexada à
pasta de cada criança. Ao propor que guardassem
o registro, deixei claro que iríamos recorrer a ele
quando, no segundo semestre, fôssemos realizar
uma oficina de reciclagem de papel na escola.
A busca de um formato adequado para a es-
crita do que haviam memorizado sobre como
se recicla o papel” foi um importante momento
de aprendizado. Nesse momento, o confronto de
diferentes gêneros textuais proporcionou uma
escolha consciente pelas crianças do texto tipo
receita” como o mais adequado para o registro.
Contar para outras pessoas
o que aprenderam
A essa altura, as crianças já tinham muitas
informações sobre reciclagem e já conseguiam
estabelecer uma relação entre ela e a coleta se-
letiva. Portanto, voltando ao mural onde estava
o roteiro do projeto, retomei a discussão sobre a
necessidade de contarem para outras pessoas a
respeito do que haviam aprendido.
O primeiro público-alvo da nossa divulgação
foram as crianças e professoras de outras turmas
da escola. Para isso, dividi a turma em equipes,
para que cada uma delas fosse até uma das salas.
A tarefa seria falar sobre a importância de se fazer
a coleta seletiva, para que a reciclagem fosse pos-
sível, e marcar um dia para que a turma trouxes-
se o lixo de casa para a escola. Depois, já em nos-
204
sa sala, construímos uma tabela em que estavam
marcados os dias de cada turma trazer o lixo. Essa
tabela foi afixada no corredor da escola.
No entanto, já feita a divulgação interna, era
preciso cuidar da externa. As crianças, quando
questionadas sobre a melhor maneira de divulgar-
mos a necessidade da coleta seletiva, disseram que
bastava que contássemos a nossa experiência para
as pessoas com as quais nos encontrássemos.
Então, eu lhes disse que contar” não era sufi-
ciente, pois as pessoas acabariam se esquecendo,
já que era preciso memorizar muitos dados (como,
por exemplo, a cor da lixeira destinada a cada ma-
terial). Sugeri a confecção de um panfleto que, além
de propagar a importância da coleta seletiva, po-
deria ajudá-las a ensinar como fazê-la.
Recolhi e analisei com as crianças uma série
de panfletos para que elas pudessem produzir o
seu próprio. Durante a análise, chamei a aten-
ção para os aspectos característicos do tipo de
linguagem utilizada e como as informações eram
organizadas. Todas as observações feitas eram
anotadas para que, ao produzirmos o panfleto
referente à coleta seletiva, pudéssemos recorrer
a elas. As características anotadas foram:
• uso de ilustração;
• uso de escrita com letras grandes e com letras
menores;
• uso de muitas cores para as pessoas enxerga-
rem melhor;
• uso de números para mostrar o endereço, o te-
lefone e o preço;
• uso de mapa para indicar caminhos;
• uso de símbolos (logomarcas);
• uso de palavras para mandar” nas pessoas:
compre, venha, não perca, venha agora, coma,
experimente;
• uso de textos afirmando que o produto ou o
serviço seria o melhor, o que nem sempre é ver-
dade, sendo apenas uma forma de induzir as
pessoas a comprar;
• uso de asteristo (*), seta ( ) ou splash ( )
para mostrar coisas importantes.
A produção do panfleto foi coletiva, numa
situação em que todas as crianças davam palpi-
tes e eu, além de realizar o registro por escrito,
fazia intervenções no sentido de aproximar a lin-
guagem utilizada àquela própria de um texto
publicitário, naquele suporte específico.
Feitos os panfletos, iniciamos sua distribui-
ção pelas ruas e prédios em torno da escola. Para
que essa tarefa fosse viável, contei com a ajuda
de uma funcionária da escola, que, a cada dia,
permanecia com parte das crianças na escola,
para que eu pudesse sair com um pequeno gru-
po. Esse trabalho de panfletagem é feito até hoje,
semanalmente.
Além do panfleto, produzimos um cartaz que
foi afixado numa feira de verduras e legumes que
fica em frente da escola. Para a sua confecção,
da mesma forma como foi feito o panfleto, levei
para a sala diferentes cartazes que, depois de
analisados, serviram de referência para a produ-
ção do nosso próprio cartaz.
Portanto, aprender a fazer panfleto e cartaz
não foi uma situação descontextualizada de
aprendizagem. Pelo contrário, ocorreu em um
contexto real de uso, em que uma comunicação
fazia-se necessária e, para que fosse de fato efi-
caz, era preciso que as crianças o fizessem de
forma adequada. Dar acesso às crianças a esses
objetos sociais de escrita faz parte do que acre-
ditamos ser indispensável para a formação de
nossos alunos.
Avaliação
Ao final do semestre, quando já cuidávamos
da divulgação da coleta seletiva e aquele proble-
ma inicial de saber o que era reciclagem e qual a
sua relação com a coleta seletiva já havia sido
resolvido, conversei com as crianças sobre o fi-
nal do projeto. Ressaltei que esse final não signi-
ficaria o fim do nosso investimento na conscien-
tização da importância da coleta seletiva, e que,
por isso, continuaríamos com a panfletagem e
com o dia de trazer lixo de casa.
A avaliação final foi feita tanto em termos
coletivos quanto individuais. Primeiramente,
houve uma conversa e um registro coletivos,
momentos em que as crianças falaram sobre o
que haviam aprendido, e, depois, uma entrevis-
ta individual em que cada qual respondeu o que
considerou mais importante no nosso projeto.
Além dessa avaliação final, o processo de
avaliação esteve presente durante todo o per-
204
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
Projetos pedagógicos
de linguagem oral e escrita
na Educação Infantil
Sonia Regina da Silva Souza*
Associação Verbo Divino/SP
curso. Exemplos: ao elaborarmos o panfleto, as
crianças avaliaram o que haviam aprendido à
medida que organizavam o conteúdo para ser
contado a outras pessoas; quando colocamos
duas lixeiras na sala, uma para plástico e outra
para papel, percebemos que o resultado não
estava adequado à nossa necessidade e, após
uma avaliação, recorremos à solução encontra-
da por outra turma. Portanto, avaliar é instru-
mento necessário para a construção de sentido
e para a continuidade do processo, e não ape-
nas uma situação estanque, localizada no final
do processo.
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DELVAL, J.
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. Trad.
Jussara Rodrigues. Porto Alegre: Artmed, 2001.
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LEITE, Lúcia Helena Alvarez (Org.).
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rizonte: Editora Balão Vermelho, 1998. Cadernos de ação
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Compreender e transformar o en-
sino
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.
O currículo
: uma reflexão sobre a prática. Por-
to Alegre: Artmed, 1998.
.
A educação obrigatória
: seu sentido educa-
tivo e social.
Trad. Jussara Rodrigues. Porto Alegre:
Artmed, 2001.
SANTOMÉ, Jurjo Torres.
Globalização e interdisciplinarida-
de
: o currículo integrado. Porto Alegre: Artmed, 1997.
Introdução
Durante muito tempo, nosso trabalho es-
teve totalmente voltado para os cuidados fí-
sicos e as práticas assistencialistas. Procurá-
vamos fazer o que sabíamos em relação ao
atendimento das crianças, mas não havia uma
proposta pedagógica nem mesmo espaço
onde poderíamos pensar sobre isso. Sentía-
mos falta de uma proposta mais consistente,
que nos permitisse olhar as crianças de uma
forma diferente.
Em 1994, surgiu a oportunidade de transfor-
mar nosso cotidiano. Recebemos um convite para
participar do Programa Capacitar 1, organizado
pela Cooperativa de Entidades (Cooperapic), fi-
nanciado pelo Instituto C&A de Desenvolvimen-
to Social e posto em prática pela ONG Creche-
plan, hoje, Instituto Avisa Lá! Nesse programa,
todos os profissionais da nossa instituição pas-
saram a receber formação em serviço. A partir daí,
as mudanças foram acontecendo.
A cada encontro de formação, descobría-
mos a importância de se pensar na creche como
* Coordenadora pedagógica da Creche da Associação de Mães Unidas do Novo Osasco (Amuno) e formadora da Creche Verbo Divino,
associada à Cooperapic/SP
206
espaço educacional. Foi se criando um olhar
diferente para todos aspectos que envolviam
as crianças. Começamos a elaborar um proje-
to institucional mais consistente, do qual par-
ticiparam todos os funcionários da creche.
Além de todas as mudanças que envolvia re-
pensar a concepção de criança, desenvolvi-
mento, aprendizagem e ensino, as práticas pe-
dagógicas foram modificadas. Dentre elas, gos-
taria de destacar a incorporação dos projetos
pedagógicos em nosso cotidiano. A experiên-
cia com projetos trouxe mais significado ao
trabalho e nos permitiu ter outra visão em re-
lação ao trabalho com Educação Infantil.
Concepção de projeto
pedagógico
Historicamente, o trabalho com projetos
tem atravessado vários momentos da história
da Educação e vem se transformando ao lon-
go do tempo. A concepção que adotamos en-
tende o projeto como um trabalho pedagógi-
co o mais próximo possível das práticas soci-
ais. O projeto é um conjunto de situações con-
textualizadas, em que há um objetivo compar-
tilhado com as crianças desde o início. As cri-
anças são envolvidas em uma seqüência de
atividades com vistas a produzir um evento ou,
então, um ou mais objetos, que dão visibilida-
de ao processo de aprendizagem. Há um forte
vínculo com uma área de conhecimento, mas,
dada a sua natureza, os projetos pedagógicos
integram sempre diferentes áreas que colabo-
ram com o produto final.
As crianças podem ser engajadas em uma
seqüência de atividades para produzir um
baile de carnaval, uma fita cassete com músi-
cas escolhidas, um livro de receitas etc.
Por que o trabalho
com projetos?
Para as crianças, há um grande ganho, pois
se sentem atraídas e motivadas a participar
das atividades, quando compreendem sua fi-
nalidade e podem relacioná-las com as coi-
sas que já conhecem.
Compartilhar com os outros também é
importante para as crianças, pois eles sabem
que o seu trabalho terá outros leitores e apre-
ciadores. Para isso, colocam em jogo tudo o
que sabem, tomando decisões e dividindo ta-
refas. Enfim, o comprometimento é maior, o
que garante que as aprendizagens sejam mais
efetivas e o resultado, o melhor possível.
É grande o envolvimento do educador,
pois geralmente ele é o responsável pela es-
colha do tema. Precisa desenvolver um estu-
do prévio e organizado, pois, o tempo todo,
está se confrontando com questões e desafios
que as crianças vão trazendo. Seu papel é o
de promover situações de aprendizagem de
forma significativa. O projeto nos permite
uma organização seqüenciada dos conteúdos
mais importantes para cada faixa etária. A
princípio, ele requer mais tempo por parte do
educador, mas, a partir de sua implantação,
o trabalho flui, facilitando nossa ação, permi-
tindo uma visão melhor de quanto e como as
crianças aprendem.
Resumindo as vantagens, podemos dizer
que a prática de trabalho com projetos pos-
sibilita:
• a promoção de aprendizagens significativas;
• o desenvolvimento de uma atitude favorá-
vel para o conhecimento;
• a garantia de uma seqüência organizada de
conteúdos;
• o acompanhamento mais fácil do que as cri-
anças estão aprendendo;
• o aprendizado da busca de informações pe-
las crianças;
• avaliação constante;
• maior envolvimento de educadores e crianças.
Quando e quanto trabalhar
com projetos
Projetos didáticos são mais adequados
quando as crianças já entendem a relação en-
tre as atividades e o produto final. A partir dos
3 anos, é possível pensar em organizar um tra-
balho como esse. Em geral, desenvolvemos um
projeto por grupo, a cada três ou quatro meses.
206
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – Educação Infantil
PAINEL 16
A organização do tempo didático envolve,
além dos projetos, as atividades permanen-
tes e diferentes seqüências. Se, por exemplo,
estamos desenvolvendo um projeto de recon-
to de histórias conhecidas, teremos muitas
ações envolvendo tanto a linguagem oral
quanto a escrita. Portanto é preciso pensar em
atividades permanentes e seqüenciais que
envolvam outras áreas, como movimento, ar-
tes visuais, música etc., para que, em outros
momentos do dia, as crianças tenham expe-
riências diferentes.
Conteúdos possíveis
na Educação Infantil
O mais importante é que, na Educação In-
fantil, podemos diversificar muito, pois não
há um currículo rígido a seguir. Isso permite
boas escolhas em relação aos projetos. É im-
portante lembrar que todo trabalho pedagó-
gico envolve conteúdos conceituais, proce-
dimentais e atitudinais. Assim, ao produzir
uma fita cassete de poesias para doar a um
grupo de crianças menores, por exemplo, es-
taremos trabalhando não só a linguagem
oral e escrita, mas também a auto-estima, a
valorização da cultura, a socialização etc.
Com as crianças de 4 a 6 anos, podemos ou-
sar um pouco mais. Há possibilidade de tra-
balharmos com mais conteúdos, pois espera-
mos que elas avancem no conhecimento do
código alfabético e da linguagem escrita. As-
sim, são inúmeros os produtos ligados a dife-
rentes gêneros textuais, como a produção de
textos informativos, folders, livro de adivinhas
ou rimas etc.
A concepção que adotamos entende o pro-
jeto como um conjunto de situações contex-
tualizadas. Há um objetivo final, que é com-
partilhado com as crianças desde o início. As
crianças são envolvidas em uma seqüência de
atividades com vistas a produzir um evento
ou um ou mais objetos, que dão visibilidade
ao processo de aprendizagem. Há um forte
vínculo com uma área de conhecimento, mas,
dada a sua natureza, os projetos pedagógicos
integram sempre diferentes áreas que colabo-
ram com o produto final.
Quando esperamos que as crianças avan-
cem no conhecimento do código alfabético e
da linguagem escrita, podemos pensar em
produtos ligados a diferentes gêneros textu-
ais, como a produção de textos informativos,
folders, livro de adivinhas ou rimas, fita cas-
sete com músicas etc.
209
PP
PP
P
AINEL AINEL
AINEL AINEL
AINEL
1717
1717
17
PROJETO PEDAGÓGICO:
POR QUÊ, QUANDO E COMO –
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Rosângela Pereira
Elizabete Monteiro
210
Por quê
Esse trabalho foi realizado em uma sala de
aula de jovens e adultos da empresa Método
Engenharia, em convênio com a Fundação
Kellog e o Centro de Estudos Escola da Vila. O
grupo era constituído, em sua maioria, por ho-
mens que desempenhavam diversas funções na
construção civil.
Nosso projeto pedagógico na Educação de
Jovens e Adultos consiste em utilizar o texto
como unidade básica e sua diversidade no uso
social, pois os educandos jovens e adultos, em-
bora não tenham freqüentado a escola, entram
em contato diário com diversos tipos de texto.
Esse trabalho proporciona aos educandos
melhorarem sua competência comunicativa, pois
amplia seu repertório no mundo letrado, tanto
lendo como produzindo textos para se comuni-
carem por meio de mais de uma linguagem.
Nessa modalidade de trabalho, os educandos
comprometem-se com o conteúdo trabalhado,
já que esse conteúdo parte de seus conhecimen-
tos prévios, e, por meio do aprofundamento dos
estudos, ampliam esses conhecimentos.
Quando
O primeiro projeto que desenvolvemos foi
o “Estudo da Migração, pois era latente, na
classe, o sentimento de solidão do alunos por
terem deixado suas famílias em outras cidades
e estarem morando em São Paulo. Trouxemos
para a sala de aula livros, revistas e artigos de
jornal sobre o tema para trabalharmos em clas-
se. Estabelecemos, como produto final desse
projeto, a confecção de um almanaque. A idéia
desse tipo de portador surgiu por ser um ma-
terial muito comum em algumas regiões do
Projeto pedagógico:
por quê, quando e como
Rosângela Pereira
Projeto Kellog/SP
Brasil e possibilitar a inclusão de diferentes ti-
pos de texto no mesmo material.
Após produzirmos esse primeiro material,
fizemos uma noite de autógrafos” em que os
educandos declamaram poesias de sua auto-
ria e contaram como foi a experiência de pro-
duzir um almanaque.
Outro projeto foi sobre a Aids, pois era uma
preocupação nossa e deles saber mais sobre o
assunto e divulgar os conhecimentos aprimo-
rados em sala de aula, o que é um dos objeti-
vos do estudo por projetos: ter um produto fi-
nal que possa transmitir os assuntos estudados
em sala de aula para a comunidade em que a
escola ou os educandos estão inseridos, com a
finalidade de debater o assunto e, se possível,
até modificar os hábitos e as atitudes dos mo-
radores, por meio do conhecimento.
Ao concluirmos esse material, demos con-
tinuidade ao estudo da reprodução humana e
produzimos um atlas desenhado pelos próprios
educandos.
Como – A escolha do tema
A partir das primeiras conversas com os
educandos, foi possível detectar temas que se-
riam de interesse da classe e, também, incluir
o estudo de diversas áreas do conhecimento.
Depois de escolhido o tema, utilizamos di-
ferentes tipos de textos: jornalísticos, contos,
receitas, poesias, cartas.
Leituras feitas pela professora
para apreciação da classe
O primeiro livro escolhido para ser lido
pela classe foi Vidas secas, por se tratar do
tema da migração e ser um texto bem escri-
210
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJA
PAINEL 17
to, pois o trabalho com bons textos serve
como modelo e dá a possibilidade aos
educandos de se apropriarem da organização
textual e de uma linguagem diferente, na hora
de produzirem textos de autoria. Depois, le-
mos os livros As mil e uma noites e Estrela so-
litária.
Houve também a leitura de diferentes con-
tos (sem que estivessem, necessariamente, li-
gados ao tema), para que a classe pudesse se
apropriar da estrutura narrativa e da caracteri-
zação dos textos.
As notícias de jornal trazidas tinham maté-
rias relacionadas ao tema do projeto. Às vezes,
trabalhávamos com todo o jornal para estudar-
mos sua organização (divisão por cadernos), a
inferência sobre o assunto da notícia por meio
das fotos ou das manchetes. Depois organiza-
mos um mural em que os educandos escolhi-
am uma notícia e faziam um pequeno comen-
tário sobre ela.
Cartas
Era um grande anseio deles escrever e man-
dar cartas, assim como poder ler as que recebi-
am. Escrevemos algumas cartas em classe e per-
cebemos que os modelos utilizados eram fixos
e nem sempre expressavam a mensagem que
eles gostariam de enviar. Um dos educandos
levou para a classe um livreto com modelos de
cartas de amor. Percebemos, então, que pode-
ria vir daí uma escrita muito parecida entre as
cartas. Passamos, então, a reescrevê-las, indi-
vidual e coletivamente. A correção individual
tratava do sentido daquilo que queriam trans-
mitir e a coletiva dizia respeito à ortografia e
concordância.
Receitas e textos instrucionais
Esse tipo de texto é direto e objetivo e pos-
sibilita a inferência do resultado por meio dos
materiais ou ingredientes usados ou da descri-
ção da execução do prato ou objeto. Lemos tex-
tos instrucionais para confeccionar objetos; le-
mos ingredientes de receitas para descobrir
qual prato seria confeccionado, e, pelo estudo
do texto A sopa de pedras, criamos a receita e
o modo de fazer esse prato.
Poesias
Estudamos diferentes poesias, exploramos
sua finalidade (despertar sentimentos), decla-
mamos e reescrevemos algumas delas, troca-
mos ou completamos algumas rimas que foram
subtraídas das poesias e, para o almanaque,
publicamos versões feitas pelos educandos da
poesia “Cidadezinha qualquer”.
Trabalho com os textos
Ao trabalhar os diferentes textos, utilizamos:
Reescrita. Era feita a leitura de um texto várias
vezes, até que eles o tivessem na memória.
Depois, era solicitado que o reescrevessem,
trabalho que possibilita que os educandos se
preocupem somente com a organização do
texto e até com a ortografia, pois o texto eles
já têm na memória.
Revisão textual coletiva. Ao produzirmos tex-
tos em sala (mesmo os reescritos), selecioná-
vamos alguns e, com autorização do autor, re-
visávamos o texto com a classe toda, avalian-
do a ortografia e a concordância e fazendo as
modificações, quando necessário.
Revisão textual individual. Na produção de tex-
tos utilizados nos produtos finais, os educandos
escreviam e nós fazíamos as revisões, discutin-
do com cada educando. Ou digitávamos os tex-
tos na forma como eles haviam escrito e discu-
tíamos se estavam bons. Eles, então, percebiam
as palavras, as frases e as concordâncias que pre-
cisavam ser corrigidas e, normalmente, alega-
vam que os erros deviam ser da digitação, pois
não acreditavam tê-los cometido.
Roda de leitura. Semanalmente, deixávamos
expostos todos os livros da classe para que os
educandos escolhessem um e o levassem para
casa. Na semana seguinte, um dos estudantes
comentava a história que tinha lido e indica-
va, ou não, o livro para os colegas.
É importante ressaltar que as atividades
eram as mesmas para toda a classe, indepen-
dente da hipótese que os educandos tinham
sobre a língua escrita. O que diferenciava o tra-
balho era a intervenção feita pela educadora
com cada um dos educandos e o nível de exi-
gência para cada um deles.
212
Contextualização
Um pouco da história
A idéia de fazer uma escola para crianças
e adolescentes atendidos pelo Projeto Axé vi-
nha sendo discutida há cinco anos. Nasceu de
uma forte demanda dos educadores em razão
da observação e constatação das dificuldades
pelas quais grande parte dessas crianças e
adolescentes passava nas escolas públicas
que freqüentavam.
Essa população costumava chegar ao Pro-
jeto Axé com uma história de evasão e repe-
tência escolar, história essa semelhante à de
muitas crianças e jovens das comunidades
pobres de Salvador.
A freqüência na escola é condição para par-
ticipar das atividades do Projeto Axé, mas, com
raras exceções, os educandos não ultrapassa-
vam a 3ª série do 1° grau, ou estavam fora da
escola. Esses dados, obtidos do relatório anual
do Projeto Axé (1998), revelam que grande par-
te desses alunos, com defasagem de idade/sé-
rie, passou por múltiplos fracassos na escola.
Geralmente, esses alunos têm uma auto-esti-
ma muito baixa e não acreditam que são capa-
zes de aprender. Por causa disso, realizou-se
uma parceria entre o Projeto e a Secretária Mu-
nicipal de Educação e Cultura (SMEC), com o
objetivo de oferecer Educação formal do Ensi-
no Fundamental de qualidade para as crianças
e adolescentes atendidos pelo Projeto Axé e da
comunidade na qual a escola estava inserida.
No início do ano letivo (abril de 1999), a es-
cola funcionou em uma casa alugada pelo Pro-
jeto Axé e, em razão de limitações das instala-
Projetos didáticos e a
prática de letramento:
experiência de uma escola
pública de Salvador
Elizabete Monteiro
Projeto Axé/BA
ções, atendemos nove classes, sendo seis no
turno matutino, com alunos que apresentavam
grande defasagem de idade/série, e três classes,
no turno vespertino, de ensino regular.
Em 2000, ampliamos a capacidade de aten-
dimento da escola para 29 turmas (dez pela
manhã, dez à tarde e nove à noite), com nú-
mero de matrículas próximo a 800 alunos. Atu-
almente, funciona num prédio bastante amplo,
com instalações modernas e bem equipadas.
A escola hoje
Inserida num contexto socioeconômico pou-
co privilegiado, no bairro de São Cristóvão, que
apresenta alto índice populacional, a escola está
localizada, estrategicamente, na rua principal,
que delimita duas áreas empobrecidas,
marcadas pela miséria e pela marginalização.
Apesar desse contexto muito próximo da
realidade das crianças e jovens atendidos pelo
Projeto Axé, percebem-se manifestações de
preconceito e discriminação da comunidade
em relação aos alunos, meninos e meninas do
Projeto Axé, que freqüentam a escola.
Tanto os alunos que vêm de outros bairros
da cidade quanto os da comunidade de São
Cristóvão estão expostos aos mesmos sintomas
da patologia da nossa cidade (que coincidem
com os de outras metrópoles brasileiras): altas
taxas de desemprego ou subemprego, moradias
sem condições mínimas de habitabilidade e de
suprimento dos serviços de água e luz, equilí-
brio familiar fragilizado, convívio com a violên-
cia e a miséria generalizada.
Um aspecto adicional que emerge das ori-
gens históricas da cidade, importante também
na construção da proposta pedagógica da Es-
212
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJA
PAINEL 17
cola Municipal Barbosa Romeo, é a articulação
entre raça e pobreza como variáveis que defi-
nem a participação precoce da criança no mer-
cado de trabalho de Salvador. No interior des-
sa conjuntura, os vínculos já frágeis dos nú-
cleos familiares dificilmente resistem.
Nesse contexto, a definição da identidade
do Projeto IIê Ori, desenvolvido na Escola Mu-
nicipal Barbosa Romeo, foi construída a partir
da idéia da sociedade como uma totalidade na
qual nossos alunos estão inseridos. Isso impli-
cou pensar numa proposta pedagógica que pu-
desse atender a essas crianças integralmente,
não só no âmbito de conteúdos conceituais,
mas, principalmente, em relação aos conteú-
dos procedimentais e atitudinais, em que éti-
ca, valores e estética estejam impregnando
toda a prática da escola.
Acreditamos que o movimento próprio do
processo de construção do conhecimento deve
permear a sala de aula, possibilitando ao alu-
no aprender pensando.
O papel da teoria nesse processo é o de for-
necer subsídios para que o professor observe
e reflita melhor sobre sua prática e perceba em
quais pressupostos ela está respaldada. A in-
tervenção do professor no processo educativo
é fundamental, no sentido de orientar a busca
de soluções, por meio da apresentação de no-
vas informações e desafios a partir de estraté-
gias pedagógicas.
Esse ponto de vista dá grande ênfase ao va-
lor da atividade grupal, ressaltando-se a coope-
ração em lugar da competição, como princípio
básico. A troca entre alunos é fator indispensá-
vel para a construção do conhecimento. Den-
tro dos grupos envolvidos em atividades signi-
ficativas, há necessidade de expressar pontos de
vista, trocar idéias e discutir meios e modos
para a resolução de problemas. Dessa forma, a
Pedagogia de Projeto, opção metodológica da
escola, atendeu a esses princípios.
Por que pedagogia de projetos
Numa sociedade em constante transforma-
ção, o conhecimento é cada vez mais volátil e fle-
xível. Como educadores deste novo milênio, pre-
cisamos desenvolver uma pedagogia em que
professor e aluno possam dialogar problemati-
zar e atualizar as questões e os desafios do co-
nhecimento.
Segundo Fernando Hernandez:
A função do projeto é favorecer a criação de es-
tratégias de organização dos conhecimentos es-
colares em relação: 1. ao tratamento da informa-
ção; e 2. à relação entre os diferentes conteúdos
em torno de problemas ou hipóteses que facili-
tem aos alunos a construção de seus conheci-
mentos, a transformação da informação proce-
dente dos diferentes saberes disciplinares em
conhecimentos próprios (Hernández, 1998: 61).
Sendo assim, o trabalho com projetos cons-
titui-se em excelente situação de uso social dos
conteúdos, que são desenvolvidos de forma sig-
nificativa.
Os projetos favorecem o necessário compro-
misso do aluno com sua aprendizagem. O fato
de o objetivo ser compartilhado desde o início
e de haver um produto final em torno do qual
o trabalho de todos se organiza, contribui mui-
to mais para o engajamento do aluno nas tare-
fas, como um todo (MEC, PCN, v. 2, 1997).
Optou-se pela organização do currículo por
meio de projetos didáticos por disciplina. Essa
perspectiva de trabalho não pressupõe a fragmen-
tação do conhecimento, muito pelo contrário.
Está pautada na multirreferencialidade do currí-
culo, que tem sua epistemologia na complexida-
de e no movimento, defendida por Edgar Morin.
Ela implica pensar complexo, dialogicamente,
indo além da visão interdisciplinar, e entende as
ações didáticas como criação de instrumentos
para a compreensão da realidade e do conheci-
mento nas múltiplas relações.
A prática de letramento
na escola pública
É possível desenvolver práticas de letra-
mento dentro da escola pública? E nas clas-
ses de EJA, como essa proposta pode ser as-
segurada?
As respostas a essas questões parecem ób-
vias. No entanto, considerando os rumos que
214
as práticas leitoras e escritoras tomaram den-
tro da escola, fomos levados a refletir sobre a
necessidade de repensarmos o nosso fazer pe-
dagógico, no sentido de tornarmos o ensino da
leitura e da escrita menos escolar, buscando
nos aproximar das situações reais do uso da
língua. Isso implica deixar de tratar o ensino
da língua da forma que só a escola o trata: me-
canicamente, sem propósito comunicativo real
e com interlocutores fictícios ou, na maioria
das vezes, inexistente.
Aqui relatamos dois dos vários projetos que
foram desenvolvidos na Escola Municipal Bar-
bosa Romeo, que tem como um de seus objeti-
vos fazer com que crianças, jovens e adultos que
por ela passem sejam verdadeiros usuários da
língua, leitores e escritores proficientes.
O primeiro projeto (Língua Portuguesa) foi
desenvolvido em uma classe de Aceleração II
(equivalente à 3
a
e 4
a
séries do Ensino Funda-
mental). O segundo, cuja área de concentra-
ção era a de Ciências, foi realizado em uma
classe de Alfabetização de Adultos (noturno).
O projeto “Era uma vez…” tinha como ob-
jetivo geral: “Ler e escrever contos, garantin-
do os elementos macroestruturais caracterís-
ticos do gênero e o destinatário real das pro-
duções” e foi aplicado numa classe com 25
alunos, com idades variando entre 13 e 19
anos, que chegaram à escola em 1999, em sua
maioria com a hipótese de escrita silábica ou
silábico-alfabética. No início de 2000, já alfa-
béticos, apresentavam ainda grande dificul-
dade de produção textual, sem fluência de lei-
tura. Muitos escreviam sem a segmentação
convencional das palavras e com muitas difi-
culdades ortográficas.
O projeto teve como empreendimento fi-
nal a produção de um livro de contos para ser
presenteado às classes de Educação Infantil e
1
o
ciclo.
Fica a pergunta: por que contos? O projeto
foi pensado a partir da surpreendente consta-
tação de que os alunos, apesar de terem idade
avançada, ficavam embriagados” com a leitu-
ra de contos infantis, especialmente os mais
tradicionais. Inicialmente, selecionamos para
a leitura contos menos infantis, partindo do
pressuposto de que os alunos, já adolescentes,
teriam mais interesse por estes e não por aque-
les. Grande engano! No levantamento dos co-
nhecimentos prévios dos alunos, observamos
que apenas um já ouvira falar da história de
“Chapeuzinho vermelho. Nenhum outro con-
to era conhecido da turma!
Optaram pela leitura dos contos “O patinho
feio, “Cinderela, “João e Maria, “Os três
porquinhos, “O gato de botas.
Essa foi a nossa primeira aprendizagem:
definir previamente o que ler, sem um pro-
fundo conhecimento da turma, dos seus de-
sejos latentes e das necessidades imbricadas
na história de vida de cada criança, jovem ou
adulto, pode comprometer um grande pro-
jeto de leitura, elaborado com a melhor das
intenções!
As intervenções durante o desenvolvimen-
to do projeto foram centradas nas estratégias
de leitura e em situações de leitura por prazer.
Em relação às intervenções de leitura voltadas
para a escrita, enfatizamos os aspectos macro-
estruturais característicos do gênero conto,
especialmente aqueles que definimos como
indispensáveis para serem assegurados pelos
alunos: marcadores cronológicos, seqüência
narrativa, zonas de descrição com utilização de
adjetivação.
Por fim chegamos à produção dos contos.
Os alunos e a professora esperavam ansiosos
por esse momento. A proposta de escrita – em
duplas – possibilitou a escrita de textos ricos em
recursos lingüísticos, ambientação, trama e des-
fecho bem definidos, seqüência narrativa bem
articulada, além do uso da intertextualidade,
sem comprometer a autoria.
As escritas dos contos possibilitaram um
espaço privilegiado de articulação das práticas
de leitura, produção escrita e reflexão sobre a
língua: a revisão textual.
Foram desenvolvidos vários procedimen-
tos de revisão até o ponto em que se decidia
que o texto estava suficientemente bem escri-
to. Para isso eram feitos rascunhos, alterações
no conteúdo e na forma. A última etapa foi re-
alizada com o apoio do computador, por meio
da digitação dos textos e revisão ortográfica.
O mais surpreendente é que todos os alu-
nos faziam, revisavam, refaziam os seus textos
214
Projeto pedagógico: por quê, quando e como – EJA
PAINEL 17
sem queixas. Pelo contrário, permaneciam en-
volvidos e extremamente motivados. Alguns
objetivos não só conceituais, como procedi-
mentais e atitudinais, foram alçados e um as-
pecto ficou assegurado: o entendimento de
que, quando escrevemos para alguém, preci-
samos escrever de forma que sejamos enten-
didos e, em se tratando de um conto, que nos-
so texto provoque o deleite. E os contos dos
nossos alunos, com certeza, nos encantaram!
Basta lê-los.
Quanto ao segundo projeto, “Tartarugas ma-
rinhas”, foi desenvolvido nas classes de PEB I
(Programa de Educação Básica – EJA – equiva-
lente à 1
a
série) e tinha como objetivo geral:
“Valorizar a vida em sua diversidade e a pre-
servação dos ambientes, por meio do estudo
sobre as tartarugas marinhas – animal amea-
çado de extinção. Os alunos tinham idade que
variava entre 17 e 59 anos.
Por um lado, os estudantes possuíam um
repertório de representações proveniente de
conhecimentos intuitivos, adquiridos pela
vivência, pela cultura e pela história de vida de
cada um. Por outro lado, desenvolveu-se um
trabalho em que os alunos confrontaram seus
conhecimentos prévios com os conhecimentos
científicos que foram construídos ao longo do
projeto. Incentivados a expor suas idéias para
explicar determinado fenômeno e confrontá-las
com outras explicações, os alunos puderam
perceber a necessidade e a importância de vá-
rias leituras que tiveram de realizar.
Esse processo, construído com interven-
ções intencionais e sistemáticas dos professo-
res, que criavam situações interessantes e sig-
nificativas e forneciam informações, permitiu
a reelaboração e a ampliação dos conhecimen-
tos prévios dos alunos. Foram desenvolvidas
leituras de textos das mais variadas fontes (jor-
nais, revistas, folhetos, enciclopédia etc.) pes-
quisas na Internet, excursões (incluindo o Pro-
jeto Tamar).
Por fim, chegou o momento da sistemati-
zação das informações, para socializar os co-
nhecimentos construídos: alunos e professo-
res optaram pela realização de um grande se-
minário, aberto à comunidade, a todos os alu-
nos e aos funcionários da escola.
Nesse ponto, quero salientar os conteúdos
procedimentais desenvolvidos por meio dessa
atividade (seminário), como também a interdis-
ciplinaridade naturalmente alcançada, na me-
dida em que os alunos elaboraram um folder,
convites, ofícios, usaram retroprojetor, apren-
deram a usar o microfone, a falar em público, a
ouvir seus interlocutores, a responder pergun-
tas, enfim, a fazer uso de todo um repertório de
conhecimentos, de forma significativa.
Essa atividade de fechamento do projeto
(empreendimento final) teve a intenção de
reunir e organizar os dados, respondendo ao
problema proposto inicialmente.
Podemos concluir, portanto, que é possí-
vel desenvolver práticas de letramento na es-
cola pública, seja ela de Educação Infantil,
Ensino Fundamental ou de Educação de Jo-
vens e Adultos. Tudo depende, evidentemen-
te, da concepção de ensino que está por trás
do que se faz.
217
PP
PP
P
AINEL AINEL
AINEL AINEL
AINEL
1818
1818
18
PROJETO PEDAGÓGICO:
POR QUÊ, QUANDO E COMO
Ivanete Carvalho e Andréa Guida Bisognin
Renata Sanches Silva e Maria Vânia Marques de Carvalho
Rosemere da Silva Vieira
218
As supervisões de
acompanhamento dos projetos
didáticos realizados em aula
Ivanete Carvalho e Andréa Guida Bisognin
Programa Escola que Vale – Fundação Vale do Rio Doce – Cedac/SP
Resumo
Este projeto está sendo desenvolvido no Cen-
tro de Educação Infantil Municipal (CEI) Profª
Honorina Pacheco Corrêa, no bairro Rio do Ouro,
em Caraguatatuba/SP. A Secretaria Municipal de
Caraguatatuba e a Fundação Orsa são parceiras na
gestão pedagógica desse CEI, que respeita a políti-
Resumo
O Programa Escola que Vale tem como eixo do
processo de formação de professores a realização de
projetos didáticos em aula, e seu desenvolvimento
é acompanhado por meio de reuniões mensais e
semanais com as coordenações regional e local.
Esses projetos necessitam de planificação de-
talhada, avaliação permanente e reorientação das
ações, em razão dos propósitos didáticos e dos ob-
jetivos compartilhados com os alunos. É nesse con-
texto que as supervisões cumprem papel funda-
mental, pois criam situações de análise que são, ao
mesmo tempo, favoráveis às transformações nas
práticas usuais e à construção de conhecimentos,
a partir dos quais pode-se refletir sobre elas e fazê-
las avançar.
Em situações de planejamento e de análise e re-
flexão sobre a prática documentada, por meio de vídeos
e relatórios, os professores que participam do progra-
ma discutem coletivamente sobre suas dúvidas e difi-
culdades e sobre os propósitos que guiam suas tare-
fas, antecipam possíveis situações que podem ocor-
rer na salas de aula, decorrentes de decisões tomadas
pelo grupo, trocam informações sobre as aprendiza-
gens das crianças a partir da análise de suas produ-
ções e passam a construir gradativamente novos ob-
serváveis sobre a relação ensino–aprendizagem.
Neste relato, serão destacadas algumas mu-
danças provocadas por essas estratégias forma-
tivas: a produção e a reflexão coletivas, a formação
de equipes colaborativas de trabalho nas escolas
que participam do PEQV e as possibilidades de
apropriação dos planejamentos como instrumen-
tos metodológicos de formação, pelos técnicos da
Secretaria de Educação de Açailândia/MA.
ca de Educação Infantil do município por meio da
presença de um programa de formação continua-
da e do atendimento à demanda para a faixa etária
de 0 a 3 anos.
A proposta pedagógica que está sendo imple-
mentada no Centro de Educação Infantil tem, como
As linguagens expressivas
no cotidiano das crianças de 0 a 3 anos
Renata Sanches Silva e Maria Vânia Marques de Carvalho
SME – Caraguatatuba/SP e Fundação Orsa
218
Projeto pegagógico: por quê, quando e como
PAINEL 18
referência, as diretrizes curriculares para o atendi-
mento às crianças e, como eixos norteadores, a cri-
ança de 0 a 3 anos, a família e a comunidade, a esco-
la e a família. Para o desenvolvimento do projeto
pedagógico, que tem como tema “Colorindo o nos-
so tempo – as crianças descobrindo cores, materi-
ais e o nosso espaço, toda a equipe do CEI idealizou
e vem realizando planos de ação compostos por ati-
vidades de caráter interdisciplinar, que procuram
atender às necessidades, às expectativas e aos inte-
resses das crianças. Na concepção da criança como
cidadã, sujeito com direitos, a participação ativa é
um marco na seleção dos temas e das atividades pro-
postas. Descobrir, explorar, experienciar, perguntar,
interagir com o meio social e físico são atitudes pre-
sentes no cotidiano do CEI.
Situação
O Centro de Educação Infantil Municipal
Profª Honorina Pacheco Corrêa surgiu da par-
ceria entre a Secretaria Municipal de Educação
e a Fundação Orsa, com 26 crianças. Esse nú-
mero foi aumentando gradativamente e, atual-
mente, o centro apresenta a seguinte situação:
Área geográfica atendida. Bairros: Rio do
Ouro, Jaraguazinho, Horto Florestal, Ponte
Seca, Caputera, Indaiá, Jardim Pimavera, Gai-
votas, Estrela Dalva, Centro.
Clientela. Crianças de 3 meses a 3 anos e 11
meses.
Proposta pedagógica. A proposta pedagó-
gica irá se nortear pela concepção de cri-
ança como ser humano completo, integran-
do as dimensões afetiva, intelectual, física,
moral e social, que, embora em processo de
desenvolvimento e, portanto, dependente
do adulto para sua sobrevivência e seu cres-
cimento, deve ser ativo e capaz, para assim
poder ampliar seus conhecimentos e expe-
riências e alcançar progressivos graus de
autonomia, frente às condições do meio,
como um sujeito social e histórico. A pro-
posta está de acordo com a política de Edu-
cação Infantil do município, na qual está
inserida.
Cotidiano
Os horários previstos para
as atividades de alimentação,
higiene, descanso e brincadei-
ras são organizados de acordo
com as necessidades das cri-
anças, estando previstos tam-
bém períodos de atividades
lúdicas, de maior e menor
concentração, em grupos e in-
dividuais. Existe flexibilidade
em relação aos horários ofere-
cidos às famílias, garantindo
formas adequadas de receber
as crianças em seus grupos e
de organizar a saída.
As crianças recebem quatro refeições diá-
rias, seguindo cardápio elaborado pela nutri-
cionista. O descanso varia de acordo com as ne-
cessidades individuais. Assim, os que não dor-
mem são envolvidos em atividade mais rela-
xante, para a qual é utilizado um dos cantinhos
existentes nas salas.
Diariamente, desde que as condições climá-
ticas o permitam, todos têm oportunidade de
brincar em área livre, desfrutando do sol e de
contato com água, areia e terra.
Projetos são desenvolvidos de forma a
abranger todas as turmas, respeitando a espe-
cificidade de cada faixa etária, e com atividades
dirigidas e semidirigidas.
Cantinho das Conchinhas
Estrelinha-Azul
Cavalo-Marinho
Peixinho Dourado
Golfinho
Aquário
3 a 11 meses
12 a 15 meses
16 a 23 meses
2 anos a 2 anos e 11meses
2 anos a 2 anos e 11 meses
3 anos a 3 anos e 11 meses
15
18
20
27
27
26
03
3
2
2
2
2
2
Turmas
Idade
N
o
de
crianças
N
o
de
adultos
N
o
de
adultos
volantes
Centro de Educação Infantil Municipal Profª Honorina Pacheco Corrêa
220
A rotina é organizada em tempos de traba-
lho, de recreio ao ar livre, de higiene, de refei-
ção, de descanso, de pequenos grupos, grande
roda, intercalados com o tempo de arrumar, pre-
visto durante todo o dia, após cada atividade.
Referenciais
Utilizamos, como referencial para o atendi-
mento às crianças, as diretrizes curriculares que
tratam do educar e do cuidar engajados no de-
senvolvimento do cidadão em potencial, sujei-
to com direitos e digno de cuidados educacio-
nais. A proposta se baseia nas diferentes formas
de ver e compreender o mundo, unindo cuida-
do, valores e conhecimento num ambiente em
que as formas de expressão ocupem lugar pri-
vilegiado, e crianças, famílias e educadores con-
vivam prazerosa e criativamente da arte de cui-
dar e educar.
A família tem atendimento individual, em
que se procuram entender suas individualidades,
seus anseios e suas necessidades, engajando-a
progressivamente no ambiente interno da esco-
la e tornando-a cada vez mais parceira na arte
de educar, sem se esquecer de que o desenvolvi-
mento é um processo integrado, que reúne di-
versos aspectos da vida: biológico, motor, cultu-
ral, emocional e social.
A comunidade também é envolvida no coti-
diano do Centro de Educação Infantil, sendo in-
formada dos principais acontecimentos e das
dicas de cuidados com as crianças de 0 a 3 anos
em seus boletins bimestrais. Também buscamos
na comunidade ajuda referente à participação
voluntária esporádica, por meio do Amigos da
Escola, e à participação na confecção de mate-
rial e brinquedos.
Objetivo geral
Educação e cuidados básicos para o desen-
volvimento das crianças, respeitando suas in-
dividualidades, entendendo a criança como um
ser total, completo, indivisível, e fornecendo-
lhes os meios de desenvolver suas capacidades
fundamentais, ampliando-lhes as possibilida-
des de acesso ao patrimônio cultural da socie-
dade em que vivem.
Experiência em andamento:
Projeto “Colorindo o nosso
tempo” (as crianças
descobrindo cores, materiais e
o nosso espaço)
Esse projeto está sendo desenvolvido no
Centro de Educação Infantil Municipal Profes-
sora Honorina Pacheco Corrêa, Bairro Rio do
Ouro, Caraguatatuba/SP. A Secretaria Munici-
pal de Caraguá e a Fundação Orsa são parceiras
na gestão pedagógica deste CEI, que respeita a
política de Educação Infantil do município por
meio da presença de um programa de forma-
ção continuada e do atendimento à demanda
para a faixa etária de 0 a 3 anos.
A proposta pedagógica que está sendo
implementada no Centro de Educação Infantil
tem, como referência, as diretrizes curriculares
para o atendimento às crianças, e, como eixos
norteadores, a criança de 0 a 3 anos, a família e
a comunidade, escola e a família. Para o desen-
volvimento do projeto pedagógico, que tem o
tema “Colorindo o nosso tempo – as crianças
descobrindo cores, materiais e o nosso espaço,
toda a equipe do CEI idealizou e realiza planos
de ação compostos por atividades de caráter in-
terdisciplinar, procurando atender às necessi-
dades, às expectativas e aos interesses das cri-
anças. Na concepção da criança como cidadã,
sujeito de direitos, a participação ativa é um
marco na seleção dos temas e das atividades
propostas. Descobrir, explorar, experienciar,
perguntar, interagir com o meio social e fisico
são atitudes presentes no cotidiano do CEI.
Quando acreditamos no potencial das cri-
anças e deixamos que elas optem e criem am-
bientes e formas de aprendizagem, respeitan-
do o momento das crianças e propondo ativi-
dades dirigidas e semidirigidas, deixamos li-
vre o caminho para a criatividade.
Foi assim que se originou esse plano de ação
do projeto pedagógico intitulado “Colorindo o
nosso tempo – as crianças descobrindo cores,
materiais e o nosso espaço, já que buscamos
nas ações propostas promover a aprendizagem
ativa das crianças, que nada mais é do que o ex-
220
Projeto pegagógico: por quê, quando e como
PAINEL 18
perimentar, direto e imediato, dos objetos, das
pessoas e dos acontecimentos.
O CEI do bairro Rio do Ouro tem sua rotina
dividida em tempos, e um deles é o da grande
roda, em que as crianças conversam sobre as-
suntos variados e compartilham experiências.
Nossa proposta para aquele dia eram as co-
res do mundo, que inicialmente deixaram as cri-
anças pensativas, mas logo desencadeou-se uma
série de observações a respeito dos objetos da
sala, das roupas dos amigos, dos espaços exter-
nos da escola e também da natureza. Nessa con-
versa, as crianças concluíram que, em tudo no
mundo, havia cores. Foi fascinante ver aqueles
olhinhos, que, apesar de já conhecerem as co-
res, nunca haviam parado para observá-las, para
observar a sua organização e presença em nosso
mundo. Aqui utilizamos a música Arco-íris, da
Xuxa, que fala das cores presentes em nosso co-
tidiano, incentivando as crianças para que acom-
panhassem o ritmo com o material da bandinha
e depois registrassem, por meio de desenhos, o
que mais lhes chamou a atenção na música.
Mais uma vez, pudemos perceber a importân-
cia e a relevância das cores no cotidiano de nossas
crianças, o que nos conduziu a buscar em revistas
o que mais lhes chamava atenção. Confecciona-
mos um mural com todas as figuras escolhidas
pelas crianças e recortadas pelas professoras, e um
mundo de cores surgiu diante de nossos olhos.
Pedimos a colaboração dos pais para que
mandassem uma fruta para o CEI, a fim de fa-
zermos uma deliciosa salada. Como sempre,
fomos atendidos, e as crianças empenharam-
se em fazer uma enorme salada de frutas com
as cores que estávamos observando.
Foi então que uma criança observou que nem
todas aquelas cores estavam presentes nas tintas
usadas por elas em pinturas a guache. A profes-
sora, então, conduziu-as para o espaço das artes
e questionou como elas poderiam ter mais cores,
usando apenas aquelas que tinham no momen-
to. Imediatamente, quase um coro, algumas cri-
anças disseram: Vamos misturar as tintas”. E foi
o que aconteceu. Experimentaram e descobriram
as cores que faltavam e prepararam tintas para
que as outras turmas pudessem utilizá-las.
A alegria gerada pela descoberta não parou por
aí. As crianças são como mágicos e sempre têm algo
mais para nos mostrar. Pensando nisso, resolvemos
aguçar esse potencial, questionando sobre o arco-
íris, se sabiam o que era, se já tinham visto. Perce-
bemos que algumas demonstravam algum conhe-
cimento. Resolvemos, em um dia ensolarado, nos
dirigir ao pátio externo com uma mangueira na
mão, para que elas pudessem experimentar mais
essa alegria de ver surgir um arco-íris.
O dia estava perfeito, ensolarado, e nossa ex-
periência deu certo. E agora, o que fazer? “Não
podemos nem devemos parar por aqui” – comen-
tavam as professoras envolvidas. Surgiu, então, a
idéia de confeccionar um arco-íris com as crian-
ças. Resolvemos integrar, mais uma vez, a família
e a escola. Enviamos um convite para os pais que
quisessem participar de uma tarde com seus fi-
lhos no CEI. Aproveitamos o momento para que
a massa de modelar fosse elaborada com ajuda
deles. Inicialmente foram feitas as massas nas
cores do arco-íris, utilizando-se uma receita ca-
seira e os conhecimentos adquiridos anterior-
mente na mistura das cores, para conseguirem
todas as tonalidades. Foi uma parceria e tanto. Os
pais aproveitaram para aprender e ensinar, na re-
lação com seus filhos, e desfrutar de mais um
momento de integração escola–família.
Essa história, nesse momento, não nos pare-
cia ter fim. Para isso, novas idéias precisavam sur-
gir. Recordamo-nos da música Aquarela, de
Toquinho e Vinícius de Morais, que foi mais uma
alavanca para a nossa imaginação. Começamos
escutando a música com as crianças e tentando
reconhecer o vocabulário desconhecido para ser
trabalhado. Dividimos o grupo, que já contava
com 26 crianças, fora os adultos envolvidos, e nos
debruçamos sobre mais uma aventura. Um gru-
po ficou responsável por dramatizar a música.
Para isso deveríamos confeccionar o material a
ser utilizado; o outro acompanharia, durante a
apresentação, com a bandinha da escola, o ritmo
da música. Foi uma experiência e tanto!
Em outro dia, dirigimo-nos à nossa sala para
o momento da conversa, que foi a respeito do mar,
peixes, aquários, conchinhas. Esses nomes são
utilizados em cada grupo como identificação dos
espaços do CEI e foram escolhidos pelos alunos
de cada grupo, por meio de votação. Nossa turma
do GII, inicialmente assim denominada, perten-
cia ao grupo do aquário. Pensamos na importân-
222
cia do contato com a natureza e com os seres vi-
vos e concluímos que deveríamos experimentar
a sensação de cuidar de um animalzinho – e nada
melhor do que um peixinho! Montamos um aquá-
rio em nossa sala, aprendemos a cuidar de nosso
novo amiguinho” e a dividir as tarefas.
Posteriormente, criamos o dia da visita. Pen-
samos que essa vivência deveria extrapolar o es-
paço da escola e adentrar o espaço da família.
Para isso enviamos um comunicado aos pais,
explicando sobre nosso novo companheiro e
pedindo autorização para que o filho pudesse
levá-lo para casa e ficar com ele por um dia. Fi-
zemos um sorteio em sala e colocamos, em um
grande cartaz, o roteiro do peixinho, para que as
crianças pudessem tomar conhecimento e saber
quando seria a vez de cada uma levá-lo para casa.
O dia em que a criança saia com ele da escola
era uma alegria só: peixe, comida, alegria, res-
ponsabilidade, e todos ao caminho de casa!
Acreditávamos que ainda tínhamos muito por
fazer com as cores e nos preparamos para a nossa
próxima etapa, que envolveu um pintor famoso:
Volpi. Por ele ter, em seus trabalhos, a presença
das cores e ser um artista brasileiro, consideramos
conveniente um primeiro contato com suas obras.
Fizemos a reprodução parcial da obra intitulada
As bandeirinhas”, que foi de fácil visualização para
nossas crianças, já que fazem parte da cultura bra-
sileira e puderam, assim, ser confeccionadas por
nossos alunos. Nessa fase, pretendíamos – e nos
foi possível – contar também com a ajuda dos pais
na criação de um ambiente apropriado para pin-
tura, com cavaletes, avental etc.
Resumo
O Projeto Gonzagão foi desenvolvido no Ensi-
no Fundamental (3ª e 4ª séries) pela Escola Muni-
cipal de Ensino Fundamental e Médio Miguel
Matias, vinculada aos Parâmetros em Ação, visan-
do resgatar e valorizar nossas tradições, assim como
promover a aquisição de conhecimentos sobre a
origem, as curiosidades, os cancioneiros, as dan-
ças típicas das festas nordestinas e ampliar o voca-
bulário dos envolvidos.
O trabalho foi direcionado para o desenvolvi-
mento da leitura, da escrita e da produção de texto
de maneira interdisciplinar, integrando conheci-
mentos nas diferentes áreas de ensino, numa visão
crítica ao preconceito social e lingüístico que
permeia o Nordeste brasileiro.
Com esse acervo cultural, objetiva-se divulgar
a arte e o saber do nosso povo, conciliando-o com
os trabalhos escolares e envolvendo a comunidade
e o poder público nessa realização.
Projeto Gonzagão –
Experiência PCN em Ação
Rosemere da Silva Vieira
SME – Campo Alegre/AL
Relato da experiência
Com sua sanfona, Luiz Gonzaga descobriu,
há décadas, um país diferente, com uma emo-
ção enraizada em seus costumes e em seus mo-
dos de vida. Uma paixão que era colocada para
fora em forma de música, de versos de pé-que-
brado e literatura de cordel. Em suas andanças,
Luiz Gonzaga viu o futuro do Brasil em suas
entranhas, com paisagens e povos que ainda
estavam por ser descobertos.
No Nordeste, as pessoas que sofrem com a
estiagem não têm recursos para investir em alta
tecnologia e, com isso, enfrentam o fenômeno
da emigração, que causa sofrimento e angústia
nos que partem e nos que ficam. Junto com eles
seguem a insegurança do desconhecido e a es-
perança de um futuro melhor, como retrata tão
bem o cantor e compositor brasileiro Luiz
Gonzaga, conhecido como o “Rei do Baião.
No ápice dessa contextura, essa região so-
222
Projeto pegagógico: por quê, quando e como
PAINEL 18
fre com o contínuo preconceito social e lin-
güístico. Portanto, decidimos explorar esse uni-
verso cultural, que divulga tão bem a vida do
nordestino, com suas dificuldades, seus senti-
mentos e seus talentos, que comove todo o ter-
ritório nacional.
Pretendemos, então, proporcionar aos nos-
sos alunos, principalmente aos que não tiveram
acesso ao cancioneiro de Luiz Gonzaga, a opor-
tunidade de conhecer, perceber e resgatar o
valor cultural que ele representa para o Brasil,
promovendo a aquisição de conhecimentos so-
bre a origem, a linguagem, as curiosidades, as
canções e as danças típicas das festas nordes-
tinas, ampliando o vocabulário e associando-
o aos trabalhos escolares de maneira signifi-
cativa e prazerosa.
Com esse acervo cultural, objetivamos es-
pecificamente:
• explorar a biografia de Luiz Gonzaga e esti-
mular a apreciação de seu cancioneiro;
• entender e respeitar o dialeto regional do
sertão;
• discutir problemas sociais do Nordeste;
• estimular a consciência crítica e despertar
para a importância de preservar o meio am-
biente;
• apreciar textos musicais, analisando-os a
partir da aplicação real da gramática e pro-
duzir novos textos;
• trabalhar a ortografia inserida nos textos;
• organizar um coral para interpretar os gran-
des sucessos de Luiz Gonzaga;
• desenvolver um programa de caça-talentos;
• envolver a comunidade e o poder público
na realização dos trabalhos.
O projeto foi desenvolvido em etapas su-
cessivas e obedeceu ao processo descrito a se-
guir.
Inicialmente, foram detalhados os conhe-
cimentos prévios dos alunos sobre o cantor e
compositor Luiz Gonzaga e as questões colo-
cadas por ele sobre os problemas sociais en-
frentados pelo nordestino. Os professores con-
cluíram que esse conhecimento se limitava a
algumas músicas tocadas no mês de junho. Os
alunos sabiam que o cantor e compositor era
sertanejo, mas não conheciam a sua história e
a sua importância na cultura nordestina. Re-
lataram que, em casa, tinham fitas cassete, mas
não gostavam de ouvi-las, porque tinham pre-
ferência por outros ritmos, como axé, pagode
e reggae, que eram mais tocadas no momento.
Em seguida, foi realizada uma reunião de pais
e professores para divulgar o tema do projeto,
sua importância e a necessidade da ajuda da
família com recortes de jornais, revistas, livros,
CDs, vídeo etc.
Após esse contato, os professores selecio-
naram material informativo como subsídio de
pesquisa para os alunos e lançaram as propos-
tas de construção do conhecimento, por meio
das atividades solicitadas no decorrer do de-
senvolvimento do projeto, ou seja, à medida
que eram solicitadas informações, os alunos
pesquisavam no banco de dados. Alguns tex-
tos oferecidos foram retirados dos sites <http:/
www.mpbnet.com.br/musicos/luiz.gonzaga/
index.htm> e <http://www. bhnet.com.br/
~expaco/oreiluizgonzaga.htm>, que informam
toda biografia do cantor e compositor, suas di-
ficuldades e conquistas, até ser consagrado
como o “Rei do Baião.
No site <http://www.tocasite.hpg.com.br/
origem.htm>, conseguimos textos sobre a his-
tória do forró e a mistura de ritmos, princi-
palmente o baião, aliado ao xote, ao xaxado e
também ao coco. No site <http://www.
vicepresidenciadarepublica.gov.br. português/
ARTIGOS/luizgonzaga.htm>, oferecemos al-
gumas publicações importantes de Marco
Maciel, vice-presidente da República, que re-
lata a contribuição das composições de Luiz
Gonzaga para a política e a cultura e destaca
que foi na composição da música Asa Bran-
ca” que Luiz Gonzaga criou o hino do Nordes-
te, o Nordeste na sua visão mais significati-
vamente dramática, o Nordeste na aguda cri-
se da seca.
Além desses textos, foi consultada a Enciclo-
pédia Ilustrada do Conhecimento Essencial, 1998,
by Reader’s Digest Brasil Ltda.; a revista Nova
Escola, p. 34, 35 e 39, de abril de 2001, e dicioná-
rios da Língua Portuguesa, na busca do signifi-
cado de algumas palavras apresentadas. Com as
informações adquiridas, organizou-se uma ex-
224
posição de gravuras, relatos e textos informati-
vos no mural da escola. Partindo dos textos ofe-
recidos, os alunos da 4ª série fizeram uma rees-
crita individual da biografia de Luiz Gonzaga,
que foi transformada em reescrita coletiva. Fo-
ram expostos também trabalhos de produção e
reescrita de textos sobre a seca no Nordeste, rit-
mos, danças, entre outros, acervo cultural a que
todos que circulavam tinham acesso.
Além das apresentações e da entoação
das músicas cantadas e tocadas por ele e por
outros intérpretes, também foram apresen-
tados instrumentos musicais utilizados nas
diferentes modalidades rítmicas, como forró,
baião, xote e xaxado. Os instrumentos apre-
sentados e explorados foram zabumba, san-
fona e triângulo, sobre os quais, antecipada-
mente, se fez pesquisa para saber o signifi-
cado de suas denominações. Os alunos apre-
ciaram e até mesmo treinaram o toque des-
ses instrumentos.
Durante a exposição dos textos musicais,
o trabalho com gramática e ortografia foi efe-
tivado por meio de debates, reescrita e pro-
dução de textos. Com a música Asa branca” e
“Triste partida, os professores mostraram o
dialeto regional de Luiz Gonzaga, aproveitan-
do para trabalhar a ortografia e a gramática
por meio do texto lacunado. Os alunos, aos
poucos, preencheram as lacunas obedecendo
às normas ortográficas da linguagem formal.
Com a letra da música “Assum preto, fo-
ram debatidos os crimes contra a flora e a
fauna e, nesse momento, as crianças relata-
ram algumas maldades que presenciaram e
praticaram. E quanto às que praticaram, pro-
meteram não mais fazê-lo. Após esse traba-
lho, foi feita a produção de texto sobre a mal-
dade dos homens contra a natureza. Entre as
músicas trabalhadas, a que mais comoveu foi
“Fogo-apagou, que conta a história do me-
nino que matou uma rolinha para saciar a sua
fome e, assim, prolongar sua própria vida. Isso
gerou uma grande discussão. A música consi-
derada de maior interesse pelos alunos foi “O
xote das meninas, pelo ritmo e pela letra, que
agradam as crianças e os adolescentes, visto
que ela fala da chegada da adolescência e do
despertar para o namoro.
Observamos que, durante a exposição das
músicas e as discussões sobre as letras, hou-
ve sensibilização dos alunos. Eles se mostra-
ram comovidos e solidários com os problemas
que a miséria causa ao povo nordestino, quan-
do ouviram, principalmente, a música Triste
partida, que conta a situação dos emigrantes
da região, e quando alguns alunos expuseram
a situação de seus pais, que estão em outras
regiões, como Mato Grosso, São Paulo e Goiás,
trabalhando para o sustento de sua família.
Quanto a essa situação, uma criança disse:
Aqui não tem emprego para todos, estávamos
passando fome e meu pai foi arranjar dinhei-
ro em outro lugar.
Consideramos que houve uma participa-
ção ativa dos envolvidos, inclusive dos alunos
que, nessa oportunidade, conheceram o Nor-
deste, explorando-o de forma interdisciplinar,
apresentando uma aprendizagem significati-
va, que muito contribuiu para crescimento
social, cultural e intelectual, questionando
fatos e sugerindo alternativas de melhoria na
qualidade de vida do povo nordestino.
O Projeto Gonzagão teve sua culminância
no dia 22 de junho e, como se tratava também
do estudo das tradições especificamente nor-
destinas, nosso projeto destacou que, além dos
problemas que enfrentamos no dia-a-dia, te-
mos também a alegria das festas juninas, com
desfile pelas principais ruas da cidade, mos-
trando em alas a vida de Luiz Gonzaga, que é
um exemplo vivo da vida do nordestino.
Os alunos e professores, caracterizados,
carregavam faixas e cartazes que, além de
contar a história, destacava também os pro-
blemas sociais mais graves, como a fome, a
sede, a exploração do trabalho braçal, o pre-
conceito e a tristeza da incerteza do amanhã.
Após o desfile, já na escola, pais, professores,
alunos e comunidade participaram da festa e
apreciaram as danças, os pratos típicos, as
vestimentas e os fogos que embelezam e atra-
em multidões. Realizamos uma grande festa
com a participação do sanfoneiro da cidade,
que estava caracterizado a rigor.
Ao final do projeto, concluímos que nada
seria possível se não houvesse a participação
coletiva de diretores, professores, alunos,
224
Projeto pegagógico: por quê, quando e como
PAINEL 18
como também a participação da família, o en-
volvimento da comunidade e até mesmo de
pessoas influentes na cidade, como o prefei-
to, os vereadores, a secretário de Educação, o
gerente do Banco do Brasil e os comerciantes
que contribuíram financeiramente e se fize-
ram presentes no encerramento do projeto.
Consideramos esse projeto como um
grande avanço na formação continuada dos
professores, que vem mostrando, de forma
clara e objetiva, a importância de um traba-
lho sistemático e coletivo, gerando situações
de conhecimento, ao mesmo tempo, reais e
diversificadas, e proporcionando, assim, uma
aprendizagem ativa, interessante, significati-
va, real e atraente para os alunos.
Os professores envolvidos no estudo dos PCN
em Ação já entendem que ninguém começa a ter
iniciativa e autonomia sem ter tido a oportuni-
dade de escolher, opinar, criticar e dizer o que
pensa e sente. E o projeto pedagógico oferece o
caminho mais curto para o saber, como destaca
Dewey, quando diz: “Todo conhecimento verda-
deiro deriva de uma necessidade. A humanida-
de desenvolveu-se tratando de obter conheci-
mentos que satisfizessem às suas necessidades.
227
PP
PP
P
AINEL AINEL
AINEL AINEL
AINEL
1919
1919
19
LEITURA NA ALFABETIZAÇÃO
Jacinta de Fátima Camargo Barbieri e Luciana de Almeida Santos
Eliane Mingues
228
Resumo
O objetivo deste relato é apresentar o traba-
lho que vem sendo desenvolvido pelas professo-
ras da Educação Infantil e Ensino Fundamental de
1ª a 4ª séries, na rede municipal de ensino de
Itapetininga–SP, com o uso das práticas de leitura
na alfabetização.
Essas práticas de leitura são desenvolvidas em
atividades permanentes, asseguradas por um
organograma curricular semanal, com as seguin-
tes estratégias: “Roda da biblioteca”; “Reconto” (lei-
tura de conto infantil, de livre escolha do aluno, que
expõe à classe a sua compreensão do texto lido e
estudado em casa); “Momento da poesia, que tem
por objetivo o prazer e o gosto pela poesia; “MPB”
– audição e leitura de repertório de compositores
brasileiros; “Hora da curiosidade, que consiste na
leitura de textos científicos trazidos pelo professor
e pelos alunos; “Caderno de textos, inicialmente,
com textos de memória, ao qual, no decorrer do
ano letivo, vão sendo agregados textos literários, ou
não, lidos com a ajuda do professor, que desper-
tam na criança o gosto pela leitura.
Além dessas, outras práticas vêm sendo desen-
volvidas pelos professores, contando, primeira-
mente, com a participação dos pais. Exemplo dis-
so é a “Leitura comunitária”: a criança leva o livro e
um caderno, no qual os pais relatam como foi o
momento de leitura feita para o filho. Depois, há a
participação da comunidade (radialistas, parentes,
professores, coordenadores, escritores regionais
etc.), que são convidados para a Roda da leitura.
Com o objetivo de despertar o gosto pela lei-
tura, o professor lê para seus alunos notícias e re-
portagens em evidência ou de interesse da classe,
de jornais e revistas, podendo ser, posteriormente,
comentadas pelo grupo. Esses suportes são colo-
cados no acervo da biblioteca da classe e lidos na
Roda da biblioteca.
Leitura, a alma da alfabetização:
práticas de leitura nas escolas do
município de Itapetininga/SP
Jacinta de Fátima Camargo Barbieri e Luciana de Almeida Santos
SME – Itapetininga/SP
O objetivo deste relato é apresentar o trabalho
que vem sendo desenvolvido pelos professores da
Educação Infantil, Ensino Fundamental de 1ª a 4ª
série e da Educação de Jovens e Adultos, com o
uso das práticas de leitura na alfabetização.
Não há a intenção de ensinar nada, apenas
de confirmar que é possível ensinar a ler e alfa-
betizar segundo alguns teóricos, que é possível
realizar ações que pareciam utópicas.
Essas práticas de leitura são desenvolvidas
em atividades permanentes, asseguradas por um
organograma curricular semanal, com as seguin-
tes estratégias: “Roda da biblioteca”; “Reconto”;
“Momento da poesia”; “MPB”; “Leitura de cader-
no de textos”; “Leitura de jornais e/ou revistas”;
Curiosidades” e “Roda da leitura.
Reunir-se para ouvir alguém ler nas escolas
da rede municipal tornou-se uma prática co-
mum e prazerosa. Como exemplo, a Escola Mu-
nicipal de Educação Infantil (EMEIF) Professo-
ra Nazira Iared, que vem conquistando a comu-
nidade, tornando-a participativa e comprome-
tida com o processo ensino-aprendizagem.
Toda a semana, na sala de aula da profes-
sora Ana Maria, há a presença de pessoas que
pertencem a diferentes segmentos da socieda-
de, como jornalistas, radialistas, professores,
escritores, pais, coordenadores, que são con-
vidados para compartilhar um texto com as
crianças.
A grande conquista é a participação dos
pais. Eles vão à escola, escolhem livros, estu-
dam” e, no dia marcado com a classe, pedem
dispensa do trabalho e fazem a leitura. Lêem à
sua maneira. Muitos se emocionam junto com
as crianças. O grupo, atento, ouve cada pala-
vra. Após a leitura, alguns pais contam suas im-
pressões espontaneamente e buscam ouvir o
que as crianças acharam da história. A profes-
229
Leitura na alfabetização
PAINEL 19
sora, nesse momento, também é uma ouvinte
atenta e compartilha, juntamente com as crian-
ças, a “Hora da história.
Os alunos vivenciam leituras, testemu-
nhando o leitor como autor, ouvem as palavras
com sons e gestos diferentes dos da professo-
ra e de seus amigos.
O objetivo da professora Ana Maria, com
seus alunos de 3
a
série, além de despertar o gos-
to pela leitura, de promover a escuta atenta,
ouvir diferentes pessoas da comunidade conhe-
cidas ou desconhecidas das crianças, para que
elas aprendam os diferentes modos de ler, tam-
bém motiva as crianças com idade avançada a
prosseguir em seus estudos para aprender a ler
e escrever de maneira diferente das que já fo-
ram por elas vivenciadas.
Como justificativa, a professora diz que há
diferentes maneiras de ouvir ou ler um texto, e
a escolha do livro a ser lido não é feita ao acaso:
é socialmente aceitável, tanto para o leitor,
como para o público. A compreensão da fun-
ção social da escrita só pode ocorrer se a crian-
ça tem múltiplas oportunidades de interagir
com diversos tipos de suportes de textos, pro-
duzidos em diferentes situações discursivas.
A partir do conceito formado, a professora
de 2ª série, Fabíola, da EMEIF do bairro da
Varginha, zona rural, investiu para conquistar
sua turma, no intuito de alfabetizá-la. Apostou
na leitura. Levou para sua sala revistas, jornais,
livros. Entre os livros apresentados, o que mais
chamou a atenção das crianças foi Matilda, de
Road Dahl. A classe ouviu atentamente cada
palavra do livro. Empolgada com a turminha
que falava e escrevia sobre a história lida, a pro-
fessora levou o filme de mesmo nome. As cri-
anças puderam fazer um paralelo entre o texto
escrito e o filme, relatando que nem tudo o que
estava escrito passou no filme e vice-versa. De-
ram opiniões a respeito do livro e do vídeo. No
momento, o que mais marcou foi a fala de uma
aluna: “Gostei muito do vídeo, mas gostei mes-
mo foi de ouvir a professora lendo a história,
porque, enquanto eu ouvia, parecia que eu es-
tava dentro da história. Eu ‘senti’ a história.
As crianças puderam falar e expressar-se livre-
mente, escrever sobre o livro e o filme, porque a pro-
fessora não ficou apenas cumprindo uma função
burocrática. Ela propôs um momento prazeroso e
significativo, em que seus alunos tiveram a oportu-
nidade de testar as suas hipóteses, de começar a
entender que a ação de ler e escrever segue um
mesmo caminho, possibilitando-lhes, por um mo-
mento, verem-se como escritores e leitores.
Sabe-se hoje que só é possível aprender a
ler, lendo, e a escrever, escrevendo. Portanto, a
linguagem concebida como atividade e meio de
interação deverá ser considerada em uso em
situações concretas e significativas. E como ela
se manifesta sob a forma de textos (orais e es-
critos), eles serão tomados como unidades do
ensino de língua, destacadas suas funções,
especificidades, seus modos de construção, os
portadores (ou suportes) em que aparecem etc.
Como uma criança aprende a ler? Ou é pos-
sível ler sem saber ler? Muitos são os que fazem
tais perguntas. Ainda há muita dúvida em rela-
ção à segunda questão.
O trabalho que a professora Vera, da EMEIF
Valter Aliberti Júnior, faz com sua turma de Pré,
não responde objetivamente às dúvidas, porém,
faz a professora refletir sobre a sua prática, le-
vando-a a acreditar, sim, e a provar que é pos-
sível ler mesmo sem saber, trabalhando com
folheto de propaganda, por exemplo, de prefe-
rência um que não seja do conhecimento da
criança, mas pertença ao seu mundo. A classe,
usando das estratégias de leitura, além da boa
intervenção da professora, vai identificando o
conteúdo do suporte de texto. Os alunos vão
reconhecendo o valor dos números dentro do
contexto social (telefone, endereço, peso, me-
didas etc.); identificam as letras dos nomes e,
aos poucos, os pequenos conseguem fazer aqui-
lo que parecia impossível: a leitura.
O que há por trás da ação da professora é o
fato de ela acreditar que é possível, sim, ler
mesmo sem saber e, que, avaliando, observan-
do, com conhecimento é possível saber como a
criança aprende a ler.
Conceber um ato de leitura em que são dadas
as oportunidades de acionar as estratégias de lei-
tura determina um acionar pedagógico particu-
lar, que, por certo, não vai consistir em ensinar
as letras” e os sons correspondentes, mas, sim, em
oferecer às crianças situações que estimulem a
antecipar, inferir, decodificar e avaliar.
230
Utilizando o folheto de propaganda, a pro-
fessora deu oportunidade às crianças para que
coordenassem a informação da imagem com as
características do texto, a fim de anteciparem o
que estava escrito no papel. Elegeram letras
como índice para antecipar o conteúdo do tex-
to, questionaram-se e corrigiram dados que não
conferiam com suas antecipações; coordena-
ram os dados gráficos – letras e sua configura-
ção – com outros elementos (gráficos ou não),
de modo a obterem significados.
Sabemos que o modelo cumpre um papel
fundamental no processo de aprendizagem e
garante muitas possibilidades de ampliar o uni-
verso cultural e de entrar em contato com o
maior número de informações, tanto na lingua-
gem oral, como na linguagem escrita.
Portanto, é muito importante que os profes-
sores criem momentos e planejem situações em
que a interação com a escrita, em processos de
leitura e produção, possibilite a construção pela
criança da escrita, da linguagem escrita e de
suas propriedades, o que significa garantir que
as relações entre o conhecimento que a criança
tem sobre a escrita (hipóteses) e a escrita como
ela é sejam relevantes, e não arbitrárias.
É importante também saber que ler e escre-
ver como atividade de linguagem são faces de
um mesmo trabalho, ainda que sejam proces-
sos diferentes.
Foi de fundamental importância para o nos-
so trabalho de coordenação o envolvimento com
os programas do MEC, PCN em Ação e PROFA,
com a finalidade de apresentar alternativas de
estudo, promovendo o debate e a reflexão sobre
o papel da escola e o do professor na perspecti-
va de uma prática de transformação da ação pe-
dagógica, pois foi possível complementar o pro-
cesso de formação que a Rede Municipal de Edu-
cação de Itapetininga vem desenvolvendo, há
muito tempo, com os professores da Educação
Infantil e, hoje, se estende ao Ensino Fundamen-
tal e à Educação de Jovens e Adultos.
Muitos professores já adotaram em sua prá-
tica pedagógica o uso de textos para alfabetizar
e incorporaram a prática de leitura, tornando-
se leitores. Entre tantas, além das já menciona-
das, citamos aqui aquelas que contribuíram de
uma forma ou de outra com nosso relato: Leni,
Bete, Silvana, Giseli, Tereza e Vanessa, da EMEIF
Profª Nazira Iared; Lucilene e Ana Joaquina, da
EMEF do bairro do São Roque; Tereza, da EJA.
O que significa mesmo ser um sujeito alfa-
betizado, nos dias de hoje?
Será que o trabalho de alfabetização, com
jovens e adultos, pode ter como pano de fundo
a variedade de textos que circulam socialmen-
te para que estes pensem sobre a leitura e a es-
crita? Como? De onde retirar essa diversidade?
O que propor que façam com tais textos? Como
não transformá-los em cartilha, repetindo com
esses escritos aqueles mesmos exercícios me-
Mostrando a língua – possibilidades
de trabalho com a escrita e a leitura
com jovens e adultos
Eliane Mingues
PCN em Ação/MEC
cânicos e sem sentido, que pressupõem que o
sujeito nada sabe sobre esse objeto com o qual
ele interage, cotidianamente, por meio dos es-
critos espalhados pelo mundo e tão na frente
de seus olhos e ao alcance de suas mãos?
Mas o que podemos afirmar e pensar que
esses indivíduos não sabem? Não sabem jun-
tar as letras? Desenhá-las? Não sabem como
elas se chamam?
E se pensarmos no contrário, ou seja, na expe-
231
Leitura na alfabetização
PAINEL 19
riência que eles têm com a escrita que está no
mundo? O que podemos afirmar e pensar que sa-
bem? Será que sabem o que é um jornal e o que
encontrar nele? Será que sabem, só de olhar, se um
escrito pode ser uma receita ou uma carta? Será
que conseguem ler nos grandes painéis, espalha-
dos pela cidade onde vivem, o nome dos produtos
que consomem? E o nome dos bancos onde po-
dem ter conta, será que sabem identificar os dife-
rentes estabelecimentos que existem lendo seus
nomes, e entrar e resolver seus problemas na agên-
cia certa? E as contas de consumo que costumam
receber em suas casas? O que será que podem re-
tirar de informações dessas contas? Será que iden-
tificam a escrita de seus nomes? São capazes de
pegar o ônibus certo para determinado lugar onde
precisam ir? E comprar um disco do cantor que
gostam? Será que podem fazê-lo sem errar, ou tro-
cam todas as bolas, ou seja, todos os nomes?
Essas e outras questões costumam aparecer
com freqüência, quando o assunto tratado diz res-
peito ao como é possível alfabetizar com textos.
Pensar no conceito, ou seja, o que se enten-
de por alfabetização, é determinante nesse con-
texto. Se entendermos que, para aprender, o su-
jeito deve pensar e ter bons problemas para re-
solver, deve poder ter acesso a informações e a
um bom modelo da língua que se lê e que se es-
creve, e que o objeto a ser conhecido deve man-
ter suas características de objeto social de conhe-
cimento, faz todo sentido organizar situações e
trazer para dentro da sala de aula os textos de
verdade, aqueles retirados do cotidiano e que
costumamos usar para obter informações, co-
municar, nos divertir, fazer pensar.
São os textos extraídos dos jornais, das le-
gendas de fotos, os poemas, os textos informa-
tivos, as piadas, as receitas, as regras de jogos,
enfim, aqueles com os quais, mesmo sem sa-
ber ler e escrever, os estudantes jovens e adul-
tos têm contato, acesso e conhecimento prévio.
Se, por outro lado, o que ainda se acredita é
que o sujeito nada sabe e precisa começar do
zero, aprendendo primeiro o desenho de letras,
o som que elas possuem e seus nomes, aí fica
inviável pensar em situações de verdade, ou seja,
situações em que os textos apareçam inteiros,
carregados de significado, e com os quais já se
construiu uma boa experiência durante a vida.
Por onde começar,
ou possíveis conteúdos
A partir dessa concepção, algumas sugestões de
conteúdos para esse trabalho são:
• Leitura diária, pelo professor e pelos alunos,
dos textos de circulação social para aprecia-
ção e diversão, para a busca de novas infor-
mações, para aprender mais sobre um assun-
to, para revisar os textos, para observar como
um autor resolve suas questões em relação à
escrita etc.
• Escrita diária, do professor e dos alunos, dos
textos de circulação social para saber escre-
ver considerando a função e a estrutura dos
diferentes tipos de textos, para saber utili-
zar a escrita como recurso no desempenho
de suas funções, para aprender a resolver
questões impostas no ato da escrita (orto-
grafia, pontuação, gramática etc.), para de-
senvolver o papel de revisor, por meio do
estudo de bons modelos de textos, da escri-
ta em duplas, individual ou em grupos, da
revisão coletiva, individual ou com o apoio
da professora.
• Participação em eventos de oralidade para
aprender a ouvir e aprender a participar, ex-
pressando opiniões de forma crítica.
Como avaliar nesse contexto?
A avaliação, nesse processo de ensino e
de aprendizagem, torna-se constante a par-
tir das produções dos alunos; da observação
em relação à participação, ao interesse e ao
desempenho na realização das atividades; da
postura como membro de grupo, consideran-
do-se sempre os avanços individuais e do
grupo.
Os instrumentos mais utilizados são: as
tabulações das aprendizagens ocorridas nas
seqüências de atividades, feitas por meio de um
quadro em que se pontua o que é mais signifi-
cativo na produção de cada aluno; provas que
sistematizam conteúdos aprendidos; bilhetes
individuais que apontam problemas a serem
resolvidos ou salientam as boas soluções encon-
tradas; observação e registro do desempenho
dos alunos.
232
Traduzindo em miúdos…
A partir de tudo que já foi dito, como, en-
tão, o trabalho pode ganhar forma, contorno,
vida? É no dia-a-dia, encontro após encontro,
nas atividades, discussões, leituras e produções
que os alunos vão tendo problemas a resolver.
Pode-se estruturar uma rotina que compre-
enda, em Língua Portuguesa:
• Atividade permanente: leitura compartilhada
da obra de um autor consagrado, feita pelo
professor.
• Leitura individual: diversidade textual.
• Escrita individual ou em pequenos grupos:
diversidade textual.
• Análise e reflexão sobre a língua: revisão textual.
Exemplo de trabalho com a leitura
Em que situações, além daquelas vivenciadas
por leitores particulares, pode-se ouvir em voz
alta e acompanhar o texto, numa situação de lei-
tura compartilhada dos livros O conto da ilha
desconhecida, de José Saramago, prêmio Nobel
de literatura; Alexandre e outros heróis, de
Graciliano Ramos, conhecido autor regionalista;
Morte e vida severina, do consagrado João Cabral
de Melo Neto; As janelas do Paratii, escrito por
Amyr Klink; O Xangô de Baker Street, de Jô Soa-
res, entre outras histórias?
Com muita sorte, isso pode ocorrer em al-
gum momento da escolaridade, quando, cons-
cientes do papel da leitura de autores consagra-
dos, professores, bibliotecários ou outros com-
partilham com os alunos suas experiências lei-
toras, fazendo “rodas” ou seções de leitura em
voz alta. Com jovens e adultos que retomaram
seus estudos, essa oportunidade poderá ser
única; portanto, os responsáveis por esse tra-
balho não deveriam deixar de fora a literatura.
Aquela que o professor aprecia, gosta e que se
não for pela voz dele, o professor, esses alunos
jamais terão a oportunidade de conhecer, gos-
tar e mergulhar no mundo das letras.
Dispor de bons livros na sala de aula, ter
acesso a eles e poder conhecer alguns clássicos
é sem dúvida uma situação privilegiada de tran-
sitar pelo mundo dos livros e aprender com eles.
Os textos citados acima são apenas algumas
possibilidades de concretizar esse trabalho. Es-
sas leituras, realizadas pelo professor, se diárias
e de boa qualidade, podem comunicar aos alu-
nos comportamentos leitores muito importan-
tes, além de servir como matéria-prima para
produções futuras. Um aluno que tem um mo-
delo pobre de língua que se escreve, normal-
mente tende a apresentar uma produção pobre
como resultado do que vivenciou. Já um aluno
que tem contato com o que há de melhor no
mundo da escrita poderá, quando solicitado,
produzir textos de melhor qualidade.
Sobre a escrita, que sugestões de
atividades podem ser propostas?
A elaboração de murais para o refeitório da
escola, seus corredores, sua porta de entrada, ou,
ainda, de um mural ambulante, que coloca à dis-
posição das outras pessoas que freqüentam a es-
cola parte do que estão aprendendo, pesquisando,
descobrindo, podem propiciar ótimas situações
de produção de escrita e de uso desta.
Organizar um caderno de receitas ou uma
coletânea dos poemas mais apreciados pela tur-
ma, elaborar um baralho com dicas culturais da
cidade, um livro de “o que é, o que é” ou de pia-
das, montar um jornal ou um álbum de família,
entre outros, podem ser situações de uso da
escrita bastante interessantes.
Os jogos, como as cruzadinhas, a forca, o caça-
palavras, podem ser situações interessantes de
aprendizagem para se pensar nas letras, em seus
sons e nas suas posições nas palavras, e não dei-
xam de ser situações de verdade do uso da língua.
Mas como propor tudo isso, se esses jovens
adultos não ainda não lêem e não escrevem? O
papel do professor, como aquele que vai aju-
dando, colocando problemas, dando forma ao
que os alunos pensam, é fundamental. Ele será
uma peça básica, pois dele dependerá, em mui-
tas ocasiões, a escrita do que os alunos podem
produzir oralmente, a leitura que eles sozinhos
ainda não podem fazer, enfim, a organização de
tudo que for proposto.
O que não se pode perder de vista é que o
cardápio que se vai oferecer não muda nunca,
ou seja, vamos continuar a propor que os estu-
dantes leiam, escrevam, copiem, façam ditado,
233
Leitura na alfabetização
PAINEL 19
interpretem o que estão lendo. O que vai mudar
é a qualidade do que será proposto, ou seja, tex-
tos bem escritos e de verdade, a interferência
constante do professor durante todo o proces-
so e a consciência de que se aprende a ler len-
do, e a escrever escrevendo, tendo como pano
de fundo bons problemas para se resolver e boas
questões para pensar.
Anexos
Exemplos de produções escritas de um
grupo de jovens adultos estudantes
A produção de autobiografias inspiradas no
texto Auto-retrato” de Graciliano Ramos, rea-
lizada pelo grupo, possibilitou uma brincadei-
ra divertida com a língua escrita: a leitura dos
textos para que se adivinhasse quem eram seus
autores. Os alunos leram o texto original do
autor várias vezes e puderam consultá-lo na
hora da produção.
Os alunos que ainda não escreviam conven-
cionalmente produziram uma primeira versão
ditando o texto para a professora. Outros produ-
ziram o texto oralmente e depois, com a ajuda de
um gravador, o professor foi dando forma escrita
a ele. Os que já escreviam produziram autono-
mamente seu próprio texto. Uma outra proposta
foi a de que aqueles que já escreviam irem ano-
tando o que ditavam os que não escreviam. De-
pois dessa etapa, os textos foram lidos em voz alta
pela professora, para que todos os alunos comen-
tassem o seu conteúdo. Todos passaram a limpo
o texto revisado, que só posteriormente ganhou
a formatação digitada que foi para um livreto
intitulado Adivinhe quem é quem…
A seguir, trechos do livreto.
Se você acha que conhece todos os que es-
tão nesta turma, teste seu conhecimento. Abai-
xo de cada auto-retrato, existe um espaço para
ser preenchido com o nome do personagem
autobiografado.
Se tiver dúvidas e não conseguir resolver o
enigma, vá até o final da sessão e recorte os no-
mes que estão na ordem correta de apresentação
dos textos no livro e cole-os no lugar indicado.
Boa sorte, e aproveite para conhecer mais
detalhadamente quem se apresenta, então, a
seguir…
Auto-retrato aos 38 anos
(texto produzido em parceria)
Nasceu em 1960, em Lagedão, Bahia
Casado duas vezes, tem quatro filhos
Altura: 1,68
Sapato nº 40
Pesa 58 quilos
Gosta de andar
Gosta de vizinhos, sendo cada um na sua casa
Gosta muito de rádio e televisão
Detesta quem fala alto
Usa óculos
Gosta de comida mineira
Adora frutas
Gosta muito de música sertaneja
Ama muito seus filhos
É católico não-praticante
Primeiro livro que leu: “O Xangô”, de Jô Soares
Fuma cigarros “Free”
Gosta muito de praia e de mar
Gosta de pescar
Tem uma gastrite nervosa que o incomoda muito
Espera morrer quando Deus quiser.
Autor:
Auto-retrato aos 33, quase 34 anos
(texto produzido autonomamente)
Nasceu em 1965, em São Carlos do Ivaí, Paraná
Casado uma única vez, tem dois filhos
Altura: 1,80
Sapato nº 40
Colarinho não sabe
Gosta da cor azul
Gosta de andar
Gosta de vizinhos a distância
Tem horror às pessoas que falam alto
Não usa óculos, não é calvo, mas tem os cabe-
los bem grisalhos
Não tem preferência por nenhum tipo de co-
mida
Gosta de frutas ácidas
Adora saladas verdes
234
Só come coisas doces em raras exceções
Gosta de todo tipo de música, principalmente
as sertanejas antigas
Gosta de ler e os livros que mais gostou foram
“O Pássaro Pintado”, mas não se lembra do
autor, e “Ilusões”, de Richard Bach
Romancistas brasileiros que mais lhe agradam:
Jorge Amado, Jorge Amado e Jorge Amado
Detesta palavrões escritos e falados
Deseja a morte da violência, da corrupção e
do ódio
Escreve poucas coisas à noite bebendo e ou-
vindo música mas somente quando se sente
sufocado
Fuma cigarros “Derby” ou de qualquer outra
marca
Já foi office-boy, militar do E.B., guarda de car-
ro-forte, ajudante de tecelão, porteiro e, atual-
mente, supervisor de produção
Apesar de o acharem pessimista, prefere dizer
que é realista
Está sempre na defensiva e é extremamente
desconfiado
Detesta se sentir enganado ou ver os outros se-
rem enganados
É altruísta, idealista e sonhador
Gosta de roupas sociais, mas ainda não tem ne-
nhuma
Lê e relê o que sempre escreve, buscando uma
perfeição que nunca consegue
Nunca esteve preso
Gosta de polícia na maior distância possível
Seus maiores amigos: Pai, Mãe, Irmãs, Irmãos,
Tios e Primos
Tem muitas dívidas, a maioria de gratidão
Não espera morrer, pois só pensa na vida
Seu maior prazer é pescar com seu maiores ami-
gos
Gosta de cutucar a onça com vara curta, para
se fortalecer
Gosta de falar através de frases feitas
Gosta de falar, mas conserva o medo de não
ser bem compreendido
Sabe o que quer e vem abrindo portas a vida
inteira à procura das portas certas
Encerra observando a esposa, porque na sua
mente já entra o forte do seu ser, que é o de
buscar respostas para tudo.
Autor:
Auto-retrato aos 41 anos
(texto ditado para a professora)
Nasceu em 1957, em Indaiatuba, São Paulo
Casado, tem duas filhas lindas
Altura: 1,74
Peso: 79 quilos
Sapato nº 39
Gosta de carro
Gosta do trabalho que executa
Gosta da família
Não gosta de muito barulho nas horas de lazer
Gostava muito de seu pai, falecido há pouco tempo
Gosta de música, desde que seja em volume
baixo
Gosta de futebol, mas só assiste quando é de-
cisão de final de campeonato
Gosta de viver todos os momentos, pois acha
que a vida é curta.
Autor:
Outro importante trabalho com a leitura e a
escrita consistiu em aprender a selecionar infor-
mações relevantes de um texto, que se traduziu
e materializou em textos informativos em forma
de “você sabia. Aqui, os alunos tiveram acesso a
muitos textos sobre animais; cada um escolheu
um bicho para saber mais e, a partir dos escri-
tos, selecionaram as informações que acharam
mais importantes. Assim como no exemplo aci-
ma, a produção foi marcada por uma variedade
de procedimentos escritores, de acordo com a
competência de cada um (produção autônoma,
produção ditada para a professora ou parceiro
mais experiente, gravada e posteriormente trans-
crita, ou, ainda, cópia de trechos do texto origi-
nal – todas seguidas de revisão).
Seguem amostras de algumas produções:
Exposição
Animal
Você sabia que o tatu peba é um dos poucos ani-
mais que continuam sendo caçados apesar da legis-
lação que proíbe a matança dos animais silvestres?
Geciel Viera Cassiano
Você sabia que o gambá foi o primeiro bicho
americano conhecido na Europa?
235
Leitura na alfabetização
PAINEL 19
O navegante Vicente Pinzón levou uma fê-
mea no navio, e ficou encantado com a bolsa que
ela tinha na barriga, onde apareciam as cabeças
dos gambazinhos curiosos.
Você sabia que o gambá mede 47 cm, mais
37 cm de rabo?
Judivan
Você sabia que, pelo tamanho, o leão parti-
lha com o tigre o primeiro lugar entre os grandes
felinos?
Um macho adulto pode medir até três metros
de comprimento do focinho à ponta do rabo, e
pesar mais de 230 quilos?
Cícero Fernandes
Você sabia que o veado mateiro é castanho?
Vive na América do Sul?
Pesa até 25 quilos?
Mede 90 cm de altura?
Come folha e capim?
Tem uma gestação de 217 dias?
O veado é castanho tendendo para cor fer-
rugem, mas quando filhote é todo pintadinho.
Essas manchinhas brancas sobre o pêlo mar-
rom ajudam o veadinho a se camuflar no meio
da mata.
Você sabia que o veado mateiro perde o chi-
fre a cada ano e cada vez que o chifre nasce ele
é maior?
Nadi
Exemplo do trabalho com poemas
que resultou num livro
Apresentação do trabalho feita pela
professora
É com muito orgulho que apresento o pro-
duto final de escrita do nosso trabalho de Lín-
gua Portuguesa.
Em síntese, ele é parte da história deste gru-
po que, durante um ano, leu muitos poemas,
devorou crônicas, apreciou romances e, portan-
to, pôde se dedicar com afinco à tarefa, mais do
que árdua, de produzir textos escritos.
Espero, realmente, que apreciem os poemas
inventados!!!
Só tenho elogios a fazer a quem, com de-
dicação, freqüentou as aulas e pôde descobrir
ou redescobrir os prazeres de conhecer…
Foi um ano em que pudemos, além de es-
crever, visitar outros mundos por intermédio da
leitura, e tenho certeza que muitos adoraram e
aproveitaram muito a viagem.
A companhia de Graciliano Ramos, João
Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de
Andrade, Luís Fernando Veríssimo, Jorge Ama-
do, Jô Soares e tantos outros nos foi muito
oportuna!
No entanto, esse tempo de trabalho foi só
o começo, e é preciso seguir avançando. E isso
significa continuar lendo, se preocupando
com a escrita correta das palavras, com a pon-
tuação, com a apresentação final dos textos,
observando, enfim, como escrevem nossos
mestres para que se possa aprender ainda
mais com eles.
Agora, é hora de colher os frutos das con-
quistas e uma delas é poder apreciar este livro.
Espero que gostem do resultado, que sem dú-
vida representa muito de tudo que foi concre-
tizado.
Parabéns, alunos!
Poemas para apreciar…
Os poemas que vocês lerão a seguir foram
feitos a partir da leitura e análise deste lindo
poema de Carlos Drummond de Andrade.
Cidadezinha qualquer
Carlos Drummond de Andrade
Casas entre bananeiras,
Mulheres entre laranjeiras,
Pomar, amor, cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar… as janelas olham…
– Êta vida besta, meu Deus!
236
Exemplos dos poemas dos alunos:
Gente
Cléo
Gente sem trabalhar
Gente sem estudar
Estudar, trabalhar, avançar
Homem precisa trabalhar,
Pois, sem trabalho, não tem
Como de sua família cuidar
Criança precisa estudar
Pois, sem estudo,
Não tem como trabalhar
– Êta vida sofrida sem estudar!!!
Aves no meio das árvores
Valdemir
Aves no meio das árvores
Que passam o tempo a cantar
E que não precisam pensar
Um carro vai devagar
Levando gente para passear
Sem beber e sem fumar
E sempre a cantar
Devagar as pessoas olham e dizem:
– Êta vida corrida, cansada e sofrida,
Meu Deus!!!
Claro que as aprendizagens desses jovens
adultos ou adultos jovens não se encerram aqui.
Por trás da língua que lhes foi mostrada, eles
puderam ampliar, e muito, seu conhecimento
de mundo. Mudaram atitudes, aprenderam pro-
cedimentos, mas, sobretudo, foram contamina-
dos pelo gostar de ler e puderam navegar em
mares de palavras nunca dantes navegados ou,
melhor dizendo, nunca dantes enfrentados…
237
PP
PP
P
AINEL AINEL
AINEL AINEL
AINEL
2020
2020
20
A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA
SALTO PARA O FUTURO
NA FORMAÇÃO CONTINUADA
DE PROFESSORES
Rosa Helena Mendonça
238
Interatividade é uma palavra que está em
voga. Há muitos sentidos para esse termo. Aqui,
vamos nos apropriar da seguinte noção, expres-
sa por Bartolomé Pina: “[...] se entende por
interatividade o fato de que ambos os extremos
do canal de comunicação participam, emitin-
do mensagens que são recebidas e interpreta-
das pelo outro extremo e que, de alguma ma-
neira, influem no modo como o diálogo conti-
nua a se desenvolver” (Bartolomé Pina, 1998).
É a partir dessa citação que queremos falar
do programa Salto para o Futuro, da TV Esco-
la. O Salto para o Futuro é mais do que um pro-
grama de televisão: é um programa de forma-
ção continuada a distância, que utiliza diferen-
tes mídias, como material impresso, tevê,
Internet, além de fax, telefone e correio eletrô-
nico. A idéia é estabelecer um diálogo, que co-
meça antes do programa de tevê e que consti-
tui o debate, prolongando-se após a sua
veiculação em cada telessala, em cada escola,
em cada sala de aula.
Quais são os limites e as possibilidades de
um programa de tevê educativo, que pretende
ter como marca a interatividade, estabelecen-
do um diálogo entre professores de todo o país?
O que podemos destacar de um projeto de for-
mação continuada de professores que se cons-
titui como um processo dialógico? Como essa
participação tem interferido na concepção dos
programas? E de que forma a discussão que
acontece ao longo dos programas se reflete na
prática dos professores?
A experiência do programa
Salto para o Futuro
na formação continuada
de professores
Rosa Helena Mendonça*
Seed/MEC
Essa prática, não faz muito tempo, era pau-
tada na transmissão de conteúdos, previamen-
te definidos pelos sistemas de educação. Mui-
tos professores foram assim reprodutores” de
um saber cristalizado, respaldado nos rígidos
rituais da escola.
No entanto, sempre houve quem se insur-
gisse contra essa ordem, quer do ponto de vis-
ta da reflexão teórica, quer da prática. Freinet,
Makarenko, Paulo Freire, para citar alguns no-
mes, e muitos, anonimamente, nas suas es-
colas e salas de aula, ousaram e ousam bus-
car alternativas para uma aprendizagem ver-
dadeira.
E a escola não é só um espaço de aprendi-
zagem para o aluno. É o locus privilegiado para
a formação do professor.
O que hoje parece consenso no campo te-
órico da educação, apontando para a constru-
ção e para a autonomia, tanto do projeto es-
colar, quanto de professores e alunos nos seus
processos de aprendizagem, é fruto dessa his-
tória longa, complexa e certamente mutável,
que os professores, esses eternos aprendizes,
vêm registrando com seus erros e acertos.
Há aprendizagens que se vêm mostrando
essenciais, na contemporaneidade, para o
exercício permanente e crítico do Magistério:
aprender a aprender e criar condições para que
os alunos aprendam, ou seja, uma formação
continuada que tem na escola e no trabalho em
equipe as condições essenciais para o seu de-
senvolvimento.
* Mestre em Educação pela PUC-Rio; professora das disciplinas Estratégias de Educação Continuada e Novas Tecnologias e Educação na
Faculdade de Pedagogia da Unesa e Supervisora Pedagógica do programa Salto para o Futuro – TV Escola – Seed/MEC.
238
Salto para o Futuro na formação continuada
PAINEL 20
Orientar os alunos no sentido do cresci-
mento e, portanto, do conhecimento é um de-
safio que exige do professor competências es-
pecíficas, que são desenvolvidas, sobretudo,
no processo de formação continuada, a qual
se dá ao longo do exercício profissional, em di-
ferentes espaços. Na própria escola, nas tro-
cas que nela acontecem, por meio de progra-
mas específicos, na interação com a comuni-
dade, no estabelecimento de parcerias e por
meio de projetos e programas voltados para a
formação do professor.
O Salto para o Futuro, sendo ao vivo e com
recepção organizada, permite também uma
interlocução com os outros programas do ca-
nal e com outros projetos, tanto do próprio
MEC quanto de outras instituições voltadas
para a educação.
Esse é um processo em permanente cons-
trução. O Salto pretende ser uma contribuição
nesse processo. Nas telessalas, em diferentes
estados, são múltiplas as trocas que se estabe-
lecem a cada dia e prolongam-se em outros es-
paços de atuação do professor: a comunidade,
a escola, a sala de aula…
Dessa forma, o Salto para o Futuro, ao lon-
go de cada um desses dez anos, vem estabele-
cendo esse diálogo com os professores de todo
país, buscando caminhos para discutir a edu-
cação no Brasil. E esse diálogo com os profes-
sores tem as mais diversas motivações.
O que deixam entrever as falas dos profes-
sores? Questões de ordem meramente meto-
dológica? Ou suas histórias profissionais, os
conhecimentos de vida, as angústias e as ale-
grias? O que os tem motivado na sua partici-
pação ao longo de uma década? O que os pro-
fessores esperam desse programa? O que suas
dúvidas, suas inquietações, suas hesitações e
seu desejo de obter respostas deixam perceber?
O que os leva a participar de um projeto de for-
mação continuada, por opção?
Podemos pensar em uma comunidade de
professores, que trocam informações, experi-
ências? Há também o desejo de ter voz e vez,
por meio de questões que muitas vezes denun-
ciam situações de trabalho que precisam ser
melhoradas, como a falta de tempo para o es-
tudo, a questão salarial, o número muitas ve-
zes excessivo de alunos por turma. Há uma
expectativa permanente por respostas pontu-
ais, que envolvem o cotidiano do professor.
Existe, também, um freqüente entusiasmo de
falar de experiências exitosas. Como pano de
fundo, percebe-se uma vontade de exercer o
direito à formação profissional continuada,
buscando uma sintonia com as tendências
atuais da educação. Em busca de um entendi-
mento desse processo, procurando conhecer
melhor quem é o professor e como acontece o
trabalho nas escolas, continuamos, a cada ano,
a partir das avaliações e da análise dos progra-
mas, a renovar esse diálogo. Investimos na
constituição de uma rede que vai sendo tecida,
explicitando diferentes concepções de escola.
As trocas, tão ricas quanto imprevisíveis, são
os fios que tecem os discursos e deixam entre-
ver as práticas.
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação
Fundamental.
Referenciais para a formação de profes-
sores.
Brasília, 1999.
FREIRE, Paulo.
Pedagogia da autonomia.
São Paulo: Paz
e Terra, 1997.
MORAN, José Manuel et al.
Novas tecnologias e media-
ção pedagógica
. Campinas, SP: Papirus, 2000.
NÓVOA, António.
Os professores e sua formação.
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PINA, Bartolomé. Sistemas multimídia. In: SACHO, Juana
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Para uma tecnologia educacional
. Porto Ale-
gre: Artmed, 1998.
SANCHO, Juana M.
Para uma tecnologia educacional
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to Alegre: Artmed, 1998.
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