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Aquele carnaval foi mesmo um estouro!
Sábado, domingo, segunda e terça o bloco dos colegas brincou nas ruas, se
misturando com os foliões todos, com as escolas de samba, com os frevos
e com os ranchos. E por onde passava, todo o mundo aplaudia, ria,
apontava:
- Olha o bloco dos palhaços!
- Viva o bloco dos palhaços!
Nessas horas a turma aproveitava pra se exibir.
Flor chegava até ficar tonta de tanto que rodopiava com a bandeira. (Os
Colegas, p. 29)
- Vivo de biscate: pego um servicinho aqui, outro ali. Quando aparece. Mas
às vezes leva um tempão sem aparecer. Que nem agora. Desde o natal que
não aparece nada. Ando apertando o cinto que só vendo. (Angélica, p. 28)
Levaram ele a uma porção de médicos. Um disse que era coluna, outro
falou que era falta de vitamina, o outro mandou ele ir pra escola: “Isso é
falta de amigos, de colegas! Botem ele no meio de uma porção de
companheiros que ele não vai mais se engasgar.”
E o Vítor fez ginástica pra coluna, tomou um monte de vitamina, foi pra uma
escola de horário duplo pra ainda ter mais companheiro. Continuou se
engasgando igualzinho. (O sofá estampado, p. 26)
Para Nardes (1988), é o fato de os animais antropomorfizados do corpus
serem buscadores que torna a fábula de Lygia Bojunga moderna:
As narrativas alegóricas [...], tendo como protagonistas animais
antropomorfizados que vivem em seu mundo próprio, onde não há lugar
para seres humanos – visto que eles mesmos representam esses seres de
forma alegórica, podem ser consideradas ‘fábulas’ ‘modernas’. ‘Fábulas’,
por suas características formais, e ‘modernas’, por contrariar o seu sentido
tradicional (pedagógico-moralizante), apresentando personagens que
buscam o caminho da auto-aprendizagem, do auto-conhecimento, e da
auto-libertação. (p.60)
No que se refere à moral, Lygia Bojunga, ao contrariar o sentido da fábula
tradicional, a reinscreve a partir de outra perspectiva, pois a autora não rompe com o
caráter didático-moralizante, mas o transforma de modo que ele passa a ser
percebido não como uma verdade única e absoluta, mas como verdades possíveis,
pois a narrativa não deixa de ser exemplar, porém leva à reflexão crítica.
No tocante aos nomes dos personagens, somente os animais recebem
nomes próprios, como por exemplo, os cães Latinha, Virinha e Flor, o pombo João
Carlos de Oliveira Brito, o porco Porto, a cegonha Angélica, o tatu Vítor, a gata
Dalva, a hipopótamo Dona Popô, enquanto os demais são designados por relações
de parentesco como os pais do Vítor, os tios de Cara-de-Pau, a Vó do Vítor, etc., ou
por suas funções, em geral atribuídas aos personagens humanos, como o porteiro,