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ANEXO 16 – Transcrição da coluna de José Roberto Torero na Folha abordando a
temática da jornada heroica
Opinião – José Roberto Torero – Por que Ronaldo é tão amado?
Não é à toa que o chamam de Highlander. Quando morrer, o legista fará exames extras,
pois o cara parece imortal: “ACHO QUE a resposta é: porque ele encarna vários
personagens dos quais gostamos.
Para começar, teve uma infância pobre, o que de cara provoca uma certa empatia. Nada
como o sofrimento infantil para gerar carinho pelo personagem.
Mas ele não foi só o menino pobre. Foi também garoto prodígio, como Pelé, Mickey
Rooney, Robinho, Macaulay Culkin, Zico, Neymar e Robin (o do Batman). Eles unem a
genialidade à singeleza infantil. E Ronaldo, campeão do mundo aos 17 anos, conseguiu ser
um menino prodígio. Ele tornou-se um caçulinha pé-quente, uma espécie de mascote da
seleção. Aliás, com os eternos dentões, ele consegue manter um tanto desta aura até hoje.
Ronaldo também se encaixa no “adolescente-que-apronta”, tipo que não exatamente
admiramos, mas com o qual temos uma grande identificação. O fato de ele fumar, beber, ir
a boates, ser pego com travestis etc torna-o meio trapalhão, tira-o do Olimpo e faz com que
ele pareça mais humano.
Ele ainda pode ser classificado no arquétipo de “comedor”, de “don juan”. Não só pelas
várias mulheres que passaram por sua biografia, mas principalmente pelos seus dois
casamentos. Primeiro, foi Milene, uma menina bonita, simpática e que jogava futebol, o
sonho de vários marmanjos. E depois houve a história com Daniella Cicarelli, na época, o
maior símbolo sexual do país. Ou seja, muitos homens tiveram identificação projetiva com
Ronaldo.
Outra faceta importante é a de “homem de sucesso”. Ele jogou pelos dois maiores times da
Espanha e pelos dois maiores da Itália. Ganhou três vezes o título de melhor do mundo, foi
artilheiro da Copa de 2002, é o maior artilheiro da história das Copas... Ao lado disso, teve
um ataque sei-lá-o-quê na final 1998. Ou seja, Ronaldo consegue temperar um lado gauche
com um lado vitorioso.
Creio que uma de suas variantes mais importantes é a do “ressuscitado”. Todos adoramos
personagens que parecem estar liquidados e acabam dando a volta por cima.
Metaforicamente, é como se eles vencessem a morte. E Ronaldo já teve três graves
contusões. Recuperar-se uma vez já seria espantoso. Duas vezes, um milagre. Mas ele está
em sua terceira recuperação. Não é à toa que o apelidaram de Highlander. Quando
realmente morrer, o médico-legista, fará exames extras, por que o cara parece imortal.
Mas o mais importante é que ele se encaixa no arquétipo de herói. Principalmente por
conta da Copa-2002. Aquele foi o grande momento de sua carreira. Ele ergueu-se das
cinzas e fez oito gols em sete jogos. Sem falar que marcou os dois gols na final conta a
Alemanha. Simbolicamente, é como se a Copa tivesse sido vencida por ele, assim como
Romário teria conquistado a de 94, Pelé a de 58 e Garrincha, a de 62.
Em resumo, acho que Ronaldo consegue se encaixar em vários personagens que
admiramos: menino pobre, garoto prodígio, adolescente problemático, jovem conquistador,
azarado, vencedor, ressuscitado e herói, e assim une a perfeição e o fracasso, sendo ao
mesmo tempo extraordinário e comum. E, além disso tudo, o cara joga muito”. (Folha de
S. Paulo, 10 de março de 2009, p. D3)