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seriam capazes de repetir o desafio de Clemenceau, isto é, que “se
pudesse haver um conflito entre a República e a liberdade, é exata-
mente à liberdade, mesmo contra a República, que eles dariam razão”.
Mas, não se pode contestar que essas gerações de burgueses...
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Notável é sua análise das elites, “os homens novos”, da Segunda
República, pós 1930:
Na transição da fase agrícola à fase industrial que coincide com as novas
técnicas de produção, as concentrações urbanas, o êxodo da população
rural, a ascensão das massas operárias e o apelo ao número, têm essas
novas elites um papel social, realmente importante, na democratização
do país. Elas não somente exprimem uma época de transição e, por-
tanto, de crise, mas preparam, sem o quererem, pela sua impotência
em controlar a industrialização e a marcha do socialismo, a aparição dos
líderes populares. A um tempo, produtos e fatores do processo de
democratização começaram por varrer e baralhar os velhos quadros
políticos, para favorecerem, sem o procurarem certamente, o “corte
ideológico”, ou uma linha mais nítida de demarcação entre as corren-
tes da opinião pública organizadas em partidos. Essa confusão preli-
minar, em que se acotovelaram as elites ascendentes e descendentes, as
antigas e as novas elites políticas, manifesta-se à evidência na pluralidade,
nas repulsões mútuas, nas fraquezas e, especialmente, nas bandeiras
dos partidos, talhadas (com exceção da do partido comunista) num
manto de arlequim zebrado de costuras e carregado de cores. As ideias,
como os homens, misturam-se em programas incoerentes e às vezes
disparatados, tecidos com panos de retalhos, para recrutar adeptos nas
massas, mediante concessões ao socialismo, e cobrir por elas, sobre as
fronteiras flutuantes dos partidos, aqueles que lhes podiam escapar.
Em todo o caso, o realismo da política de base rural, aristocrática e
autoritária, como o idealismo burguês, que se formou na linhagem
dos Enciclopedistas, pais da burguesia liberal, cederam o lugar a uma
nova política, burguesa, democrática sem dúvida, mas não liberal que,
no seu instinto conservador, procura uma posição de equilíbrio, entre
as diversas correntes, radicais ou moderadas, de direita e de esquerda,
em que se divide a opinião. As rupturas e cisões dos partidos, as lentas
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AZEVEDO, Fernando. Canaviais e engenhos na vida política do Brasil: ensaio socioló-
gico sobre o elemento político na civilização do açúcar. Rio de Janeiro, Instituto do
Açúcar e do Álcool, 1948, pp. 172-173. Grifos meus.
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