FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO FÍSICA
UNIDADE 1 | RAÍZES HISTÓRICAS GERAIS
A Paidéia grega confere um desta-
que para a educação, como uma
força diretriz do potencial de cada
indivíduo, para desenvolver as virtu-
des do caráter e, conseqüentemente, para o alcance
da excelência na organização política da sociedade.
Nesse contexto, a ginástica surge como uma medi-
da social de caráter essencialmente educativo,
comprometida com a formação de um homem sau-
dável. Porém, se, na visão de Sócrates, era por
meio da ginástica que o homem demonstrava ter
cuidado com o corpo, para Platão, o fim último da
educação deveria estar sempre fixado na alma. As-
sim, o propósito da ginástica era muito mais desen-
volver a coragem da alma do que a força do corpo.
Ao tentar proteger o homem da ignorância, Platão
reserva para o corpo uma posição ambígua. Valo-
riza o corpo, quando ele se apresenta como objeto
da ação educativa, contribuindo: (1) para obtenção
da saúde; (2) para a guerra na defesa da cidade-
estado; (3) para a prática esportiva e confraterniza-
ção entre cidades-irmãs. Quando, porém, afasta-
se de uma dessas funções sociais, ou as exerce de
forma descontextualizada, com a busca do bem
comum, o corpo assume a conotação negativa
descrita acima.
Se os significados atribuídos ao corpo na filosofia
grega eram marcados pela ambigüidade, o dualis-
mo teológico, mesmo acentuando a separação en-
tre corpo e espírito, não é capaz de eliminar o ca-
ráter contraditório das posturas em relação ao cor-
po, que oscilam entre o sacro e o profano. Enquan-
to parte da cultura, o corpo nunca figurará sob uma
visão estática e única.
Dessa maneira, se o corpo ocupa o centro da fes-
ta é porque existem pessoas que estão em uma
condição pecaminosa; o que parecia reconheci-
mento, transforma-se em algo indigno. Logo, o que
resta para o corpo é o castigo, devendo ser cons-
tantemente vigiado e severamente punido. A morti-
ficação do corpo, e até mesmo a total separação
do mundo, é o ideal medieval para que o homem
consiga se aproximar de Deus.
A reflexão sobre essas questões abre espaço para
uma discussão do significado do corpo dentro da
própria teologia cristã, e não pela simples oposição
da visão do corpo na religião com outras formas de
se ver o corpo.
O professor de Educação Física está diante do de-
safio de dialogar com a filosofia e a teologia, não
como áreas de interesse de estudo, mas como a
conquista da possibilidade de negociar os significa-
dos atribuídos ao corpo em cada uma delas, com
as interpretações que tramitam no senso comum e
que definem, em última instância, o alcance da
nossa legitimidade e reconhecimento social.
O advento da ciência moderna é um elemento cha-
ve na construção de uma nova concepção de ho-
mem e sociedade. O conhecimento científico, re-
vestido da autoridade que conquistou, ao demons-
trar que era capaz de explicar e intervir na nature-
za, até então sujeita exclusivamente à vontade de
Deus, coloca o corpo em um duplo destaque: epis-
temológico e investigativo.
A submissão de todas as coisas ao crivo da razão
científica retira a aura de sacralidade que existia em
torno da natureza, enquanto criação de Deus, algo
que era perfeito e deveria permanecer intocável. O
corpo humano assume o
status
de objeto de estu-
do, passando a ser alvo de interesse de biólogos,
químicos, físicos e outros, preocupados em des-
vendar os segredos dessa maravilhosa máquina.