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ANTONIO GRAMSCI
filosófico, o problema do conhecimento, “marcar os limites da cer-
teza de nossos conhecimentos e os fundamentos das opiniões que
vemos reinar entre os homens”. Enganou-se, porém, no método a
seguir para resolver essa questão, que estudou como psicólogo e não
como epistemólogo
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. Não tinha percebido claramente a natureza
do problema crítico, que Kant
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teve o mérito de ser o primeiro em
pôr em evidência. Sua psicologia é, de certo modo, uma teoria do
conhecimento que não tomou consciência de si mesma.
Como quer que seja, postulando a tábula rasa
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, a ausência de
toda capacidade inata na criança, Locke não mostrava ao educa-
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Epistemólogo, estudioso da epistemologia, parte da lógica que versa o conhecimento
científico do ponto de vista do valor desse conhecimento, isto é, do ponto de vista crítico. “É
essencialmente o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos resultados das várias
ciências, com o fim de determinar-lhes a origem lógica (não psicológica), o valor e o alcance
objetivo” (Lalande. Vocabulaire technique et critique de la philosophie, v. 1. 4. Ed. Paris:
Alcan, 1938. p. 212. (Nota do tradutor).[Publicado no Brasil pela Martins Fontes (N.E).
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Emanuel Kant (1724-1804), filósofo alemão, a cujo grande nome está ligado o criticismo,
doutrina segundo a qual o eixo de toda indagação filosófica está no problema do valor do
conhecimento. Aspirou também a constituir uma moral independente da metafísica e
baseada no imperativo categórico. Principais obras: Crítica da razão pura e Crítica da razão
prática. Mas, Kant se preocupou igualmente com pedagogia, além de outros variados
temas, campo sempre estreito para seu vasto e poderoso espírito; dele é um tratado
sobre a matéria, Traité de pédagogie, na trad. fr. de Jules Barni, com estudo crítico de R.
Thamin, Alcan, Bibli. de Philos. Contemp., Paris, 5. ed., 1931. V., a respeito desse
filósofo tão largamente estudado, entre muitos outros: Külpe, O. Kant. trad. esp. de
Domingo M. López, Labor. 2. ed. Barcelona: [s.n.], 1929; Ruysseb, T. Kant. Paris: Alcan,
1909; Cantecor, G. Kant. Paris: Mellotéc, [s.d.]; Messer, A. De Kant a Hegel. trad. esp.
de J. P. Bances. Revista de Occidente, Madrid, pp. 9-119, 1927, além dos manuais de
história da filosofia e de história da pedagogia. (Nota do tradutor).
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Tábua rasa ou, como também se escreve, conservando a forma latina, tabula rasa,
expressão que significa inexistência de quaisquer impressões anteriores à experiência. Na
tábua de cera, plana e lisa, nada ainda se havia escrito: era uma tabula rasa. A expressão,
tradicional na história da filosofia e na da pedagogia, tem origem numa passagen de
Aristóteles, no seu livro de psicologia, De anima. Em Santo Tomás de Aquino: “A alma
humana não tem em si as espécies inteligíveis como um dado natural… mas as possui em
potência, tal como uma tábua rasa na qual nada foi escrito... (sicut tabula rasa, in qua nihil
est scriptum... – Quaestiones disputate de Anima, VIII). Em Locke: “Let us then, suppose
the mind to be, as we say, white paper, void of all characters, without any Ideas...” –
“Suponhamos que o espírito seja, como dizemos, um papel branco, sem nada escrito, sem
nenhuma ideia.“ (Essay concerning the understanding, II. I). Tábua rasa, papel branco; é
bem o sentido da expressão. Para Leibniz, racionalista opositor de Locke, a tabula rasa era
uma ficção impossível. – Cf. Laland. Vocabulaire, cit. (Nota do tradutor).
CLAPARÈDE EDITADO.pmd 21/10/2010, 09:0942