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Com a transformação da vida familiar devido a sua união com a medicina, observa-se a
família como responsável pela higiene e educação das crianças e dos empregados; o
fortalecimento da figura da mãe (aliança médico-mãe e enfraquecimento da figura paterna); a
criação de um espaço específico para as crianças com vigilância constante; preocupação e
proteção quanto ao seu bom desenvolvimento (DONZELOT, 1986).
No Brasil, após o advento da República, final do século XIX, as cidades passam por
intensas transformações. O fluxo migratório do campo para cidade e de cidade para cidade, as
mudanças demográficas e sociais, o surgimento de novas cidades, o povoamento do espaço
urbano, a construção de habitações de maneira desordenada, as epidemias etc., criam a
necessidade de modernização, leia-se organização e controle demográfico-político-social,
dessas cidades. Precisava-se organizar o espaço público e o privado. Assim, seguindo o
modelo parisiense de gestão do espaço público, onde se separava os pobres e miseráveis da
elite burguesa, o Brasil, crente neste modelo, coloca-o em prática em nossas cidades, tendo o
Rio de Janeiro como local dessa primeira experiência. O objetivo do Estado nesse momento
era
(...) estabelecer a caracterização dos espaços de abrangência pública, reservada à
circulação e lazer controlado, e daqueles privados, reservados à pratica da
intimidade institucionalizada pelos códigos de comportamentos específicos e
rígidos a serem mantidos e promovidos preferencialmente pela família nuclear. A
uma ordem estipulada pelos gestores do Estado para as ruas – públicas – devia
corresponder outra destinada às casas – privadas. (MARINS, 1998, p.136).
As epidemias e endemias de cólera, febre amarela, malaria, varíola, tuberculose, a
peste bubônica, decorrentes das péssimas condições de saúde das populações e dos espaços
habitados aumentavam o controle médico sanitário. Destruíam-se as casas das populações
pobres, consideradas como foco das doenças, com o intuito de excluir do espaço urbano essa
população que ameaçava a ordem social. O que não se mostra uma estratégia eficaz, pois
começa a construção das favelas. Como resposta da população excluída, temos em 1904, a
Revolta da Vacina diante da obrigatoriedade da vacinação contra a varíola. Invade-se as casas
das famílias na busca de doentes, na profilaxia dos espaços públicos e privados. (ibid)
A medicina social brasileira, por meio das políticas higienistas, invadiu a família,
criando um estado de dependência e impondo regras e normas não só relativas à higiene mas
também à moral, ao físico, ao sexual e ao intelectual, com o objetivo de que as famílias
“cultivassem o gosto pela saúde, exterminando assim, a desordem higiênica, dos velhos
hábitos coloniais” (COSTA, 1979, p. 12). Ela se impôs como técnica de regulação do contato
entre indivíduos e família com a cidade e o Estado.