Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO-SENSU EM
EDUCAÇÃO FÍSICA
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E
LAZER: O PROGRAMA ESPORTE NA COMUNIDADE (FORTALEZA/CE)
Ana Amélia Neri Oliveira
BRASÍLIA-DF
2010
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Democracia participativa e políticas públicas de esporte e lazer: o Programa
Esporte na Comunidade (Fortaleza/CE)
Fonte: Programa Esporte na Comunidade/Núcleo Rosalina, 2009
Ana Amélia Neri Oliveira
ads:
O48 Oliveira, Ana Amélia Neri.
Democracia participativa e políticas públicas de esporte e lazer: o
Programa Esporte na Comunidade (Fortaleza/CE) / Ana Amélia Neri
Oliveira. Brasília, 2010.
232 p.: il. ; 29 cm.
Dissertação (Mestrado). Universidade de Brasília. Faculdade de
Educação Física, 2010.
Orientadora: Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
Co-Orientador: Nicolino Trompieri Filho
1. Democracia participativa 2. Políticas públicas 3. Esporte. 4. Lazer
I. Suassuna, Dulce Maria Filgueira de Almeida, orient. II. Título.
CDU 796(81)
Ficha catalográfica elaborada por Deise Lourenço de Jesus CRB-1/1201
iii
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E
LAZER: O PROGRAMA ESPORTE NA COMUNIDADE (FORTALEZA/CE)
ANA AMÉLIA NERI OLIVEIRA
Dissertação apresentada à Faculdade de Educação Física da
Universidade de Brasília, como requisito parcial para obtenção
do grau de Mestre em Educação Física.
Orientador (a): Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
Co-orientador: Nicolino Trompieri Filho
iv
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E
LAZER: O PROGRAMA ESPORTE NA COMUNIDADE (FORTALEZA/CE)
Dissertação apresentada à Faculdade de Educação Física da
Universidade de Brasília, como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre em Educação sica.
BANCA EXAMINADORA
Prof.(a) Dr.(a) Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
ORIENTADORA
Universidade de Brasília UnB
Prof. Dr. Nicolino Trompieri Filho
CO-ORIENTADOR
Universidade Federal do Ceará - UFC
Prof. Dr. Fernando Mascarenhas
MEMBRO INTERNO
Universidade de Brasília - UnB
Prof. Dr. Valter Bracht
MEMBRO EXTERNO
Universidade Federal do Espírito Santo - UFES
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, à minha mãezinha do coração Licínia, pelo amor a mim
cedido, pelos afagos e pelas muitas palavras de estímulo e exemplo de
luta e coragem; ao meu pai Raimundo, pela educação que me
proporcionou nos primeiros anos dia vida ainda em nosso lar em
Trairi/CE e por nunca ter medido esforços no sentido de assegurar
condições materiais para o estudo de seus filhos. Mamãe e papai, tudo
isto e o que ainda há de vir devo a vocês!
Aos meus professores e professoras, que no percurso da escola à
universidade (graduação e pós-graduação) me estimularam com seus
ensinamentos e muito mais com sua prática a singularidade do ser
professor. Alguns deles foram essenciais, outros foram imprescindíveis, é
o caso do camarada Nicolino.
vi
AGRADECIMENTOS
Aos meus familiares:
Pais, Raimundo e Licínia.
Irmãos, Beatriz, Américo, Silvana, Idalina, Marcos, Maria Izolda, Icelda, Carlos,
Eleison (in memorian) e Paco (ele fugiu para a África, mas ainda é da família...).
Sobrinhos e sobrinhas, João, Walewsky, Janderson, Pablo, Arthur, Levi, Marcos,
Sabrina, Claiz e Sophia (minha princesa).
Tio e tias, Autran, Neri e Salete.
Aos amigos:
Gleide Marley e Bergson Rodrigues companheiros desde os tempos da faculdade.
Tone Wagner, Gabriel Guerreiro, Maria Silva, Maria Denise e Fábio Silvestre pelo
cuidado e pela atenção dedicada durante a minha permanência em Brasília.
À Escola Santa Tereza:
Família Santa Tereza que sempre me recebeu com muita estima, em especial aos
meus alunos e ao grupo gestor representado pela Professora Rita de ssia que
sempre me encorajou a seguir na luta pelo mestrado.
À Escola Professor José Militão de Albuquerque:
Grupo gestor, de modo singular a Professora Marta Leuda pelo auxílio nos
momentos de dificuldade.
À Secretaria de Esporte e Lazer:
vii
Coordenadores e supervisores do Programa Esporte na Comunidade.
Às comunidades:
Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II, de
modo especial, ao Sr. Nonato da Associação dos Moradores do Planalto Universo e
a Sra. Neusa da Cooperativa das Costureiras da Rosalina que sempre me acolheram
com muita atenção e interesse pela pesquisa.
Aos funcionários do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de
Educação da Universidade Federal do Ceará:
Francisco, Carlos, Maria e Gerson que sempre me receberam com bastante
solicitude.
Aos funcionários da Faculdade de Educação sica da Universidade de Brasília:
Josino, Raposo, Denise, Alba e Quélbia pela cordialidade e habilidade diante dos
aperreios da cearense”.
Aos professores:
Dulce Suassuna, pela orientação e cumplicidade ao longo do caminho árduo e
solitário que caracteriza o mestrado. E pela credibilidade no tocante à minha
atuação no âmbito do grupo de pesquisa do Núcleo de Estudos do Corpo e
Natureza.
Nicolino Trompieri, por mais uma orientação e tantos outros ensinamentos. Nós
somos “tri...!
Deixo o mestrado com a certeza de que muito pouco aprendi, talvez o suficiente
para construir esta dissertação. Contudo, estou certa de como experiência de vida
muita coisa ficou, dentre outras, aprendi o quanto o lugar da gente diz muito de nós
e vice-versa.
viii
“O que chamamos democracia começa a assemelhar-se tristemente ao
pano solene que cobre a urna onde já está apodrecendo o cadáver.
Reinventemos, pois, a democracia antes que seja demasiado tarde”.
José Saramago
ix
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS ......................................................................................... xi
LISTA DE FIGURAS ........................................................................................... xii
LISTA DE ABREVIATURA ............................................................................... xiv
RESUMO .............................................................................................................. xv
RESUMEN .......................................................................................................... xvii
ABSTRACT ......................................................................................................... xix
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 21
CAPÍTULO I:
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E GESTÃO DEMOCRÁTICA
1.1 Do clássico ao contemporâneo: uma reflexão sobre a teoria da democracia .. 28
1.2 Democracia participativa no cenário contemporâneo ........................ ............ 36
1.3 Participação em teoria democrática ................................................... ............ 42
1.4 Participação na cena sociopolítica contemporânea ............................ ............ 45
CAPÍTULO II:
PERCURSO METODOLÓGICO DO ESTUDO
2.1 Procedimentos de pesquisa .............................................................................. 60
2.1.1 Notas iniciais: abordagem qualitativa e quantitativa ................................ 61
2.1.2 Categorias analíticas .................................................................................. 64
2.1.3 Pesquisa social em foco ........................................................................... 65
2.1.4 O Programa Esporte na Comunidade em números ................................... 70
2.1.5 Fortaleza: o lócus do estudo ...................................................................... 76
2.1.6 Definição e critérios de seleção dos sujeitos ............................................. 84
2.1.7 Cuidados éticos da pesquisa ...................................................................... 87
2.1.8 Procedimentos de análise dos dados ......................................................... 87
CAPÍTULO III:
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E LAZER: IDENTIDADE LOCAL E O
CENÁRIO BRASILEIRO
3.1. Políticas de esporte e lazer no país ................................................................. 89
3.2. O Programa Esporte na Comunidade ........................................................... 100
CAPÍTULO IV:
NORDESTINO SIM, NORDESTINADO NÃO!
4.1 Quadro analítico-descritivo da população investigada .................................. 123
4.1.1 Comunidades investigadas ..................................................................... 124
4.1.2 Perfil dos participantes do programa ............................................ .......... 141
4.1.3 Tipo de trabalho e renda dos pais, e renda familiar ...................... .......... 148
4.1.4 Participação da comunidade no programa............................................... 155
4.1.5 Síntese do quadro analítico-descritivo ......................................... .......... 171
4.2 Democracia participativa no programa: eixo central da análise ......... .......... 172
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 193
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 203
ANEXOS ............................................................................................... .......... 209
ANEXO I: Documento N . 1 - Projeto Esporte na Comunidade .............. .......... 209
ANEXO II: Documento N . 2 - Para Celebrar a utopia Reflexões sobre o Programa
Esporte na Comunidade no município de Fortaleza/CE ........................... .......... 218
xi
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Caracterização da população atendida e participação no PENC
................................................................................................................................ 67
Quadro 2: Eixos temáticos do PENC. ...................................................... ............ 68
Quadro 3: Distribuição dos sujeitos envolvidos no PENC em 2008......... .............70
Quadro 4: Situação conforme critérios estabelecidos e núcleos visitados .............73
Quadro 5: Sujeitos da pesquisa e técnicas de investigação apresentadas . ............ 85
Quadro 6: Grupos de informantes-chave ................................................ ............ 86
xii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Mapa de Fortaleza por Secretaria Executiva Regional ............. ............ 77
Figura 2: Mapa da Secretaria Executiva Regional I ................................ ............ 78
Figura 3: Mapa da Secretaria Executiva Regional II ............................... ............ 79
Figura 4: Mapa da Secretaria Executiva Regional III ............................. ............ 80
Figura 5: Mapa da Secretaria Executiva Regional IV ............................. ............ 81
Figura 6: Mapa da Secretaria Executiva Regional V ............................... ............ 82
Figura 7: Mapa da Secretaria Executiva Regional VI ............................. ............ 83
Figura 8: O cenário cotidiano da comunidade Planalto Universo ............ .......... 125
Figura 9: O momento de lazer da comunidade ........................................ .......... 126
Figura 10: A rua do Planalto Universo .................................................... .......... 127
Figura 11: O lugar do jogo e da brincadeira............................................. .......... 128
Figura 12: O lugar do lazer das crianças ................................................. .......... 129
Figura 13: O campo de futebol da Rosalina ............................................ .......... 130
Figura 14: A “rua” da Rosalina .............................................................. .......... 131
Figura 15: A transição da velha para a nova moradia ............................. ...........132
Figura 16: A aula de ginástica ................................................................. .......... 133
Figura 17: Os meninos da Serrinha ......................................................... .......... 136
Figura 18: Um time de meninos e meninas ............................................. .......... 137
Figura 19: Representação da amostra por sexo ....................................... ...........141
Figura 20: Representação da amostra por .... ........................................... ...........142
xiii
Figura 21: Representação da amostra por estado civil ............................ .......... 143
Figura 22: Situação dos participantes em relação à escolarização ........... .......... 144
Figura 23: Condição de moradia dos participantes ................................. .......... 145
Figura 24: Tipo de ocupação do pai ........................................................ .......... 148
Figura 25: Tipo de ocupação da mãe ...................................................... .......... 149
Figura 26: Tipo de moradia das famílias ................................................. .......... 150
Figura 27: Renda familiar mensal .......................................................... .......... 151
Figura 28: Número de pessoas por residência ......................................... .......... 152
Figura 29: Número de pessoas que trabalham por residência .................. .......... 153
Figura 30: Informação sobre o PENC ................................................................. 157
Figura 31: Tempo de participação no PENC ....................................................... 158
Figura 32: Freqüência semanal de participação no PENC ....................... .......... 159
Figura 33: Motivos da participação no esporte e/ou prática corporal no PENC
.............................................................................................................................. 162
Figura 34: Objetivos da participação no PENC ...................................... .......... 164
Figura 35: Indicador de pessoas na família que participam do PENC ..... .......... 169
xiv
LISTA DE ABREVIATURAS
CEDES: Centro de Desenvolvimento do Esporte Recreativo e do Lazer
CRAS: Centro de Referência da Assistência Social
COELCE: Companhia Elétrica do Ceará
EJA: Educação de Jovens e Adultos
IDH: Índice de Desenvolvimento Humano
OP: Orçamento Participativo
ONG: Organização Não-Governamental
PPA: Plano Plurianual
PENC: Programa Esporte na Comunidade
SECEL: Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza
SER‟s: Secretarias Executivas Regionais
SER I: Secretaria Executiva Regional I
SER II: Secretaria Executiva Regional II
SER III: Secretaria Executiva Regional III
SER IV: Secretaria Executiva Regional IV
SER V: Secretaria Executiva Regional V
SER VI: Secretaria Executiva Regional VI
xv
RESUMO
Democracia participativa e políticas públicas de esporte lazer: o Programa Esporte
na Comunidade (Fortaleza/CE)
Autora: Ana Amélia Neri Oliveira
Orientadora: Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
Co-Orientador: Nicolino Trompieri Filho
O estudo investigou os princípios acesso”,democratização” e participação
política”, que compreendem o conceito de democracia participativa, nas políticas
públicas de esporte e lazer do município de Fortaleza/CE (2005-2008),
considerando como recorte o Programa Esporte na Comunidade (PENC). Trata-se
de uma pesquisa com abordagem qualitativa, que teve como delineamento o
estudo de caso, utilizando-se como técnicas questionário, entrevista e observação.
Os sujeitos da pesquisa se constituíram por participantes e responsáveis (pais) e
professores do programa, grupo gestor e lideranças comunitárias. O trabalho de
campo foi realizado em cinco comunidades núcleos do programa, a saber: Planalto
Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II. A análise dos
dados foi realizada com base na análise das falas dos sujeitos entrevistados,
cruzando-se informações descritivas apontadas pela análise dos questionários
(com o auxílio do Programa Computacional Statistical Package for the Social
Sciences (SPSS) versão 15.0 para windows), que permitiu caracterizar a população
atendida, complementados pelos registros obtidos por meio da observação e pelos
levantamentos bibliográfico e documental. Pelos resultados, pode inferir que o
acesso” ao programa é limitado em relação à inserção dos adultos nas atividades,
sobretudo das mulheres, e à situação de instabilidade no funcionamento dos
núcleos. Em relação à consolidação do princípio “democratização”, destaca-se a
existência de canais de diálogo importantes com as comunidades. Estes, apesar de
assumirem uma configuração diminuta e limitada no tocante ao atendimento das
demandas de esporte e lazer das comunidades atendidas, sinalizam para a
possibilidade de construção de um modelo alternativo de intervenção
governamental no setor do esporte e lazer no município de Fortaleza/CE. No
quadro do programa existem dois limites para a consolidação do princípio
participação política”, quais sejam: (a) o modo como o governo se estrutura, que
xvi
tem como escopo a ineficiência de seus órgãos e a burocratização no que tange,
respectivamente, à construção e manutenção de equipamento de esporte e lazer e à
viabilização e liberação de recursos orçamentários necessários à manutenção dos
núcleos; (b) a carência das comunidades quanto às práticas participativas, que de
certa forma impediriam o avanço do debate em torno da soberania popular das
comunidades.
Palavra-Chave: Democracia participativa, políticas públicas, esporte e lazer.
xvii
RESUMEN
Democracia participativa y poticas públicas de deporte y ocio: El Programa
Deporte en la Comunidade (Fortaleza/CE)
Ana Amélia Neri Oliveira
Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
Nicolino Trompieri Filho
El presente estudio investigó los principios “acceso”, democratización” y
participación política”, que comprenden el concepto de democracia participativa
en las políticas públicas de deporte y ocio del municipio de Fortaleza/CE (2005-
2008), considerando como recorte el Programa Esporte na Comunidade” (PENC).
Se trata de una investigación con abordaje cualitativo, que tuvo como
delineamiento el estudio de caso, utilizándose como técnicas cuestionario,
entrevista y observación. Los sujetos de la investigación se constituyeron como
participantes y responsables (padres de los alumnos) y profesores del programa,
grupo gestor y lideranzas comunitarias. El trabajo de campo fue realizado en cinco
comunidades núcleos del programa, a saber: Planalto Universo, Rosalina,
Serrinha, Presidente Kennedy y João Paulo II. El análisis de los datos fue realizado
con base en el análisis de las fallas de los sujetos entrevistados, cruzándose
informaciones descriptivas apuntadas por el análisis de los cuestionarios (con el
auxilio del Programa Computacional Statistical Package for the Social Sciences
(SPSS), versión 15.0 para windows), que permitió caracterizar la población
atendida, complementados por los registros obtenidos por medio de la observación
y por los levantamientos bibliográfico y documental. Con los resultados, se puede
inferir que el acceso” al programa es limitado en relacn a la inserción de los
adultos en las actividades, sobre todo de las mujeres, y a la situación de
instabilidad en el funcionamiento de los núcleos. En relación a la consolidacn
del principio democratización”, se destaca la existencia de canales de diálogo
importantes con las comunidades. Estas, a pesar de asumir una configuración
diminuta y limitada en lo tocante al atendimiento de las demandas de deporte y
ócio de las comunidades atendidas, son señaladas para la posibilidad de
construcción de un modelo alternativo de intervención gubernamental en el sector
del deporte y ocio en el municipio de Fortaleza/CE. En el cuadro del programa
xviii
existen dos límites para la consolidación del principio participación política”, los
cuales son: (a) el modo como el gobierno se estructura, que tiene como escopo la
ineficiencia de sus órganos y la burocratización en lo que corresponde,
respectivamente, a la construcción y manutención de equipos de deporte y ócio y a
la viabilización y liberación de recursos orsamentarios necesarios para la
manutención de los núcleos; (b) la carencia de las comunidades en cuanto a las
prácticas participativas, que de cierta forma impedirian el avance del debate en
torno a la soberania popular de las comunidades.
Palabra-Clave: Democracia participativa, políticas públicas, deporte y ócio.
xix
ABSTRACT
Participatory democracy and public policy for sport and leisure: The Program
Sport Community (Fortaleza/CE)
Ana Amélia Neri Oliveira
Dulce Maria Filgueira de Almeida Suassuna
Nicolino Trompieri Filho
The study investigated the principles of "access", "democratization" and "political
participation" that understand the concept of participatory democracy, public
policy for sport and leisure in the city of Fortaleza (2005-2008), considered as
cutting the Programa Esporte na Comunidade”. This is a qualitative research
approach, which was to design the case study, using techniques such as
questionnaire, interview and observation. The research subjects were constituted
by participants and leaders (students' parents) and teachers of the program group
manager and community leaders. The fieldwork was conducted in five
communities cores program, namely: Planalto Universo, Rosalina, Serrinha,
Presidente Kennedy and João Paulo II. Data analysis was based on analyzing the
speeches of the interviews, crossing descriptive information indicated by the
analysis of questionnaires (with the aid of the computer program Statistical
Package for Social Sciences (SPSS) version 15.0 for "windows") , which allowed
characterization of the population served, complimented by records obtained
through observation and surveys by bibliographic and documentary. The results
led to infer that the "access" to program and limited in relation to the insertion of
adults in activities, especially women, and by instability in the functioning of the
cores. Regarding the consolidation of the "democratization", highlights the
existence of important channels of dialogue with communities. These, despite
taking a small setting and limited with regard to addressing the demands of sport
and leisure in the targeted communities, point to the possibility of constructing an
alternative model of government intervention in the sector of sport and leisure in
the city of Fortaleza. As part of program there are two limits to the consolidation of
the "political participation", namely: (a) how the government structure, which is
scoped to the inefficiency of its organs and bureaucratization in terms,
respectively, the construction and maintenance of sports equipment and leisure and
xx
the viability and release of budgetary resources required for maintenance of the
cores, (b) lack of communities with regard to participatory practices, which in
some way blocked out the progress of the debate on popular sovereignty
communities.
Keyword: Participatory democracy, public policies, sporte and leisure.
21
INTRODUÇÃO
O trabalho tem como objeto de estudo a democracia participativa a qual se
compreende como um ideal democrático que supõe o envolvimento dos cidadãos
em diferentes níveis de participação na sociedade civil. Neste âmbito, investigou-
se os princípios acesso”, democratização” e participação política”, que
compreendem o conceito de democracia participativa, nas políticas públicas de
esporte e lazer do município de Fortaleza/CE, considerando como recorte o
Programa Esporte na Comunidade (PENC).
Criado em 2005, esse programa se constitui como parte da política de
governo municipal de orientação de esquerda Partido dos Trabalhadores -
vigente no período de (2005 a 2008). Ele desenvolve ações que pressupõem a
consolidação da democracia participativa nas políticas públicas de esporte e lazer
no âmbito de uma gestão democrática e popular que sinaliza para a auto-
organização social e a articulação entre Estado e sociedade.
Compreende-se que o Brasil, no contexto de ascensão dos governos de
caráter progressista, tem avançado no tocante à participação potica no quadro
das políticas sociais, notadamente na área da Educação sica, Esporte e Lazer.
Neste sentido, destaca-se como fator basilar a criação de uma pasta ministerial
exclusiva para o esporte no governo Lula da Silva (2003-2007), bem como a
possibilidade de construção da Política Nacional do Esporte
1
, objeto de debate
1
Documento da Política Nacional do Esporte, Resolução N . 05/Conselho Nacional de Esporte
de 14 de junho de 2005. Referência: Brasil, Ministério do Esporte, 2005 (ME, 2005).
22
das duas primeiras conferências nacionais de esporte realizadas em 2004 e 2006.
Neste governo, evidencia-se ainda a crescente importância atribuída aos
princípios acesso”, “democratização” e “participação política” nas políticas de
Esporte e Lazer, de modo específico, no Programa Esporte e Lazer da Cidade,
este surgiu “com o objetivo de responder a questões amplamente detectadas no
quadro social brasileiro, indicativas de que parcela significativa da população
brasileira não tem acesso ao lazer” (CASTELLANI FILHO, 2007, p. 6). Entende-
se que a Política Nacional do Esporte vem estimulando o fortalecimento de ações
e programas no âmbito estadual e municipal, posto que tem como um de seus
objetivos, descentralizar a gestão das políticas públicas de esporte e de lazer
(ME, 2005). Orientado por tal preceito, afirmar-se que o Programa Esporte na
Comunidade pode significar a consecução desta intervenção governamental na
perspectiva de uma política municipal de esporte e lazer.
Nesta direção, a reflexão acerca desse outro tempo de incentivo à
participação política alude a práticas nas quais atuam diferentes atores sociais,
tais como: governo, sociedade civil e universidade que estão no contexto da
dinâmica social. Esta, por seu turno, engendra novos mecanismos de atuação para
estes atores, particularmente, no setor do esporte e lazer. Desta forma, pressupõe-
se que o desenvolvimento de políticas públicas de esporte e lazer, com base na
democracia participativa, consiste na adoção de um modelo” de potica cujo
fundamento es em uma perspectiva crítica da realidade social. Por isso,
investigar o significado das políticas públicas e a adoção dos princípios da
democracia participativa em governos democráticos, particularmente no tocante
aos programas sociais no setor em foco, é contribuir para a garantia do direito ao
esporte e ao lazer na perspectiva do acesso, da democratização e da participação
política.
Com base no cenário desenhado pelo quadro de constituição de políticas
que envolvem maior participação dos cidadãos, bem como, pelo realinhamento
23
das políticas de esporte e lazer, considerados como direitos sociais (cf. art. 6º,
inciso III da CF de 1988), a escolha pelo objeto do estudo se corporifica à medida
que a conformação do Programa Esporte na Comunidade do governo municipal
de Fortaleza/CE atende, pelo menos este é o pressuposto, aos preceitos da
democracia participativa. Porquanto este programa, conforme Sousa Sobrinho et
al. (2007, p. 3), aponta para a necessidade de construção de um projeto político
que propõe uma intervenção social na perspectiva de transformação da realidade,
através de um projeto pedagico capaz de promover uma reflexão sobre a ação
dos homens no âmbito do esporte e lazer”, vivenciados nos diferentes espaços
presentes nas comunidades atendidas.
Diante de tais elucidações, pode-se dimensionar a importância da escolha
pelo tema investigado a democracia participativa nas poticas públicas de
esporte e lazer subsidiadas pelos princípios de acesso”, “democratização” e
participação política”. Torna-se interessante evidenciar a focalização de tais
princípios uma vez que estes consistem, em pressupostos de garantia e
materialização do esporte e do lazer como direitos sociais.
Para tanto, o problema da pesquisa consistiu no seguinte questionamento:
em que medida os princípios norteadores da democracia participativa repercutem
no quadro das políticas públicas de esporte e lazer do governo municipal de
Fortaleza/CE no período (2005-2009), considerando como parte desta política o
Programa Esporte na Comunidade?
Teve-se como objetivo geral: analisar as repercussões dos princípios
norteadores da democracia participativa os quais estão presentes no Programa
Esporte na Comunidade ao passo que o revertidos à autonomia e auto-
organização social. Os objetivos específicos propostos foram, a saber:
(i) identificar e analisar as estratégias de acesso”, desenvolvidas pelo programa,
considerando o perfil da população atendida;
24
(ii) verificar em que medida o programa consolida por meio do acesso os
princípios da democratização” e da “participação política”, visando o
envolvimento dos cidadãos na busca pelo exercício dos seus direitos sociais,
especificamente, o direito ao esporte e ao lazer.
Constituiu-se, como hipótese da pesquisa, a afirmação de que o modelo de
gestão da potica municipal de esporte e lazer, bem como as estratégias presentes
em suas ações inviabilizam e/ou são insuficientes para a consolidação da
democracia participativa, considerando o contexto específico 2005-2008 no que
concerne ao Programa Esporte na Comunidade (Fortaleza/CE).
Buscou-se construir o estudo em quatro capítulos que serão tratados
sumariamente a seguir. O Capítulo I trata do referencial teórico alusivo à
democracia a partir de um recorte que se reporta ao século XVII, nele a
abordagem é delineada pelas contribuições de teóricos da democracia clássica e
da democracia contemporânea com destaque para o debate sobre democracia
participativa. Além disto, traz uma discuso acerca do significado assumido pela
participação à luz das teorias da democracia nas sociedades contemporâneas e
como processo/mecanismo vinculado ao modelo de gestão pública de viés
participativo. O Capítulo II se reporta a descrição do percurso metodológico do
estudo, com enfoque nos procedimentos de pesquisa, no município lócus da
investigação e no quadro numérico do Programa Esporte na Comunidade. O
Capítulo III versa sobre as políticas públicas de esporte e lazer na esfera federal e
municipal, com enfoque na Política Nacional do Esporte (ME, 2005) e Política
Municipal de Esporte e Lazer de Fortaleza/CE (2005-2008). A discussão é tecida
pelo significado de cidadania, direito social, Estado, potica social/pública. Por
último, o Capítulo IV discorre sobre o Programa Esporte na Comunidade a partir
de um panorama geral das comunidades investigadas. Posteriormente, é
apresentado o perfil da população atendida pelo programa, os aspectos pertinentes
a participação da comunidade e as dimensões de esporte/prática corporal
25
observadas. Por fim, aborda-se a repercussão dos princípios acesso”,
democratização” e participação política” presentes na intervenção
governamental em tela.
26
CAPÍTULO I
DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E GESTÃO DEMOCRÁTICA
Sendo a democracia, por definição, o governo
do povo, como poderá o povo governar, sem
participar?
(Assis Brandão, 1997)
Neste capítulo, procura-se situar o debate acerca da democracia e da
democracia participativa com base no referencial analítico. Para tanto, decidiu-se
por um recorte teórico o qual se reporta ao culo XVII seguindo um percurso até
a democracia participativa problematizada no cenário vigente. Com efeito,
compreende-se que para uma investigação acerca dos princípios: acesso”,
democratização” e participação política”, na Política Municipal de Esporte e
Lazer de Fortaleza/CE no período (2005-2008), notadamente no Programa
Esporte na Comunidade, faz-se necessário conhecer o significado da participação
frente às teorias da democracia representativa e participativa para que se possa
apresentar as raízes histórico-conceituais desta categoria analítica retratadas na
cena sócio-política contemporânea. Também conhecer, neste contexto, o
significado da gestão participativa como modelo de administração pública na qual
a democracia participativa se materializa na reorganização das estruturas de
governo e na participação dos diferentes atores sociais que compõem a dinâmica
societal que se faz presente.
27
De maneira a atender a tal enunciado, no que diz respeito à democracia,
considera-se para abordagem do tema a multiplicidade e diversidade de
referências construídas sobre esta categoria anatica ao longo dosculos desde a
antiga Atenas, de Platão a cidade-Estado, de Rousseau, culminando nos escritos
mais contemporâneos sobre a democracia nas sociedades do pós-guerra na
Europa, nas sociedades capitalistas industriais e nas sociedades em vias de
desenvolvimento. Neste ensaio, são evidenciadas as contribuições dos autores
clássicos e contemporâneos, de origem liberal e socialista. Em seguida, versa-se
sobre democracia participativa em Poulantzas (1936 - 1979), Macpherson (1911 -
1987) e Pateman (1992), autores reconhecidos como expoentes no debate acerca
do tema abordado, constrdo nos últimos anos da década de 60 e ao longo da
década de 70. Vale ressaltar que para a compreensão destes se destaca as
contribuições de Brandão (1997). Posteriormente, discute-se a participação em
teoria democrática, com base nas análises de Pateman (1992), subsidiada por
outros autores da democracia clássica e da democracia contemporânea em relação
às finalidades educativas e políticas desta categoria analítica. Conclui-se com o
enfoque da participação na cena sócio-política contemporânea e toma-se como
marco temporal o século XX, momento no qual esta a participação surge na
dinâmica societal como mecanismo de luta e ampliação de espaços em defesa da
materialização dos direitos sociais. Neste, faz-se sobressair os trabalhos dos
autores, a saber: Nogueira (2004) sobre as múltiplas combinações da participação;
e Texeira (2002), sobretudo no tocante ao conceito de participação cidadã que se
remete ao fazer ou tomar parte” no processo político-social e, ao mesmo tempo,
está atrelada à cidadania em seu sentido cívico.
28
1.1 Do clássico ao contemporâneo: uma reflexão sobre a teoria da
democracia
Com base na multiplicidade e diversidade de referenciais analíticos
constrdos sobre democracia, é possível sugerir que o tema em questão suscita
diferentes impressões entre cientistas sociais e politólogos de origem liberal e
socialista. Dessa forma, é prudente, para não incorrer em equívocos, esboçar-se
um eixo norteador que trata o tema em questão a partir de um marco teórico que
desemboque na compreensão dos sentidos e significados da teoria inerente à
democracia ou, como expressa Bobbio (1987), das democracias.
A discussão acerca da democracia foi edificada ao longo dos séculos
desde da antiga Atenas, de Platão à cidade-Estado, de Rousseau, culminando nos
escritos mais contemporâneos sobre a democracia nas sociedade do pós-guerra na
Europa, nas sociedades capitalistas industriais, a exemplo da norte-americana e
nas sociedades em vias de desenvolvimento, no caso da América Latina. Devido a
isto, pode-se compreender que a depender do tempo histórico, a teoria produzida
é categorizada como clássica ou contemporânea. Tamm, esclarece-se que a
depender da teoria da democracia a qual determinado autor defenda, este pode ser
qualificado por seus predecessores como um pensador clássico” ou
contemporâneo”.
Com tantos pormenores na investigação em democracia, torna-se
inexequível tratá-la em todos os aspectos e contextos, mesmo demarcando-se o
período moderno e o contexto histórico do capitalismo (1760-atual) sobre os
quais se debruçaram diferentes teóricos ao longo da História. Contudo, ao tratar
de democracia a partir da discussão proposta, uma questão parece essencial, qual
seja: como pontuar as contribuições de uma gama de autores para a teoria da
democracia e da democracia participativa, tendo em vista a multiplicidade e a
diversidade de abordagens encontradas na literatura? Em resposta, optou-se por
29
destacar apenas as principais contribuições, com base na literatura consultada, as
quais forneceram os postulados básicos para a construção desses dois modelos de
democracia. Para tanto, utilizou-se como marco histórico inicial de elaboração de
teorias sobre democracia o século XVII.
Nesta acepção, destaca-se que os principais estudos sobre democracia são
orientados pela teoria clássica da democracia, cujos teóricos precursores são: Jean
Jacques Rousseau (1712 - 1778), Jeremy Bentham (1748 1832), James Mill
(1773 1836), Alexis de Tocqueville (1805 - 1859), John Stuart Mill (1806 -
1873) estes sistematizaram os primeiros escritos sobre democracia; e pela teoria
da democracia contemporânea, cujos principais expoentes são: George Douglas
Howard Cole (1889 - 1959), Joseph Schumpeter (1883 - 1950), Bernard Berelson
Reuben (1912 - 1979), e Harry Eckstein (1924 - 1999), Robert Alan Dahl (1915),
Giovanni Sartori (1924).
Os teóricos supracitados foram influenciados por pensadores de duas
correntes de pensamento: a corrente liberal” que tem como principais
idealizadores: Platão (428/427 348/347 a. C) e John Locke (1632 - 1704); bem
como, a corrente socialista” que tem como principais idealizadores: Karl Marx
(1818 - 1883), Friedrich Engels (1820 - 1895) e Vladimir Llitch Lênin (1870 -
1924).
Reconhecido pelos seus predecessores como um clássico da democracia,
Rousseau (1968) é um intelectual de relevância para o século XVIII. Em O
Contrato Social
2
, ele teoriza sobre a democracia à época das cidades-Estado. Em
seus escritos fornece os postulados básicos para a construção do pensamento
democrático clássico. Para este autor, democracia é um sistema no qual os
cidadãos executam as leis que eles próprios construíram. Este sistema
democrático é tido como direto e não representativo. O autor também é aceito
como uma fonte clássica da democracia participativa visto que foi um dos
2
Jean Jacques Rousseau, “The social contact”, M. Penguin Books, 1968.
30
primeiros autores a propiciar reflexão sobre o tema. Neste sentido, toda a sua
teoria política se baseia na participação individual de cada cidadão no processo
político de tomada de decisões. Na teoria da democracia de Rousseau, a
participação não é somente o mecanismo protetor de uma “série de arranjos
institucionais” posto que também provoca um efeito psicológico sobre os que
participam de modo que garanta uma inter-relação contínua entre o
funcionamento das instituições e as qualidades e atitudes psicológicas dos sujeitos
que interagem dentro delas (PATEMAN, 1992). Em seus escritos, o autor se
apresenta favorável à participação dos sujeitos em todos os espaços da sociedade
civil, defendendo ou advogando sua centralidade. Embora seus escritos datem de
antes do desenvolvimento da institucionalização daquilo que se entende como
Estado moderno, sua teoria também é apresentada como norteadora do princípio
de participação potica.
Na dimensão da participação como controle e aceitação das decisões
coletivas, Rousseau (1968) defende a possibilidade de que todos possam
participar ativamente do processo de discussão e decisão dos assuntos de interesse
coletivo. Com isto, almeja a aceitação e o cumprimento dessas decisões na vida
social. Na dimensão da participação como integração, destaca que quanto mais o
indivíduo participa do processo potico, mais ele estará integrado no seio de sua
comunidade. Constitui, portanto, a “integração do indivíduo na sociedade, no
sentido de pertencimento” (PATEMAN, 1992).
Tomando-se como referência o século XIX, identifica-se como teóricos de
renome que norteiam os estudos científicos acerca da democracia Alexis de
Tocqueville (1805 - 1859) e John Stuart Mill (1806 - 1873). Tocqueville (1957) é
reconhecido como clássico da teoria política. Ele elaborou um estudo sobre a
democracia norte-americana publicado sob o título “A Democracia na
31
América”
3
. Boron (1994, p. 128) ressalta que Tocqueville caracterizou a
democracia como uma condição social na qual prevalece o princípio e a prática
da igualdade”. Para este autor, democracia e igualdade se fundem em uma única
entidade sociológico-política”, e, mesmo quando estas não se encontram
definidas de modo rigoroso em seu trabalho, pareceria ser meridianamente claro
que Tocqueville se distancia da tradição clássica do liberalismo e produz uma
definição substantiva, não somente formal, da democracia”.
J. S. Mill (1965) elaborou análises acerca da democracia participativa no
contexto de um sistema político moderno. O autor, em seus escritos sobre
política, bem como em outros assuntos, baseia-se com fervor nas doutrinas de seu
pai (James Mill) e de Jeremy Bentham. Conquanto, mais tarde, realiza uma crítica
severa a essas mesmas doutrinas. Assim, forneceu um excelente exemplo das
diferenças entre as teorias do governo representativo e das democracias
participativas. Porém, jamais rejeitou por completo os primeiros ensinamentos,
tanto que no final da vida sua teoria política compunha-se de uma mescla das
diversas influências que o afetaram (PATEMAN, 1992).
Para a discussão acerca da democracia no século XX, são evidenciadas as
contribuições de Joseph Schumpeter (1883 - 1950), George Douglas Howard
Cole (1889 - 1959) e Norberto Bobbio (1909 - 2004) para o pensamento
democrático. Schumpeter (1942), no livro “Capitalismo, Socialismo e
Democracia”
4
, sinaliza a necessidade de uma revisão da teoria democrática
clássica”. Nesta obra, ele fornece uma teoria revisada e coloca em evidência uma
definição realista de democracia. Segundo Schumpeter, a democracia constitui-
se como um método potico, isto é, um certo tipo de arranjo institucional para
chegar as decisões políticas (legislativas e administrativas)”. Logo, é incapaz de
ser um fim em si mesma, independentemente de quais sejam as decisões que ela
3
Alexis de Tocqueville, “La democracia em América”, México, Fondo de Cultura Económica,
1957.
4
Joseph Schumpeter, “Capitalism, socialism and democracy”, Londres, Allen & Unwin, 1943.
32
produzirá sob certas condições históricas. Este deve ser precisamente o ponto de
partida para qualquer tentativa de defini-la” (SCHUMPETER citado por
BORON, 1994, p. 93).
Consoante Pateman (1992, p. 13-14), Schumpeter afirma que existem
condições necessárias para a operação do método democrático, quais sejam:
liberdades civis e tolencia para as opiniões de outros e um certo tipo de caráter
e de hábitos nacionais‟; todavia destaca que não se pode confiar que a operação
do próprio método democrático forneça tais condições. Outra exigência quanto à
operação do método democrático é que todos os interesses envolvidos fossem
unanimemente leais aos „princípios estruturais da sociedade existente‟. O autor
não considera necessário o sufrágio universal, em sua teoria, os únicos meios de
participação que o cidadão tem acesso são o voto para o líder e a discussão.
Cole (1919) é reconhecido como um teórico da democracia participativa e
seu trabalho se situa no cenário de uma sociedade moderna industrializada. O
autor constrói sua teoria social e política com base no “argumento de Rousseau de
que a vontade, e não a força, é a base da organização social e política. Os homens
precisam cooperar em associações para satisfazer suas necessidades”. Com base
nisto, começa a examinar os motivos que mantêm os homens em uma
associação‟ e os modos pelos quais os homens agem por meio de associações,
suplementando e completando suas ões enquanto indivíduos isolados ou
privados” (COLE citado por PATEMAN, 1992, p. 52).
Na obra cujo título é O Futuro da Democracia
5
, Bobbio (1986, p. 18)
problematiza este tema, considerando suas possibilidades e limites frente à
conjuntura política vigente no mundo contemporâneo, mais precisamente, na
sociedade industrial. O autor, ao construir uma mínima definição de democracia,
esclarece de modo preliminar que: o único modo de se chegar a um acordo
quando se fala de democracia, entendida como contraposta a todas as formas de
5
Norberto Bobbio, O futuro da democracia”, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986.
33
governo autocrática”, é caracterizá-la “como um conjunto de regras (primárias ou
fundamentais) que estabelecem quem está autorizado para tomar as decisões
coletivas e com quais procedimentos” (parênteses nosso).
No entanto, mesmo para uma definição mínima de democracia, como é a
que o autor aceita,
o bastam nem a atribuição a um elevado número de cidadãos do
direito de participar direta ou indiretamente da tomada de decisões
coletivas, nem a existência de regras de procedimento como a da
maioria (ou, no limite, da unidade). É indispensável uma terceira
condição: é preciso que aqueles que são chamados a decidir ou a eleger
os que deverão decidir sejam colocados diante de alternativas reais e
postos em condição de poder escolher entre uma e outra (idem, 1986,
p. 20).
Segundo Bobbio para que esta condição se realize é preciso que aos
sujeitos chamados a decidir sejam garantidos os nomeados direitos de liberdade,
quais sejam: direitos de liberdade, de opinião, de expressão das próprias opiniões,
de reunião de associação, etc. Quer dizer, “os direitos à base dos quais nasceu o
estado liberal e foi construída a doutrina do estado de direito em sentido forte,
isto é, do estado que não apenas exerce o poder sub lege”, mas o exerce dentro
de limites derivados do reconhecimento constitucional dos direitos invioláveis‟
do sujeito. Seja qual for o fundamento filosófico destes direitos, eles são o
pressuposto necessário para o correto funcionamento dos próprios mecanismos
predominantemente procedimentais que caracterizam um regime democrático.
Complementando seu pensamento, esclarece que as normas constitucionais que
atribuem esses direitos não são exatamente regras do jogo: o regras
preliminares que permitem o desenrolar do jogo” (ibdem, 1986, p. 20, grifo
nosso).
Bobbio (1986, p. 44) assevera que há dois modelos de democracia: a
democracia representativa e a democracia direta. A expressão democracia
34
representativa” dá significado de modo genérico “as deliberações coletivas, isto é,
as deliberações que dizem respeito à coletividade inteira, são tomadas não
diretamente por aqueles que dela fazem parte, mas por pessoas eleitas para esta
finalidade”. Vale esclarecer que na democracia representativa
o estado parlamentar é uma aplicação particular, embora relevante do
ponto de vista histórico, do princípio da representação, vale dizer, é
aquele estado no qual é representativo o orgão central (ou central ao
menos em nível de princípio, embora nem sempre de fato) ao qual
chegam as reivindicações e do qual partem as decisões coletivas
fundamentais, sendo este orgão central o parlamento.
Sobre a democracia direta Bobbio (1986, p. 51) expressa o seguinte:
para que exista democracia direta no sentido próprio da palavra, isto é,
no sentido em que direto quer dizer que o indivíduo participa ele mesmo
nas deliberações que lhes diz respeito, é preciso que entre os indivíduos
deliberantes e a deliberação que lhes diz respeito o exista nenhum
intermediário.
Para o autor, isto deixa claro que, mesmo o delegado que exerce uma
função substituível - é considerado um intermediário, porque apesar de estar
vinculado à base, ele tem certa liberdade de movimento e, se ocorrer um
desentendimento entre ele e todos os que devem chegar a uma deliberação
coletiva, qualquer tipo de deliberação se torna impossível.
Apesar das especificidades dos paradigmas da democracia tratadas de
maneira sumária, sublinha-se que “os significados históricos de democracia
representativa e de democracia direta são tantos e de tal ordem que não se pode
pôr os problemas em termos de ou-ou, de escolha forçada entre duas alternativas
excludentes, como se existisse apenas uma única democracia representativa
possível e apenas uma única democracia direta possível; o problema da passagem
de uma a outra somente pode ser posto através de um continuum no qual é difícil
dizer onde termina a primeira e onde começa a segunda” (BOBBIO, 1986, p. 52).
35
Davis citado por Pateman (1992, p. 33) argumenta que a estratégia para
atingir este objetivo seria o uso da atividade política e do governo com vistas à
educação pública‟. Mais à frente, o autor afirma que o negócio pendente” da
teoria democrática é a elaboração de planos de ação e prescrições específicas
que proporcionem uma esperança de progresso, no sentido genuinamente
democrático”. Conforme a autora isto pode observado nas teorias da democracia
política e se efetua por meio da educação pública”, que por sua vez, depende da
participação em muitas esferas da sociedade na “atividade potica”.
Boron et al. (1999, p. 33) aponta um caminho para o entendimento dos
preceitos necessárias à democracia ao assinalar que, [...] um dos requisitos mais
importantes da democracia é a existência de um grau bastante avançado de
igualdade social”. E acrescenta o autor:
nenhum teórico da democracia se enganou tanto de modo a sustentar que esta só poderia
funcionar depois de eliminadas todas as diferenças de classe. Mas todos sem exceção
qualquer que fosse sua origem e as simpatias que despertasse neles este regime potico,
desde Platão à Marx, passando por Maquiavel, Hegel, Tocqueville coincidiram num
prognóstico: a democracia não pode sustentar-se sobre as sociedades assinaladas pela
desigualdade e exclusão social. Para que o regime democrático funcione é preciso haver
sociedades bastantes igualitárias, e a igualdade, como lembra o próprio Adam Smith,
devia ser de condições e oportunidade.
Pelas palavras do autor, o aniquilamento da desigualdade e da excluo
social seria essencial no processo de construção de uma sociedade igualitária na
qual a democracia pudesse tornar-se realidade e neste contexto houvesse
igualdade de condições e oportunidades.
Observa-se que as diferentes abordagens acerca da democracia aqui
tratadas (Rousseau a Boron) foram essenciais no sentido de situar a democracia
como um fenômeno que apresenta igualdades e contradições e, que, portanto,
exige uma leitura da dinâmica social na qual ela vem se constituir como um
sistema e/ou regime político, considerando-se os dois modelos existentes,
36
democracia representativa e democracia participativa. Esta última, a partir de seus
fundamentos, apresenta-se contrária ao pensamento de Schumpeter no qual
advoga que a democracia como método restringe a participação dos sujeitos a
escolha de líderes e a discussão - sem poder de deliberação -, ela manifesta-se em
favor da ampliação da participação dos sujeitos na tomada de decisão na cena
político-social, a qual será tratada a seguir a partir do aporte teórico de autores
contemporâneos como Poulantzas (2000), Mcpherson (1979) e Pateman (1992).
1.2 Democracia participativa no cenário contemporâneo
De modo similar ao que ocorre com a democracia, são inúmeras e
diversificadas as formas de abordagem da democracia participativa. Isto é
retratado por Brandão (2007) ao afirmar que a ideia de democracia participativa é
utilizada de três formas diferentes, a saber: para qualificar a democracia de
Atenas dos séculos V e VI; em referência às concepções de democracia de
pensadores como Rousseau ou John Stuart Mill e, em alusão a concepção
marxista clássica de democracia.
Tomando-se como referência a segunda metade do século XX, marco
histórico de surgimento da concepção de democracia participativa, centrada
principalmente na ampliação da participação dos cidadãos, passa a ser mais
evidenciada, tendo como orientação principalmente os teóricos: Nicos Poulantzas
(1936 1979), Crawford Brough Macpherson (1911 1987) e Carole Pateman
(1992). Estes são considerados expoentes no debate acerca do tema surgido nos
últimos anos da década de 60 e ao longo da década de 70. Norteados por um
movimento contra-hegemônico, os autores acreditam que a justiça social seria
alcançada se a participação do povo não se restringisse somente à escolha dos
37
líderes no governo, devendo ser expandida para outras esferas da vida social e
política (BRANDÃO, 1997).
No contexto evidenciado, o debate sobre o tema em questão se deu em
razão de três fatores: primeiro, um pouco como fruto do ímpeto participacionista
que desponta com o espraiamento da força militante dos novos movimentos
sociais”; segundo um pouco como resultado de uma crítica liberalizante a uma
certa concepção clássica de democracia no campo do marxismo” e terceiro, um
pouco como consequência das intensificações criadas pela percepção dos
impasses enfrentados pelo Estado liberal-democrático na „sociedade de mercado
possessivo‟ do século XX” (idem, 1997, p. 114).
Como modelo contra-hegemônico, a concepção de democracia
participativa se apresentava como um modelo alternativo à democracia liberal,
que pode ser concebido como um modelo o qual limita a soberania, na medida em
que restringe a participação dos cidadãos ao voto. Esta concepção de democracia
se desvincula de qualquer finalidade ideal, não passando de um mero arranjo
institucional em que líderes rivais disputam a preferência do povo no direito de
governar. De modo contrário, a concepção de democracia participativa” propõe
uma participação maior do cidadão nas decisões governamentais. Assim, esses
líderes passam a atuar como sujeitos no processo de construção da política, por
conseguinte, um envolvimento maior da população nos processos decisórios,
como uma maneira de minimizar diferenças da formação de opinião advindas do
modelo capitalista, mas sem deixar de lado os instrumentos da democracia
representativa existentes.
Em conformidade com tal pressuposto, Poulantzas (2000, p. 139) apresenta
um modelo de democracia representativa distinta dos moldes burgueses. Salienta
o autor que a democracia representativa com mandatos livres pode ser inspiradora
e não representar uma estratégia de domínio da burguesia sobre os demais
cidadãos. E faz uma advertência em relação à democracia, ao afirmar que duas
38
alternativas que devem ser evitadas, a social-democracia
6
e o socialismo real
7
,
pois ambas apresentam uma conivência de base: o estatismo e a profunda
desconfiança em relação às iniciativas das massas populares. Defende, ainda, a
articulação entre a democracia representativa e a democracia direta. Segundo o
autor, historicamente todas as experiências de democracia direta na base, que
não eram articuladas durante certo tempo com certas instituições de democracia
representativa, foram um fracasso”. Com base nessa compreensão, o autor
acredita na construção de um modelo socialista democrático, que congregue ao
mesmo tempo, a transformação do Estado e uma ampla participação da sociedade.
Nesta acepção Brandão (1997, p. 117) coloca que:
modificar a correlação de forças no interior do Estado significa, na
opinião do autor, não apenas conseguir maioria em eleições
parlamentares ou eleger a presidência da república, mas também
redefinir a relação de forças no interior do próprio exército, da pocia,
da burocracia blica, do judiciário etc., tornando todas essas
instituições mais democráticas. E mudar a sua “materialidade” é, para
além de uma modificação na correlação de forças, uma modificação do
modelo mesmo de organização das diversas instituições.
Com base na perspectiva de Brandão aliada à concepção de Poulantzas
(2000), a participação dos cidadãos nos processos decisórios da vida social pode
contribuir para a redefinição de correlações de força e romper com a ideia da
social-democracia de que a apatia social é o ideal de participação nas democracias
modernas. Poulantzas defende uma ampla articulação que difunda a democracia
em todas as instâncias de poder, de modo a gerar um amplo movimento das
massas populares em todos os setores sociais (estudantes, trabalhadores e etc).
6
Conforme Brandão (1997, p. 115) Poulantzas tinha a compreensão de que a social-democracia caminharia no
sentido de acolher apenas a democracia representativa, mesmo com pequenas modificações, o que permitiria a
edificação de uma estrutura estatal bastante ampla, convivendo com uma organização parlamentar de estilo liberal,
e por isso mesmo, com um profundo receio da participação ativa e direta da cidadania. A apatia das massas seria
vista, neste caso, com bastante benevolência.
7
Este se atende a uma organização de democracia direta, definida pela existência de mando imperativo e pela
revogação dos mandatos, levaria, dentro de um peodo de tempo mais ou menos longo, a uma ditadura estatista,
que, ao contrário do fascismo, veria com muito maus olhos a participação das massas (idem, 1997, p. 115).
39
Macpherson (1979), que em seus escritos adota como contexto as
sociedades liberal-democráticas ocidentais à semelhança de Poulantzas, sustenta
que a democracia participativa deve ser ao mesmo tempo direta e representativa.
Nesta acepção, os políticos o vitais ao funcionamento da democracia, o
problema seria torná-los responsáveis. O autor argumenta que dois requisitos
necessários à democracia participativa, quais sejam: o primeiro é a mudança na
consciência do povo, de maneira que este deixe de ver e agir como consumidor e
passe a ver e agir como executor e desfrutador da execução e desenvolvimento de
sua própria capacidade; e o segundo é que deve haver uma sensível diminuição da
atual desigualdade sócio-econômica (BRANDÃO, 1997).
Macpherson citado por Brandão (1997) assinala que não se pode diminuir a
desigualdade sócio-econômica e mudar a consciência do povo, sem uma maior
participação da cidadania. Trata-se, portanto, de um ciclo vicioso no qual
alguns elos fgeis. Em primeiro lugar, a consciência do povo como consumidor
que teria sofrido uma redução devido aos novos valores. Se por um lado, a
produção a todo custo tem permitido o consumo, por outro, tem diminuído a
qualidade de vida dos cidadãos que passam a enxergar a relação perversa
configurada por uma estrutura direcionada ao consumo a todo custo e a destruição
da qualidade de vida; em segundo lugar, haveria uma consciência crescente dos
custos da apatia política e certa ampliação da participação não somente no
trabalho, mas em outras instâncias da vida social; e, em terceiro lugar, a crescente
desconfiança quanto à possibilidade do capitalismo financeiro satisfazer as
expectativas do consumidor diminuindo o atual estado de desigualdade.
Dentre suas contribuições à teoria da democracia participativa, Macpherson
(1979) circunscreve dois modelos de democracia participativa que são ao mesmo
tempo direta e representativa. Um primeiro modelo, mais simples, caracterizado
pela existência de um modelo piramidal com democracia direta na base e
democracia por delegação em cada nível depois dessa base‟. Neste modelo
40
haveria democracia direta, por exemplo, nas fábricas, na vizinhança e em todos
os demais espaços onde fosse possível uma comunicação face a face entre as
pessoas”. A partir daí, haveria um sistema de delegação sequenciada para cima,
com a organização de conselhos de bairros, da cidade, da região até o topo da
pirâmide, com a organização de um conselho nacional”. O segundo modelo de
democracia participativa que o autor julga como apropriado para os países
ocidentais deste final de século, combinaria a estrutura piramidal com um sistema
multipartidário. Assim,
seria mantida a atual estrutura de governo e os partidos operariam com o
estilo de participação piramidal, passando a haver democracia
participativa configurada pela democracia direta na base, em convívio
com a democracia representativa a cada vel seqüencial superior.
Haveria, assim, a democracia representativa e, conseqüentemente, o
instituto do mandato livre, no entanto, sendo o mandato livre, não
significa que ele não deva ser controlado. Ao contrário, sem o controle
democrático da representação e sem partidos genuinamente
participativos o existiria democracia participativa (BRANDÃO, 1997,
p. 122-124).
Macpherson citado por Brandão (1997, p. 124) sublinha que o modelo de
democracia participativa que propõe seria liberal e socialista. Socialista, diz ele,
porque não haverá democracia participativa até que tenhamos grandemente
diminuído as atuais desigualdades sociais e econômicas. É certo que isto só será
possível na medida em que a relação entre capital e trabalho que prevalece em
nossa sociedade tenha sido fundamentalmente mudada, porque as relações
capitalistas produzem e reproduzem classes antagônicas”.
Diferentemente de Poulantzas e Macpherson, Pateman (1992) não tem em
suas formulações, o propósito de esboçar modelos de democracia participativa.
Seu interesse é comprovar a possibilidade de existência deste modelo de
democracia nas sociedades modernas. Para tanto, debruça-se sobre a investigação
do lugar da participação em uma teoria da democracia moderna e viável”. Ela
justifica sua preocupação pelo fato de que, no final da década de 60, a palavra
41
participação” passou a integrar o vocabulário político popular. Diante disto,
sentiu a necessidade de elaborar um estudo científico que pudesse averiguar as
possibilidades da participação ativa da cidadania no contexto das sociedades
modernas, particularmente na indústria (idem, 1997).
Nestes termos, ao comparar-se a teoria da democracia representativa, na
qual a participação limita-se à escolha de representantes no âmbito do governo e à
regulação do sistema eleitoral com a teoria da democracia participativa. É
possível inferir que a teoria da democracia participativa possui funções bem mais
abrangentes e decisivas no sentido de promover uma educação política com vista
à consolidação de processos e/ou mecanismos participativos para o
estabelecimento de um Estado democrático.
1.3. Participação em teoria democrática
Como categoria anatica, a participação é tratada sob diferentes pontos de
vista que estão relacionados à teoria da democracia investigada. Na realização
deste exercício, Pateman (1992) constrói um estudo intitulado Participação e
teoria democrática”, no qual discute no campo da teoria potica, o lugar da
participação em uma teoria democracia moderna e viável”. O trabalho analisa a
concepção de participação presente na teoria da democracia contemporânea cujos
representantes são Berelson (1952), Dahl (1956), Sartori (1962) e Eckstein (1966),
bem como na teoria da democracia clássica cujos expoentes são Bentham (1843), J.
Mill (1965), Rousseau (1968) e J. S. Mill (1937). Para diferenciá-las, a autora
utiliza o conceito de participação subjacente à teoria democrática de Schumpeter
(1943).
Segundo o autor citado por Pateman (1992, p. 13), a democracia se configura
como um método político, ou seja, refere-se a um determinado „arranjo
42
institucional para se chegar as decisões políticas (legislativas e administrativas), no
qual os indivíduos adquirem o poder de decidir utilizando para isso uma luta
competitiva pelo voto do povo‟. Concomitantemente, a autora reconhece a teoria
da democracia clássica e a teoria da democracia contemporânea como teorias do
governo representativo. No entanto, adverte que a teoria do governo representativo
o representa toda a teoria democrática.
Conforme Pateman (1992), nem todos os teóricos da democracia clássica são
classificados como teóricos da democracia participativa. Neste sentido, a autora
considera que a concepção de participação presente nas teorias de Mill e Bentham,
teóricos da democracia clássica, é idêntica à encontrada nos teóricos da democracia
contemporânea - democracia do governo representativo -, isto é, a participação é
vista como um dispositivo de proteção. Com base em tal argumento, Pateman
adota o conceito de democracia participativa para se referir às teorias de Rousseau
(1968) e J. S. Mill (1937).
Pateman (1992, p. 25) assevera que a participação na teoria do governo
representativo se configura como a participação na seleção daqueles que tomam
as decisões. Logo, ela tem função protetora, isto é, proteger os indivíduos contra
decisões arbitrárias dos representantes eleitos e os interesses privados. Segundo a
autora, seus defensores argumentam que para manter a estabilidade do sistema, o
nível de participação da maioria não deve ultrapassar o mínimo necessário a fim
de manter o sistema eleitoral ativo e se manifestam em favor de que “embora o
haja exigência de um caráter democrático‟ definido para todos os cidadãos, o
treinamento social ou a socialização necessários ao método democrático podem
se dar dentro das estruturas de autoridade existentes, variadas e não-
governamentais. Contanto que haja algum grau de congruência entre a estrutura
de autoridade do governo e as estruturas não-governamentais próximas a ele, a
estabilidade pode ser mantida”. Sobre a teoria da democracia participativa, a
autora assevera que a participação além proteger os interesses privados e
assegurar um bom governo, assume a função educativa, que diz respeito à
43
educação potica a qual contempla o desenvolvimento de condições psicológicas,
bem como o aprendizado de práticas e procedimentos democráticos. Logo, pode-
se compreender que a participação no contexto político assume diferentes
significados que são determinados pelas dinâmicas sociais e pelos interesses em
disputa entre diferentes atores e se caracterizam como critérios que privilegiam
uma menor ou maior participação do cidadão na esfera pública.
Pateman (1992) afirma que não problema singular no tocante à
estabilidade de um sistema participativo, posto que ele se auto sustenta por meio do
impacto educativo do processo educativo. Neste sentido, argumenta que na teoria
da democracia participativa os processos participativos são determinantes para a
instauração e manutenção do Estado democrático, que corresponde não apenas ao
conjunto de instituições representativas nacionais, mas também ao que nomeia de
sociedade participativa sociedade na qual todos os sistemas políticos passaram
pelo processo de democratização e onde a socialização oportunizada pelo ato de
participar se dá em todas as instâncias em que as relações sociais se estabelecem.
Nestes termos, percebe-se que a depender da configuração assumida pelo
Estado representado pelos governos, demais líderes políticos e administração
pública e do paradigma de democracia que defendem, a participação pode ou não
ser vista como um mecanismo de ampliação da participação ativa dos cidadãos na
esfera pública. Seja no exercício consciente do voto, seja na prática política
cotidiana como protagonista nas diversas instâncias que perpassam sua existência
individual e coletiva, seja na luta pela consolidação de um Estado democrático.
Retomando a discussão acerca da democracia, Davis (1964) citado por
Pateman (1992, p. 33) expressa que a teoria “clássica” - ou seja, a teoria da
democracia participativa - tinha um propósito ambicioso, isto é: a educação de
todo o povo até o ponto em que suas capacidades intelectuais, emocionais e morais
tivessem atingido o auge de suas potencialidades e ele tivesse se agrupado, ativa e
livremente, numa comunidade genuína‟. A estratégia para alcançar este objetivo,
44
seria o uso „da atividade potica e do governo com vistas à educação pública‟
(apud PATEMAN, 1992, p. 33). Com base nisto, ao comparar a teoria da
democracia representativa com a teoria da democracia participativa, é possível
sinalizar que nesta a participação possui funções bem mais abrangentes e decisivas
no sentido de promover uma educação política, com vista à consolidação de
processos e/ou mecanismos participativos para o estabelecimento de um Estado
democrático.
Em síntese, pode-se compreender que na seara da democracia existem
convergências e diverncias entre diferentes teóricos no campo das Ciências
Sociais. Por sua vez, esta diversidade de pensamento resulta em pontos de vista
diferentes em relação à participação que adquire sentidos e significados
específicos. Sob o enfoque da teoria do governo representativo, a participação se
limita à escolha dos representantes no cenário político posto que se relaciona à
proteção de interesses individuais e coletivos de atores sociais e grupos que se
mantêm na liderança nos diversos setores que representam o governo e a
manutenção do sistema eleitoral. Enquanto na teoria da democracia participativa, a
participação assume - primordialmente - a função educativa vista em seu sentido
mais amplo o qual atinge seu apogeu na prática política. Portanto, pode-se afirmar
que esta perspectiva de participação avança na medida em que possibilita ao
cidadão atuar como protagonista nos espaços decisórios e na consolidação de ações
participativas na esfera do governo e do Estado. Também reforça-se a importância
adquirida pelo Estado no tocante à abertura de canais de participação nos quais a
democracia participativa possa tornar-se real.
1.4 Participação na cena sociopolítica contemporâneo
Ao considerar-se o século XX como marco temporal para a apropriação do
significado de participação como uma ação educativa da prática política, pode-se
45
entender o contexto em que diferentes grupos sociais ampliam seus espaços de luta
e participação em defesa da materialização dos direitos sociais. Este contexto
consistiu na afirmação dos direitos sociais, denotando uma ebulição da sociedade
civil, o que coincidiu com um cenário determinado no Estado brasileiro em que
leis e marcos jurídicos, políticos e sociais significativos que desembocaram no
Estado democrático. Nesta acepção, ao identificar o panorama histórico de
enaltecimento da participação no cenário mundial se remete aos últimos anos da
década de 60 no qual houve uma onda de reclamações, notadamente, por parte de
estudantes que almejavam a abertura de novos espaços de participação, também
por parte de grupos que queriam a implementação dos direitos sociais declarados
como seus na teoria. Conforme Pateman (1992), nos continentes europeu em
países como França e Grã-Bretanha; e americano nos Estados Unidos; a
participação foi uma das últimas palavras de ordem usada pelos governos em
campanhas políticas, relatórios e programas de combate à pobreza.
Nogueira (2004, p. 135) enfatiza que ao longo do século XX, as múltiplas
combinações de participação colocaram em xeque o ideal de democracia
representativa ao passo que pressões derivadas de novos arranjos societais, outras
formas de economia, lutas sociais e meios de cultura, comunicação e informação
se reconfiguram. Conforme o autor, essa compreensão desemboca na
especificidade da democracia participativa, tendo por base quatro aspectos: (i) os
interesses particulares se disseminam e os atores sociais passam a questionar os
preceitos da democracia participativa; (ii) o alargamento do processo de
democratização leva a sociedade a exigir mais participação e presença na
tomada de decisões; (iii) uma complexificação de problemas sociais, o que
exige o trato do conhecimento especializado; e (iv) o processo de informatização
e a espetacularização dos meios de comunicação de massa afetam os mecanismos
e valores da representação, da governabilidade democrática e do Estado. Desta
forma, ele afirma que a política enreda-se em suas próprias contradições,
46
perdendo eficácia”. Com isso, passa-se a adotar um modelo de questionamento
da democracia representativa.
Consoante este autor, no mundo moderno
8
há quatro grandes modalidades de
participação que integram o cenário pré-potica e política. No primeiro, destaca-se:
a participação assistencialista que é de natureza filantrópica ou solidária e se
constitui como uma atividade universal encontrada em todas as épocas, como uma
extensão de caráter gregário e associativo do ser humano, particularmente é
relevante entre as camadas sociais pobres que vivem à margem ou em períodos
históricos em que crescimento do estado de miséria e falta de proteção, este
modelo predominou nas fases que antecederam a afirmação dos direitos de
cidadania; e a participação corporativa” é utilizada com a finalidade de atender
interesses específicos de determinados grupos sociais ou categoria; é fechada em si
e tem propósito particular, é excludente por natureza posto que ganha apenas
aqueles que pertencem ao grupo ou à associação na arena de disputas. No segundo,
a participação eleitoral que não defende apenas interesses particulares, todavia
interfere de modo direto na governabilidade e possui efeitos que se relacionam à
coletividade como um todo. Esta manifesta uma consciência mais transparente do
poder político e das possibilidades de guiá-lo ou reorganizá-lo; e a participação
política que inclui, completa e supera a participação eleitoral e a participação
corporativa; orienta-se pelo pressuposto de que o ato de votar é uma forma política
de participação, bem como uma ão em defesa de interesses. Estas o
encontradas de maneira mais especifica no campo político.
A participação assistencialista e a participação coorporativa, sob o ponto de
vista de Nogueira (2004), integram uma versão pré-política de agregação moderna
em que as classes e comunidades reconhecem a necessidade de exercerem a
solidariedade a fim de defender com melhores condições as regras de sua adesão à
8
Consoante Nogueira (2004) o mundo da sociedade de classes, do capitalismo e do Estado
democrático representativo.
47
sociedade moderna. Elas o caracterizadas como práticas bem mais harmonizadas
com a classe proletária e as camadas populares do que com a burguesia.
Enquanto a participação propriamente política se realiza tendo em vista à
comunidade como um todo e a organização da vida social em seu conjunto, ou
seja, o Estado. Ela propicia a consolidação, proteção e dinamização da
cidadania e de todos os variados direitos humanos. E é em razão disso que seus
protagonistas principais são os cidadãos, “que se distinguirão entre si não à base
das categorias que representam, mas à base das diversas visões globalizantes dos
problemas que conseguiram formar, visões globalizantes estas que cada um possui
por pertencer não a esta ou àquela categoria, mas a este ou àquele movimento
político” (BOBBIO; NOGUEIRA, 2004, p. 133).
Para Texeira (2002), a participação tem suas primeiras manifestações na
antiguidade. No ideário liberal, responvel pelo ressurgimento de seu conceito,
sua origem remete à pólis grega, na qual a participação tem sentido decisório e se
restringe ao ato de votar que, por sua vez, é limitado aos cidadãos que detenham
algum patrimônio. Contudo, percebe-se que no contexto histórico atual, a
participação política passou a adquirir diferentes configurações que implicaram na
tradução de novos conteúdos e sentidos que por vezes podem apresentar-se como
contraditórios e múltiplos e, por conseguinte, podem le-la a um processo de
descaracterização. Em vista disto, compreende-se que a fim de não cometer
equívocos, é primordial e se faz necessária uma leitura da realidade na qual a
participação é consolidada como prática política. Para isto, convém focar-se no
movimento dos atores e na dinâmica social empreendida, a fim de construir uma
compreensão acerca do significado e sentido da participação inerente a cada
cenário em específico.
Teixeira (2002) ressalta ainda, que o conceito de participação política
carrega certo conteúdo ideológico que é utilizado de diferentes formas com vista a
disfarçar e legitimar a dominação por meio do uso de subterfúgios de manipulação
48
e tamm para negar qualquer papel de institucionalidade, portanto cabe a
sociedade opor-se ao Estado. Em vista disto, o autor alerta quanto à necessidade de
considerar o poder político - que, neste caso, não se confunde com autoridade ou
Estado, no entanto supõe uma relação em que atores, com os recursos disponíveis
nos espaços públicos, fazem valer seus interesses, aspirações e valores, construindo
suas identidades, afirmando-se como sujeitos de direitos e obrigações no qual o
conceito de participação é empregado. Por último, enfatiza que a participação
admite uma relação de poder, manifestada não só por meio do Estado que a
concretiza, mas entre os próprios atores. Assim exige certas formas de agir e
condutas racionais.
O autor, ao discorrer sobre participação política e sociedade civil, distingue
dois tipos de participação, quais sejam: a participação orientada para a decisão que
se reveste nas práticas de intervenção organizada e não episódica dos atores da
sociedade civil, que é reconhecida pelos críticos como fundamental e definidora -;
e a participação orientada para a expressão que possui caráter simbólico, dirige-se à
expressão e se caracteriza pela presença no cenário político ainda que possa causar
impacto ou influência no processo de tomada de decisão. Ele elucida que ambas
podem fortalecer e aprofundar a democracia, porém suas possibilidades de
efetivação são limitadas.
Com base nesta percepção, Texeira (2002, p. 32) defende o conceito de
participação cidadã posto que não faz uso somente de mecanismos institucionais
disponíveis ou a serem construídos, mas propicia a articulação destes com outros
mecanismos e canais que se legitimam pelo que chama de processo social”. O
autor se apóia em Telles (1994) que, por seu turno, sugere requalificar a
participação popular nos termos de uma participação cidadã que interfere, interage
e influencia na construção de um senso de ordem pública regido pelos critérios da
equidade e da justiça‟. Completa com a afirmação de que a participação cidadã não
nega o sistema de representação, entretanto busca seu aperfeiçoamento. Desta
forma, ela exige a responsabilização potica e jurídica dos mandatários, o controle
49
social e a transparência das decisões para tornar mais freqüentes e eficazes certos
instrumentos de participação semidireta a exemplo do plebiscito, do referendo, da
iniciativa popular de projeto de lei, da democratização dos partidos, dentre outros.
Em sua diferenciação em relação às outras formas de participação, Teixeira
(2002) aponta que a participação cidadã difere da participação social e comunitária
porquanto não objetiva a mera prestação de serviços à comunidade ou a sua
organização isolada também por não se tratar de simples participação em grupos ou
associações para defesa de interesses específicos ou expressão de identidades.
Mesmo sendo essencialmente política, ela se distingue da atividade potica, pois se
sustenta na sociedade civil e não se reduz aos mecanismos institucionais nem busca
o exercício do poder. Também, difere-se da participação popular que
costumeiramente é utilizada para nomear a ão dos movimentos tendo em vista o
atendimento de carências ou a realização de atos de protesto. Teixeira argumenta
que, em geral, a participação popular parte de uma postura de contraposição ao
Estado e circunscreve-se apenas aos segmentos sociais mais explorados
(trabalhadores, favelados e desempregados) ao mesmo tempo que exclui outros
setores sociais (intelectuais, profissionais, pequenos e médios empresários) os
quais também participam do processo de dominação, entretanto são considerados
fora do campo popular. Acrescenta que este modelo de participação é utilizado por
governos e organismos internacionais com o propósito de envolver segmentos
dominados da população em seus projetos poticos, como estratégia de redução de
custos e com objetivos de manipulação ideológica, de maneira a conferir
legitimidade a governos e a programas de caráter compensatório.
Ao referir-se à participação cidadã, Texeira (2002, p. 32) procura contemplar
dois elementos contraditórios presentes na atual dinâmica potica:
50
primeiro, o “fazer ou tomar parte”, no processo político-social, por
indivíduos, grupos, organizações que expressam interesses,
identidades, valores que poderiam se situar no campo “particular”, mas
atuando num espaço de heterogeneidade, diversidade, pluralidade. O
segundo, o elemento cidadania”, no sentido “cívico”, enfatizando as
dimensões de universalidade, generalidade, igualdade de direitos,
responsabilidades e deveres.
Ou seja, a participação cidadã permite a participação ativa de diferentes
segmentos sociais com interesses múltiplos e diversos que atuam em um espaço
comum ampliado e abrangente no qual cada cidadão poderá exercer, reivindicar e
desfrutar de seus direitos, bem como ser protagonista de suas responsabilidades e
deveres. Para este autor, a dimensão cívica se vincula a ideia de responsabilidade
e deveres,à propensão ao comportamento solidário, inclusive relativamente
àqueles que, pelas condições econômico-sociais, encontram-se excluídos do
exercício dos direitos, do direito de ter direito” (idem, 2002, p. 32).
Para Texeira (2002), na dimensão da participação como controle social, a
participação monitora a ação do Estado no tocante às questões sociais e políticas a
fim de garantir o cumprimento da agenda dos governos em termos de demandas
por direitos. Ou seja, a participação se configura como um instrumento de
controle do Estado pela sociedade na esfera social e política que possibilita aos
cidadãos definir critérios e pametros de orientação da ação política. Esta
compreensão é contraria à encontrada na perspectiva liberal a chamada
liberdade negativa - que objetiva impedir maior ão do Estado em detrimento da
garantia de excessiva liberdade aos indivíduos. Conforme o autor, o controle
social esalicerçado por duas dimensões sicas: uma equivale à accountability,
a prestação de contas segundo critérios determinados socialmente em espaços
públicos próprios; e a outra, que é decorrente desta última e consiste em
responsabilizar os agentes políticos pelos atos praticados em nome da sociedade,
consoante os procedimentos prescritos nas leis e nos padrões éticos em vigor. O
controle social consiste em uma noção de soberania popular, no sentido não
51
apenas do poder de eleger mandatários, mas também, do poder de exercer o
controle sobre o mandato de forma permanente e não só por eleições.
numerosas alternativas institucionais para esse controle: o mandato imperativo e
revogável como propõem alguns teóricos e juristas; o recall que é utilizado em
certos níveis de poder nos Estados Unidos; a figura do representante
substituível”, vinculada à instruções que recebe da base; censura jurídica ou ética
e a desconstituição de ato lesivo.
O autor coloca ainda, que o controle social se configura como “um
mecanismo de participação dos cidadãos que, para tornar-se efetivo, precisa ter
como alvos não somente seus centros periféricos, mas, sobretudo, aqueles que se
destinam às decisões, às estratégias e ao próprio sistema econômico”.
Compreende que no contexto atual em especial, devido à globalização da
economia e ao impacto do desenvolvimento tecnológico sobre os recursos
naturais e as relações sociais este deve estender-se para o sistema econômico,
submetido cada vez mais às leis do mercado, apesar de algumas limitações legais
existentes, facilmente burladas pelo poder dos lobbies e pela influência política
dos seus agentes”. Com base em tais dizeres, o conceito de controle social
vincula-se a ideia de que:
a correção dos desvios e a responsabilização dos agentes poticos e
que seu exercício requer a organização da sociedade civil, sua
estruturação e capitação para esse fim, de forma permanente, em
múltiplos espaços públicos, antes e durante a implementação das
políticas, tendo como parâmetros não apenas variáveis técnicas, mas
também exigências de equidade social e aspectos normativos. Requer,
por outro lado, uma total transparência e visibilidade do Estado, um
trazer de volta a ágora, traduzida em amplos espaços públicos
autônomos, e que os cidadãos e suas organizações disponham de
mecanismos institucionais e garantias legais para exercer o seu papel
com um nimo de eficácia. destacam-se as associações
voluntárias, organizadas em rede e de forma autônoma e autolimitada,
e as novas tecnologias de comunicação e informação, que podem
potencializar novos espaços para o exercício do controle, desde que às
mesmas seja garantido o amplo e livre dos cidadãos (2002, p. 39-40).
52
No entanto tal entendimento não contempla a participação vista como um
mecanismo de intervenção nas ações estatais, portanto há a necessidade de buscar
referenciais analíticos que abordem tal perspectiva, pois se compreende que
problematizar a participação à luz da gestão pública como mecanismo de
intervenção das políticas de esporte e lazer é lançar mão de seu significado e
sentido quando inserida no campo político administrativo.
Nestes termos, Nogueira (2004) afirma que esse novo tempo em que a
participação se amplia e se ativa, ela passa a regular a administração pública e os
governantes, determinando um novo modelo de administração que obriga a gestão
a rearranjar-se em termos de planejamento organizativo e material humano.
Ademais, essa nova forma de governar requer uma maior participação ativa da
sociedade civil nos espaços decisórios uma vez que a tendência central é a
descentralização das decisões. Por conseguinte, exige-se que o Estado seja uma
instituição mais aberta à dinâmica social, mais democrática e tecnicamente
preparada para apoiar as comunidades no exercício de autogestão, sendo um
recurso ético e político de apoio e organização da sociedade civil.
Conforme o autor, se antes havia a convicção de que os mecanismos
participativos
9
significavam um obstáculo ao ato de governar, posto que poderiam
colocar em risco o crescimento econômico na medida em que demandavam
processos mais demorados de tomada de decisão resultando em um maior tempo de
construção e materialização das políticas; hoje, a opinião de maior visibilidade é a
de que a participação seria particularmente relevante no sentido de dar maior
sustentabilidade às políticas públicas. Este raciocínio remete à noção de que os
9
Tem-se como exemplo o orçamento participativo que entendido à esquerda como um
procedimento destinado a elevar as comunidades à condição de sujeitos das operações
governamentais, uma espécie de instrumento de emancipação, e à direita como um dispositivo de
transferência de responsabilidades e impulsionamento do „bom governo‟ (NOGUEIRA, 2004, p.
118).
53
processos participativos são recursos estratégicos para a formulação de políticas
públicas, de modo particular na área social.
Registra-se que este novo modelo de gestão pública ”busca modificar a
articulação entre governantes e governados. O gestor governamental se relaciona
com o cidadão de modo não „amigável‟ mas também interativo‟, superando
distâncias, atritos e unilateralidade”. Nesta perspectiva, a função do gestor é trazer
o cidadão para o governo a partir da comunidade, de modo que este passe a
envolver-se em assuntos pertinentes à esfera governamental. A gestão participativa
é colocada como uma resposta à crise do Estado e à necessidade de sua reforma a
fim de se promover um novo encontro entre Estado e sociedade. Ela opera para
além da forma e do burocrático, pois busca ter iniciativa e criatividade para
produzir resultados efetivos, ou seja, resultados que não se limitem ao
administrativo e que estejam, portanto, abertos à transformação social. Todavia,
chama-se a atenção para o fato de que o novo status adquirido pela participação
no campo da gestão pública corresponde não apenas, nem principalmente, a uma
mudança política e teórico-ideológica, mas antes de tudo “às exigências da
modernidade radicalizada e da globalização capitalista” (NOGUEIRA, 2004, p.
148 e 121).
Portanto, deve-se atentar para os sentidos, os significados e as ideologias
subjacente a participação quando utilizada como mecanismo de intervenção das
políticas públicas, em específico no contexto das políticas públicas de esporte e
lazer. Esta necessidade também foi sublinhada anteriormente por Teixeira (2002),
ao tratar do conceito de participação considerando o contexto sociopolítico.
Guiando-se em tais dizeres, é possível perceber que a participação
incorporada à gestão pública é projetada para a agenda política de cada governo
consoante o desenho político-ideológico que pretende desenvolver, e que pode
desembocar no favorecimento dos cidadãos e das suas demandas históricas e
sociais ou no favorecimento das exigências da modernidade e do capitalismo
materializado nas relações sociais e econômicas.
54
Com a possibilidade de ampliação dos canais de participação na esfera dos
governos por meio dos mecanismos de legitimação da democracia participativa,
concorda-se com Teixeira (2002, p. 21) quando afirma que o poder local –
sempre visto como centro de atraso e mandonismo aparece, hoje, em alguns
municípios, como cenário de inovações, seja como novos agentes políticos seja
como movimentos e organizações da sociedade civil. Este movimento pode ser
visto a partir de perspectivas e impactos diferenciados nos governos de
democráticos e populares e aqui será tomado a partir da realidade do município de
Fortaleza/CE, na gestão (2005-2008) e no capítulo subsequente.
Segundo Liáo Jr. (2003), o movimento de ampliação da participação no
cenário político brasileiro foi marcado por conquistas históricas, a exemplo da
abertura política que contribui para que o Partido dos Trabalhadores (PT) passasse
a conquistar espaços nas administrações públicas - municipais e estaduais. Quanto
a isto, exprime-se que o restabelecimento democrático no país favoreceu a
ocupação de cargos estratégicos na gestão blica por parte de partidos do campo
popular, apoiados pelo sufrágio universal. No cenário do governo federal, Suassuna
et al. (2007) também sublinha que na nova conjuntura política sob a liderança do
governo Lula da Silva, o esporte e o lazer passam a compor a agenda política
governamental à semelhança da saúde, educação, do meio ambiente, dentre outros.
Reconhece-se, com base em suas diretrizes, que as políticas de esporte e
lazer do campo popular carregam a marca da legitimidade do esporte e do lazer
como direitos sociais e são norteadas pela democratização de tais práticas. Sendo
assim, convém elucidar que tais poticas m como um de seus princípios
10
buscar
formas concretas a fim de democratizar os espaços e equipamentos de esporte e
lazer, de maneira a ampliar e melhorar o nível de participação popular nas
manifestações culturais - corporais e esportivas -, e apropriação de seus
significados com vistas ao desenvolvimento humano.
10
Carta de Princípios de uma administração Democrática e Popular para o Esporte e Lazer.
Documento produzido coletivamente por militantes do PT. Ver Liáo Jr. (2003).
55
Sugere-se, portanto, pelas palavras de Liáo Jr., de Suassuna et al. e das
diretrizes norteadoras da política de orientação petista, que a participação é vista
como um mecanismo de intervenção das políticas governamentais que visa à
mobilização da sociedade civil no tocante à materialização de direitos, atendimento
de demandas cotidianas da população e protagonismo dos atores sociais nos
espaços decisórios alusivos à gestão (orçamento participativo, assembléias
participativas, comissões comunitários, dentre outros). Este raciocínio possibilita
construir-se à ideia de que a participação se configura como um recurso estratégico
para a formulação de políticas públicas, de modo particular na área social.
No contexto das políticas (programas e ações) no setor vigente no país,
alude-se à experiência de Potica de Esporte e Lazer sob a égide do Partido dos
Trabalhadores a Política de Esporte e Lazer de Fortaleza/CE do Governo Luizianne
Lins (2005-2008). Esta gestão se define como um governo popular que tem como
prioridade o cuidado com as pessoas (Prefeitura Municipal de Fortaleza, 2005).
Neste contexto, o Programa Esporte na Comunidade à época de sua implementação
se vinculava à extinção Célula de Esporte e Lazer
11
e, atualmente, é parte do
conjunto de ações da Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza
12
. Destaca-se a
institucionalização destas pastas para tratar do esporte, pois são pioneiras no
contexto político do município de Fortaleza/CE e acenam para a garantia de acesso
e democratização do esporte e lazer como direitos sociais da população
fortalezense (Prefeitura Municipal de Fortaleza, 2005, 2008).
Ressalta-se ainda, que o programa consiste na ação de maior relevância na
esfera do Governo Luizianne Lins (2005-2008), também no principal projeto da
campanha de reeleição da então candidata ao governo da capital cearense na pasta
de esporte e lazer. Segundo Sousa Sobrinho et al. (2006), o programa tem como
11
A Célula de Esporte e Lazer de Fortaleza foi criada em 2005 primeiro ano de gestão do governo
Luizianne Lins, vinculava-se à Secretaria de Desenvolvimento Econômico SDE. Esta pasta foi
extinta em 2008.
12
A Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza foi criada em março de 2008, último ano de
mandato da primeira gestão do Governo citado.
56
propósito a democratização do esporte e lazer em uma perspectiva de participação
que propicia a organização das comunidades de modo autônomo e democrático.
Portanto, entende-se que esta ão se aplica ao aporte teórico evidenciado e as
diretrizes do campo democrático popular.
Em suma, conclui-se que as proposições colocadas acerca da participação na
cena sociopolítica contemporânea, a partir do aporte teórico enfocado, permitem
formular uma compreensão da participação política em sua interlocução com a
sociedade civil a ser empregada no estudo, qual seja:
(a) configura-se como uma prática social visto que seus fundamentos são inerentes
ao ato educativo, participação como prática política (DAVIS; PATEMAN, 1992);
(b) atua como mecanismo de materialização da ação da sociedade civil no contexto
societário local e global, a partir do conceito de participação cidadã (TEIXEIRA,
2002);
(c) se constitui como um mecanismo de intervenção das políticas públicas de
esporte e lazer de viés democrático e popular (NOGUEIRA, 2004);
Dito isto, dá-se início a descrição do percurso metodogico do estudo.
57
CAPÍTULO II
O PERCURSO METODOLÓGICO DO ESTUDO
“Não tenho um caminho novo. O que eu tenho de novo é um jeito de
caminhar”.
(Thiago Melo)
Investigar os princípios acesso”, democratização” e participação
política nas intervenções governamentais de esporte e lazer, notadamente no
governo de Fortaleza/CE, referenciada pelo Programa Esporte na Comunidade é
lançar um olhar à política deste setor em desenvolvimento no país na esfera
federal e municipal, na perspectiva de evidenciar suas especificidades e
interlocuções. Certa disto apresenta-se os procedimentos da pesquisa e o
município lócus da investigação e o quadro numérico do Programa Esporte na
Comunidade. Ao optar por este percurso pretende-se, parafraseando Bourdieu
(1999), possibilitar ao leitor identificar o lugar de onde se fala o autor”.
Mais detalhadamente, descreve-se os procedimentos de pesquisas, com
destaque para a abordagem quantitativa e qualitativa, as categorias analítica e o
delineamento da pesquisa. Posteriormente, descreve-se o Programa Esporte na
Comunidade em números, o lócus da pesquisa, a definição e os critérios de
seleção dos sujeitos, os cuidados éticos da pesquisa e os procedimentos para
análise dos dados coletados. Para tanto, utilizou-se o referencial teórico, qual
seja, Minayo et al. (1993), Gil (2007), Galliano (1986), Bourdieu et al. (1999),
58
Richardson (1999), Ianni (1986), Yin (2005) e Chizzotti (2006). Também se fez
uso dos documentos Plano Plurianual 2006-2009, do município de Fortaleza/CE
(2005) e Cidades@ do Instituto do Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2009).
2.1 Procedimentos da pesquisa
É tarefa primordial do pesquisador, notadamente em seu processo de
formação, construir um percurso metodológico de pesquisa em conformidade
com o objeto de alise e a realidade investigada, uma vez que ambos se
relacionam dialeticamente posto que o conhecimento científico se dá em um
processo de articulação entre a teoria e a realidade empírica (MINAYO et al.,
1993). Compreende-se que na investigação em Ciências Sociais, a teoria
proporciona a definição de categorias de modo a possibilitar o estabelecimento de
sistemas conceituais e, ao mesmo tempo, indica lacunas no conhecimento e
auxilia na construção de hipótese/pressuposto de pesquisa. Ela explica, generaliza
e sistematiza os conhecimentos e aponta a metodologia apropriada à investigação
(GIL, 2007).
O conhecimento científico deriva da investigação metódica e sistemática da
realidade social, transcende os fatos e os fenômenos em si mesmos, interpretando-
os. Em suma, o conhecimento científico resulta de um exercício denso e fatigante
de apropriação e interpretação, permitindo ao pesquisador construir uma teoria,
um pressuposto, um modelo ou uma hipótese. Neste sentido, entende-se que em
Ciências Sociais, o processo de produção do conhecimento é fundamentado na
relação entre dois sujeitos: o pesquisador e o sujeito investigado. Tal afirmação se
59
opõe à perspectiva positivista que preconiza uma relação de distanciamento entre
sujeito e objeto, partindo do conhecimento nomológico cuja base se encontra na
observação, experimentação e comprovão dos fatos em uma perspectiva
empírico-anatica.
Com base no entendimento de que o conhecimento científico é proveniente
do exercício da pesquisa torna-se essencial destacar algumas exigências deste ato,
a saber: a investigação profunda e sistemática do objeto de estudo pelo
pesquisador que, após realizar sucessivas observações e procedimentos, consegue
desvendar níveis da realidade do objeto que antes eram desconhecidos; e o rigor
metodológico. Com efeito, Minayo et al. (1993) asseveram que a metodologia é o
fio condutor da pesquisa e precisa estar adequada ao objeto de estudo (sujeito
investigado, na forma que se compreende aqui) da investigação. Portanto, é
oportuno enfatizar os elementos basilares de uma metodologia de pesquisa em
Ciências Sociais, quais sejam: a teoria ou o paradigma norteador do estudo, o
método de investigativo do objeto, os procedimentos e as técnicas utilizadas na
investigação. Tais elementos, descritos de modo preciso e detalhado, são
essenciais no sentido de assegurar, como afirma Bourdieu et al (1999), a
vigilância epistemológica.
2.1.1 Notas iniciais: abordagem quantitativa e qualitativa
Sabe-se que as pesquisas científicas são orientadas por dois tipos de
abordagem, quais sejam: a quantitativa e a qualitativa. Estas atuam de modo
complementar e se constituem como instrumentos com os quais se serve o
pesquisador para estabelecer uma relação (de proximidade) com o objeto e a
realidade investigada, sendo, portanto elementos essenciais na construção do
percurso metodológico dos trabalhos qualitativos. Para Minayo & Sanches (1993,
60
p. 245), o trabalho qualitativo caminha sempre em duas direções: em uma
"elabora teorias, seus métodos, seus princípios e estabelece seus resultados; na
outra, inventa, ratifica seu caminho, abandona certas vias e toma direções
privilegiadas”. Neste sentido, a autora compartilha a ideia de „devir‟ no conceito
de cientificidade.
A compreensão das relações e atividades humanas com os significados que
animam é radicalmente diferente do agrupamento dos fenômenos sob conceitos
e/ou categorias genéricas dadas pelas observações e experimentações e pela
descoberta de leis que ordenariam o social (MINAYO et al., 1993, p. 244). Mas,
ainda que sejam evidentes as diferenças em relação à natureza das abordagens
qualitativa e quantitativa destacadas pelos autores citados, é provável que a
depender do objeto de análise (sujeito investigado), essas diferenças sejam
instrumentos de um mesmo estudo científico posto que o uso da abordagem
qualitativa não exclui a possibilidade de emprego de dados numéricos, como
forma de complementação de informações. Ao contrário, parte-se aqui do
pressuposto de que os dados numéricos (quantitativos) podem ajudar na
compreensão da realidade a ser estudada, ao passo que o diálogo entre eles é
estabelecido.
Conforme Minayo et al. (1993, p. 241),no âmbito das soft sciences,
(Psicologia, Sociologia) tem surgido a oportunidade de se usar a linguagem
matemática para descrever, representar ou interpretar a multidiversidade de
formas vivas e suas possíveis inter-relações”. No entanto, o uso da linguagem
matemática implica na descrição de modelo idealizado, este por sua vez pode
induzir o pesquisador a um entendimento parcial da realidade observada. Ciente
disto esclarece-se que o uso dos dados numéricos será necessário no estudo
porquanto possibilitará caracterizar o perfil da população atendida pelo Programa
Esporte na Comunidade, do ponto de vista socioeconômico, o que favorecerá um
processo de interpretação e análise do objeto deste estudo.
61
Sabe-se que as investigações elaboradas com base em uma análise
qualitativa têm como objeto situações complexas ou estritamente particulares. Por
outro lado, estudos que fazem uso da abordagem qualitativa são capazes de
descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de certos
elementos, compreendendo os processos dinâmicos vividos por grupos sociais.
Com efeito, essa abordagem possibilita maior nível de profundidade, bem como o
entendimento de particularidades que se apresentam à realidade estudada. Esta
perspectiva metodológica difere, em princípio, do quantitativo à medida que não
emprega um instrumento estatístico como base do processo de análise de um
problema (RICHARDSON, 1999). Diante das considerações acerca da
abordagem qualitativa, compreende-se que esta metodologia é a que mais se
aproxima do objeto - a democracia participativa - da investigação proposta, por
tratar-se de um fenômeno social.
Ressalta-se que a utilização de aspectos numéricos na análise em pauta
ocorrerá de modo complementar à abordagem qualitativa, pois se entende que os
dados levantados por meio do questionário permitiram ao investigador uma maior
apropriação da caracterização da população, conforme: 1. perfil da população
atendida; 2. tipo de trabalho e renda dos pais, e renda familiar; e, 3. participação
no programa: (a) conhecimento, tempo e frequência nas atividades; (b) prática
esporte e suas dimensões e (c) participação da comunidade, visando à
compreensão do objeto do estudo - a democracia participativa - em sua
interconexão com as poticas de esporte e lazer, notadamente, no cenário do
Programa Esporte na Comunidade no munipio de Fortaleza/CE.
62
2.1.2 Categorias analíticas
Construir teoria implica em construir conceitos ou categorias de alise. E
cada conceito é resultado de estudos do abstrato ao concreto dialeticamente, é a
representação mais simplificada do significado, a natureza das coisas. Nesta
acepção,
a construção da categoria é, a meu ver, um desfecho, é uma síntese da
proposta de Marx, a saber: como se explica cientificamente um
acontecimento, como se constrói a explicação. Na medida em que a
explicação se sintetiza na categoria que poderíamos traduzir em
conceito, em lei, então a construção da categoria é por assim dizer, o
núcleo, o desfecho da reflexão dialética (IANNI, 1986, p. 1).
O autor coloca que explicar dialeticamente é construir as categorias que
resultam da reflexão sobre o objeto (fato, acontecimento) que se está
investigando, logo, a categoria que se constrói é o resultado de uma reflexão
obstinada, que interroga o real reiteradamente e que desvenda do real aquilo que
não está dado, não é imediatamente verificado. Nesta direção, faz-se necessário,
portanto, que o pesquisador se coloque diante do fato, a fim de interrogá-lo sob
todos os aspectos e perspectivas, partindo do reconhecimento de que o fato não se
a conhecer de modo imediato (idem, 1986), mas que é algo a ser construído
com base no exercício metódico.
Com base na compreensão de Ianni (1986), pressupõe-se que estudar a
democracia participativa nas poticas públicas de Esporte e Lazer subsidiadas
pelos princípios de acesso”, de democratização” e de participação política”,
com base nos determinantes históricos e estruturais presentes no contexto do
Programa Esporte na Comunidade, é investigar a realidade em uma perspectiva
63
dialética, admitindo-se que a construção do objeto se conforme o exercício
metódico que vai se desenhando no curso da pesquisa.
2.1.3 Pesquisa social em foco
Pressupondo-se a construção do objeto de estudo conforme o exercício
metódico, tendo-se em conta o processo dialético de compreensão do fenômeno
na realidade social, esta pesquisa utilizou diferentes técnicas de investigação,
tendo-se como delineamento o estudo de caso.
O estudo de caso como delineamento de pesquisa investiga um fenômeno
atual dentro do seu contexto de realidade, quando as fronteiras entre o fenômeno
e o contexto não são claramente definidas e no qual são utilizadas várias fontes de
evidência (YIN, 2005). E ainda,
os estudos de caso visam explorar, deste modo, um caso particular,
situado na vida real contemporânea, bem delimitado e contextualizado
em tempo e lugar para realizar uma busca circunstanciada de
informações sobre um caso específico (CHIZZOTTI, 2006, p. 136).
Considera-se que o estudo de caso conduz a uma investigação minuciosa
de um ou poucos objetos, de modo a permitir o seu conhecimento amplo e
detalhado em um determinado contexto limitado pelo espaço-tempo histórico.
Neste enfoque, o contexto de estudado foi o do Programa Esporte na
Comunidade, tendo-se como técnicas: questionário, entrevista e observação.
Define-se questionário como uma técnica de investigação formada por um
número variado de questões apresentadas por escrito aos respondentes e visa
conhecer opiniões, interesses, expectativas, situações vivenciadas, dentre outros
64
(GIL, 2007). Portanto, seu uso nesta pesquisa objetivou averiguar o perfil da
população atendida e aspectos relacionados à intervenção governamental
analisada, tais como: (a) conhecimento, tempo e frequência nas atividades, (b)
esporte e suas dimensões no programa e (c) participação da comunidade no
programa.
Conforme Gil (2007) o questionário pode apresentar três tipos de questões,
a saber: questões fechadas - apresenta-se um conjunto de alternativas de respostas
ao respondente para que ele escolha a que melhor represente sua situação ou
ponto de vista; questões abertas - apresenta-se a pergunta e deixa-se um espaço
para que o respondente escreva sua resposta sem qualquer restrição; e questões
dependentes - quando uma questão depende da resposta dada a outra questão. Em
vista disto, foi utilizado na investigação um questionário composto de questões
fechadas, abertas e dependentes no qual se abordava aspectos relacionados ao
perfil socioeconômico, caracterização da população atendida e participação no
programa (ver apêndice 1).
O quadro 1 demonstra, de forma precisa, os aspectos e temas de perguntas
que foram abordados quando da elaboração do roteiro de apresentação do
questionário.
65
Quadro 1 - Caracterização da população atendida e participação no PENC
Aspectos
Temas das Perguntas
N . de
Questões
Tema I
Informações
pessoais
- Idade, sexo, estado civil, escolarização, formação para o
trabalho, tipo de escola, tipo de trabalho, bairro onde mora,
como quem reside, família se é beneficiada por programa
social, qual e quanto recebe.
11
Tema II
Situação
econômica dos
pais
- Pai e mãe: profissão, tipo de trabalho e salário.
02
Tema III
Grau de
instrução dos
pais
- Nível de escolaridade do pai e da mãe.
02
Tema IV
Perfil
econômico
familiar
-Responsável pela família, número de pessoas que moram
em casa, número de pessoas que moram em casa e
trabalham, renda familiar mensal, contribuintes na renda
familiar, tipo de moradia, aparelhos eletrônicos e
eletrodomésticos, acesso à internet e TV por assinatura.
10
Tema V
Participação no
PENC
- Conhecimento do PENC, tempo de participação no
programa, esportes e/ou práticas corporais, participação em
outras atividades além das mencionadas anteriormente, é
beneficiado (a) por programa social do governo de incentivo
à prática de esporte qual e quanto recebe -, motivos que
justificam a participação no programa, objetivos da prática
de esporte e/ou prática corporal no programa, n. de pessoas
na família que participam do programa.
08
-
-
Total: 33
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008), com base em dados do trabalho de campo.
Como forma de apropriação da realidade investigada também se utilizou da
técnica da entrevista, nas modalidades: estruturada e semi-estruturada. A
entrevista estruturada se desenvolveu com base em uma relação fixa de perguntas
cuja ordem e redação permaneceu invariável para todos os sujeitos entrevistados,
ao passo que a entrevista semi-estruturada, o informante discorreu livremente
66
sobre o tema proposto, com um roteiro que pôde ser alterado (GIL, 2007). Desta
forma, as perguntas eram feitas aos respondentes com base em um rol pré-
determinado de questões que permitiu flexibilidade à medida que novas
informações eram reveladas pelos respondentes. O entrevistado tinha liberdade
para discorrer sem a interferência do entrevistador. Cabe anunciar que as
entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas.
O quadro 2 demonstra, de forma detalhada, os temas e sub-temas que
foram abordados quando da elaboração dos roteiros de entrevistas.
Quadro 2 - Eixos temáticos do PENC
Eixos Temáticos
Temas
Subtemas
Eixo I
Marco teórico do PENC
Pressupostos teóricos que
fundamentaram a construção
do projeto e diretrizes do
programa.
-Concepção de esporte e lazer
-Política de esporte e lazer
-Relação esporte, lazer e direito
social (qual significado? Para que
serve?)
Eixo II
Intervenção do PENC
nas comunidades
- Estratégias e mecanismos
-Atores e grupos sociais
envolvidos no processo
-Áreas de atuação do programa
Eixo III
Acesso e
democratização
Elementos norteadores
destes princípios no PENC.
- Estratégias
-Funcionamento: estrutura, locais
Eixo IV
Participação potica
-Mecanismos de
participação da comunidade
nas ações do programa.
-Mobilização e articulação
da comunidade.
-Planejamento participativo
-Resposta da SECEL as
demandas da comunidade
-Compreensão da proposta
Eixo V - Funcionamento
-Dificuldades e avanços
-Recurso orçamentário
-Estrutura dos núcleos
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008), com base em dados do trabalho de campo.
67
Ainda é oportuno mencionar dois aspectos que se considera pertinentes:
a) para a realização das entrevistas (estruturada e semi-estruturada) foram
elaborados roteiros distintos conforme cada grupo de entrevistado, a fim de
atender ao nível de compreensão e entendimento dos diferentes sujeitos da
pesquisa, bem como apreender de modo mais fidedigno o conteúdo das falas
apresentadas.
b) a opção por essas duas modalidades de entrevista deu-se com a
finalidade de confrontar os dados da realidade do programa com as informações
colhidas com base nos documentos oficiais, cruzando-se com os dados obtidos
por meio dos questionários e das informações coletadas por meio da observação,
que foram analisadas à luz da literatura definida. A análise relativa às entrevistas
será apresentada no capítulo IV.
Na observação direta foi utilizado como instrumento o diário de campo.
Percebeu-se que a observação consistiu em um elemento fundamental em todas as
etapas do processo investigativo, a saber: na formulação do problema, na
construção de hipóteses e na coleta, análise e interpretação dos dados. Todavia, é
na etapa do trabalho de campo propriamente dito (coleta de dados) que sua
importância apareceu com maior veemência. Ressalta-se que a observação nada
mais é que o uso dos sentidos com vistas a adquirir os conhecimentos necessários
para o cotidiano”. Pom, ela pode ser utilizada como procedimento científico, ao
passo que: (a) serve a um objetivo formulado de pesquisa; (b) é
sistematicamente planejada. (c) é submetida à verificação e controles de validade
e precisão. Por meio da observação, almejou-se obter informões sobre as
dinâmicas sociais, bem como sobre a ão dos sujeitos na realidade observada
(GIL, 2007, p. 110).
Como toda construção do procedimento de pesquisa supõe, utilizou-se
como fontes complementares às informações obtidas em campo (trabalho de
68
campo) os levantamentos bibliográfico e documental. O levantamento
bibliográfico possibilitou à pesquisadora apropriar-se das contribuições dos
diversos autores acerca do tema, enquanto o uso de fontes documentais propiciou
a melhor compreensão do discurso oficial presente nos documentos que deram
origem e nortearam o programa.
2.1.4 O Programa Esporte na Comunidade em meros
O programa, como parte do quadro das políticas do governo municipal de
Fortaleza/CE atua em comunidades de baixa renda no atendimento de
aproximadamente 3.644 sujeitos de segmentos de etários distintos - crianças,
adolescentes e adultos (cf. dados coletados em campo, 2008).
No quadro 3, é apresentada a distribuição do número de sujeitos envolvidos
no programa, conforme divisão por secretarias executivas regionais.
Quadro 3 - Distribuição dos participantes do PENC em 2008
SER
Núcleos
N . de
alunos
N . de
alunas
Total de
alunos
Professores e/ou
estagiário de
Educação Física
Lideranças
comunitárias
1
8
577
137
714
8
8
2
8
314
244
558
8
8
3
10
590
149
739
10
10
4
4
324
15
339
4
4
5
9
405
185
590
9
9
6
10
539
162
701
10
10
Total
49
2748
891
3.644
49
49
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008), com base em dados do trabalho de campo.
69
No tocante à gestão, quatro técnicos vinculados à Secretaria de Esporte
e Lazer que atuam diretamente no programa, sendo um coordenador e três
supervisores. Em cada cleo do programa atua um professor de educação física
e/ou estagiário e, pelo menos, um agente social e/ou comunitário (cf. dados
coletados em campo, 2008).
Em relação aos critérios de seleção da amostra, na primeira fase da
investigação (dezembro de 2008 a março de 2009) foi realizado um levantamento
de informações referentes aos núcleos junto à Secretaria de Esporte e Lazer de
Fortaleza que possibilitou perceber que para atingir os objetivos do trabalho com
mais clareza, seria apropriado realizar uma visita aos núcleos ativos desde 2005,
ano de implantação do programa nas comunidades.
Outra questão relevante foi à identificação dos núcleos que ainda não
tinham passado pelo processo de mudança de professor, pois se entendia que
nestes, o programa não tinha sofrido nenhum tipo de interrupção no que concerne
ao desenvolvimento das atividades, à relação professor e comunidade e à
apropriação da sua proposta por parte da comunidade. Ou seja, entendia-se que
tais determinantes em conjunto ou de maneira isolada poderiam prejudicar a
materialização e as consequentes repercussões dos princípios norteadores da
democracia participativa presente nesta política. Também, optou-se por visitar os
núcleos apontados pela coordenação do programa como locais potencialmente
propensos à materialização da democracia participativa no cenário do programa.
Tal afirmação se pautava na organização social, na participação popular e na
intervenção político-pedagica do professor.
Resguardado de tais iias, adotou-se como critérios para a seleção da
amostra dos núcleos do programa, conforme descrito:
(1) núcleo ativo desde implementação do programa (2005);
(2) núcleo que não havia passado por processo de transição de professor;
(3) núcleo com histórico de participação popular;
70
Como base no exposto acima e segundo a realidade apresentada por cada
núcleo no período da investigação, são estes: cleo ativo ou inativo, cleo em
processo de extinção e inacessibilidade de aproximação do professor. O mero
de visitas era determinado pelas condições de acesso à comunidade, na maioria
delas, só era possível chegar ao núcleo acompanhado pelo professor.
O quadro 4 retrata os núcleos selecionados conforme critérios
estabelecidos, situação na época da investigação e números de visitas realizadas.
Observar em destaque os núcleos apontados pela coordenação do programa.
71
Quadro 4 - Situação conforme critérios estabelecidos e cleos visitados
N.
Núcleo
Situação na época da investigação
Número de visitas
01
Bela Vista
Ativo
01
02
Conjunto Palmeiras
Ativo
01
03
Guajeru
Em processo de extinção
01
04
João Paulo
Ativo
01
05
José Walter
Ativo
01
06
Novo Perimetral
Ativo
01
07
Padre Andrade
Inativo
-
08
Parque Genibaú
Não houve contato com o professor
-
09
Pio Saraiva
Inativo
-
10
Pirambu
Inativo
-
11
Planalto Universo
Ativo
06
12
Presidente Kennedy
13
Rosalina
Ativo
01
14
Serrinha
Ativo
05
15
Vila Nova
Não houve contato com o professor
-
16
Vila Velha
Inativo
-
17
Vila União
Em processo de extinção
02
Total de visita
22
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008), com base em dados do trabalho de campo.
Evidencia-se que na primeira fase da investigação, as visitas tinham caráter
diagnóstico, isto é, pretendia-se estabelecer uma primeira aproximação com o
lócus da pesquisa, o núcleo (local, atores sociais envolvidos direta e diretamente
nas ões) e a comunidade (com ênfase na problemática social e condições infra-
estruturais).
72
Pôde-se identificar que os núcleos: José Walter, Bela Vista e Conjunto
Palmeiras não mantêm uma interlocução entre comunidade e Secretaria de
Esporte e Lazer de Fortaleza no sentido de articulação/diálogo que permitam
compreender os princípios da democracia participativa, tomando a comunidade
em sua totalidade, porquanto suas atividades acontecem no centro de cidadania
dos respectivos bairros, o que em certa medida limitaria o acesso de ampla
parcela dos sujeitos nas atividades. Outro fator limitante do acesso seria o fato de
as atividades, nesses núcleos, serem incorporadas as demais atividades oferecidas,
o que em certa proporção prejudicaria a autonomia da comunidade em relação à
seleção dos temas da cultura corporal. Não foi possível visitar os cleos que se
encontravam temporariamente inativos ou em que não houve uma aproximação
com o professor.
Após análise das condições de viabilização da investigação junto aos
núcleos, optou-se por investigar os núcleos: Planalto Universo e Rosalina. Neles,
observou-se a existência de uma articulação entre os movimentos sociais que os
representam (associações, cooperativas comunitárias e organizações não-
governamentais) e a Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza.
Contudo, ao retornar-se ao campo, para a execução da segunda fase da
investigação (agosto a dezembro de 2009), isto é, a aplicação dos instrumentos de
pesquisa, o programa passava por um momento de interrupção de suas atividades,
porquanto os professores estavam sem receber seus vencimentos.
Concomitantemente, a maioria dos cleos passava por um processo de retomada
das atividades e, por isso, a quantidade de alunos por núcleo tinha sofrido uma
redução. Além do mais, alguns núcleos estavam sem funcionar por falta de
espaço adequado para a realização das atividades e, ao mesmo tempo, a Secretaria
de Esporte e Lazer de Fortaleza passava por um momento de transição de
secretário que implicava em certa instabilidade no programa.
Diante do contexto evidenciado, optou-se pela realização da investigação
em mais três núcleos: Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II. Tendo em
73
vista atender aos critérios de validade e representatividade da amostra de sujeitos
atendidos pelo programa.
Com base no universo dos núcleos do programa, que perfaziam um total de
42 na época da primeira fase do trabalho de campo e feita à análise do contexto
social e estrutural dos núcleos, foram selecionados cinco comunidades, quais
sejam: Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo
II. Optou-se por investigar os cleos Planalto Universo, Rosalina, Presidente
Kennedy e João Paulo II porquanto neles, ao que parece, há uma articulação entre
a comunidade e a Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza, visto que nestes
núcleos os professores - além de realizarem uma intervenção potico-pedagógica
como agentes de esporte e lazer - atuam como agentes sociais e/ou comunitários,
interagindo com a comunidade e sendo sensível à problemática social vivenciada
pelas famílias e, ao mesmo tempo, conseguem mobilizar as lideranças
comunitárias. A opção pelo cleo Serrinha é justificada pelo fato de estar em
funcionamento desde 2005, ano de implantação do programa nas comunidades.
Neste âmbito, tais núcleos podem ser reveladores da existência ou não de
diálogo e interlocução entre a Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza e a
comunidade atendida pelo programa, particularmente, no sentido de compreender
o significado atribuído nesta relação à noção de democracia participativa. Vale
ressaltar que parte das ações desenvolvidas pelo programa passaram a ser
apropriadas pela comunidade como algo que compõem o cotidiano não somente
de quem o pratica - o que pode representar do ponto de vista simbólico a
cristalização das demandas sociais, ao passo que houve tal apropriação mais
tamm ser um indicador de que as estratégias dialógicas e a comunhão de
interesses entre governo e sociedade civil são fundamentais para a
realização/concretização de programas sociais no contexto de políticas públicas
em diferentes instâncias, particularmente, na instância municipal.
74
2.1.5 Fortaleza: o lócus do estudo
O estudo de caso foi aplicado junto ao Programa Esporte na Comunidade
cuja localização se encontra no município de Fortaleza, capital do Estado do Ceará,
situada na região nordeste do Brasil. Fortaleza é a quinta capital do país no que diz
respeito ao indicador população, sendo superada em ordem crescente pelas cidades
de Belo Horizonte, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. Possui uma população
que corresponde a 2.505.552 habitantes
13
e uma área de unidade territorial
equivalente a 313 Km
2
. O município possui cinco distritos, estes são: Fortaleza,
Antônio Bezerra, Messejana, Mondubim e Parangaba (cf. dados IBGE - cidades@,
2009). Em sua estrutura administrativa o município é subdividido em seis
subprefeituras denominadas de secretarias executivas regionais que englobam
todos os bairros de Fortaleza (cf. Plano Plurianual 2006-2009, 2005).
A seguir é apresentado o mapa de Fortaleza demarcado pelas seis secretarias
regionais.
13
Conforme estimativa do IBGE para 2009.
75
Figura 1 Mapa de Fortaleza - por Secretaria Executiva Regional
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A figura 2 descreve a Secretaria Regional I com destaque para os bairros
que a representam.
76
Figura 2 Mapa da Secretaria Executiva Regional I
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
Esta Secretaria Executiva Regional perfaz um total de 15 bairros, ocupando
a última posição em relação ao indicador bairro.
A figura 3 descreve a Secretaria Regional II com destaque para os bairros
que a representam.
77
Figura 3 Mapa da Secretaria Executiva Regional II
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A Secretaria Executiva Regional II perfaz um total de 20 bairros e ocupa a
segunda posição em relação ao número de bairros.
A figura 4 descreve a Secretaria Regional III com destaque para os bairros
que a representam.
78
Figura 4 Mapa da Secretaria Executiva Regional III
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A Secretaria Executiva Regional III é formada por 16 bairros, dentre eles: o
bairro Presidente Kennedy no qual se localiza um dos núcleos investigados. Esta
ocupa a quinta posição no tocante ao número de bairros.
A figura 5 descreve a Secretaria Regional IV com destaque para os bairros
que a representam.
79
Figura 5 Mapa da Secretaria Executiva Regional IV
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A Secretaria Executiva Regional IV é a terceira maior em quantidade de
bairro, apresentando 19 bairros em sua totalidade. Nela se localizam os núcleos
Planalto Universo e Serrinha.
A figura 6 descreve a Secretaria Regional V com destaque para os bairros
que a representam.
80
Figura 6 - Mapa da Secretaria Executiva Regional V
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A Secretaria Executiva Regional V ocupa a quarta posição no que tange ao
número de bairros. Estes correspondem a um total de 17.
A figura 7 descreve a Secretaria Regional VI com destaque para os bairros
que a representam.
81
Figura 7 Mapa da Secretaria Executiva Regional IV
Fonte: Plano Plurianual do Município 2006-2009, 2005.
A Secretaria Executiva Regional VI ocupa a primeira posição em relação ao
número de bairros. Estes perfazem um total de 26. Nela se localizam os núcleos da
Comunidade Rosalina e do João Paulo II.
O município possui um total de 114 bairros que compõem as secretarias
executivas regionais apresentadas. Dos 114 bairros de Fortaleza, 63 apresentam
baixa” média de anos de estudo dos chefes de família; 113 demonstram alta”
taxa de alfabetização e 104 possuem renda média dos chefes de família (salários
mínimos) baixa”. Tais indicadores foram utilizados como parâmetros para a
mensuração do Índice de Desenvolvimento Humano do Município que em 06
82
bairros é alto”, 66 é médio” e 41 é baixo”. Os bairros que apresentam baixo
IDH se localizam em sua maioria nas Secretarias Executivas Regionais V e VI. (cf.
Plano Plurianual do município 2006 - 2009). Vale salienta que dos cinco núcleos
envolvidos na pesquisa, dois se situam na SER VI (cf. Plano Plurianual 2006-2009,
2005).
Conforme o mapa da pobreza e desigualdade dos municípios Brasileiros de
2003, Fortaleza apresenta uma incidência de pobreza de 43,17%. Com base neste
indicador, entre as capitais da região nordeste, Fortaleza ocupa uma posição
inferior apenas as cidades de Maceió (58,37%), São Luís (54,83%) e João Pessoa
(52,98%). É oportuno destacar que a região Nordeste apresenta os maiores índices
em relação à incidência de pobreza no país.
2.1.6 Definição e critérios de seleção dos sujeitos
A seleção dos sujeitos investigados constitui um momento crucial da
metodologia da pesquisa social, posto que visa reunir um grupo de informantes-
chave que possam apresentar informações coerentes sobre o tema investigado. A
diversidade de pessoas e visões é importante para que a entrevista não se limite
apenas a contar opiniões ou pessoas, mas a explorar o espectro de opiniões e as
diferentes representações sobre o tema abordado (GASKEL, 2002).
Para representar os sujeitos da pesquisa foram escolhidos todos os
participantes (alunos cadastrados no programa), ou seja, crianças, adolescentes e
adultos (conforme o número de alunos atendidos pelos núcleos selecionados para
aplicação do estudo de caso); os responsáveis (pais dos alunos); as lideranças
comunitárias; os professores e o grupo gestor do programa (coordenador de
83
políticas públicas, coordenador geral de programas, coordenador e ex-
coordenador pedagógico e supervisor).
A amostra aleatória simples foi composta de 140 sujeitos (participantes
alunos do programa), tendo seu tamanho mínimo calculado para uma variável
que, quando medida dicotomicamente, tem distribuição com variância máxima,
confiança de 95% e erro amostral de 9%. Obteve-se um tamanho mínimo de
amostra igual a 119 sujeitos. Foram tomados aleatoriamente na população
investigada 140 sujeitos. Além destes, foram sujeitos da investigação 05 sujeitos
representantes do grupo gestor, 05 sujeitos professores e 09 sujeitos responsáveis
(pais de alunos) e/ou lideranças comunitárias.
O quadro 5 demonstra, de forma detalhada, os sujeitos e respectivas
técnicas de investigação utilizadas.
Quadro 5 - Sujeitos da pesquisa e técnicas de investigação apresentadas
Sujeitos
Técnica de Investigação
Identificação
Participante (alunos)
- Questionário:
Caracterização da
população atendida e
participação no
PENC
- Questões abertas,
fechadas e dependentes
- Estruturada
Responveis (pais dos alunos) e
lideranças comunitárias
- Entrevista
- Estruturada
Professores
- Entrevista
- Estruturada
Grupo gestor
- Entrevista
- Estruturada e semi-
estruturada
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008/2009), com base em dados do trabalho de campo.
As entrevistas foram realizadas no período de 01/08/2009 a 06/11/2009.
Foram selecionados três grupos de informantes-chave: o primeiro grupo é
84
representado por alunos que participam diretamente e acompanham as atividades
do programa nos núcleos; o segundo grupo é composto por lideranças
comunitárias e responsáveis (pais dos alunos) que acompanham diretamente o
programa nos núcleos; o terceiro é formado pelo professor que possui relação
direta com a execução do programa; e o quarto grupo, envolve coordenadores do
programa, coordenador de poticas públicas e assistentes técnicos, que detém a
compreensão política e pedagógica do programa e que foi responsável idealização
e concepção do programa.
O quadro 6 mostra, de maneira minuciosa, a identificação dos grupos de
informantes-chave.
Quadro 6 - Grupos de informantes-chave
Formação dos grupos
N . de sujeitos
Identificação
Grupo 1 -
Grupo gestor
05
Entrevista 1 a 5
Grupo 2 -
Professores
05
Entrevista 6 a 10
Grupo 3 -
Responveis (pais dos alunos) e lideranças
comunitárias
09
Entrevista 11 a 19
Grupo 4 -
Participantes (alunos)
04
Entrevista 20 a 24
Total
24
-
Fonte: Oliveira, Ana Amélia (2008/2009), com base em dados do trabalho de campo.
No caso da entrevista, a escolha dos informantes-chave foi feita a partir de
critérios pré-definidos:
(i) relação dos respondentes com o programa;
(ii) experiência no programa;
85
(iii) compreensão potica da proposta do programa;
2.1.7 Cuidados éticos da pesquisa
Para que a pesquisa fosse realizada junto ao Programa Esporte na
Comunidade, a Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza por meio da
coordenação do programa citado foi comunicada em documento oficialmente
emitido pelo Núcleo de Estudos do Corpo e Natureza / FEF-UnB, coordenado
pela Profa. Dra. Dulce Suassuna (ver apêndice 5). Por sua vez, a referida
coordenação se manifestou favorável à realização da investigação junto aos
núcleos selecionados.
Os sujeitos da pesquisa assinaram um termo de livre consentimento para
participação na pesquisa. Os documentos do programa cedidos pela Secretaria de
Esporte e Lazer de Fortaleza foram guardados com sigilo e usados somente para
os fins deste trabalho (ver apêndices 6 a 9).
Os dados obtidos junto aos sujeitos da investigação foram tratados e
guardados com sigilo. Eles foram utilizados somente para os fins do trabalho.
O projeto de pesquisa foi submetido à aprovação junto ao Comitê de Ética
em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília (UnB)
e recebeu parecer favorável em dezembro de 2009.
2.1.8 Procedimentos para análise de dados
Posteriormente à coleta, a análise foi realizada com base em dados obtidos
por meio dos questionários, entrevistas e registros em diário de campo.
Na investigação, os dados obtidos por meio do questionário foram tratados
e analisados tendo como suporte a estatística descritiva por meio do Programa
Computacional SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 15.0
86
para windows. Estes possibilitaram a compreensão do perfil socioeconômico,
nível de renda da população atendida e relação entre as demandas sociais e as
ações desenvolvidas por este programa, com base em diferentes perspectivas.
As entrevistas subsidiaram a análise à medida que possibilitaram a
compreensão do sentido de democracia participativa” no quadro das políticas
sociais de Esporte e Lazer, particularmente, no caso do programa. Desta forma, a
fala dos participantes, lideranças comunitárias e responsáveis (pais dos alunos),
professores e gestores foram compreendidos como “discursos” produtores de
significado.
Os registros das observações serviram para conhecer a dinâmica social
característica dos núcleos investigados e a problemática vivenciada pela
comunidade, suas demandas sociais e também para compreender a inserção do
programa na comunidade.
Por último, sublinha-se que em seguida será abordado o cenário político de
constituição das políticas públicas de esporte e lazer, tomando-se como referência
o governo Lula da Silva (2003-2007) e a Política Municipal de Esporte e Lazer de
Fortaleza/CE no Governo Luizianne Lins (2005-2008), contexto de criação do
Programa Esporte na Comunidade. Também sefeita uma descrição do programa
com o propósito de evidenciar as repercussões dos princípios da democracia
participativa nesta política.
87
CAPÍTULO III
POLÍTICAS PÚBLICAS DE ESPORTE E LAZER: IDENTIDADE LOCAL
E O CENÁRIO BRASILEIRO
“Na atualidade, não basta criticar a política social; é fundamental
realizar a crítica da sua crítica, que quase sempre despreza a realidade
e até legitima-a pelo avesso, quer dizer, ao desconhecer a realidade,
confirma-a.”
(Evaldo A. Vieira, 1997).
O capítulo em questão faz alusão às poticas públicas de esporte e lazer no
país - esfera federal e estadual - com destaque para o cenário de constituição delas
que é delineado pelo significado de cidadania, direito social, Estado, política
social/pública. Especificamente, a discussão tem como pano de fundo a cidadania
e a garantia do direito social ao esporte e ao lazer na conjuntura histórica em que
a democracia participativa norteia o ideário dos governos democráticos e
populares, haja vista as diretrizes da Política Nacional do Esporte criada no
Governo Lula da Silva em que a descentralização da gestão das políticas de
esporte e lazer se faz presente (ME, 2005), de modo particular na Política
Municipal de Esporte e Lazer de Fortaleza/CE.
No primeiro momento, versa-se sobre as poticas de esporte e lazer no
país. A trama é tecida pela discussão das categorias analíticas cidadania
(SANTOS, 1987; DEMO, 1995), Estado (POULANTZAS, 2000; JACOBI citado
88
por SUASSUNA et al. 2007; PEREIRA, 2008), Estado democrático (BORON,
1999), direito social (TELLES, 1999), política social (VIEIRA, 1992; PEREIRA,
2008), política pública (SOUSA, 2003; REIS, 2003) e é permeada pelo
reconhecimento do esporte e do lazer como direito social (cf. art. 6 , inciso III da
CF de 1988). Ao final, discorre-se sobre a conjuntura política que possibilitou a
criação da pasta de esporte no governo federal, com destaque para as
contribuições de Liáo Jr. (2003) e de Suassuna et al. (2007). Em seguida, elenca-
se as ões que em certa medida propiciaram a ampliação dos espaços de debate
sobre a temática do esporte e do lazer nesta esfera em consonância com a
democracia participativa, com foco na democratização e universalização do
acesso ao esporte e ao lazer” e na descentralização da gestão das políticas de
esporte e lazer” presentes na Política Nacional do Esporte (ME, 2005).
No segundo momento, parte-se para a descrição e análise do Programa
Esporte na Comunidade na perspectiva de compreender e interpretar suas
singularidades no que concerne à formulação, implementação e execução. Para
tanto, utiliza-se os documentos, Projeto Esporte na Comunidade” (2007) e Para
Celebrar a Utopia: avaliação do Programa Esporte na Comunidade
14
(SOUSA et.
al., 2006), também o registro das falas do grupo gestor e professores em que o
perfil dos primeiros é demarcado por serem fundadores/idealizadores/executores
da política e dos segundos pela apropriação da proposta pedagógica, do
conhecimento e da interlocução com as comunidades atendidas.
14
O texto foi construído durante o I Seminário de Avaliação do Programa Esporte na
Comunidade, realizado em Fortaleza/CE, em 24 de junho de 2006.
89
3.1 Políticas públicas de esporte e lazer no país
Analisar as repercussões dos princípios norteadores da democracia
participativa que se fazem presentes no Programa Esporte na Comunidade (2005-
2008), ao passo que são revertidos à autonomia e à auto-organização social,
implica em compreender a configuração assumida pelas políticas públicas de
esporte e lazer no país. Neste percurso, compreende-se que a institucionalização
do esporte e do lazer como direitos sociais ocupa papel central na consolidação
deste modelo de intervenção governamental que tem o cidadão como sujeito das
ações e decisões pertinentes à coletividade.
“Há cidadãos neste país?”, é um questionamento que faz Santos (1987, p.
7) ao lembrar que o Brasil é um país onde a figura do cidadão é esquecida. Diante
desta situação, o autor esclarece que o “simples nascer investe o sujeito de uma
soma inalienável de direitos, apenas pelo fato de ingressar na sociedade humana
e que a cidadania, sem dúvida, se aprende” e, ao ser aprendida, “se torna um
estado de espírito, enraizado na cultura”. Com isto, Santos revela um problema
inerente à sociedade brasileira, qual seja, o não reconhecimento do ser cidadão, e,
ao mesmo tempo, aponta um caminho à reversão desta situação o qual consiste no
aprendizado da cidadania de modo a torná-la um conhecimento/prática inerente à
cultura. Demo (1995, p. 1), por seu turno, compreende a cidadania como a
compencia humana de fazer-se sujeito, para fazer história própria e
coletivamente organizada”. Assim, ela tem seu cerne na ação humana, na
capacidade de o sujeito constituir-se como um ser social e histórico. Conforme o
pensamento destes autores foi possível apreender que quanto maior o grau de
desenvolvimento da cidadania, maior a possibilidade de expansão dos canais de
participação ativa do cidadão e garantia dos direitos sociais.
90
Em vista disto, vê-se que a cidadania constitui o cerne dos direitos
humanos uma vez que estes podem manifestar-se onde a sociedade se
comporta como sujeito histórico, capaz de discernir e efetivar seu plano de
desenvolvimento (DEMO, 1995).
Reconhecendo a importância da cidadania para os direitos humanos,
afirma-se que uma sociedade deveras cidadã atina para a necessidade de
constituir uma instância pública comum, à qual delega uma série de serviços e
funções, que somente m razão de ser frente aos desafios do bem-estar comum”.
Nesta acepção, o [...] desafio descomunal do Estado é de que seja público (sirva
aos interesses comuns) e de serviço (promova o bem comum), para que seja,
então legítimo, ou, de direito” (Demo, 1995, p. 3, parênteses do autor). Isso posto,
entende-se que a cidadania perpassa a dinâmica social - suas relações e
contradições - e se manifesta na ação dos sujeitos em seu cotidiano e em sua
prática política. Deste modo, a participação dos atores sociais com vistas ao
atendimento de suas necessidades e de seus interesses individuais e coletivos, é
essencial para a existência da cidadania e para o estabelecimento de um Estado
democrático.
No dizer de Poulantzas, citado por Brandão (1997, p. 119), o Estado não é
mais do que uma condensação de uma correlação de forças entre as classes”. Por
sua vez, Pereira (2008, p. 26) esclarece que o Estado não é um fenômeno dado,
aistórico, neutro e pacífico, mas um conjunto de relações criado e recriado num
processo histórico tenso e conflituoso em que grupos, classes ou frações de classe
se confrontam e se digladiam em defesa de seus interesses particulares, por isso
é uma arena de conflitos de interesses”. Ainda em relação ao Estado, a referida
autora coloca que no alicerce de sua construção e desenvolvimento estão
presentes determinações e processos associados aos diferentes modos de
produção dos quais o Estado foi e é parte integrante, os quais, por sua vez, foram
e são determinados por mudanças na estrutura da sociedade e nas relações sociais
91
correspondentes”. Donde se pode chegar à conclusão, por meio de Jacobi, de que
o Estado representado pelo governo é capaz de exercer funções contraditórias,
de acumulação e de legitimidade, para criar as bases de um consenso através da
ação das suas instituições” (JACOBI citado por SUASSUNA et al., 2007, p. 15).
Conforme as discussões que perpassam o significado de Estado, percebe-se
que este é mutável, posto que é permeado por relações sociais nas quais circulam
conflitos e interesses de classe.
No período contemporâneo - pós-segunda guerra mundial - viu-se a
eclosão, em seguida a generalização do Estado-providência cujas missões de
proteção social e de redistribuição dos ganhos parecem mesmo inaugurar uma
nova forma de cidadania. Neste contexto, as políticas sociais como ação do
Estado, além de garantir os direitos sociais, tornaram-se possibilidades concretas
de exercício da cidadania a qual é constituída de direitos e instituições. Além de
ser também, produto de histórias sociais diferenciadas protagonizadas por grupos
sociais diferentes. Por outro lado, o triunfo do neoliberalismo trouxe uma
avassaladora tendência à mercantilização de direitos conquistados pelas classes
populares, ao longo de mais de um século de luta, convertidos agora em “bens”
ou “serviços” adquiridos no mercado (BORON, 1994).
Segundo a Constituição de 1988, art. 6 : são direitos sociais a educação, a
saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção
à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
constituição”. Esta também estabelece em seu art. 217, que é dever do Estado
fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um
[...]”. Guiado pelo referido documento, pode-se afirmar que o esporte e o lazer
são direitos sociais, com garantia efetivada no plano jurídico-formal. No entanto,
é sabido que estes precisam estar pautados na dinâmica social como demanda de
cidadania e, ao mesmo tempo, serem um vínculo social.
92
Neste sentido, Telles (1999) ao analisar as possibilidades, no Brasil atual,
de a cidadania se enraizar nas práticas sociais análise que supõe discutir as
possibilidades, impasses e dilemas da cidadania, pautada na dinâmica social -,
assinala que tal discussão não pode ocorrer sem uma pvia problematização dos
direitos que são percebidos como práticas, discursos e valores que afetam a
maneira como as desigualdades e diferenças são demonstradas na esfera pública,
como os interesses se apresentam e como os conflitos se concretizam. Salienta
tamm, que os direitos inseridos no ponto de vista da sociedade não se
relacionam apenas às garantias formais inscritas nas leis e instituições. Contudo,
não se desconsidera a importância da ordem legal e do aparato institucional que
são asseguradores da cidadania e da democracia.
Segundo essa autora, pela visão da dinâmica societária, os direitos se
referem, antes de qualquer coisa, à maneira como as relações sociais são
estruturadas. Desse modo, os direitos estabelecem um modo de sociabilidade no
qual o sujeito reconhece seus pares como sujeitos de interesses válidos, valores
pertinentes e demandas legítimas. Dito de outro modo:
os direitos operam como princípios reguladores de práticas sociais,
definindo as regras das reciprocidades esperadas na vida em sociedade
através da atribuição mutuamente acordada (e negociada) das
obrigações e responsabilidades, garantias e prerrogativas de cada um.
Como forma de sociabilidade e regra de reciprocidade, os direitos
constroem, portanto, vínculos propriamente civis entre indivíduos
grupos e classes. Melhor dizendo, constroem uma gramática civil que
baliza práticas e interações sociais [...] (idem, 1999, p. 138-139,
parêntese da autora).
Presume-se então que os direitos sociais no contexto societário, além do
sentido utilitário de satisfação das necessidades humanas, neste caso por esporte e
lazer, norteiam as práticas sociais e favorecem a construção de canais de diálogo
que poderiam impulsionar o desenvolvimento da autonomia e auto-organização
93
social. Mas isso tudo é possível por meio de uma cultura pública democrática
que se abra ao reconhecimento da legitimidade dos conflitos e dos direitos
demandados como exigência da cidadania” (ibdem, 1999, p. 139).
Não obstante, torna-se essencial refletir sobre o significado atribuído à
política social posto que métodos distintos implicam em diferentes compreensões
do significado desta. É o caso daqueles que a interpretam sob a ótica do
liberalismo ou do materialismo. Certo disto, Vieira (1992, p. 31) defende o
método materialismo histórico e dialético, porém, adverte que este tem razão
de ser quando as proposições alusivas à potica social não são inertes, muito
menos figuram jargão amolante”. Acrescenta que estas proposições necessitam
proceder de apreciação conseqüente e apoiada no materialismo histórico e
dialético, atendendo a determinado Estado, a determinada classe social, a
determinada ação potica, a alternativas histórias sem equivalência”.
Para Vieira (1992, p. 22), a política social consiste em uma estratégia de
governo que, normalmente, se apresenta sob a forma de relações jurídicas e
políticas, não contendo em si uma definição, bem como não resulta apenas do
despertar do espírito humano”. Ela é uma forma de expressão das relações
sociais cujas raízes se situam no mundo da produção. Desta forma, como coloca o
autor, os projetos, os programas e outros documentos referentes em certo
momento a uma política - setorial ou social/econômica - o se colocam como
totalidade absoluta.
Sob outro ângulo, Sousa (2003, p. 3-4) sublinha que política pública
consiste em um “campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, „colocar o
governo em ão‟ e/ou analisar essa ação e quando necessário, propor mudanças
no rumo ou curso dessas ações”. No entanto, considera-se a noção de Estado em
ação limitada uma vez que não permite diferenciar política de Estado de política
de governo, logo se define de modo focal e não contempla a necessidade de
continuidade das políticas. A política de Estado assume um caráter de
94
continuidade, assim não pertence a nenhum governo, mas ao Estado. Nesta
configuração, ela incorpora uma dimensão mais ampla que se vincula aos
interesses sociais gerais. Convém acrescentar que para o desenvolvimento de
políticas (ações e programas) que tenham a continuidade como característica se
torna necessário estabelecer políticas de Estado (SUASSUNA et al., 2007).
Outro aspecto interessante destacado por Reis (2003) diz respeito ao fato
de que a formulação, implementação ou os resultados da ação política devem
contemplar a alise de situações concretas, com fundamento em problemas
empíricos para possível (des) legitimação da escolha definida. As considerações
da autora contribuem no sentido de permitir a compreensão da realidade na qual a
intervenção ocorrerá que pode servir de subsídio para a definição da ação política.
Isto pode vir a indicar, no texto das políticas voltadas para o setor do esporte e
lazer, a necessidade de apropriação da cultura e das práticas sociais presentes em
cada comunidade, município, estado ou região para a qual a policies incidirá.
Com o sentido de apropriação da cultura, sugere-se aqui a necessária
interpretação da cultura corporal
15
local a fim de entender o “cenário” para a
construção da ação política.
Sob o pano de fundo da cidadania e garantia dos direitos sociais ao esporte
e ao lazer, no momento histórico no qual a democracia norteia o ideário dos
governos democráticos e populares, faz-se alusão à política do governo Lula da
Silva na qual foi instituída a Política Nacional do Esporte (ME, 2005) que
possibilitou uma renovação no pensamento e na prática potica no setor de
esporte e lazer em âmbito nacional.
Sabe-se que o acontecimento supracitado não se efetivou de modo isolado,
isto é, desvinculado das discussões e intervenções políticas vigente no país,
conforme enfatiza Vieira (1992) ao referir-se a constituição da política social.
Desta maneira, Liáo Jr. (2003, p. 45) salienta que o restabelecimento
15
Conceito tratado no Capítulo IV. Coletivo de autores, 2009.
95
democrático no Brasil propiciou condições para que os partidos que compõem o
campo popular passassem a ocupar funções estratégicas de gestão do poder
público, respaldadas pelo sufrágio universal”.
Na esfera federal, chama-se a atenção também para instituição do
Ministério do Esporte
16
que tem como propósito “formular e implementar
políticas públicas inclusivas e de afirmação do esporte e lazer como direitos
sociais dos cidadãos, colaborando para o desenvolvimento nacional e humano”
(doc. final da I Conferência Nacional do Esporte, 2004, p.7). Nesta pasta, foram
criadas a Secretaria Nacional de Esporte Educacional, a Secretaria Nacional de
Desenvolvimento do Esporte e Lazer e a Secretaria Nacional de Esporte de Alto
Rendimento. Como afirma Suassuna et al. (2007, p. 29), [...] a criação de uma
pasta ministerial para tratar do esporte propiciaria a ampliação do debate sobre
esse tema contribuindo para legitimar a discussão e conferindo ao esporte, bem
como ao lazer, um redimensionamento”. Isso quer dizer que esta pasta se propõe
a potencializar as possibilidades de ampliação dos mecanismos de materialização
da democracia participativa ao passo que dá materialidade à Potica Nacional do
Esporte.
Outra ação significativa no âmbito do governo federal sob a égide do
Ministério do Esporte e articulada aos diferentes segmentos sociais e poticos
que atuam no cenário esportivo brasileiro dizem respeito às conferências
nacionais do esporte
17
(2004 e 2006). Por meio delas, objetivava-se tornar o
espaço de debate acerca do esporte e do lazer mais democrático. Essas iniciativas
tamm se consolidaram como espaços de materialização das demandas dos
segmentos sociais envolvidos com o esporte e lazer no país, o que pode vir a
16
Criado pela Medida Provisória 103/2003.
17
I Conferência Nacional de Esporte (2004) que discutiu o tema Esporte, Lazer e
Desenvolvimento Humano” e a II Conferência Nacional de Esporte (2006) que problematizou o
tema “Construindo um Sistema Nacional de Esporte Lazer”.
96
representar um exercício de democracia participativa no âmbito da participação
política neste setor.
Conforme observa Suassuna et al. (2007), as conferências disponibilizaram
subsídios que orientaram a construção das diretrizes e definições da Potica
Nacional do Esporte. Por sua vez, esta política podevir a repercutir, por meio
do princípio da descentralização da gestão das ões federais, no estabelecimento
de programas e ações nos níveis estadual e/ou distrital, municipal, a exemplo do
Programa Esporte na Comunidade, os quais podem ser compreendidos como
importantes espaços para a ampliação da participação da sociedade civil.
No âmbito desse governo, evidencia-se a criação do Programa Segundo
Tempo
18
e do Programa Esporte e Lazer da Cidade
19
. Estes m como uma de
suas diretrizes a auto-organização social em conciliação com o princípio da
democratização da gestão e da participação, sinalizando para a consubstanciação
dos princípios acesso, democratização e participação política no centro de
suas ações. Os programas em questão são vistos como possibilidades para a
efetivação do esporte e do lazer como um direito social e como espaços de
construção democrática por meio dos princípios acesso, democratização que são
materializados na participação política.
No entanto, é conhecido que a possibilidade de concretização da democracia
participativa nos governos democráticos e populares, dos quais o governo Lula da
Silva (2003-2007) é a principal referência, é limitada quando se tem como
18
O programa atua “diretamente como crianças e jovens em situação de vulnerabilidades social,
na prevenção, tanto no âmbito da saúde quanto nas situações de risco e violência. Além disso,
tem possibilitado o acesso ao conhecimento, à cultura, à prática esportiva e ao reforço alimentar,
desenvolvendo os valores mais elevados de auto-estima, confiança e tolerância dos alunos de
escolas blicas e de outras instituições não-governamentais (Política Nacional do Esporte,
2005, p. 29).
19
O programa “volta-se para a consolidação do esporte e lazer como direitos sociais, e portanto,
como potica blica de governo que viabilize e garanta o acesso da população às ações do
esporte e lazer em todos os segmentos criança, adolescentes, jovem, adulto, idoso, bem como
pessoas com deficiência e com necessidades educacionais especiais, numa perspectiva
intergeracional” (idem, 2005, p. 29).
97
referências o governo em sua totalidade e o Estado materializado no aparato legal,
bem como nos serviços públicos garantidores dos direitos sociais, dentre eles: o
direito ao esporte e ao lazer. Neste raciocínio, evidencia-se, nos limites da Política
Nacional do Esporte, na democratização e universalização do acesso ao esporte e
ao lazer” e na “descentralização da gestão das políticas públicas de esporte e
lazer”, a inserção de mecanismos que permitem a legitimação da democracia
participativa nas diferentes instâncias de consulta e deliberação popular sobre as
ações na área do esporte e lazer.
Com fundamento na ideia de descentralização da gestão presente na política
supracitada, os estados, o Distrito Federal e os municípios passam a ter autonomia
frente às políticas de esporte e lazer, determinando os nortes dos programas e
ações a serem desenvolvidas no âmbito do governo local. Nisto reside a
importância de se estudar as ações de esporte e lazer nos municípios brasileiros,
caso específico de Fortaleza/CE, por se tratar de uma política local e por ter como
modelo de administração pública a gestão participativa na qual se observa como
elemento central, o Programa Esporte na Comunidade, cabendo neste contexto
duas observações/registros:
a) o Programa Esporte na Comunidade segue as diretrizes da Política Nacional do
Esporte (ME, 2005), podendo representar um respaldo das políticas federais para o
setor;
b) o Programa Esporte na Comunidade se pauta na descentralização da gestão das
políticas públicas de esporte e lazer;
Dito isto, parte-se para a descrição e alise do Programa Esporte na
Comunidade do município de Fortaleza/CE.
98
3.2 O Programa Esporte na Comunidade
Compreender as repercussões dos princípios “acesso”, democratização” e
participação política”, no quadro das políticas públicas de esporte e lazer, suscita
conhecer os determinantes e aspectos centrais que serviram de subsídios para sua
institucionalização. Nisto consiste a relevância de descrever e analisar o Programa
Esporte na Comunidade
20
. Para tanto, buscou-se, além da consulta aos documentos
Projeto Esporte na Comunidade” (doc. Projeto Esporte na Comunidade),
formulado em 2007 e Para Celebrar a Utopia: avaliação do Programa Esporte na
Comunidade”
21
(SOUSA SOBRINHO et al., 2006), também o registro das falas
do grupo gestor e do grupo dos professores em que o perfil do primeiro é
demarcado por ser fundador/idealizador/executor da política e dos segundos pela
apropriação da proposta pedagógica, conhecimento e interlocução com as
comunidades. Os trechos das falas transcritas serão identificados por entrevista 1 a
10. Ao todo, foram realizadas 10 entrevistas. Estas serão exploradas para análise
em função do interesse sobre o objeto do estudo e a relação com a temática em
desenvolvimento.
O Programa Esporte na Comunidade apresentou dois modelos institucionais.
O primeiro se tratava de um modelo pautado em princípios e práticas voltados ao
esporte de rendimento, que perdurou a 2006. Ao passo que as disputas
partidárias internas se consolidavam e o Partido dos Trabalhadores conquistava a
liderança da lula de Esporte e Lazer, houve um rearranjo (2006-2007) na
concepção do programa que culminou na formulação de um segundo modelo
20
Evidencia-se que não foram encontrados registros jurídico-formais (Lei, decretos, portarias e
outros) de criação do programa. Documentos consultados: Lei Orgânica Municipal, Plano
Plurianual 2006-2009 - este apenas menciona uma demanda denominada esporte comunitário”.
O orçamento inicial do programa era de 700 mil reais, em 2006 (cf. entrevista 5).
21
O texto foi constrdo durante o I Seminário de Avaliação do Programa Esporte na
Comunidade, realizado em Fortaleza/CE, em 24 de junho de 2006.
99
institucional. Neste, o esporte e o lazer foram tratados como demandas sociais que
foram respaldadas pelos princípios de uma gestão democrática e popular.
A pasta de esporte e lazer desde sua criação como lula de Esporte e
Lazer, em 2005 até Secretaria de Esporte e Lazer, em 2008, passou por momentos
de instabilidade e tensão no tocante à concepção de esporte e lazer. Como se pode
evidenciar na fala descrita,
na realidade, de 2005 a 2008, nós vivenciamos um período extremamente complexo, até
mesmo de entendimento do que era esporte e lazer. Pois, as pessoas que comem a
gestão da prefeitura, da prefeita até os assessores mais próximos, não tinham muito
conhecimento da importância de uma potica de esporte, posto que não havia nenhum
quadro político ligado ao esporte que desse esse embasamento a eles. Então, nós vivemos
dentro da prefeitura um processo bem contraditório. Desde políticas antagônicas, uma
que visava à questão do esporte participação, uma coisa bem mais elevada
conceitualmente, e outra que se limitava a distribuir bolas. Mas nesse processo que foi
construído, chegou em 2008 como um processo consolidado realmente de participação
com a criação da secretaria [SECEL]. Então, o nome Secretaria de Esporte e Lazer já deu
o impacto de que seria uma gestão que estaria mais relacionada à participação e
democratização do esporte e lazer. Então, nesse processo interno de disputada e de vários
tencionamentos com relação ao próprio esporte, com a criação da secretaria quem ficou
com ela venceu - vamos dizer assim -, porque centralizou a potica, centralizou a gestão
e a política foi centralizada nessa questão do esporte e lazer (Entrevista 5).
Além da contradição em relação às finalidades das políticas em
desenvolvimento, existia um processo de disputa interna pelo controle da pasta de
esporte e lazer. Somente após a definição da gerencia da lula de Esporte e Lazer
se deu início ao processo de formulação do segundo modelo institucional do
programa a partir da realização do I Seminário de Esporte e Lazer.
100
nós tivemos o impacto violento justamente no primeiro momento quando [...] assume a
gerencia da lula de Esporte e Lazer e no mesmo o [...] assume a coordenação da
Célula de Esporte e Lazer que é ligada a Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
Então essas duas poticas se divergem. [...] quando o [...] veio e me convidou a vir com
ele nós começamos a fazer essas coisas que s víamos na academia como a questão da
formulação, as experiências de outras gestões no campo democrático popular. Então nós
pegamos algumas experiências e começamos a elaborar um planejamento em cima
dessas poticas. No I Seminário de esporte e lazer que nós estruturamos convidamos a
Prefeitura de Recife, a Prefeitura de Caxias do Sul e chamamos pessoas que eram da
Prefeitura de Belém da gestão anterior e a Celi Taffarel. s também chamamos
pessoas tanto da universidade com de gestões para dar um suporte para nós começarmos
nosso processo. Então, nós viemos do embasamento tanto das pessoas daqui como das
experiências desses outros locais (Entrevista 5).
no começo foi muito difícil. Pois, ninguém tinha falado antes em uma perspectiva destas.
Tinha uma experiência em Recife, em Pernambuco, que nós usamos como modelo. Afinal
de contas nós não vamos reinventar a roda. Mesmo porque a possibilidade de estudo era
muito pífia [...]. E eu me baseie no pessoal de Recife com os Círculos Populares [...]. A
idéia era levar uma consciência crítica à população, ou seja, aos participantes e chegar à
comunidade adulta através dos pais, da participação popular mesmo envolvendo os pais, e
tentar levar uma contradição cada vez maior dos limites do setor público, dos limites do
Estado [...] (Entrevista 1).
O segundo modelo institucional foi construído com base nas experiências da
gestão petista, na setorial de esporte e lazer - nome atribuído à pasta no quadro do
Partido dos Trabalhadores - citadas, notadamente, no Programa Círculos Populares
de Esporte e Lazer
22
, assim como no ideário político e no comprometimento com a
perspectiva crítica da Educação sica dos atores sociais que conduziam a potica
em foco na época, no âmbito da Célula de Esporte e Lazer.
nós já vínhamos no processo de construção, o seminário foi o ápice, porque foi que
nós ouvimos também a comunidade que estava com algumas proposta, chamamos os
professores e a partir desse seminário que ocorre em abril , em julho, teve o seminário
22
É o programa âncora da política de esporte e lazer da cidade do Recife e tem como objetivo
principal implantar nas comunidades de baixa renda da cidade, círculos de convivência social que
possibilitem o desenvolvimento de aprendizagens significativas relacionadas à cultura corporal,
esporte e as artes como forma de Educação para o tempo livre (Extrdo do documento
Contribuição do setorial de esporte e lazer do PT-PE para o plano de governo da frente do Recife.
Recife-PE, 2008).
101
interno do Esporte na Comunidade onde ele mudou os seus elementos conceituais,
exatamente porque via-se que uma potica democrática e popular como se propõe a
gestão e uma gestão como nós estávamos nos propondo a fazer de esporte e lazer não
poderia vir com base na formação de atletas. Isso foi um processo que nós fizemos
junto com os professores, que veio com esse processo do seminário. E nós conseguimos
a partir daí começar a mudar os conceitos. Eu lembro que o tema, as diretrizes foram
montadas a partir daí junto com os professores nessa relação de coordenação do
programa, da própria gestão conosco e os professores. A partir daí houve essa mudança
conceitual. Então foi assim a secretaria começou realmente a mudar quando nós
mudamos o Esporte na Comunidade que ainda era o único programa desta pasta [...]
(entrevista 5).
O Programa Esporte na Comunidade, como base em seu segundo modelo
institucional, é orientado pelo questionamento das condições estruturais da
sociedade e pelo papel do Estado frente ao modelo societário vigente e, ao mesmo
tempo, constitui-se como um meio para a materialização da soberania popular na
construção e/ou prática do esporte e lazer a partir do acesso aos conhecimentos
relativos à cultura corporal (doc. Projeto Esporte na Comunidade, 2007).
A Célula de Esporte e Lazer de Fortaleza almejava desenvolver uma
política de esporte e lazer direcionada à classe trabalhadora a partir de práticas
participativas e democráticas que apontassem a transformação social”. Esta classe
social é vista como a mais prejudicada em relação à inacessibilidade aos espaços e
às práticas de esporte e de lazer. Em razão disto, ressalta-se a necessidade de
garantir o acesso às práticas e conhecimento do acervo da cultura corporal à
classe trabalhadora, historicamente expropriada dos direitos sociais”. O público-
alvo do programa consiste em crianças, adolescentes, jovens e adultos (idem,
2007, s/n). Nota-se um comprometimento do programa em relação ao atendimento
das demandas por esporte e lazer dos diferentes atores, em uma perspectiva de
intergeracionalidade na qual se prioriza os atores sociais provenientes da classe
trabalhadora.
102
Os núcleos
23
do programa estão distribuídos conforme seis Secretarias
Executivas Regionais que representam a estrutura geográfica e administrativa do
município de Fortaleza/CE. É importante salientar que no primeiro modelo
institucional do programa, a seleção dos núcleos acontecia com base em
acordos/indicação que eram influenciados por políticos e atores sociais que tinham
algum prestígio perante a gestão da lula de Esporte e Lazer, como mostra o
gestor ao relatar a situação, qual seja,
[...] acontecia das pessoas chegarem à Célula dizendo que queriam um programa para
determinado bairro. Nisso, era vereador exigindo, era fulano exigindo, ou seja, era uma
loucura dentro da gestão. E existia uma pressão sobre a coordenação para que ela
acatasse aquilo de maneira que muitas vezes nós ficávamos sem poder fazer nada, isto é,
de mãos atadas. Era pressão sobre nós (Entrevista 1).
No entanto, ao passo que o grupo gestor responsável pelo segundo modelo
institucional do programa identificou a necessidade de definição de cririos para a
escolha dos núcleos a realidade descrita foi modificada. De maneira que a solução
encontrada
foi a criação de critérios bem claros para que os programas fossem alocados em cada
bairro, em cada local, de modo que se resolvesse o problema de cada um exigindo o seu,
cada um no seu bairro, na sua esquina. Foi deste modo que resolvi a situação, até mesmo
com a gestão da Célula. Fizeram pressão e nós dissemos: não! Tem critérios. Os critérios
eram o IDH
24
, o OP
25
e o Habitafor
26
e por último eram as demandas das comunidades,
elas vinham solicitar, mas era por questão de prioridade (Entrevista 1).
23
Quantitativo encontrado no Projeto Esporte na Comunidade, agosto/2007.
24
Índice de Desenvolvimento Humano da comunidade a ser contemplada com o programa.
25
Demandas do orçamento participativo.
26
Órgão vinculado à Prefeitura de Fortaleza responsável pela concessão de benefícios
domiciliares as comunidade em situação de vulnerabilidade social que residem em locais de
invasão ou áreas de risco.
103
Pelo relato, a implementação dos critérios supracitados não aconteceu de
modo passivo, houve um confronto entre o grupo gestor do programa e a gestão da
Célula de Esporte e Lazer.
As atividades do programa acontecem em espaços públicos (campos,
quadras e praças) existentes na comunidade. Por isso, há uma diversidade no
tocante ao espaço de funcionamento do núcleo conforme a localidade, como
expressam os professores:
estou em um local que é chamado de quadra, mas, não é, é um campo de
areia. [...] quando chove alaga, aí quando acontece isto você não consegue fazer as
atividades, você tem que criar outra situação na calçada onde o pedestre passa [...]
(Entrevista 6).
o nosso espaço de funcionamento é o campo do palito, que fica na parte inferior da
comunidade e o campo da associação que fica na parte alta. Também tem a sala da
ginástica que funcionava na antiga cooperativa e agora mudou para o centro comunitário.
E agora nós vamos mudar para o campo novo da Rosalina (Entrevista 7).
nas calçadas, nas residências - para os meninos terem acesso a água. Na pizzaria, padaria,
onde dá a gente senta, faz uma roda e planeja (Entrevista 8).
temos o Campo do Ceará Mirim, mesmo porque o tem outro espaço [...]. Das
escolas, para não dizer que nós nunca usufruímos tem a Escola Prof. Joaquim Francisco
onde nós já fizemos vários eventos lá (Entrevista 9).
nós temos o campo society e a quadra. [...] para formação e capacitação, e alguma outra
atividade dentro da comunidade nós usamos a creche, a igreja e a escola (Entrevista 10).
Pelo que foi relatado pelos professores, pode-se perceber que as atividades
do programa acontecem em campos e outros locais, tais como: calçadas, na sede da
cooperativa, na igreja, em escolas e creches. O espaço da quadra é utilizado em
apenas um núcleo investigado.
O acompanhamento das atividades é feito por um (01) supervisor e quatro
(04) auxiliares técnicos que são responsáveis pela orientação pedagógica dos
104
professores e pela interlocução com as comunidades. Estes recebem auxílio dos
regionais, que atuam nas secretarias executivas regionais, realizando visitas de
reconhecimento dos bairros e construindo uma relação de aproximação com as
lideranças comunitárias. E dos agentes comunitários que atuam junto com o
professor na mobilização e articulação da comunidade.
Consoante o documento Projeto Esporte na Comunidade (2007), o programa
tem como finalidades primordiais:
(a) garantir e democratizar o acesso ao esporte e ao lazer como direito
social por meio do conhecimento de temas da cultura corporal, através
de uma práxis pedagógica contextualizada de modo que a comunidade
possa ter novos elementos para a compreensão e reflexão da realidade
social.
(b) potencializar a construção participativa das ações do programa em
conjunto com a comunidade entendendo-a enquanto soberana na
determinação das formas de instalação dos instrumentos de lazer e no
acompanhamento das atividades desenvolvidas.
Logo, admite-se que o programa contempla em seus aspectos centrais a
questão da garantia e democratização do acesso ao esporte e ao lazer. Para isto,
faz-se uso do acervo de conhecimentos da cultura corporal que atrelado a uma
práxis pedagógica, permite a leitura da dimensão social da realidade pelos atores
sociais das comunidades. Além disto, compreende a construção participativa como
elemento integrador Secretaria de Esporte e Lazer-comunidade, respeitando a
soberania popular nas decisões pertinentes à construção dos espaços e
equipamentos de lazer, assim como, na supervisão das ações realizadas.
Ao levar em consideração a concepção da política em foco, traçada pela
gestão, lança-se mão da compreensão de esporte e lazer construída pelos
professores, quais sejam:
eu vejo o esporte e lazer dentro da comunidade com uma força para a libertação do
conhecimento. Por quê? Porque na realidade se entende o esporte somente no jogo da
competão no jogo da individualidade e o esporte e o lazer estão fundamentados em
uma vertente crítico-superada, fazendo com que o aluno se identifique não somente com o
105
programa, mas também com a realidade cultural dele, com o que ele vivencia no dia a dia
(Entrevista 6).
entendo como um beneficio que é dado por direito à comunidade, que é cedido pela
SECEL neste caso. E que é um direito das pessoas daquele local [...]. Então eu
compreendo toda essa parte de esporte e lazer como um beneficio de direito do cidadão
[...] (Entrevista 7).
[...] é a questão da participação do povo no espaço do lazer, a participação das camadas
populares, como no lazer à noite, com o objetivo de sair do ócio quando eles estão sem
fazer nada. Então um dos princípios é tentar levar o povo para esse momento de lazer no
tempo livre e à noite (Entrevista 8).
no programa o esporte e o lazer aqui na comunidade são muito determinantes. [...] a
concepção de esporte e lazer do programa é que o menino tenha acesso, que o esporte e
o lazer são direitos e que são fatores determinantes para o próprio desenvolvimento da
criança. E no nosso caso em que há questões políticas envolvidas, como na questão do
campo onde nem todo mundo tem acesso ao espaço, também trabalhar mais a
democratização dos espaços públicos, o direito da população de usufruir do espaço
público [...] (Entrevista 9).
Eu compreendo o esporte como uma forma de se trabalhar em grupo, uma forma de
união. E o lazer é aquela coisa “irresponsável”, sem muito compromisso, sem muita
cobrança. Esse é o lazer que para mim deve acontecer, você participasse sem
compromisso, sem responsabilidade (Entrevista 10).
Percebe-se que a compreensão de esporte e lazer, apontada pelos
professores, fundamenta-se na oportunidade de construção/ampliação de
conhecimento, na noção de direito social e na ocupação do tempo livre. O
professor (entrevista 10) percebe o esporte como um meio para o desenvolvimento
do trabalho em grupo, culminando com a união do mesmo, ao passo que vê o lazer
como um momento de diversão/descontração. Tal apreensão do esporte e do lazer
sugere que haveria um momento na aula destinado ao desenvolvimento do esporte
e outro ao lazer.
106
Em seguida, destaca-se a relação entre esporte, lazer e direito social também
com base na percepção dos professores:
no momento que falo que compreendo como um direito do cidadão eu compreendo que
esse direito é comum, então tanto as camadas inferiores como as mais abastadas da
sociedade tem direito a ele. Mas você o vai ver na pracinha do Conjunto Esperança ou
da Rosalina um rico fazendo cooper ou qualquer esporte. Nesta linha de raciocínio, ele é
mais direcionado para as comunidades que não tem tanta estrutura, que não tem tanto
conhecimento, é algo que permeia todo o desenvolvimento mesmo dessas camadas
sociais [...]. Então eu compreendo com um benefício que deve ser tratado com forma de
luta de cada um, cada um tem que reivindicar esse direito (Entrevista 7).
diverge um pouco esporte, lazer e direito social. Porque é muito simples você sentado
contratar vários professores para trabalhar lazer, trabalhar esporte, trabalhar a questão da
inclusão, mas, ao mesmo tempo, não oferecer os recursos. Diante do contexto, não se tem
estrutura, a fundamentação deixa a desejar [...] (Entrevista 8).
[...] essa relação do esporte e do lazer com o direito social quer dizer que estes têm que
ser direito de todos independente do menino ser o que for. [...] a minha concepção de
esporte e lazer é de que eles o direitos. E por meio desses direitos pode-se ir atrás de
outros direitos com o direito a educação, o direito a saúde, tudo isso (Entrevista 9).
eu compreendo com uma forma de oportunizar as pessoas da comunidade a terem lazer, é
fazer com que esse direito chegue até elas (Entrevista 10).
O direito social ao esporte e ao lazer é tratado como um benecio vinculado,
prioritariamente, às camadas menos abastadas da população, no caso as
comunidades beneficiadas pelo programa. Diz-se ainda que esse direito precisa ser
reconhecido e reivindicado pelos participantes de maneira direta. Afora isto, o
esporte e o lazer são percebidos como direito de todos, sem restrições definidas
pelas condições sócio-econômicas dos participantes, podendo também ser um
meio para a obtenção de outros direitos, dentre eles: educação e saúde. O professor
(entrevista 8) tece uma crítica a estrutura e aos recursos oferecidos pela gestão do
programa os quais seriam um obstáculo à consolidação do direito social ao esporte
e ao lazer.
107
Haja vista a importância da apreensão da proposta da intervenção
governamental em foco, por parte da comunidade atendida, questionou-se o grupo
gestor sobre como a comunidade compreende a proposta do programa e obteve-se
como resposta isto:
[...] quando nós chegamos eles querem que ajeitemos a quadra, querem que
disponibilizemos 50 bolas, 50 coletes e criemos uma escolinha. O que eles querem é isso
[...]. Quando eles entendem essa proposta [a do programa] nós temos algumas
experiências interessantes de visualizar que é possível o esporte e lazer na praça [...] então
nós temos algumas coisas no sentido da comunidade perceber que a proposta o é uma
coisa de outro mundo”, é uma proposta pedagógica, os professores elevam essa fala e aí
levam a questão do termo educação. O professor diz: oh aqui também tem uma relação
com a educação [...]. E os pais quando ouvem isso, de certa forma dão credibilidade,
principalmente quando se trata de crianças e jovens. Eles dizem: não, o professor não
dá só a bola não, ele traz temas, ele conversa com os meninos [...] (Entrevista 2).
Nesta exposição, é possível identificar que há uma apropriação da proposta
do programa por parte de algumas comunidades que no início percebiam-no como
uma escolhinha de esporte. Suscita-se que isto poderá ter ocorrido em razão do
primeiro modelo institucional do programa estar voltado ao esporte de rendimento.
Em concordância com o exposto anteriormente no tocante às finalidades
primordiais do programa, ratifica-se que este prima pelo acesso ao esporte e ao
lazer.Além de incorporar a questão da apropriação do conhecimento da cultura
corporal, tendo em vista a interpretação da realidade social. Concomitantemente,
adota a construção participativa como estratégia para o desenvolvimento de ações,
por meio do diálogo entre gestão e comunidade atendida, compreendendo esta
como soberana em seu tempo/espaço de lazer. Ademais, este documento
estabelece que o programa pretende:
108
I. Oferecer novos elementos para a compreensão e reflexão social em
que se insere a comunidade através da prática contextualizada da
cultural corporal.
II. Problematizar a prática pedagica do esporte na comunidade junto
às comunidades com temas que elucidem “conceitos-chave” da cultura
corporal e da sociedade;
III. Problematizar os valores do esporte de competição, pretendendo
construir outras possibilidades de abordar o esporte, pautados na
participação, criatividade, autonomia e cooperação.
IV. Construir com a comunidade espaços de conscientização potica e
deliberativos sobre as ações dos programas como assembléias e
conselhos comunitários.
V. Mobilizar as representatividades comunitárias para o
acompanhamento e construção dos espaços de construção coletiva.
Segundo os itens I e II, a cultura corporal é colocada como conhecimento a
ser tratado pedagogicamente com base na leitura e interpretação da realidade
social. No item III, destaca-se a ênfase nas reflexões acerca dos valores do esporte
de rendimento e das alternativas de abordagem e superação da perspectiva
hegemônica. No item IV, a possibilidade de construção de espaços e/ou ações
participativas protagonizadas pela comunidade. No item V, o estímulo à
mobilização comunitária com vista à realização de ões coletivas. Registra-se,
portanto, uma preocupação com o conhecimento inerente à área da Educação
sica, focalizada na cultura corporal e na interconexão deste com
questões/demandas sociais que perpassam o tempo/espaço cotidiano das atividades
do programa, mas que podem ser problematizadas, articuladas e ressignificadas
nele.
Neste, o esporte, por seu turno, é tratado como um fenômeno universal e
hegemônico da humanidade que se apresenta como manifestação da cultura
corporal construída historicamente por homens e mulheres os quais o
consolidaram como direito social (idem, 2007). Segundo o Coletivo de Autores
(2009, p. 39), na perspectiva de reflexão sobre a cultura corporal, busca-se:
109
desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de
representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da
história, exteriorizadas pela expressão corporal: jogo, danças, lutas,
exercícios ginásticos esporte, malabarismo, contorcionismo, mímica e
outros, que podem ser identificados como formas de representação
simbólica de realidade vividas pelo homem, historicamente criadas e
culturalmente desenvolvidas.
Consoante os autores, o esporte pode ser utilizado como um mecanismo de
leitura e interpretação da realidade social conforme o contexto e a percepção dos
atores sociais envolvidos em sua prática. Neste sentido, o homem se apropria da
cultura corporal com intenção lúdica, agostica, estética ou outras, que se
configuram como representações, idéias e conceitos elaborados pelas
„significações objetivas‟. E, a partir delas, ele desenvolve um sentido pessoal‟
que expressa sua subjetividade e vincula as significações objetivas com seu
contexto de vida, com seu mundo e com suas motivações (idem, 2009).
Desta maneira, destaca-se que o esporte participação
no programa é tratado
como proposta chave das ações. Por meio dele, visa-se tematizar o esporte
voltado às camadas populares como prática inclusiva no sentido de que qualquer
sujeito possa estar inserido nas atividades, independentemente, de suas
capacidades para realização de determinada prática esportiva (doc. Projeto
Esporte na Comunidade, 2007).
O esporte participação/comunitário ou de lazer foi instituído no governo
José Sarney (1985) e é amplamente aceito no cenário esportivo e nos documentos
oficiais referentes ao esporte brasileiro, a exemplo da Constituição Federal de
1988. Ele é vivenciado de modo voluntário e compreende as modalidades
desenvolvidas com o propósito de contribuir para a integração dos participantes
na totalidade da vida social, na promoção da saúde e da educação e na
preservação do meio ambiente (Lei Zico, Lei 8.672/1993, Cap. III, art. 3 ).
De fato, como observa Bracht (2005, p. 15), o conceito de esporte parece
precisar dar conta de atividades que, pelo seu grau de diferenciação, estão a exigir
110
adjetivações do tipo: esporte de alto rendimento ou de rendimento, esporte de
lazer, esporte educativo [...]”. Levando-se em consideração as palavras deste
autor, pode-se compreender que tais adjetivações parecem dar legitimidade ao
objetivo pretendido no uso do esporte. Consoante tal premissa, é possível proferir
que, no âmbito do Programa Esporte na Comunidade, o esporte é tomado por um
conjunto de interesses característicos do governo municipal de Fortaleza/CE
representado pelos atores sociais que detêm o domínio das ações no quadro da
Secretaria de Esporte e Lazer.
Logo, presume-se que a atenção atribuída ao esporte se deve ao fato de que
ele é em praticamente todas as sociedades, uma das práticas sociais que reúne a
unanimidade quanto a sua legitimidade social”. Daí a razão de também ser tratado
como um campo de disputa política e ideológica no âmbito do governo
mencionado (idem, 2005, p. 10).
Como se pôde observar, a perspectiva de esporte contemplada pelo
programa é estruturada no tempo/espaço do lazer. Todavia, o documento
orientador do mesmo não propõe de maneira categórica uma concepção de lazer
que norteia suas ações. Contudo, os relatos apontam para uma concepção de lazer
defendida pelo grupo gestor envolvido diretamente com o programa, como se
pode observar:
[...] em relação ao lazer, penso que é mesmo o Marcelino, posto que é o autor que as
pessoas daqui de certa forma se aproximam mais [...]. No caso do Marcelino foi por
afinidade de algumas pessoas que o trouxeram, ou seja, algumas pessoas que tinham
afinidade apresentaram, da mesma forma como, por exemplo, o referencial que diz tudo
aqui em questão de estudo que eram os encontros intersetoriais em que nós em alguns
momentos fazíamos estudo de textos, apresentávamos textos [...]. Mas já estudamos
também o Dumazedier, que também foi apresentado, alguns falaram que tinha
estudado na Educação Física e quiseram apresentá-lo ressaltando que ele traz uma
concepção de lazer que extrapola a relação tempo/trabalho, não sei [...]. Mas de adotar o
referencial para lazer eu desconheço, assim de adotar como refencia (Entrevista 2).
Essa fala evidencia as contribuições de Marcelino e de Dumazedier para a
discussão acerca do lazer nos encontros intersetoriais que ocorriam no contexto
111
da Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza. Todavia, como ressalta o gestor,
não havia um referencial de lazer para o programa.
Quanto às contribuições dos teóricos do lazer, diz-se que para Dumazedier
(2000, p. 34)
o lazer é um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-
se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se
e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação
desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre
capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações
profissionais, familiares e sociais.
-se que esta construção teórica não contempla a dimensão do lazer
problematizado/contextualizado no sentido de possibilitar o desenvolvimento de
uma consciência crítica por parte dos atores sociais das comunidades em relação à
reflexão e compreensão de sua realidade social como determina a proposta do
programa. Além disto, norteado pela autonomia e auto-organização social, o
conceito tratado não contempla a soberania popular na construção e prática do
esporte e lazer posto que a participação, caracterizada como participação social,
tem cunho livre e pertence a vontade de cada um. Logo, não uma vontade
geral, como também não existe um espaço comum no qual conflitos e consensos
são apresentados por meio da interlocução entre os atores sociais envolvidos.
Por seu turno, Marcelino (2004, p. 27) compreender o lazer como
um conjunto de atividades gratuitas, prazerosas, voluntárias e
liberatórias, centradas em interesses culturais, físicos, manuais,
intelectuais, artísticos e associativos, realizado num tempo livre
roubado ou conquistado historicamente sobre a jornada de trabalho
profissional e doméstico e que interferem no desenvolvimento pessoal
e social dos indivíduos.
Observa-se que, em Marcelino, também não está posta a dimensão da
problematizadora/contextualizadora do lazer no sentido de elevar o nível crítico
112
dos atores sociais das comunidades em relação à reflexão e compreensão de sua
realidade, considerando seus determinantes históricos e sociais.
Diante da situação de indefinição acerca da concepção de lazer do
programa, questiona-se: como garantir o acesso ao lazer como direito social sem
ter uma definição precisa sobre este fenômeno”? Deste modo, conjectura-se a
necessidade de definição de uma concepção de lazer que dialogue com a proposta
que fundamenta o programa e que, concomitantemente, dialogue com a
concepção de esporte adotada. Ou seja, uma concepção de lazer que permita a
apreensão da realidade social a partir de uma prática contextualizada.
Nesta acepção, faz referência a Mascarenhas (2005) que defende o lazer
como um fenômeno articulado com participação, cidadania e transformação
social e o conceitua como:
fenômeno tipicamente moderno resultante das tensões entre capital e
trabalho, que se materializa como um tempo e espaço de vivências
lúdicas, lugar de organização da cultura, perpassado por relações de
hegemonia.
Com base neste conceito, observa-se que o autor dialoga com Castellani
Filho (2007, p. 9) ao expressar que: quando digo que o esporte e o lazer são
entendidos como práticas sociais quero dizer que eles se traduzem como
atividades humanas construídas historicamente com a intenção de dar respostas às
necessidades sociais, identificadas pelos que fazem a história do seu tempo a
partir das múltiplas determinações das condições neles presentes”. Então, pode-se
afirmar que a partir de tais autores, o esporte e o lazer, singulares em cada
momento histórico, configuram-se como práticas sociais atentas às mudanças e
contradições presentes na sociedade e, ao mesmo tempo, articulam-se com as
diferentes instituições, movimentos e atores existentes na dinâmica social.
É importante esclarecer que a problemática pautada na questão do esporte e
do lazer, inseridos no programa, não consiste no eixo central da discussão que se
113
estabelece. Todavia, sabe-se que a apropriação do caráter teórico-conceitual
destes é necessária no estudo para a compreensão da participação popular como
prática que tem suas primeiras manifestações nas ações/intervenções educativas.
A proposta pedagógica do programa é traçada na leitura e interpretação da
realidade social das comunidades, com vistas à apreensão dos determinantes
estruturais e históricos de formação da sociedade, a partir de práticas
problematizadoras orientadas pela pedagogia crítico-superadora (doc. Projeto
Esporte na Comunidade, 2007). Sobre isto, Sousa Sobrinho et al. (2006, p. 4)
discorre que [...] a prática pedagica do Programa Esporte na Comunidade se
define ao lado da classe trabalhadora. Aponta para uma ação educativa na área de
esporte e lazer comprometida com o projeto histórico da classe trabalhadora, que
corresponde à conquista de uma sociedade sem classes sociais”. Para tanto, a
pedagogia da Educação Física que contemplaria a proposta aludida seria a crítico-
superadora construída pelo Coletivo de Autores (2003). Neste sentido, o grupo
gestor assevera que:
crítico-superadora com certeza, a histórico-crítico, a idéia era essa [...], a idéia era a
cultura corporal, trabalhar com o conceito de cultura corporal, nosso objeto o é o
esporte, nosso objeto era a cultura corporal (Entrevista 1).
[...] a referência que eu tenho de metodologia da Educação Física é o Metodologia do
Ensino da Educação Física - Coletivo de Autores. E na hora que eu disse isso ele já fez
assim [...], porque até então era essa a proposta que se tinha como referencial de ensino
da Educação Física [...] (Entrevista 2).
[...] cultura corporal - que é a abordagem pedagógica a ser adotada na comunidade. E a
questão da implementação da política pública com base na participação popular, a questão
da democratização, a questão do acesso ao direito de fazer/realizar atividades de lazer e
esportivas nos equipamentos públicos. Na perspectiva de que seja um processo em que a
comunidade possa construir junto com a potica pública. (Entrevista 3).
114
[...] então o que guia realmente é a cultura corporal, nessa perspectiva - vamos dizer - um
pouco mais radical do esporte e lazer [...]. Nós pensamos assim: vamos democratizar e
dar o acesso garantindo um direito que está na constituição, mas para isto temos que levar
o nimo de conhecimento, para que essas pessoas possam se apropriar realmente do que
seja esse esporte e lazer. Caso contrário, seria mais um esporte e lazer como todos os
acessos têm, mas que o teria a questão mesmo do conhecimento [...] Então está
relacionado mesmo a cultura corporal, levar o conhecimento da cultura corporal onde eles
[a comunidade] possam trabalhar a cultural corporal enquanto elemento de conhecimento,
enquanto elemento que nós possamos está trabalhando em relação ao esporte e lazer [...]
(Entrevista 4).
Visto isto, a pedagogia crítico-superadora da Educação sica é por
definição o eixo orientador das ões no programa. Esta pedagogia tem como
objeto de conhecimento a cultura corporal. Com efeito, nota-se nas duas últimas
falas a presença da participação popular como mecanismo que possibilitaria uma
aproximação entre governo e comunidade na perspectiva de construção de espaços
democrático-participativos nos quais a cultura corporal pudesse ser apropriada.
Neste modelo de intervenção pedagógica, a metodologia e os conteúdos são
organizados de modo a promover a compreensão do caráter histórico da sociedade,
contextualizando-se os temas da cultura corporal no processo educativo. Logo,
evidencia-se o papel essencial do professor em relação ao tratamento atribuído aos
conteúdos de ensino e as suas abordagens didático-metodológicas inerentes à
praxis pedagógica. Busca-se nas aulas dar significado à prática em uma relação
constante de troca desenvolvida nas atividades, de maneira que o conteúdo seja
assimilado e ressignificado (doc. Projeto Esporte na Comunidade, 2007).
O programa propõe uma reflexão crítica que possibilite ao ator social
questionar a sua prática e elevar o seu nível de consciência para legitimar uma
perspectiva de esporte e lazer que prime pela participação de todos de forma
igualitária. Neste ideário, o jogo e a competição são vistos apenas como mais um
conteúdo do esporte e não como o principal objetivo da aula. O diálogo se
configura como elemento fundamental no processo ensino-aprendizagem. Parte-se
115
do pressuposto de que a prática pedagógica é um ato político. Desta forma, faz-se
necessária a formação de insncias de participação popular por meio de
assembléias e comissões comunitárias de esporte e lazer em que a comunidade
possa expor suas demandas em esporte e lazer e decidir questões relativas ao
núcleo do programa (idem, 2007).
Segundo o Projeto Esporte na Comunidade (2007), sob a lógica do direito, o
Estado tem o dever de garantir à população o acesso às manifestações esportivas.
Desse modo, entende-se que um compromisso por parte do programa com a
garantia do direito social ao esporte e lazer às comunidades atendidas. Conquanto,
reafirma-se que esta garantia não está respaldada por uma potica maior que
contemple as ações do setor no município, ou seja, não um determinante em
termos jurídico-legal que assegure que este preceito se materialize no cotidiano do
programa.
Mediante o marco teórico e a proposta do programa se perguntou: como se
consolidam as intervenções nas comunidades? O grupo gestor declarou que
é a partir da participação popular [...] Nós começamos em 2006 com umas 10 e, em
2007, quase todos os núcleos fizeram assembléia. Então era uma estratégia que nós
sempre pensávamos para a implantação de núcleo. Primeiro para a comunidade saber: o
que é, por que é, para que veio; e, segundo, para nós sabermos se eles queriam o
programa [...]. Primeiro entramos em contato com o der comunitário [...] nós entramos
em contato com essa pessoa referência, que então chama uma reunião com a comunidade
ou nós participamos da reunião da associação, daí explicamos o que é o programa, o que
é a secretaria, o que viemos fazer [...] (Entrevista 4).
Nota-se que as intervenções nas localidades aconteciam inicialmente por
meio de assembléias e reuniões comunitárias que se configuravam como
estratégias para a implementação dos núcleos. Nelas, era estabelecida uma
interlocução com a comunidade pautada em assuntos referentes à infraestrutura e
ao funcionamento do núcleo, aos eixos norteadores, aos conceitos e à concepção
116
do programa. Também, era realizada uma consulta a comunidade no que tange à
aceitação ou não da potica. A mobilização da comunidade era feita a partir do
contato com a liderança comunitária.
Quanto à interlocução do programa com outra política municipal, os
professores assinalam o seguinte:
[...] o que eu conheço de ação da prefeitura é o Habitafor que é responsável pela
construção das casas do Conjunto Habitacional da Rosalina, isso tem um lado positivo
que a construção da casa daquele povo e também a questão de empregar pessoas da
comunidade como pedreiro, auxiliar de pedreiro, que eu acho isso uma coisa boa. E
também tem o Projeto Rua da Criança
27
[projeto de lazer da SECEL] que nós já levamos
para lá duas vezes. Enfim, tem esse tipo de apoio, mas outras intervenções grandes não
(Entrevista 6).
Nós estamos atuando no CRAS [Centro de Referência da Assistência Social] que é uma
ação social voltada para o público com necessidade, ele serve mais como apoio de cesta
básica. Também estamos atuando com os recicladores. Além disto, nós acompanhamos
as ações relacionadas à cultura. Quer dizer, nós conseguimos expandir na questão social,
cultural e artística (Entrevista 7).
o único programa que tem além do Esporte na Comunidade é o Programa Academia na
Comunidade. Mas os nossos horários não coincidiam [dos professores]. Teve uma época
em que o Academia na Comunidade estava com um número o muito bom de pessoas
freqüentando então nos fizemos uma parceria para fazer uma caminhada para chamar as
pessoas a participar e para divulgar o programa, mas não houve mais nada além disso
(Entrevista 9).
torno a dizer que isso depende muito da gente, do professor [...]. A área de atuação
mesmo do núcleo da Serrinha é muito pouca. Eu penso que esse projeto ainda está
existindo devido aos atores pais, professora e alunos, porque em relação a apoio [...]
(Entrevista 8).
27
O Projeto Rua da Criança leva lazer às ruas da cidade, através de brincadeiras, palhaços,
oficinas, pintura de rosto e apresentações teatrais. É voltada para crianças e adolescentes de
bairros da periferia que apresentam um baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Todo
sábado o programa visita uma comunidade de Fortaleza. (Prefeitura Municipal de Fortaleza,
2010).
117
Enquanto se evidencia em um núcleo a exisncia de uma potica
habitacional que propiciaria um emprego para as pessoas da comunidade e de uma
política de lazer itinerante; em outro, a atuação em conjunto com o CRAS e o
grupo de recicladores, bem como a proximidade com as ações realizadas no
âmbito da cultura e, no outro, a realização de uma ação conjunta com outro
programa da SECEL, no caso o Programa Academia na Comunidade. Na última
fala se verifica que não existe uma interlocução entre o Programa Esporte na
Comunidade e outra política municipal. Pelo exposto, pode-se perceber que fica a
critério do professor optar ou não pela atuação e proximidade com outra
intervenção municipal.
Em síntese, o Programa Esporte na Comunidade (segundo modelo
institucional) contempla, em seus aspectos centrais, a questão da garantia e
democratização do acesso ao esporte e ao lazer, por meio do acervo de
conhecimento da cultura corporal que atrelado a uma práxis pedagógica crítica
permita a leitura da dimensão social da realidade pelos atores sociais, e
compreenda a construção participativa como elemento integrador governo-
comunidade, respeitando a soberania popular nas decisões pertinentes ao esporte e
lazer nas comunidades. As assembléias comunitárias são utilizadas como
estratégia para aproximação, reconhecimento e identificação das lideranças locais,
nestas o grupo gestor do programa discute com a comunidade questões que se
remete à infraestrutura do programa e funcionamento dos núcleos e também
aspectos relacionados aos eixos norteadores, conceitos e concepções da
intervenção governamental em foco. Quanto à interlocução do programa com
outras políticas, esta fica a critérios dos professores responsáveis pelos núcleos.
Em seguida, apresenta-se o quadro analítico-descritivo da população
investigada e a análise das repercussões da democracia participativa considerando-
se os princípios “acesso”, “democratização” e “participação potica”.
118
CAPÍTULO IV
NORDESTINO SIM, NORDESTINADO NÃO!
“Nunca diga nordestino
que Deus lhe deu o destino
causador do padecer
nunca diga que o pecado
que lhe deixa fracassado
sem condição de viver.
Não guarde no pensamento
que estamos no sofrimento
é pagando o que devemos
A Providência Divina
não nos deu a triste sina
de sofrer o que sofremos.
Deus, o autor da criação
nos dotou com a razão
bem livres de preconceitos
mas os ingratos da terra
com opressão e com guerra
negam os nossos direitos.
Não é Deus que nos castiga
nem a seca que obriga
sofrermos dura sentença
não somos nordestinados
nós somos injustiçados
tratados com indiferença.
Sofremos em nossa vida
uma batalha renida
do irmão contra o irmão
nós somos injustiçados nordestinos explorados,
nordestinados, não ”.
(Patativa do Assaré, 2001)
119
Em alusão ao poeta cearense Patativa do Assaré se diz: “nordestino sim,
nordestinado não”! O poeta, por meio de sua arte retrata a condição do povo
nordestino diante da desigualdade social imanente no país a qual foi evidenciada
tamm por Pochmann et al. (2003) ao fazer uso da expressão abaixo e acima
do trópico”. Justifica-se o enredo por compreender-se que para analisar uma
política pública de esporte e lazer, é necessário identificar as marcas que ela
carrega, ou seja, o país, o lugar e o povo que a faz-desfaz. Neste exercício e, ao
mesmo tempo, aprendizado, inicia-se com a apresentação do quadro analítico-
descrito dos atores sociais atendidos pelo Programa Esporte na Comunidade e se
conclui com uma discussão sobre a democracia participativa e suas repercussões
na intervenção governamental em questão, com destaque para os princípios
acesso”, “democratização” eparticipação política”.
Mais especificamente, reporta-se ao quadro analítico-descritivo da
população investigada com o intuito de caracterizá-la. Inicialmente, é feita uma
descrição das cinco comunidades investigadas, quais sejam: Planalto Universo,
Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II; considerando a dinâmica
social e sua singularidade em cada núcleo. Posteriormente, evidencia-se o perfil
dos participantes do programa, levando-se em consideração a amostra da
população por sexo e por idade, o estado civil, a situação em relação ao estudo e a
condição de moradia; o tipo de trabalho dos pais, e renda; com destaque para
ocupação do pai e da mãe, tipo de moradia, renda mensal da família, número de
pessoas que moram nas residências dos sujeitos e número de pessoas que
trabalham por residência; bem como, a participação da comunidade. Os aspectos
levados em conta foram: (a) conhecimento, tempo e frequência nas atividades, (b)
esporte e/ou prática corporal e suas dimensões - motivos que justificam a
participação no esporte e/ou prática corporal e os objetivos da participação no
programa - e (c) participação da comunidade - indicador de pessoas na família
envolvidas no programa, participação em outras atividades do programa e
120
participação em outras políticas de esporte e lazer. Finaliza-se com uma síntese
do quadro analítico-descritivo constrdo com base nos resultados obtidos com a
aplicação da estatística descritiva que teve como suporte o Programa
Computacional SPSS versão 15.0 para o windows.
Na sequência, apresenta-se a discussão sobre a repercussão dos princípios
acesso”, democratização” e participação política” no Programa Esporte na
Comunidade. Na elaboração deste, fez-se uso dos documentos Projeto Esporte
na Comunidade” (2007), Para Celebrar a Utopia: avaliação do Programa Esporte
na Comunidade (SOUSA SOBRINHO et al., 2006)” e “Programa Esporte na
Comunidade: participação popular e análise do diagnóstico dos cleos”
(CUNHA et al., 2009), além do quadro teórico construído e dos registros das
falas dos atores sociais e institucionais.
4.1 Quadro analítico-descritivo da população investigada
Neste quadro, pretende-se apresentar as comunidades investigadas e
caracterizar a população atendida pelo programa - descrição dos sujeitos e do
perfil socioeconômico, e da participação da comunidade. Para tanto, fez-se uso da
obra “Atlas da Exclusão social no Brasil”, de Pochmann et. al. (2003). Buscou-
se articular os resultados da estatística descritiva com os indicadores sociais no
contexto brasileiro apresentado pelo autor. Por sua vez, na discussão acerca das
dimensões do esporte presente no programa é estabelecido um dlogo com
Bracht (2005), Castellani Filho (2007) e Mascarenhas (2003).
Os resultados foram elaborados com base nos dados obtidos por meio da
aplicação do questionário: (1) perfil socioeconômico, caracterização da população
atendida e participação no programa (ver apêndice 1); o qual foi aplicado com os
121
participantes (um dos grupos envolvidos na pesquisa). Evidencia-se, ainda, que os
resultados são apresentados conforme indicação dos questionamentos abordados e
das representações gráficas.
4.1.1 Comunidades investigadas
Neste momento é feita uma descrição das cinco comunidades investigadas
com base nas informações obtidas no documento Fortaleza em Números 2004”,
no “site da Prefeitura Municipal de Fortaleza e nos diários de campo. É
oportuno salientar que em cada núcleo as informações pertinentes as observações
são tomadas de modo diferente, porquanto não se pretendeu homogeneizá-las
posto que se tinha como finalidade observar a dinâmica social em sua
singularidade, tomando-se por base aquilo que caracterizava a comunidade. Ou
seja, o modo de vida dos atores sociais, a percepção deles sobre a comunidade e
sua problemática, as relações sociais, para compreender como isso tudo se refletia
no programa compreensão, apropriação, repercussão. Nesta abordagem, as falas
dos professores aparecem como informações verbais, obtidas nos diálogos com
eles, nas visitas aoscleos.
122
(1) Comunidade Planalto Universo
Figura 8 - O cenário cotidiano da comunidade Planalto Universo
Fonte: Própria.
Formada seis anos, a comunidade Planalto Universo se configura como
um conjunto habitacional popular construído pela Prefeitura de Fortaleza para
beneficiar famílias que residiam em áreas de risco às margens da Lagoa do Opaía,
no bairro Vila União e outras que moravam na comunidade Maravilha, zona de
ocupação próxima ao bairro São João do Tauape (Prefeitura Municipal de
Fortaleza, 2008).
123
Figura 9 O momento de lazer da comunidade
Fonte: Própria.
Ela é composta por um total de 644 famílias aproximadamente. Muitas delas
obtêm sua renda de ocupações informais, dentre elas, a coleta de material
reciclável. Por isso, é comum o relato de pessoas que dividem o local em que
vivem com o material coletado por elas.
124
Figura 10 A rua do Planalto Universo
Fonte: Própria.
Não foram encontrados registros em relação ao IDH da comunidade.
Entretanto, tem-se como parâmetro deste indicador social o bairro Vila União, no
qual eslocalizado o Conjunto Habitacional Planalto Universo, que corresponde a
0,556 - é reconhecido com um IDH médio (cf. Fortaleza em Números, 2004).
125
Figura 11 - O lugar do jogo e da brincadeira
Fonte: Própria.
Na comunidade, o programa oferece aulas de futebol para ambos os sexos,
como também atividades assistemáticas, tais como: passeios e festivais esportivos
aos finais de semana.
126
Figura 12 - O lugar do lazer das crianças
Fonte: Própria.
Em relação à auto-organização social, existe a Associação de Moradores do
Conjunto Planalto Universo que mantém uma interlocução com a Secretaria de
Esporte e Lazer mediada pelo professor. Por ter sido formada recentemente, a
comunidade dispõe apenas de uma associação que a representa, porém poucos
membros desta exercem ativamente suas funções, o que compromete o trabalho
realizado no local por parte das lideranças comunitárias. O representante do
esporte no âmbito da associação acompanha cotidianamente as atividades do
programa e atua nelas auxiliando o trabalho desenvolvido pelo professor (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
127
(2) Comunidade Rosalina
Figura 13 O campo de futebol da Rosalina
Fonte: PENC, núcleo Rosalina.
Rosalina consiste em uma área de ocupação de terras blicas, situadas no
bairro Serrinha. Nela vivem 1.831 famílias, em um cenário de precariedade no
concerne à moradia, ao saneamento básico, à infraestrutura urbana, aos espaços e
equipamentos públicos. Perfaz um total de 1.831 famílias que vivem no local
mais de 10 anos, estas correspondem a aproximadamente 9,2 mil pessoas
(Prefeitura Municipal de Fortaleza, 2008). Na comunidade existe uma grande
incidência de violência, de tfico de drogas e de prostituição (cf. registros diários
de campo, 2008/2009).
128
Figura 14 A “rua” da Rosalina
Fonte: PENC, núcleo Rosalina.
Não foram encontrados registros em relação ao índice de desenvolvimento
humano da comunidade, porém, tem-se como referência deste indicador social o
IDH do bairro Parque Dois Irmãos, no qual se situa a comunidade Rosalina, o
qual corresponde a 0,577 - é considerado um IDH médio (cf. Fortaleza em
meros, 2004).
No tocante às condições de vida das famílias que residem na comunidade, a
Prefeitura de Fortaleza viabilizou a construção do Conjunto Habitacional da
Rosalina. Esta ação também foi impulsionada pela mobilização dos moradores
articulados com lideranças comunitárias vinculadas à Associação dos Moradores
da Comunidade Rosalina (cf. registros diários de campo, 2008/2009).
129
Figura 15 A transição da velha moradia para a nova
Fonte: PENC, núcleo Rosalina.
O programa é apoiado pela associação e pela cooperativa que contribuem
na articulação e na mobilização dos moradores para o desenvolvimento das
diversas atividades do núcleo. A cooperativa cede o espaço sico que comumente
é utilizado pelas costureiras para a realização das aulas de ginástica como se
percebe na foto abaixo exposta, cuja maioria dos participantes é mulher em idade
adulta.
130
Figura 16 A aula de ginástica
Fonte: PENC, núcleo Rosalina.
O professor do programa que atua na Rosalina é uma pessoa envolvida com
a comunidade, dialoga com os moradores e articula com as lideranças locais,
tanto na cooperativa das costureiras como na associação dos moradores,
compreende a problemática social local, conhece as famílias e o histórico de vida
delas. Ele conseguiu desenvolver um sentido de pertencimento em relação à
comunidade da Rosalina, por isso é reconhecido como uma liderança local (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
Em destaque a fala de três alunas do núcleo Rosalina de distintos
segmentos etárias em visita às suas residências. Estas narram um pouco de como
se constitui suas vidas - ocupações, família, condições socioeconômicas -
percepção em relação à comunidade e perspectivas sobre o programa.
131
[...] fomos a casa da F., 48 anos, ela é uma mulher caseira, como ela mesma falou:
gosto de ficar em casa, aproveito minha vida assim e acho bom”. Sua casa é bastante
organizada, ficamos impressionados com a linda TV que ela tem em sua sala, ela até
ligo-a para assistirmos ao programa hoje em dia enquanto estávamos lá. Percebi que ela
o gostava muito de sair de casa pelo próprio local onde mora. F. é dona de casa. Ela
tem uma filha chamada Débora, 26 anos, casada, não tem filhos, ela é artesã, trabalha
com confecção de sandálias com bijuterias e de acessórios como brincos e enfeitas para
cabelo. D. ressaltou que não vende muito porque as pessoas acham suas peças caras.
Falou que vive mais da renda do marido e que perdeu o benefício do Programa Bolsa
Família. Ela não tem filho.
Posteriormente fomos a casa da M., 34 anos. Ela é artesã, seu trabalho é confeccionar
brincos, colares e bolsas de tecido. Ela é casada e tem dois filhos homens frutos do
primeiro casamento. Casou-se aos 13 anos de idade, porque sua mãe lhe deu duas
opções de futuro: trabalhar em uma casa de família ou conseguir um marido para
sustentá-la. Daí ela preferiu a segunda opção. Ressaltou ainda, que sua mãe falava que
estudar não era importante porque ela nunca tinha estudado e isso não tinha
atrapalhado em nada sua vida”. E enfatizou que apesar de não ter tido uma mãe que a
incentivasse a estudar, não desejava o mesmo para os filhos e por isso fala todos os dias
para o filho mais velho estudar, salientando que ele está no ano mais que era para
ter terminado se não tivesse repetido dois anos. Disse também que lamenta pelo filho
o ter nenhuma opção de lazer na comunidade e que pela ociosidade ele pode ser
influenciado pelos traficantes e enveredar pelo caminho do tráfico de drogas, podendo
ser um avião ou qualquer outra coisa. [...]. M. contou que recebe 50,00 reais ou pouco
mais por mês pelo seu trabalho de artesã, uma vez que é muito difícil vender suas peças,
às vezes vende R$ 30,00 para receber dois ou três meses depois. Sua família não é
beneficiada pelo Programa Bolsa Família, entretanto, já foi cadastrada pela regional IV
[Secretaria Executiva Regional IV] e está esperando ser contemplada com o benefício.
Mesmo não trabalhando diretamente na cooperativa ela borda para a mesma e sempre
que possível faz alguma atividade lá. Relatou que não freqüenta muito a cooperativa,
porque precisa cuidar da casa e dos filhos. Mesmo com as atividades de dona de casa
consegue um tempo para trabalhar como artesã. Sua casa não é muito organizada,
muitas coisas fora do lugar, fica visível que ela prioriza os filhos e o seu trabalho.
Mostrou-nos a geladeira nova que tinha comprado com o dinheiro que o marido tinha
recebido no trabalho, falou que tinha comprado a vista, pois ela e o marido não
possuíam cartão de crédito, disse que é muito difícil viver sem geladeira por causa dos
filhos. Em sua casa tinha um cachorro muito barulhento [informação verbal]
28
.
Estes relatos revelam um pouco do cotidiano das alunas. Estas
evidenciaram a falta de um local adequado para a prática da ginástica, sendo este
um dos principais motivos de abandono/evasão das aulas. Elas salientam que a
população de Fortaleza tem uma visão negativa acerca da comunidade Rosalina e
28
Notícias fornecidas pelas alunas da ginástica do programa em visita às suas residências, na
comunidade Rosalina, em Fortaleza-CE, em 2009.
132
afirmam que esta é noticiada constantemente em jornais e programas policiais. É
visível na comunidade a separação entre os moradores que praticam atividades
ilícitas e aqueles que m ocupação formal e/ou informal cita - estes são
reconhecidos pela comunidade como “cidadãos de bem” -, os últimos procuram
manter boas relações com os primeiros, porém, sem qualquer tipo de
envolvimento, para que sua conduta perante a sociedade não seja prejudicada.
Observou-se que a maioria das famílias que foram visitadas, não é beneficiada
pelo Programa Bolsa Família do governo federal (cf. registros em diário de
campo, 2008/2009).
Quanto à auto-organização social, a comunidade é representada pela
associação supracitada e pela Cooperativa das Costureiras. Ambas desenvolvem
atividades em parceria com a Prefeitura Municipal de Fortaleza, com as ONG‟s, a
exemplo da ONG Terra Azul cujo trabalho consiste em desenvolver atividades na
área do meio ambiente, e com a Companhia Elétrica do Ceará (Coelce), que apóia
diversas atividades da Cooperativa das Costureiras (cf. registros em diário de
campo, 2008/2009).
(2) Comunidade Serrinha
Serrinha é um bairro antigo da cidade de Fortaleza, delimitado por uma
grande área territorial que apresenta contrastes em termos de condições de
moradia, de infraestrutura urbana e de equipamentos e serviços públicos. Por ser
formado por um conjunto de comunidades, o bairro apresenta um quadro de
desigualdade social acentuado que pode ser comprovado pelo tipo de moradia,
por exemplo, enquanto uma família reside em uma casa com um ou dois
modos; outra mora em uma residência ampla (cf. registros em diário de campo
2008/2009).
133
O bairro possui uma população de 25.682 habitantes e IDH de 0,444,
índice considerado baixo (cf. Fortaleza em Números, 2004). Além disso,
observou-se que existe um descaso por parte da prefeitura em relação ao entorno
do campo onde ocorrem as atividades do programa o qual resulta no constante
acumulo de lixo próximo ao local.
Figura 17 Os meninos da Serrinha
Fonte: Própria.
Uma moradora alerta que a própria comunidade joga lixo no campo
próximo ao local onde moram muitas famílias. Tamm, declarou que o campo
fica em uma antiga área militar cedida à comunidade pela aeronáutica (cf.
registros em diário de campo 2008/2009).
É notório, no entorno do campo sede do cleo, construções habitacionais
que aparentemente atendem às necessidades de famílias de estrato social médio,
ao mesmo tempo, o espaço do campo é ocupado por crianças e adolescentes que
134
moram em locais mais distantes dentro da própria comunidade onde as habitações
são precárias (cf. registros em diário de campo, 2008/2009).
Figura 18 Um time de meninas e meninos
Fonte: Própria.
Outro contraste evidente é o fato de que, ao lado do campo onde acontecem
as atividades do programa, existe outro campo no qual funciona uma escolhinha
de futebol particular, administrada por uma liga esportiva do bairro. Nela, as
crianças e adolescentes são obrigados a pagar uma taxa mensal para participarem
das atividades. Observou-se que o campo possui uma boa infraestrutura e
iluminação, terreno uniforme, área ao redor sem mato e sem lixo. O que não
acontece com o campo sede do programa. É oportuno frisar que ambos os
campos ocupam áreas públicas (cf. registros em diário de campo, 2008/2009).
Na comunidade em questão, não foi verificada a existência de organização
social institucionalizada que mantivesse interlocução com o programa, o que
existe é a mobilização de famílias que residem próximo ao núcleo em algumas
135
ações no sentido de solucionar demanda concernentes à infraestrutura das ruas e à
realização de festividades comemorativas.
(4) Comunidade Presidente Kennedy
O Presidente Kennedy é um bairro que apresenta razoáveis condições de
infraestrutura urbana. Nele há asfalto nas ruas, iluminação pública, rede de esgoto
e posto de saúde. O IDH do bairro é 0,531 - índice considerado médio (cf.
Fortaleza em Números, 2004). O programa atua em uma zona de fronteira, entre
os bairros Presidente Kennedy e Álvaro Weyne, onde grande incidência de
assalto e tráfico de drogas.
O campo onde acontecem as atividades do programa apresenta uma
infraestrutura boa, é cercado por alambrados e tem dimensões suficientes para a
realização de várias atividades. Entretanto, necessita de manutenção, sobretudo,
no gramado, pois a grama foi transformada em mato seco, além disto buracos
em vários locais. O núcleo oferece aulas de futebol e de recreação.
Conforme relatos da professora responsável pelo núcleo, a liga esportiva
que monitora as atividades no campo não trata de sua manutenção. Segundo ela,
no início do programa as condições de infraestrutura do local eram melhores.
Explicou também que um demanda do Orçamento Participativo para a reforma
do campo, porém a liga dificulta a viabilização desta reforma uma vez que tem
interesse em responsabilizar-se por esta ação. Por último, enfatizou que os alunos
do programa e os demais moradores do bairro não m livre acesso ao campo,
porque ele permanece fechado e só é aberto com autorização da liga esportiva (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
No que concerne à auto-organização social, a professora informou que são
poucas as pessoas da comunidade que apresentam interesse em participar de
alguma atividade comunitária. Quando participação, esta se restringe as
reuniões do Orçamento Participativo para eleger um morador como representante
136
do bairro. Advertiu que a comunidade é atendida por uma ONG vinculada ao
Fundo Cristão para Crianças, esta atua na promoção de cursos profissionalizantes
para jovens do bairro. Não foi identificada a presença de agente social e/ou
comunitário atuando nas atividades do núcleo. Entretanto, percebeu-se a
existência de uma liderança comunitária que cuida do material utilizado nas
atividades (cf. registros em diário de campo, 2008/2009).
(5) Comunidade João Paulo II
João Paulo II é uma comunidade formada em um local de ocupação
localizado na área urbana correspondente ao Grande Jangurussu, terceiro bairro
mais populoso de Fortaleza com uma população de 63.401 habitantes. A
comunidade é afetada pela carência em relação à infraestrutura urbana, porquanto
foi edificada em área inadequada para habitação (cf. registros em diário de
campo, 2008/2009).
Na comunidade do João Paulo II uma grande concentração de famílias de
baixa renda e uma alta incidência de tráfico de drogas em meio a uma realidade de
desemprego entre jovens e adultos (cf. registro diários de campos 2008/2009).
Não foram encontrados registros sobre o índice de desenvolvimento humano
da comunidade, todavia, tem-se como parâmetro o IDH do bairro Jangurussu que
corresponde a 0,421 este é considerado baixo (cf. Fortaleza em meros, 2004).
O programa oferece aulas de futsal e futebol, como também atividades
assistemáticas, tais como: passeios e festivais esportivos aos finais de semana. Os
participantes são do sexo masculino (crianças, jovens e adultos). Chama a atenção
a grande quantidade de meninos participando das atividades e organização deles
na realização das atividades, mesmo nos momentos de auncia do professor (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
137
As aulas acontecem na quadra e no campo de areia. Em relação às
condições de infraestrutura da quadra, os alambrados estão enferrujados e
furados, as redes de proteção furadas, não rede nas traves e existe lixo no
entorno (cf. registros em diário de campo, 2008/2009).
O futebol parece fazer parte do cenário da comunidade. Isto ficou evidente
na fala dos participantes. Pôde-se verificar que muitas crianças e adolescente
freqüentam os espaços de lazer no horário das atividades do programa (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
Em relação à atuação do professor, verificou-se que não se limitam aos
espaços de desenvolvimento das atividades do programa. Ele conhece a história de
vida dos participantes, acompanha o cotidiano deles, realiza visitas às famílias,
mobiliza moradores, dialoga com as lideranças das ligas esportivas, com outras
políticas de governo e com ONG‟s que desenvolvem trabalhos na comunidade em
parceria com o governo do Estado do Ceará e a Prefeitura Municipal de Fortaleza.
É notória na fala do professor a preocupação em relação ao futuro dos
participantes (a maioria adolescentes e jovens), ao estudo e a ocupação deles (cf.
registros em diário de campo, 2008/2009).
Em relação à auto-organização social, foi constatada a existência de
associação comunitária no bairro e também de ligas esportivas que atuam no
espaço do núcleo, todavia, não foi percebida uma relação de proximidade entre os
representantes das ligas e o programa.
4.1.2 Perfil dos participantes do programa
No tocante ao perfil pessoal dos sujeitos investigados, observa-se que a
amostra foi constituída por 102 (72,9%) participantes do sexo masculino e 38
(27,1%) participantes do sexo feminino, perfazendo um total de 140 sujeitos.
138
A figura 19 representa a amostra da população por sexo.
Figura 19 Representação da amostra por sexo
27,14%
72,86%
Feminino
Maculino
Sexo
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Pelos resultados, pode-se observar que uma alta concentração de sujeitos
do sexo masculino participando do programa.
A figura 20 representa a amostra da população por idade.
139
Figura 20 Representação da amostra por idade
0,71%
0,71%
0,71%
0,71%
0,71%
0,71%
1,43%
2,14%
2,86%
6,43%
11,43%
12,86%
15,71%
15,00%
12,86%
9,29%
2,86%
0,71%
63
50
48
47
43
34
26
22
21
18
17
16
15
14
13
12
11
10
9
8
7
Representação da amostra por idade
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
No que diz respeito à idade dos participantes que se distribui no intervalo de
7 a 63 anos, fica evidente que existe uma concentração de participantes no
segmento etário de 9 a 15 anos, perfazendo um total 117 que corresponde a 83,6%
do número de sujeitos da amostra. A distribuição da idade apresenta uma
concentração em valores abaixo da média que é de 12 anos de idade.
A figura 21 retrata a amostra da população por estado civil.
140
Figura 21 Representação da amostra por estado civil
2,86%
0,71%
1,43%
95,00%
Casado
Viúvo
Separado
Solteiro
Representação da amostra por estado civil
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
No que concerne ao estado civil, 133 (95%) sujeitos são solteiros, 4 (2,9%)
sujeitos são casados, 2 (1,4%) são separados e 1 (0,7%) sujeito é viúvo.
Observar figura 22 referente à situação dos sujeitos em relação ao estudo.
141
Figura 22 Situação dos participantes em relação à escolarização
0,71%
7,86%
91,43%
Nunca estudou
Já estudou
Estuda
Situação dos participantes em relação à escolarização
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Em relação à escolaridade dos sujeitos investigados, 128 (91,4%)
participantes ainda estudam, 11 (7,9%) estudaram e 1 (0,7%) nunca estudou.
Entre os participantes que estudaram, 4 deles tem 14 anos ou menos, os demais
m idade igual ou maior que 17 anos; e o participantes que nunca estudou tem 9
anos. Entre os 128 participantes que estudam, 125 (97,7%) têm idade variando de 7
a 18 anos e 3 (2,3%) m idade igual ou superior a 34 anos; sendo que a pessoa
mais idosa da amostra que tem 63 anos - está estudando.
Entre os participantes que estudam, 117 (91,4%) participantes são
matriculados no Ensino Fundamental, 4 (3,1%) no Ensino Médio e 7 (5,5%) no
Ensino Fundamental - modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA). Entre os
11 participantes que estudaram, 5 cursaram pelo menos até o ano do Ensino
Fundamental, 4 cursaram até o ano do Ensino Médio e 2 não declararam até que
142
ano estudaram. Entre os participantes, 14 (10%) frequentam cursos de formação
para o trabalho, dentre eles apontaram corte e costura, cabelereiro, enfermagem,
operador de telemarketing e informática e/ou computação e outros.
Ver figura 23 alusiva à condição de moradia dos sujeitos.
Figura 23 Condição de moradia dos participantes
9,29%
1,43%
2,14%
2,14%
84,29%
Com parentes
Com filhos
Com esposo (a)
Com esposo (a) e
filhos
Com seu pai e/ou
mãe
Condição de moradia dos participantes
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Conforme os dados obtidos, considerando a predominância de crianças e
adolescentes, 118 (84,3%) dos participantes moram com os pais, 13 (9,3%) com
parentes, 6 (4,2%) com esposo (a) e filhos, 2 (1,4%) com filhos e 1 (0,8%)
sozinho.
Pelos resultados descritos em relação ao perfil pessoal, pode-se afirmar que a
maioria da população atendida pelo programa é composta de crianças e
143
adolescentes do sexo masculino, com idades variando entre 9 e 15 anos. Por
conseguinte, são sujeitos de estado civil solteiro. Nota-se também que quase 100%
dos participantes do programa estão inclusos no segmento etário entre 7 e 18 anos
de idade, a maioria deles moram com os pais e cursam o Ensino Fundamental.
Pode-se afirmar, portanto, que embora o programa permita o acesso de sujeitos de
diferentes segmentos etários às suas atividades, a maioria dos que participam são
crianças e adolescentes.
Por outro lado, chama-se a atenção para o fato de que somente cerca de 2%
dos participantes m idade superior a 34 anos. Isto implica dizer que somente uma
reduzida parcela de trabalhadores está envolvida diretamente nas atividades dos
núcleos. Assim, o programa que a princípio se volta às camadas populares,
particularmente à classe trabalhadora, como prática inclusiva, no sentido de
qualquer sujeito poder estar inserido nele independentemente de suas capacidades
para realização de determinada prática esportiva e/ou corporal, não conseguiu
promover a inserção de todos, em especial dos adultos em suas ações - aqui
compreendidas como as atividades realizadas de modo sistemático no cotidiano
dos núcleos.
Pode-se inferir também que existe uma participação acentuada de sujeitos do
sexo masculino no programa quando comparado a participação dos sujeitos do
sexo feminino. Isto pode ser explicado pelo fato de a modalidade futebol - a priori
praticado com mais frequência pelos sujeitos do sexo masculino - ser ofertada nos
cinco núcleos investigados, sendo que em um núcleo João Paulo II só
participação de sujeitos do sexo masculino - neste é ofertado o futsal e o futebol
society. No Planalto Universo, Serrinha e João Paulo II, o futebol é ofertado como
atividade principal; no Planalto Universo existe uma turma de futebol feminino.
Pode-se apontar, em certa medida, que tais considerações explicariam a
significativa participação dos sujeitos do sexo masculino no programa.
144
Outra questão a ser destacada, e de certo modo determinante, refere-se ao
fato de a comunidade possuir autonomia sobre as atividades a serem ofertadas no
núcleo. Logo, o futebol como tema no programa, é tratado como conteúdo - da
cultura corporal seria uma prática social comum ao cotidiano das comunidades.
Sobre este aspecto importa ressaltar também, o papel da mídia, sobretudo,
televisiva no enaltecimento do futebol espetáculo. Conforme Bracht (2005), o
esporte espetáculo” possui uma massa consumidora responsável pelo seu
financiamento e os meios de comunicação de massa são co-organizadores dela. O
que poderia justificar a adesão quase unânime ao futebol como principal atividade
nos cleos do programa, partindo do pressuposto de que a mídia exerce grande
influência nas escolhas pessoais de grande parcela da sociedade.
Além dos aspectos citados, outro fator merece registro, qual seja, a seleção
das atividades está sujeita às condições infraestruturais da comunidade
beneficiada pelo programa. Ocorre, na maioria das vezes, que os espaços de lazer
existentes na comunidade se resumem ao lugar no qual as comunidades jogam
futebol, costumeiramente um campo construído em uma várzea, realidade dos
núcleos Rosalina e Serrinha. Nos núcleos Planalto Universo e João Paulo II, o
futebol é praticado em um campo de areia. Somente o núcleo Presidente Kennedy
possui um local apropriado à prática do futebol.
No tocante à reduzida participação do sexo feminino (crianças,
adolescentes, adultos) no programa a qual também é expressa nos quadros de
distribuição dos envolvidos no Programa Esporte na Comunidade em 2008/2009
exposto no capítulo 3, que em 2008, de um total de 2.493 alunos, 2.166 são do
sexo masculino e apenas 777 do sexo feminino; e em 2009, de 2.718 alunos,
2.749 o do sexo masculino e 892 do sexo feminino. Tal acontecimento poderia
ser explicado pela pouca adesão do sexo feminino às práticas de futebol e,
concomitantemente, a carência do programa em relação à oferta de outras
145
modalidades esportivas, bem como práticas corporais, conforme observado nos
núcleos investigados.
4.1.3 Tipo de trabalho e renda dos pais, e renda familiar
A figura 24 retrata o tipo de ocupação dos pais dos participantes do
programa.
Figura 24 - Tipo de ocupação do pai
18,95%
27,37%
47,37%
5,26%
Autônomo
Prestador de
serviço
Funcinário de
empresa privada
Funcionário público
Tipo de ocupação do pai
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Quanto ao trabalho do pai, dos 118 participantes que moram com os pais, 5
(4,2%) m o pai trabalhando como funcionário público, 49 (41,5%) têm o pai
146
trabalhando com carteira assinada em empresa privada, 35 (29,7%) têm o pai
trabalhando como prestador de serviço ou autônomo sem carteira assinada e 29
(24,6%) não souberam declarar o tipo de trabalho do pai.
O salário do pai variou de R$ 90,00 a R$ 3.200,00 com concentração de
salários na faixa de R$ 90,00 a R$ 800,00.
Em relação à mãe, a figura 25 apresenta os resultados pertinentes à
ocupação.
Figura 25 - Tipo de ocupação da mãe
35,62%
45,21%
19,18%
autônoma
Prestadora de
serviço
Funcinária de
empresa privada
Ocupação da mãe
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Segundo o descrito acima, 73 (que corresponde a 52,1% da amostra)
participantes m a mãe trabalhando, sendo que 15 (20,5% das que trabalham) são
funcionárias de empresa privada, ou seja, trabalham com carteira assinada e têm
147
salários variando de R$ 465,00 (salário mínimo na época da pesquisa) a R$ 500,00;
14 (19,2% das que trabalham) trabalham como autônoma com renda mensal
variando de R$ 500,00 a R$ 2.000,00; 29 (39, 7% das que trabalham) trabalham
em prestação de serviço, em sua grande maioria em serviços domésticos com renda
mensal variando de R$ 40,00 a R$ 500,00.
Na figura 26, pode-se observar o tipo de moradia dos participantes do
programa.
Figura 26 Tipo de moradia das famílias
59,29%
40,71%
Casa
Apartamento
Tipo de moradia das famílias
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Sobre os tipos de moradia, verificou-se que 57 famílias (40,7%) residem em
moradia do tipo apartamento em conjuntos populares e 83 famílias (58,3%)
148
residem em moradia do tipo casa, sendo estas habitações precárias em locais de
ocupação.
A figura 27 faz referência à renda mensal das famílias dos sujeitos
investigados.
Figura 27 Renda familiar mensal
1,43%7,86%
20,00%
41,43%
29,29%
Maior que R$ 3.720,00
R$ 1.861,00 - 3.720,00
R$ 931,00 - 1.860,00
R$ 466,00 - 930,00
Até R$ 465,00
Renda familiar mensal
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Quanto à renda familiar mensal, esta variou de R$ 233,50 a R$ 3.720,00,
média R$ 908,76, desvio padrão R$ 771,42 e coeficiente de variação 84,9%,
indicando alta heterogeneidade na distribuição da renda familiar. Dessas famílias,
66 são beneficiadas pelo Programa Bolsa Família do governo federal, os valores do
benefício variam de R$ 20,00 a R$ 250,00, média R$ 99,24, desvio padrão R$
42,67 e coeficiente de variação 43%.
149
Na figura 28, alude-se a representação do número de pessoas por residência
dos participantes investigados.
Figura 28 Número de pessoas por residência
2,86%
5,00%
5,00%
10,71%
10,71%
32,86%
19,29%
10,71%
2,86%
10
9
8
7
6
5
4
3
2
Número de pessoas por residência
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
A figura 29 se refere ao número de pessoas que trabalham por residência.
150
Figura 29 Número de pessoas que trabalham por residência
3,57%
0,71%
1,43%
3,57%
8,57%
43,57%
38,57%
nenhuma
6
5
4
3
2
1
Número de pessoas que trabalham por residência
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
O número de moradores por residência variou de 2 a 10 moradores, com a
concentração da distribuição variando de 3 a 7 moradores por residência (118
residências que corresponde a 84,3% do total de residências ). Em 115 residências
(82,2% do total de resincias), o número de pessoas por residência que
trabalham varia de 1 a 2 pessoas. Em 54 residências (38,6% do total de
residências) somente uma pessoa trabalha e em 61 (43,6% do total de resincias)
somente duas trabalham. Em 13 residências, o número de moradores varia de 8 a
10 pessoas, em 3 somente uma pessoa trabalha e em 10 somente duas pessoas
trabalham. Logo, observa-se que o mero de pessoas que trabalham por
residência é baixo posto que mais de 82% do total de residências somente 1 ou 2
pessoas trabalham. Nas residências dos 140 participantes vivem um total de 745
pessoas, entre estas 248 (33,35%) exercem atividade remunerada.
151
Com base nos resultados apresentados, pode-se concluir que o percentual
(41,5%) de pais que trabalham com carteira assinada - ocupação formal é duas
vezes maior que o percentual (20,5%) de mães trabalhando na mesma condição.
Vale ressaltar também que o salário do pai tem uma variação maior que o salário
da mãe e que aproximadamente 30% dos pais e 60% das mães - destas a grande
maioria trabalha em serviços domésticos - trabalham em condições precárias (como
autônomo ou na prestação de serviços). Pochamann et al. (2003), sustenta que em
relação ao indicador que mensura a participação dos assalariados em ocupações
formais no total da população em idade ativa, 36,1% das cidades do Brasil
apresentam diminuta participação deste tipo, sendo que a maioria delas está
localizada nas áreas acima do Trópico de Capricórnio
29
, a exemplo da região
nordeste.
Pochamann et al. (2003) revela que de forma indireta este indicativo aponta
para uma das marcas da exclusão social específica dos locais no quais o mercado
de trabalho assalariado nunca chegou a estruturar-se minimamente. E lembra que
em uma situação inversa, 10,3% dos municípios estes se localizam nas áreas em
torno e abaixo desta linha de referência geográfica - do país contam com uma
estrutura ocupacional marcada pelo assalariamento formal.
Constata-se que 60% das famílias residem em moradia do tipo casa e 40%
do tipo aparamento. Sabe-se que as casas nas quais os participantes residem se
caracterizam como habitações precárias, pois a maioria foi edificada em locais de
ocupação. E os apartamentos o habitações construídas em conjunto populares
cedidos pela Prefeitura Municipal de Fortaleza.
Em média, a renda mensal das famílias corresponde a R$ 908,76, sendo que
os resultados mostraram uma distribuição bastante heterogênea. Isto quer dizer que
29
Esta linha é chama pelo autor de Trópico de Capricórnio. O mesmo utiliza o termo acima do
trópico para se referir à região norte e nordeste e abaixo do trópico em alusão à região centro-
sul.
152
existe uma significativa diferença no que concerne à renda familiar mensal das
famílias. Cerca de 50% delas são beneficiadas pelo Programa Bolsa Família do
Governo Federal e recebem em média R$ 99,24, o que equivale a menos de ¼ do
salário mínimo no valor de R$ 465,00.
Diante dos resultados apresentados, faz sentido a afirmação de Pochmann
et al. (2003, p. 25), na qual registra que: a selva” da exclusão mostra-se no
contexto investigado intensa e generalizada, com poucos “acampamentos” de
inclusão social, pontuando uma realidade marcada pela pobreza e pela fome, que
atingem famílias extensas, jovens, população pouco instruída e sem experiência
assalariada formal”. O autor ressalta que, nesse novo milênio, o país continua a
contar com um projeto de nação fragilizado pelas disparidades entre as áreas que
o compõem. No cenário das comunidades nas quais o programa atua isto ocorre
em uma mesma área, qual seja, o município de Fortaleza/CE, considerando-se a
significativa diferença no tocante ao indicador renda familiar.
Em seguida, abordam-se aspectos referentes à participação no programa,
dentre eles: o conhecimento, o tempo e a frequência semanal de envolvimento nas
atividades, os motivos de ingresso, os objetivos da prática de esporte com base
nas dimensões educacional, de participação e de rendimento.
4.1.4 Participação da comunidade no programa
A participação no programa foi verificada com base nos seguintes aspectos:
(a) conhecimento, tempo e frequência nas atividades; b) prática corporal e/ou
esporte e suas dimensões no programa; e (c) Participação da comunidade no
programa.
Em relação ao item (a), almejou-se obter informações acerca de como os
participantes tiveram conhecimento do programa, de sua permanência nele e do
153
nível de envolvimento nas atividades, o que é importante para evidenciar o modo
como as informações referentes ao programa circulam na comunidade e quem são
os informantes-chave, o nível de aproprião que os participantes têm em relação
à proposta do programa e o grau de envolvimento nas atividades.
Quanto ao item (b), procurou-se verificar os motivos da participação no
esporte/prática corporal e objetivos da participação no programa de modo a
identificar se houve modificação na percepção dos participantes no que concerne
à prática de esporte/prática corporal ao ingressarem no programa.
No tocante ao item (c), buscou-se indicadores de participação da
comunidade de modo geral, ou seja, que não se restringisse somente aos
participantes (alunos) mas também envolvesse as famílias, que não se limitasse a
participação nas atividades sistemáticas, mas tamm a organização e articulação
comunitárias os demais espaços participativos, nem somente a participação no
programa mas tamm o vínculo com outros programas de esporte e lazer.
(a) Conhecimento, tempo e frequência nas atividades
Sobre como conheceu o programa, os participantes responderam conforme
os resultados apresentados.
A figura 30 retrata os resultados encontrados no que diz respeito ao
questionamento como conheceu o programa.
154
Figura 30 Informação sobre o PENC
2,14%
1,43%
3,57%
30,00%
12,86%
50,00%
Outro
Por material de
divulgação (panfletos,
faixas e etc)
Pelo líder comunitário
Pelo professor
Por familiares
Por amigos
Informação sobre o PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Dos participantes, 70 (50%) tiveram conhecimento por meio de amigos, 42
(30%) pelo professor do núcleo, 18 (12,9%) por meio de familiares, 5 (3,6%) por
meio das lideranças comunitárias, 2 (1,4%) por meio de material de divulgação e
3 (2,1%) por outro tipo de informante.
A figura 31 mostra os resultados encontrados quanto ao tempo de
participação no programa.
155
Figura 31 - Tempo de participação no PENC
18,57%
39,29%
12,86%
10,00%
19,29%
Há mais de 2 anos
De 1 ano a 2 anos
De 6 meses a 1 ano
De 3 a 6 mese
Menos de 3 meses
Tempo de participação no PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Dos participantes, 55 (39,3%) m tempo de participação no programa de
1 a 2 anos”, 26 (18,6%) participam do programa a mais de 2 anos”, 27 (19,3%)
participam do programa a menos de 3 meses”, 8 (12,9%) participam do
programa a 6 meses a 1 anos” e 14 (10%) m tempo de participação no
programa de 3 a 6 meses”.
A figura 32 representa os resultados alusivos à frequência semanal de
participação do programa.
156
Figura 32 - Freqüência semanal de participação no PENC
32,86%
6,43%
30,00%
27,14%
3,57%
5 vezes por semana
4 vezes por semana
3 vezes por semana
2 vezes por semana
1 vez por semana
Frequencia semanal de participação no PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
No tocante ao mero de vezes por semana que em que ocorre a
participação no programa, verificou-se que 46 (32,9%) participantes a fazem de
5 vezes por semana”, 42 (30%) de 3 vezes por semana”, 38 (27,1%) de 2
vezes por semana”, 9 (6,4%) de 4 vezes por semana” e 5 (3,6%) somente “1 vez
por semana”.
Em relação ao esporte e/ou prática corporal praticada, evidenciou-se que
131 (93,6%) participantes praticam futebol, 31 (22,1%) praticam futsal, 8 (5,7%)
praticam caminhada e 6 (4,3%) praticam ginástica. Declararam ter participado
de festivais esportivos e/ou torneios 66 (47,1%) respondentes.
Dos participantes, 50% tiveram conhecimento do programa por meio de
amigos e 30% pelo professor do núcleo e somente cerca de 4% souberam do
programa pelo líder comunitário.
157
Quase 60% dos participantes tem tempo de participação no programa
estimado entre 1 e mais de 2 anos. O que se remete à continuidade de participação
em termos de frequência no programa. É possível constatar também que,
pelos demais intervalos apresentados, está havendo um fluxo de ingresso no
programa. Por isso, uma possível extinção do programa não poderia ser
justificada pela demanda insuficiente de alunos nas atividades. Este resultado
mostra ainda que as comunidades atendidas pelo programa demonstram ter uma
boa aceitação em relação a ele. Este fato poderia contribuir positivamente no
sentido de facilitar o diálogo com a comunidade na perspectiva de garantir a
ampliação do acesso e da democratização das práticas de esporte e lazer nos
bairros beneficiados.
Constatou-se que mais de 96% do total dos participantes envolvem-se nas
atividades do programa pelo menos 2 vezes por semana. O que significa dizer que
uma boa participação nas atividades, principalmente, quando se verifica que
69,3% participantes envolvem-se em atividades do programa pelo menos3 vezes
por semana”.
Pelos resultados, quanto ao esporte e/ou prática corporal praticada, nota-se
uma incidência de prática do futebol seguida pela prática do futsal. Vê-se também
que os festivais esportivos e/ou torneios o atividades nas quais os participantes
m um bom envolvimento. As práticas corporais caminhada e ginástica são
pouco praticadas pelos participantes, portanto, pode-se considerar que o número
de praticantes nessas atividades é reduzido.
Com isto, percebe-se a popularidade atribuída ao futebol no programa que
suscita o seguinte questionamento: o que leva a prática massificada do futebol nos
núcleos do programa? (i) a popularidade do futebol enquanto elemento da cultura
brasileira e neste contexto a influência da mídia na escolha das práticas de esporte
e lazer e/ou práticas corporais? (ii) a facilidade de prática do futebol diante da
escassez de recurso material apresentada pelo programa em questão? (iii) a
ausência de espaços e equipamentos públicos para a realização de outras práticas
158
no âmbito da cultura corporal? ou (iv) a ausência de conhecimento que resultaria
na pouca atenção atribuída pelas comunidades aos demais temas da cultura
corporal uma vez que a mesma tem autonomia na seleção das atividades a serem
desenvolvidas no núcleo?
Em resposta a este questionamento, pode-se inferir que o discurso
hegemônico do esporte espetáculo,” pontuado por Bracht (2005), seria um
elemento determinante na preferência quase que exclusiva pelo futebol por parte
dos alunos do programa. Logo, torna-se claro a influência da mídia na
determinação da preferência pelo futebol por parte dos participantes do programa.
Por outro lado, a escassez de recursos presente no programa, bem como a
ausência de espaços e equipamentos públicos para a realização de atividades que
abordem outros temas da cultura corporal contribuem significativamente para a
permanência do futebol como principal atividade nos núcleos investigados.
Por último, a ausência de conhecimento que resultaria na pouca atenção
atribuída pelas comunidades aos demais temas da cultura corporal uma vez que
esta tem autonomia na seleção das atividades a serem desenvolvidas no núcleo.
Quanto a isto, poderíamos registrar que a ausência de conhecimento levaria a uma
adaptação dos alunos às condições impostas pela sociedade, alienando-o de sua
condição de sujeito histórico, capaz de intervir na transformação desta
(COLETIVO DE AUTORES, 2009). Bem como, de decidir sobre suas
preferências em relação aos temas da cultura corporal.
(b) Prática corporal, e/ou esporte e suas dimensões no programa
Neste momento a dimensão do esporte seaqui abordada como um dos
aspectos a serem destacados no que se refere à análise do programa posto que tal
dimensão está presente na própria nomenclatura deste. Para tanto, destaca-se os
resultados abaixo descritos.
159
Questionados sobre os motivos que justificam a participação no programa,
os 138 participantes declararam desde achar bom, legal e divertido, e por gostar
de jogar bola/futebol, treinar e aprender a jogar, e também porque amigos
chamaram para participar e ficar perto deles e fazer novos amigos; e para
manter/melhorar as condições de saúde, emagrecer e evitar doenças, e o
sedentarismo, e ainda, crescer saudável, exercitar-se e desenvolver o corpo até
para prevenir contra drogas, tirar das ruas e para ser um cidadão, e por lazer,
ocupação de tempo livre e oportunidade de esporte e lazer.
Essas declarações foram sistematizadas na figura 33.
Figura 33 - Motivos da participação no esporte e/ou prática corporal no
PENC
14,49%
8,70%
4,35%
6,52%
10,14%
18,84%
26,09%
10,87%
Lazer, ocupação de tempo
livre, oportunidade de esporte
e lazer
Previnir contra drogas, tirar
das ruas e ser um cidadão
Crescer saudável, exercitar-se
e desenvolver o corpo
Manter/melhorar as condições
de saúde, emagrecer, evitar
doenças e sedentarios
Amigos chamaram para
participar, ficar perto deles e
fazer novos amigos
Treinar, jogar e aprender a
jogar
Gosta de jogar bola / futebol
Acha bom, legal e divertido
Motivos da participação no esporte e/ou prática corporal no PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
(1) O primeiro grupo, que corresponde a 62 (44,9%) participantes, afirmou
que é por gostar de jogar bola/futebol e para aprender a jogar e treinar.
160
Com isto, percebe-se como o esporte, e em particular o futebol, posto que
se pode compreender o termo jogar bola” proferido pelos participantes
como jogar futebol, é utilizado amplamente nas comunidade periféricas (a
exemplo dos núcleos do programa) para denotar o jogar futebol no campo
de várzea ou mesmo na rua, dentre os temas/conteúdos da cultura corporal
é o mais aceito entre os participantes do programa, bem como seu fim que
diz respeito à prática no sentido de apreensão da técnica e para
treinamento.
(2) O segundo grupo, 29 (21%) participantes, ressaltou que acha bom, legal
e divertido, amigos chamaram para participar e para ficar perto dos amigos
e fazer novas amizades. Nisto, vê-se a presença do lazer na perspectiva de
diversão e socialização.
(3) O terceiro grupo, composto de 20 (14,5%) participantes, disse que é
para prevenir contra o uso de drogas, tirar das ruas e ser um cidadão. Neste,
nota-se a presença do discurso salvacionista do esporte amplamente
difundido nas comunidades que colocam o esporte - com ênfase no futebol
- como meio para se atingir melhores condições de vida.
(4) O quarto grupo, formado por 15 (10,9%) participantes exprime que é
para crescer saudável, exercitar/desenvolver o corpo, manter/melhorar as
condições de saúde, emagrecer, evitar doenças e o sedentarismo. Aqui se
observa a atenção ao esporte como meio que favorece a obtenção de
melhor rendimento físico, aquisição de aptidão sica e
melhoria/manutenção da saúde.
(5) O quinto grupo, composto de 12 (8,7%) participantes, respondeu que
está no programa por lazer, por ocupação de tempo livre e por
oportunidade de esporte e lazer. O esporte na dimensão do lazer aparece
como último elemento de motivação para participação no programa.
161
Quando questionados acerca dos objetivos que pretendem atingir com a
prática de esporte no programa, 135 participantes responderam conforme os
resultados apresentados na figura 34.
Figura 34 - Objetivos da prática de esporte e/ou de prática corporal no PENC
6,67%
4,44%
1,48%
66,67%
2,96%
4,44%
13,33%
Ter disciplina - respeito e
obdiência, ser um cidadão,
tirar das ruas, ter um futuro
melhor
Por lazer
Se alegrar, conquistar
amigos e participar de
brincadeiras saudáveis
Ser jogador de futebol,
conquistar medalhas e
melhorar de vida
Exercitar/desenvolver o
corpo, melhorar a condição
física, a força e a inteligência
Manter/melhorar a saúde
Aprender a jogar e
continuar jogando
Objetivos da prática de esporte e/ou de prática corporal no PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Por meio deste resultado, concentrando-se as respostas apenas em quatro
grupos, pode-se inferir que:
(1) O primeiro grupo, 108 (80%) participantes, sendo que 18 (12,86%)
deles pretendem aprender a jogar e continuar jogando e 90 (64,29%)
pretendem ser jogador de futebol, conquistar medalhas e melhorar de vida.
Nesta acepção, a prática de esporte/prática corporal se relaciona à obtenção
de melhores condições socioeconômicas e ao reconhecimento social por
meio da ascensão profissional, via de regra, pelo esporte.
162
(2) O segundo grupo, 10 (7,4%) participantes, sendo que 6 (4,29%) deles
almejam manter/melhorar a saúde e 4 (2,86%) exercitar-se/desenvolver o
corpo 6 (4,29%) melhorar a condição sica, a força e a inteligência. Neste
sentido, a prática vincula-se ao esporte e/ou prática corporal na perspectiva
de obtenção de saúde, por meio da preocupação com o corpo e
reconhecimento dos benefícios sicos e psicológicos adquiridos com a
prática.
(3) O terceiro grupo, 9 (6,7%) participantes, ressaltou que pretendem ter
disciplina (respeito e obedncia), ser um cidadão, tirar das ruas e ter um
futuro melhor. Esta concepção se aproxima do esporte/prática como meio
para obtenção de disciplina, de desenvolvimento da cidadania (participação
na vida comunitária), de crescimento pessoal (por meio do estudo e do
trabalho), e de prevenção de males inerentes ao espaço da rua, na
perspectiva de aquisição de um futuro promissor.
(4) O quarto grupo, 8 (5,72%) participantes, sendo que 2 (1,43%) deles
participam do programa para se alegrar, conquistar amigos e participar de
brincadeiras sauveis e 6 (4,29%) por lazer. Aqui, reporta-se ao esporte
e/ou prática corporal voltado à integração e à sociabilização dos
participantes em um ambiente de descontração e contentamento, assim
como ao lazer como ocupação de tempo livre.
Conforme os dados obtidos, constata-se que uma predominância em
relação à prática de esporte para fins de rendimento posto que a maioria dos
participantes almeja ser atleta de futebol e com isto ganhar medalhas e conquistar
um futuro melhor. Logo, observa-se que o programa se desvirtua em relação à sua
concepção de esporte. Posto que, ao contrário do que pressupõe, não desemboca
na dimensão do esporte participação.
Apesar disto, pelas respostas dos participantes, observa-se que o esporte
educacional e o esporte participação também aparecem como objetivos. Segundo
a legislação brasileira, o esporte é tratado sob a forma de três manifestações quais
163
sejam: desporto-perfomance; desporto-participação e desporto-educação. Isso
posto, o desporto com atividade predominantemente sica e intelectual, pode ser
reconhecido em qualquer das seguintes manifestações”:
I. desporto educacional, através dos sistemas de ensino e formas
assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a
hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o
desenvolvimento (4,29%) integral e a formação para a cidadania e o
lazer;
II. desporto de participação, de modo voluntário, compreendendo as
modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a
integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da
saúde e na preservação do meio ambiente;
III. desporto de rendimento, praticado segundo normas e regras nacionais
e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e
comunidades do país e estas com outras nações (Lei 8.672/1993, capítulo
III, art. 3º).
Diante desta evidência é interessante compreender como essas dimensões
do esporte se refletem nos sentidos e significados atribuídos a este fenômeno, a
saber:
a) esporte de rendimento busca da medalha, da habilidade/aptidão
física.
Pelas respostas em relação aos motivos que justificam a participação e os
objetivos que os participantes pretendem atingir com a prática de esporte no
programa, evidenciou-se uma ênfase na dimensão de rendimento. Porquanto este
é o principal motivo de ingresso e permanência no programa. Deste modo, tantos
os motivos de ingresso como os objetivos da prática de esporte se orientam pela
perspectiva de rendimento, ou seja, pela busca de medalha e de reconhecimento
profissional. Deve-se enfatizar também que em 45% dos casos, a participação no
programa é motivada pelo rendimento no esporte e, após o ingresso e
permanência, 80% dos participantes têm isto como propósito.
164
Tais resultados legitimam o discurso hegemônico do esporte de
rendimento. Com isto, diz-se que a concepção do esporte de rendimento é a
hegemônica entre os participantes do programa, mesmo não sendo a única. Logo,
pode-se inferir que a participação no programa não garante uma mudança de
olhar em relação ao sentido e significado hegemônico do esporte.
Portanto, um paradoxo entre a concepção de esporte apresentada pelo
programa que se remete a dimensão da participação, com vista à tematização do
esporte voltado às camadas populares, em particular à classe trabalhadora, como
prática inclusiva no sentido de que qualquer sujeito poder estar inserido nas
atividades, independentemente, de suas capacidades para realização de
determinada prática esportiva, e o sentido e significado do esporte apresentado
pelos participantes.
b) esporte e sociabilidade lazer
Entre os motivos de participação no programa o esporte de lazer, aparece
na segunda posição como prática voltada à diversão, integração e socialização. Na
última posição, como prática que favorece a participação em atividade de lazer e
ocupação de tempo livre. Naquela, o lazer é tratado como atividade que permite o
sujeito desvencilhar-se de seus afazeres e ter um momento de distração, sendo
vista bem mais como uma necessidade pessoal. É essencial destacar que o esporte
na dimensão do lazer como ocupação de tempo livre aparece como último
elemento de motivação da participação dos sujeitos no programa.
Quanto aos objetivos da prática de esporte e/ou prática corporal, esta
dimensão do esporte aparece em terceira posição, na perspectiva de prazer,
contentamento e de sociabilidade. Evidencia-se que o lazer como ocupação de
tempo livre não aparece como resposta neste item.
c) dimensão salvacionista do esporte (esporte como elemento de inclusão
social)
165
Esta dimensão ocupa a terceira posição em se tratando dos motivos da
participação no programa, pelas respostas es focada na prevenção do uso de
drogas e na retirada dos sujeitos das ruas, como também na capacidade de ser um
cidadão.
Já nos objetivos da prática de esporte e/ou prática corporal, a referida
dimensão aparece em última posição, o esporte aparece como agente
disciplinador que possibilita o aprendizado do respeito e da obediência, além de
promover a formação para a cidadania. Também é visto como meio de retirar os
sujeitos das ruas e como instrumento por meio do qual se pode almejar um futuro
próspero.
Repara-se, com isso, que o esporte é entendido como
mecanismo/instrumento que pode resolver e/ou amenizar os problemas sociais
decorrentes da exclusão social da qual é tima a população que vive em
condições de vulnerabilidade social e econômica.
Feitas tais considerações acerca das dimensões do esporte, é possível
apontar que ele como conteúdo da cultura corporal, na perspectiva da pedagogia
crítico-superada que tem como referência o documento norteador (segundo
modelo institucional do programa) e a fala do grupo gestor, precisa ser reavaliado
a fim de que possibilite realmente a leitura e interpretação da realidade social, a
começar pelos sentidos e significados atribuídos a este femeno, tendo em vista
a apreensão de seus determinantes históricos e sociais, bem como a sua
problematização.
166
(c) Participação da comunidade no programa
A figura 35 apresenta a participação das famílias no programa,
considerando-se o número de pessoas.
Figura 35 Número de pessoas na família que participam do PENC
2,86%
2,14%
2,14%
7,86%
12,86%
27,14%
45,00%
9
7
6
4
3
2
1
Número de pessoas por família que participam do PENC
Fonte: Dados da pesquisa, elaborado pela autora.
Sobre o número de pessoas na família que participam do programa, foram
encontrados os seguintes indicadores: 63 (45%) participantes responderam que
somente ele participa do programa, 38 (27,1%) responderam que ele e mais uma
pessoa da família participa, 18 (12,9%) responderam que ele e mais duas pessoas,
11 (7,9%) responderam que ele e mais três pessoas e 10 (7,1%) responderam que
ele e mais cinco ou mais pessoas.
Verifica-se, portanto, que em 45% dos casos apenas uma pessoa da família
participa do programa e em 27% o respondente e mais uma pessoa da família
167
participam, estes indicadores somados correspondem a 72%. Com isto, conclui-se
que o mero de participantes do programa por família se concentra no intervalo
de uma a duas pessoas.
Quando se relaciona a informação supracitada com as respostas do item
como conheceu o programa, observa-se apenas 13% dos sujeitos obteve tal
informação por meio de familiares. Isto demonstra que poucas pessoas em uma
única família participam do programa. Na maioria das vezes, são os filhos que
participam posto que, como destacado anteriormente, a maioria dos participantes
do programa são crianças e adolescentes.
Sobre a participação em outras atividades do programa, dentre elas:
reuniões comunitárias, passeios, assembias comunitárias, planejamento
participativo, torneios ou festivais esportivos: 94 (67,1%) declaram que
participam de passeio, 21(15%) de reuniões comunitárias, 9 (6,4%) de
assembléias comunitárias e 6 (4,3%) de planejamento participativo. É possível
inferir que a participação expressiva nos passeios, sendo quase 70%, deve-se ao
fato de participantes não terem opções de lazer na comunidade, além do interesse
por atividades diversificadas das realizadas no cotidiano dos núcleos.
No tocante à participação em outros programas de esporte e lazer,
constatou-se que: 16 (11,4%) participantes tem participação no Programa
Segundo Tempo do governo federal, 10 (10%) no Projeto ABC do Jangurussu
mantido pelo governo do Estado do Ceará, 4 (2,9%) no Projeto Atleta Nota 10 -
uma iniciativa do governo do Estado do Ceará que beneficia crianças e
adolescente que apresentam um bom desempenho escolar - e 3 (2,1%) na
Escolhinha de Futebol do Serrinha - que se constitui como um projeto atrelado à
liga esportiva do bairro da Serrinha.
Salienta-se que das comunidades atendidas pelo programa, apenas uma
parcela reduzida, que corresponde a pouco mais de 11% dos participantes, é
atendida por programas de esporte e lazer do governo federal, com destaque para
o Programa Segundo Tempo. Este indicador mostra que as comunidades
168
atendidas pelo Programa Esporte na Comunidade têm pouco acesso ao Programa
Segundo Tempo e não m acesso ao Programa Esporte e Lazer da Cidade - que
se configuram como ações do Governo federal implementadas nos municípios e
estados da federação. Com isto, visualiza-se a pouca ou inexpressiva interlocução
entre a Prefeitura Municipal de Fortaleza, o Governo do Estado do Ceará e
Governo Federal no tocante às políticas desenvolvidas na área do esporte e lazer.
4.1.5 Síntese dos resultados apresentados no quadro analítico-descritivo
Quanto à caracterização da população e perfil socioeconômico se constatou
que 72,9% dos participantes é do sexo masculino, 83,6% deles m idades
variando segundo o segmento etário 9 a 15 anos, 95% m estado civil solteiro.
Destes, 91,4% estudam e estão matriculados no Ensino Fundamental, 84,3%
moram com os pais.
Em relação aos pais, 41,5% tem o pai trabalhando em empresa privada com
carteira assinada e com concentração de salário variando de R$ 90,00 a R$ 800,00
e 20,5% tem a mãe trabalhando em empresa privada com carteira assinada e com
concentração de salário entre R$ 465,00 e R$ 500,00. Sobre a renda familiar
mensal, esta variou de R$ 233,50 a R$ 3.720,00, com média equivalente a R$
908,76, foi verificada alta heterogeneidade na distribuição da renda familiar.
Dos participantes, 50% deles tiveram conhecimento sobre o programa por
meio de informações oriundas dos amigos. E 62,9% deles têm frequência semanal
nas atividades, no intervalo de 3 a 5 vezes por semana. E mais, 57,9% m tempo
de participação no programa, no intervalo de 1 a mais de 2 anos.
Ainda em relação aos participantes, 44,9% deles m como motivo
principal de participação no programa o gosto pelo jogo/futebol, para aprender a
jogar e treinar; 80% m como objetivos da prática de esporte e/ou prática
169
corporal aprender a jogar e continuar jogando, ser jogador de futebol, conquistar
medalhas e, com isto, melhorar de vida; 93,6% participam da modalidade futebol.
4.2 Democracia participativa: eixo central da análise
Para análise dos princípios “acesso”, “democratização” e participação
popular” com base na abordagem qualitativa, procurou-se, além da consulta ao
documento “Projeto Esporte na Comunidade” (2007) e aos artigos “Para celebrar a
utopia” e Programa Esporte na Comunidade: participação popular e análise do
diagnóstico do núcleos”, o quadro teórico construído e os registro das falas dos
atores sociais e institucionais cujo perfil é demarcado por serem gestores da
Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza vinculados direta e indiretamente ao
programa, participantes (alunos) e responsáveis (pais dos alunos), e lideranças
comunitárias. Os trechos das falas transcritas serão identificados por entrevista 1 a
24. No total, foram realizadas 24 entrevistas, mas apenas 11 serão exploradas para
análise, em função do interesse sobre o objeto do estudo e da relação com a
temática em desenvolvimento.
A discussão apresentada seconstruída com base nos princípios acesso”,
democratização” e participação política” abordados nas entrevistas em diálogo
com a literatura sobre democracia participativa, participação, gestão participativa,
cidadania e direito social. Para tanto, tem-se como elemento central para a análise
as finalidades precípuas do programa conforme Projeto Esporte na Comunidade
(2007, s/n), quais sejam:
170
(a) garantir e democratizar o acesso ao esporte e lazer como direito
social por meio do conhecimento de temas da cultura corporal através
de uma práxis pedagógica contextualizada de modo que a comunidade
possa ter novos elementos para a compreensão e reflexão da realidade
social, e
(b) potencializar a construção participativa das ões do programa em
conjunto com a comunidade entendendo-a enquanto soberana na
determinação das formas de instalação dos instrumentos de lazer e no
acompanhamento das atividades desenvolvidas.
Posto que tais finalidades se remetem à compreensão de democracia
participativa aqui abordada.
(a) acesso
No processo de constituição de uma política pública de esporte e lazer de
viés democrático e participativo, a definição da população a ser atendida e as
possibilidades e condições de acesso se constituem como fatores determinantes
para o desenvolvimento das ões que lhe oferecem sustentação. Haja vista o
atendimento do preceito de garantia deste princípio com base na noção de direito
social. Conforme o dizer de Telles (1999), os direitos sociais são percebidos como
práticas, discursos e valores que afetam a maneira como as desigualdades e
diferenças são demonstradas na esfera pública, como os interesses se apresentam e
como os conflitos se concretizam. Logo, elenca-se três questionamentos com o
propósito de subsidiar a alise, a saber: para quem é garantido o acesso? Quais as
possibilidades de acesso? Quais as condições de acesso?
O primeiro questionamento diz respeito a quem efetivamente tem acesso ao
Programa Esporte na Comunidade. No critério de seleção dos cleos, indica-se
que no contexto da extinta Célula de Esporte e Lazer prevalecia o interesse
particular de parlamentares. Com isto, percebe-se que o acesso das comunidades
ao programa, no início da vigência deste em 2005, era determinado
171
primordialmente por interesses políticos de cunho conservador que dominavam o
setor esportivo no município de Fortaleza/CE. Mesmo no contexto de uma gestão
democrática e popular, esses grupos controlavam as ações do programa (cf.
entrevista 1 e 5, Cap. III).
Tal perspectiva pode encontrar algum sentido em Castellani Filho (2005)
ao elaborar um pensamento tomando como elemento central o marco legal do
esporte no país, em específico a Lei Zico (Lei n. 8672/93 e decreto n. 2.574/98) e
a Lei Pe (Lei n. 9.615/98 e decreto n. 2.574/98) que colocam em xeque
interesses liberalizantes relacionados à autonomia do mercado esportivo e
interesses conservadores que entendem a liberalização como uma ameaça ao
poder instituído oligarquicamente. Este raciocínio possibilita compreender,
notadamente, no que tange aos interesses conservadores, como a ação de
determinadas forças políticas nos governos fazem prevalecer interesses que são
alusivos a determinados grupos em detrimento da maior constituída pela
população brasileira que, a priori, deveria ser beneficiada pela política no caso
específico do Programa Esporte na Comunidade. Ainda no embate entre
interesses liberalizantes e conservadores, o autor esclarece que embora estes, em
uma situação de embate, tenham impulsionado a autonomia e a pluralidade como
fator de mudança, em nenhum deles foram consolidadas alternativas norteadas
por uma percepção de esporte como uma necessidade e/ou direito social. Daí, ser
necessário um rearranjo na organização dos critérios de seleção dos núcleos (cf.
entrevista 1, cap. III).
O segundo questionamento se refere às possibilidades de acesso. O
documento balizador do programa não prescreve cririos que limitem a
participação de nenhum segmento etário nas atividades do programa. No entanto,
o quadro analítico-descritivo pelos resultados do perfil dos sujeitos revela que a
maioria dos participantes dos núcleos investigados m idade entre 9 e 15 anos,
isto corresponde aproximadamente 84% deles. Além disto, quase 73% dos
172
participantes são do sexo masculino. Ou seja, a maioria dos participantes do
programa são crianças e adolescentes meninos, fato evidenciado no relato descrito:
[...] geralmente no PENC é mais criança. Então é principalmente esse blico que nós
estamos atendendo [...]. No programa geralmente é mais meninos que participam, [...]
meninos mais do que meninas, isso é um fato, mas a gente tenta mobilizar as meninas
também [...] (Entrevista 3).
E o terceiro questionamento aponta para os recursos orçamentários,
estrutura material e estabilidade do programa na comunidade. Quanto à
idealização do programa em termos de efetivação das ações coloca-se que:
o programa foi pensado inicialmente por meio do debate seguinte: nós temos tanto de
dinheiro para desenvolver o PENC. Então a questão é: nós priorizamos mais
comunidades terem o programa ou priorizamos uma comunidade ter um recurso bastante
amplo e desenvolver? [...]. Passou que nós iríamos oferecer as condições básicas de
trabalho e iríamos oferecer a mais comunidades. Essa foi a proposta (Entrevista 2).
Pela fala do entrevistado se observa a prioridade definida pelo grupo gestor
responsável pela implementação do programa, que se pauta no atendimento ao
maior número possível de cleos, mas que, por outro lado, reduz/limita a oferta
de estrutura material aos núcleos, conforme especificação e quantidades descritas:
[...] um professor para cada núcleo inicialmente, com bolas redes e bombas [...]. Bolas
daquela modalidade que era possível desenvolver naquele local, ou seja, se era uma
quadra era bola de futsal. A quantidade era de três bolas a cada quatro meses, sendo três
bolas de cada modalidade no caso do voleibol, basquetebol e handebol, para o futebol
eram quatro bolas. Além disto, tinha a rede de vôlei, futebol e futsal e a bomba. Enfim,
esta era a estrutura material (Entrevista 2).
Esta foi a estrutura material instituída para subsidiar o funcionamento do
programa no que tange às atividades sistemáticas. Além da definição de um
professor para atuar em cada núcleo. Na realidade em questão se observa pelo
relato apresentado abaixo o quanto o recurso orçamentário-financeiro era escasso
173
para o atendimento de uma maior quantidade de comunidade, segundo as palavras
do entrevistado.
[...] o orçamento era 700 mil, este era praticamente o orçamento da Célula. Depois
teve um incremento e este passaria para um valor entorno de 1 milhão ou 1 milhão e
250 [...]. Tinha um orçamento específico do esporte [PENC], só que o nosso orçamento
era utilizado em outras coisas da lula. Na verdade a Célula trabalhava com um
orçamento [...] e a secretaria ainda hoje trabalha com um orçamento [...]. O orçamento
do esporte era metade do orçamento da célula. Só orçamento do esporte era metade do
orçamento todo da Célula. Quando houve a criação da secretaria foi do mesmo jeito,
foi o mesmo orçamento. Quer dizer, o orçamento para o esporte e lazer era [...], mas
para o que a gente se propunha 1 milhão de reais não dava para nada (Entrevista 1).
Com isto, é possível perceber que muito embora a política que subsidia as
ações do programa se paute na garantia do direito social ao esporte e ao lazer, as
condições de acesso em termos de recurso orçamentário não contemplam as
demandas no que se refere ao custeio da estrutura material. Outra questão que
dificultava a viabilização da estrutura material é abordada na fala a seguir:
[...] o programa em si, em seu projeto, não tinha material, porque ele já era vinculado à
secretaria. Isso dificultou muito, porque hoje, por exemplo, nós estamos sem material
uma vez que a licitação da secretaria não saiu. Então, o programa ficou sem material.
Com o desenvolvimento do programa em 2007, 2008, 2009 foi se agravando essa
situação do material, porque a célula passou a ser secretaria e assim as outras
secretarias já não ajudavam mais a lula, pois esta tinha passado a ser SECEL e
entendia-se que ela deveria caminhar com as próprias pernas [...]. Essa é a situação
de hoje, setembro de 2009, sendo que desde julho de 2009 nós estamos em uma
situação mesmo em que não temos material e o programa está com grandes
dificuldades de desenvolver as atividades (Entrevista 2).
Este quadro se vincula à escassez de recurso orçamentário-financeiro no
contexto da extinta Célula de Esporte e Lazer que se perpetuou na Secretaria de
Esporte e Lazer, como fator agravante se identifica a inexistência de orçamento
específico para manutenção das atividades do programa. Ocorre que tal situação
impacta diretamente na qualidade do atendimento oferecido às comunidades
174
como destacam os entrevistados ao serem questionados sobre o que poderia ser
melhorado/aperfeiçoado em relação ao programa.
a começar pelo espaço, porque a comunidade não tem um espaço adequado para isto. As
aulas são dadas no meio da rua com a poeira batida. O professor tem que aula muito
cedo, porque a partir de 9h não tem mais condições. Não considero adequado o local
onde ele desenvolve o esporte com a garotada. É um chão de terra batida [...]. O ideal
seria um local apropriado, uma quadra coberta [...], mas isto é uma coisa que vai demorar
muito ainda, da comunidade ter um espaço mais saudável para a garotada poder praticar
um esporte (Entrevista 16).
[...] melhorar o campo, porque onde a gente joga tem muita pedra. Todo dia que a gente
sai do campo, a gente sempre saí com o pé machucado (Entrevista 15).
[...] eu queria mais um professor, mais gente que assumisse as coisas, que se interesse
mais para tratar as crianças e ajudar. [...] porque acontece do professor [...] não ter
condições de vir e tem que ter uma pessoa para lhe substituir e também porque a
turma é muito grande [...] (Entrevista 13).
um lugar fixo, porque o professor mudou muito de local, por conta de não ter um lugar
fixo para nós fazermos as atividades e no momento nós permanecemos sem um lugar. E
também os equipamentos, porque o professor tem muita boa vontade, mas falta isto. Nós
fazíamos os exercícios com cabo de vassoura, com garrafas, nós não nunca deixamos de
fazer a atividade porque não tínhamos equipamentos. Mas, penso que se tivessem
equipamentos as pessoas se interessariam mais, pois elas diziam assim: ah eu vou
levantar um cabo de vassoura e uma garrafa e vou ficar sarada”? Elas ficavam pensando
que aquilo o ia servir para nada. Mas para quem quer fazer serve, isto é, se fizer
continuamente, porque se for só uma vez não vai servir de nada não (Entrevista 18).
Também é identificada uma deficiência no que concerne ao
acompanhamento do programa nas comunidades por parte da Secretaria de
Esporte e Lazer. Uma participante também narra acerca das condições do local no
qual acontecem as atividades, como exposto:
175
a prefeitura olhasse mais para cá, porque aqui têm muito jovens. E o trabalho que o
professor faz com a gente ele tinha que ter mais apoio e incentivo para fazer com os
jovens, porque os jovens daqui são muito carentes. Eu tenho um filho de 15 anos a
Educação sica que ele faz é na escola naqueles dias e acabou. E os outros dias? Ele
fica em casa. Era para ter uma atenção para jovens na semana ou no final de semana,
porque nessas áreas críticas quem precisa de mais atenção são os jovens. A gente se
ocupa com algumas coisas, mas os jovens, eles vão para as esquinas, vão se enveredar
para o caminho das drogas. E aqui é uma favela muito carente. E enquanto falta gente
para fazer o bem como o professor tem vários para fazer o mal, para chamar seu filho
para ser aviãozinho e enveredar no mundo das drogas. Então quer dizer, a prefeitura
deveria olhar mais para este lado, porque é melhor a pessoa cuidar antes dos jovens
entrarem no mundo das drogas do que depois que eles estiverem lá, pois para se
recuperarem vai ser mais trabalhoso (Entrevista 18).
Outro fator que alude às condições de acesso e interfere na garantia dele é a
situação de instabilidade no funcionamento dos cleos como é ressaltado na fala
mencionada:
[...] nós temos hoje (2009) 39 núcleos. De 2005 até hoje nós tivemos em torno de 54
núcleos, que funcionaram e não estão mais funcionando, 54 comunidades tiveram o
programa, alguns fecharam por impossibilidade mesmo, outros por questões pessoais do
professor e nós não conseguimos mandar outro professor para aquele local, tiveram
rias questões (Entrevista 2).
Esta realidade demonstra a incerteza no que diz respeito às condições de
repasse dos recursos orçamentários previstos para manutenção das atividades
junto aos núcleos. O que pode interferir negativamente em seu funcionamento e
na credibilidade que lhe é atribuída por parte dos participantes e demais pessoas
que o acompanham nas comunidades. Posto isto, questiona-se: como garantir o
acesso a um direito social sem que seja garantida a ação que legitima esse direito?
Então, observa-se contradição entre os pressupostos do programa, e a
política que o legitima, mesmo sendo uma política ancorada em uma gestão
democrática e popular. Conforme Jacobi citado por Suassuna et al. (2007), o
Estado representado pelo governo é capaz de desempenhar funções contraditórias,
176
de acumulação e legitimidade a fim de construir condições para a existência de
um consenso por meio da ação de suas instituições.
Logo, fica claro, nos limites do programa, como o Estado brasileiro, a
partir de sua estrutura organizativa, limita a ampliação do direito social, neste
contexto do direito ao esporte e ao lazer. Diante da realidade apresentada, que em
certa medida impacta e limita o acesso da população ao conjunto de ações do
programa, ressalta-se a necessidade de estabelecer novos parâmetros para
manutenção e funcionamento do Programa Esporte na Comunidade, no sentido de
ampliá-lo e qualificá-lo como ação de governo/Estado prevista no orçamento do
município e assegurada por lei. Somente assim, a população poderá usufruir
plenamente do esporte e do lazer como direito social.
(b) Democratização
Discutir a democracia participativa nas intervenções governamentais de
esporte e lazer pressupõe atentar para o princípio da democratização, uma vez que
garantir a participação do coletivo que compõe a esfera comunitária seria o
primeiro movimento no sentido de legitimação da existência da democracia no
âmbito destas ações e, em particular, no Programa Esporte na Comunidade. Outro
movimento diz respeito à ampliação dos espaços de participação de cada ator
social no conjunto das ações a serem desenvolvidas. Nesta acepção, faz-se alusão
à Brandão (2004) orientado por Poulantzas, Macpherson e Pateman ao afirmar
que, a participação do povo não deve ser restrita apenas à escolha dos líderes no
governo, devendo ser expandida para outras esferas da vida social e política.
Diante de tais supostos, uma primeira estratégia de democratizar o esporte
e lazer no conjunto da intervenção governamental em questão, foi garantir a
177
abertura de canais de diálogo com as comunidades a fim de se construir um
debate em torno de suas demandas de esporte e lazer, como expressa o gestor:
[...] abrir canais onde? Nessas reuniões, nas aulas, nas reuniões da própria
comunidade. Se eles estão querendo alguma demanda em relação ao esporte e lazer em
uma reunião comunitária deles mesmos. Da associação pode deliberar sobre o PENC
[...]. Então nós estamos abrindo canais. Mas canais que não existiam. Então isso já é
um passo a frente. Quando nós falamos: gente, nós viemos saber de vocês se é possível
ou o implantar o programa aqui! é diferente! Por que qual é o programa? Qual é a
demanda de esporte e lazer que quer ouvir a comunidade? Geralmente, se coloca!
Então isso é algo diferente. Estamos ouvindo e vamos saber se eles querem isso.
Porque nós só oferecemos isso: o conhecimento e o professor. Então são canais que se
abrem. Estratégias que eu coloque que ainda são muito pequenas, mas diferentes em
relação à realidade existente anteriormente no contexto das poticas de esporte e lazer
no município [...] (Entrevista 4).
Como se coloca, a construção de canais de diálogo seria um aspecto
inovador diante do contexto político que esteve em vigor nos governos anteriores.
Muito embora se reconheça que são estratégias que assumem uma dimensão
diminuta, contudo apontam para uma nova perspectiva de configuração das
intervenções estatais na pasta de esporte e lazer.
O gestor esclarece ainda que,
[...] essas reuniões comunitárias são necessárias para implantação do núcleo. A
principal estratégia são essas reuniões que acontecem antes e depois da assembléia, é
nela que nós colocamos os horários, definimos as modalidades e outras questões
relacionadas ao núcleo. E eu coloco isso como sendo nosso limite. Porque nós
colocamos para discutir o horário, o local e as modalidades. Então nós precisamos
expandir essa assembléia para coisas mais amplas. Por outro lado, nós sabemos a nossa
carência diante do fato de não poder dar esse poder de deliberação, uma vez que não
temos como atendê-las. (Entrevista 4).
Nesta, destaca-se os limites no processo de interlocução com as
comunidades, tendo em vista o atendimento das demandas por esporte e lazer.
Entretanto, esclarece-se que o diálogo com as comunidades ocorre com a
finalidade de atender a uma demanda delas e que tamm impulsionou ões de
178
resistência por parte dos professores que a princípio pretendiam atuar apenas em
uma modalidade esportiva, como visto:
[...] foi um processo que nós fomos amadurecendo. Pois em 2005 com a
implementação do PENC nas comunidades o antigo gestor achou que estava fazendo
um favor mesmo e chegou às comunidades sem estabelecer nenhum diálogo e colocou
os programas. Sendo que dos 100% que ele colocou apenas 5% conseguiram se efetiva
de fato. Os outros 95% tiveram problema de rejeição da comunidade ao programa. Nos
processos seguintes nós aprendemos com esse erro. De maneira que três meses depois
os processos foram de total diálogo com a comunidade. [...] a nossa grande dificuldade
nesse processo foi o próprio professor, posto que ele não compreendia que precisava
está formado para trabalhar com a questão da cultura corporal, ela achava que era
professor de modalidade. [...] nós procurávamos o professor de Educação Física [...]
(Entrevista 5).
Em vista disto, sublinha-se a importância do protagonismo dos atores
sociais (participantes, lideranças comunitárias, pessoas da comunidade) nas ões
que afetam diretamente o funcionamento e permancia do programa nas
localidades, por meio de sua resistência à implementação dos cleos sem a
construção de um diálogo com as comunidades.
Ademais, reconhece-se como um movimento que sinaliza para a legitimação
do princípio democratização no âmbito do programa o fato de tornar o
conhecimento pertinente à cultura corporal acessível às comunidades, segundo o
relato dos gestores em destaque:
[...] a iia era a cultura corporal, trabalhar o conceito de cultura corporal, nosso objeto
o é o esporte, nosso objeto é a cultura corporal (Entrevista 1).
então está relacionado mesmo a cultura corporal, levar o conhecimento, enquanto
elemento que nós possamos estar trabalhando em relação ao esporte e ao lazer, então
isso é o básico (Entrevista 4).
Quanto à ampliação dos espaços de participação dos atores sociais da
comunidade no conjunto das ações a serem desenvolvidas, verifica-se que além
179
das reuniões e assembléias comunitárias que propiciavam a mobilização,
articulação e organização das comunidades em torno do programa; procurou-se
possibilitar ao coletivo local a ocupação dos diferentes espaços de lazer e
socialização dos comunitários, sem, contudo levar em consideração seu estado de
conservação, como ressaltado na fala exposta abaixo:
[...] se tiver um campo batido e não tiver trave estamos lá. Tem algum espaço de lazer
onde se possa fazer alguma coisa, então estamos lá. Não necessariamente se precisa da
estrutura de uma quadra, de um canto ou outro. Assim, a comunidade teve um espaço
onde é possível fazer alguma atividade nós estamos lá [...]. E no espaço com uma infra-
estruturanima já dá para fazer mais de uma modalidade (Entrevista 4).
Há, portanto, uma preocupação por parte do grupo gestor no sentido de
garantir a democratização dos espaços nos quais pode ser possível a realização
das atividades do programa. O que não implica em uma maior participação do
coletivo da comunidade nos núcleos se levando em consideração os resultados
obtidos em relação à participação por sexo em que há uma incidência maior de
participantes do sexo masculino, e por segmento etário em que maioria dos
participantes se concentra no intervalo de idade de 9 a 15 anos.
Sumariamente, em vista dos movimentos elucidados ao levar-se em
consideração a existência da democracia participativa no âmbito do Programa
Esporte na Comunidade com base no princípio democratização”, que foram: (1)
garantir a participação do coletivo que compõe a esfera comunitária e (2)
ampliação dos espaços de participação de cada ator social no conjunto das ações
desenvolvidas, constata-se a construção de canais de diálogo importantes com a
comunidade algo que na política anterior e no início da gestão do governo em
xeque não fora identificado. Estes apesar de assumirem uma configuração
diminuta e limitada no tocante ao atendimento das demandas de esporte e lazer
das comunidades apontam para uma nova perspectiva de configuração das
intervenções governamentais no setor do esporte e lazer, de modo determinante
180
no município de Fortaleza/CE. Evidencia-se aqui, a importância do protagonismo
dos diferentes atores sociais das comunidades nas ações que afetam diretamente o
programa em cada localidade seja com ações de apoio e/ou resistência ao
governo. Também se reconhece como relevante o fato do conhecimento inerente
à cultura corporal ser garantido às comunidades atendidas.
(c) Participação política
Ao discutir a democracia participativa nas políticas públicas de esporte e
lazer se traz à tona a necessidade de se conhecer os princípios e mecanismos que
legitimam esse modelo de democracia que tem como um de seus determinantes, a
participação. Conjectura-se que esse novo tempo em que a participação se amplia e
se ativa, passa-se a regular a administração blica e os governantes, determinando
um novo modelo de administração que obriga a gestão a rearranjar-se em termos
de planejamento organizativo e material humano. Entretanto, deve atentar para o
fato de que o novo status adquirido pela participação no campo da gestão pública
não diz respeito somente a uma mudança política e teórico-ideológica mas,
sobretudo, às determinações da “modernidade radicalizada e da globalização
capitalista” (NOGUEIRA, 2004).
Com base nisto, a participação, que no escopo do programa é nomeada
participação popular, vincula-se à idéia de que, conforme Souza Sobrinho et al.
(2006, p. 7),
as práticas de participação popular significam a construção de uma
esfera de poder que aponte uma relação entre Estado e sociedade onde a
sociedade civil possa pautar a transparência das ações de governo, a
inversão de prioridades e a abertura dos canais que viabilizem o controle
político da gestão, tendo em vista a conquista da hegemonia na
sociedade em torno de um programa socialista.
181
Para tanto, esse autor ressalta que os atores sociais envolvidos com o
programa nas comunidades também precisam compreender as variáveis, as
conjunturas e as correlações de força presentes na esfera do governo e do Estado.
Pelo exposto, infere-se que a proposta desta política traduz-se em um
comprometimento com a participação das comunidades materializada no
envolvimento delas nas decisões e no controle social das ações, além de
possibilitar a potencialização da comunidade no sentido de organizar-se e planejar,
conjuntamente com o Estado, políticas públicas voltadas ao atendimento de suas
demandas sociais e também estimular a auto-organização desta em favor do seu
direito ao esporte e ao lazer.
Com fundamento em Teixeira (2002), na acepção de participação com
controle social na realidade do programa, esta se materializa em um processo no
qual os atores e organizações sociais das comunidades monitoram a ação do
governo via ação dos gestores no tocante às questões sociais e políticas pertinentes
ao programa no contexto dos cleos, a fim de garantir o cumprimento das ações
planejadas e atendimento das demandas por esporte e lazer.
Sob tal orientação, procurou-se construir condições objetivas de
participação popular que culminaram com a instituição das assembléias
comunitárias de esporte e lazer
30
, que consistiam em espaços de fortalecimento da
comunidade como coletivo, e também de mobilização e participação popular; e as
comissões comunitárias de esporte e lazer
31
, que visavam suprir a exigência de
organização da comunidade para uma constante e efetiva participação na
construção do núcleo de esporte e lazer. Pretendia-se como isto garantir espaços
nos quais as comunidades pudessem expor suas demandas de esporte e lazer, assim
30
No primeiro momento a intervenção das assembléias é limitada ao programa, de modo que as
decisões a serem tomadas pertencem exclusivamente à realidade de cada núcleo.
31
Esta deve ser composta por delegados e delegadas eleitos na Assembléia Comunitária de
Esporte e Lazer. Cabe a mesma acompanhar e auxiliar o professor/a em sua prática e contribuir
para a mobilização da comunidade. Com isto, busca-se “integrar a sistemática de participação
popular às práxis pedagógicas do programa” (SOUSA SOBRINHO et al., 2006, p. 8).
182
como exigir atendimento junto às instituições responsáveis. Além disto, essas
instâncias eram utilizadas também com a finalidade de gerar mudanças na
organização comunitária. Assim sendo, o debate representava a estratégia de
diálogo com os atores sociais nas diferentes instâncias de participação com o
propósito de assegurar que as ações pertinentes ao programa sejam decididas
coletivamente em conformidade com as demandas da comunidade (SOUZA
SOBRINHO et al., 2006). Pelo anunciado, é plausível compreender que essas
instâncias consistiam em espaços participativos, assim sendo, deveriam ter caráter
essencialmente educativo e contribuir no sentido de fortalecer os vínculos
comunitários e a tomada de consciência em relação à sua condição de classe, uma
vez que, como salienta Sousa Sobrinho et al. (2006), o atendimento às demandas
das comunidades não pode ser realizado sem a efetiva participação popular.
Diante da configuração assumida pela participação popular, seria essencial
que os atores sociais direta e indiretamente envolvidos no programa se
apropriassem de conhecimentos/conceito de participação popular, de organização
comunitária e dos mecanismos de participação popular. E paralelo, anterior ou
depois da apropriação de tais conhecimentos, seria necessário que participassem
de vivências, ações práticas, pois se entendia que o conceito surgiria destas
intervenções, ou seja, da ação (doc. Projeto Esporte na Comunidade, 2007, s/n).
Cunha et al. (2009, p. 5), ao abordar a participação popular a partir de um
diagnóstico dos cleos (ver anexo 2) obtido por meio do uso das técnicas de
investigação observação direta e participante, questionários, entrevista com grupo
focal e entrevistas diretas que foram sistematizadas em um documento síntese,
identificou nove núcleos do programa com expressivo potencial de/para a
participação popular, a saber: Vila Manoel Sátiro, Parque Santana, Grande
Jangurussu, Presidente Kennedy, Bairro Hellery, Pan Americano, Vila
União/Planalto Universo, Parque Manicura e Rosalina.
183
É importante evidenciar que a investigação supracitada foi orientada por um
documento que permitia a identificação no que concerne à participação popular:
(a) as ferramentas de participação popular: reuniões, comissões,
assembléias, planejamento participativo, participação no orçamento
participativo; b) mobilização: Se ocorrem as mobilizações dentro da
comunidade, quem realiza tais mobilizações e com se realiza; c)
Parcerias e organização comunitária: Se existem parcerias com as
entidades comunitárias, como quem são as parcerias e como se
processam;
(b) impacto social: como o programa é visto pela comunidade
(lideranças formais, lideranças naturais, pais de alunos, alunos,
comunidade em geral).
Outro aspecto considerado diz respeito à infraestrutura dos núcleos: recursos
materiais (quantidade, qualidade, estado de conservação, tempo de duração) e
espaço sico (onde ocorrem as atividades, o estado de conservação do espaço, a
iluminação e o acesso - físico e simbólico). Salienta-se que o estudo ora exposto,
não traz uma descrição da participação popular nos cleos que possam ser
observadas por meio de ações/situações concretamente vivenciadas pelas
comunidades que tenham impulsionado em mudanças em termos de infra-
estrutura, orçamento e outros, ele apenas apresenta sumariamente o modo como
elas estão se organizando, a partir do potencial de cada uma, em torno do
programa.
Após caracterizar a participação popular com base no documento projeto
norteador do programa, em Sousa Sobrinho et al. (2006) e em Cunha et al. (2009),
passa-se a evidenciar a maneira como a participação popular se consolidava no
cotidiano das comunidades a partir da percepção do grupo gestor, dos
participantes, das lideranças comunitárias e demais pessoas da comunidade.
É interesse esclarecer, segundo o entrevistado que:
184
a participação popular era uma proposta pedagógica. s não tínhamos nenhuma crença
de que o caminho era a participação popular. Nem muito menos de que o caminho era a
ampliação da democracia, posto que esta não se ampliou na verdade, se ampliou a
possibilidade do debate. Entendido como algo que tem a possibilidade de acumular
conhecimento. Mas, em termos de democracia, eles não decidiam nada na verdade. Se a
comunidade falasse: nós queremos uma quadra! s não tínhamos condições de fazer
uma quadra. Se a comunidade dissesse: nós queremos uma reforma aqui! Nós não
tínhamos condições de fazer isso. Então na verdade nós tentávamos mostrar a eles que
nós não poamos fazer isso, que quem faz isso é [...] (Entrevista 1).
E reforça a partir de sua compreensão acerca da participação popular no
programa que o propósito último seria a organização comunitária para tanto os
atores sociais deveriam perceber-se como sujeito histórico no processo de
construção do conhecimento que era permeado pelo diálogo,
[...] era um momento pedagógico para eles [a comunidade] se entenderem como sujeitos
históricos. Mas o objetivo final era que eles como sujeitos históricos se organizassem.
Porque a organização não pode ser algo simplesmente abstrato. Ah vamos nos organiza
para fazer isso! Isso tem que ser feito a partir de um diálogo e a iia era se organizar em
torno do programa e do núcleo que era algo real e viabilizar a estrutura, intervir no
processo pedagógico, debater e acumular conhecimento e se preparar para algo maior
(Entrevista 1).
Existe, portanto, uma ação pedagógica que orienta a ação dos atores sociais
participantes. Esta é mediada pelo professor em sua ação político-pedagógica de
mobilização e articulação da comunidade com base nos mecanismos de
participação popular. Sendo assim, é extremamente fundamental que o professor
contribua na consolidação de rotinas com a comunidade em espaços que a
comunidade fale, reflita e construa algo para ela relacionado ao esporte e ao lazer”
(doc. Projeto Esporte na Comunidade, 2007, s/n). Sabe-se que a referência de
organização comunitária aludida pressupõe o reconhecimento do ser cidadão, ou
seja, é necessário conforme os dizeres de Santos (1987) aprender a cidadania e, ao
mesmo tempo, desenvolver a competência humana de fazer-se sujeito, para
185
construir a história do esporte e lazer na comunidade de maneira coletiva e
organizada (DEMO, 1995).
Porém, devido aos impasses na gestão da Célula de Esporte e Lazer, o
sentido de organização comunitária proposto foi utilizado para justificar
inoperância dos órgãos responsáveis pela manutenção dos equipamentos de esporte
e lazer e a escassez de estrutura material como se verifica:
que se tornou um processo que essa organização foi de certa forma assimilada pela
gestão [...]. Assim, nós não tínhamos orçamento para nada e então nós fomos tapar os
buracos” que a gestão não conseguia resolver. Então resulta no que se propõe a
participação popular agora, é a comunidade ajeitando a quadra, conseguindo a bola do
próprio bolso, a comunidade bancando eventos [...] Quer dizer, isso não é um trabalho
[...] No meu entendimento isso é militância, mas, essa militância não chega ao objetivo
que era posto inicialmente, porque ela não avançava na perspectiva de classe, é uma
milincia meio ativista, ela não tem clareza das contradições [...] ela reduziu o papel do
Estado, ela está dando conta do Estado. Se ela fizesse o debate da contradição e fosse
para cima” do Estado, beleza, era o que nós queríamos mesmo, trabalhar a soberania da
comunidade. Nesse caso não é soberania da comunidade, é substituir o Estado mesmo.
Então eu tentava toda hora desmistificar o debate da participação popular e da democracia
e chegou a ponto de uma contradição mesmo dentro da própria gestão, dentro da própria
coordenação (Entrevista 1).
Pode se reportar a Teixeira (2002) ao discorrer sobre a participação
orientada à expressão que possui um caráter simbólico e se limita apenas a
intervenção por meio das ideias, ainda que cause algum impacto ou influencie no
processo de tomada de decisão.
A ausência de manutenção dos espaços de realização das aulas levou a
comunidade a organizar em torno do programa em substituição ao Estado como
destacada na fala anterior e que é retratado na fala do líder comunitário:
[...] pintamos os campos, pintamos os alambrados, colocamos as redes, limpamos os
campos, então quem mantêm tudo isso somos s. Eu até entendo e reconheço que é
direito da comunidade, é direito dos moradores zelar pelo patrimônio, mas infelizmente
nem todos pensam assim, que tem que zelar para poder preserva [...] (Entrevista 11).
186
Compreende-se este modelo de participação como sendo orientado para a
decisão posto que se reveste em práticas de intervenção organizada e não
episódicas dos atores da sociedade civil, esta é reconhecida como fundamental e
definidora. Entretanto, Texeira (2002) adverte que a participação orientada para a
decisão e a participação orientada para a expressão tem possibilidades de
efetivação limitadas. O contexto descrito acima sobre a participação popular é
visto sob o enfoque do autor, no qual esta é utilizada pelos governantes com o
propósito de envolver segmentos dominados da população em seus projetos
políticos, como estratégia de redução de custos e com objetivos de controle
ideológico, com vista a legitimar o governo e os programas de cunho
compensatório.
Ao focar a participação como um mecanismo de intervenção/aproximação
da gestão com a comunidade que foi impulsionado pelos novos arranjos societais
os quais passaram a questionar a democracia representativa, conforme Nogueira
(2004), é válido evidenciar o modo como ocorre o diálogo entre a Secretaria de
Esporte e lazer e as comunidades atendidas identificadas pela lideranças
comunitárias e pelos participantes do programa.
A comunidade da Rosalina está de parabéns e a prefeita está de parabéns, porque a nossa
comunidade apesar de alguns moradores não reconhecerem. Mas o momento em que a
comunidade foi mais assistida foi no atual governo, nós conseguimos [...] e o Esporte na
Comunidade [...] (Entrevista 17).
[...] não esse elo entre a SECEL, a associação e a comunidade. Gostaria de enfatizar
que a SECEL depois que colocou o PENC aqui, ela tem o projeto, porém, ela não assiste
à comunidade (Entrevista 20).
Quanto à divulgação, eu penso que no início ela existiu, esse contato entre a associação e
a SECEL para que esse projeto viesse para [...]. Mas quanto à questão de como é o
acompanhamento da SECEL em relação ao programa aqui na comunidade, de como se
esse apoio à comunidade eu não sei falar muito, eu não tenho conhecimento disto, de
como é isto (Entrevista 16).
187
Não conheço nenhuma ação da associação e nem da prefeitura no conjunto (Entrevista
15).
Com isto, chama-se a atenção para divergência em relação à atuação da
secretaria em questão e em última instância a gestão do programa nas
comunidades apontadas pelas lideranças comunitárias que correspondem a
primeira e a segunda fala. Também se acentua o desconhecimento por parte dos
participantes em relação a esse aspecto.
Outra consideração a ser feita é a falta de interesse no que concerne à
criação de mecanismo de participação popular na comunidade, como informa a
liderança comunitária/agente social de esporte e lazer:
o [...] teve aqui, mostrou a importância e nos incentivo a formar o conselho de esporte. Só
que infelizmente nessa área os moradores não deram apoio. Não teve nenhuma pessoa
que fosse atrás com baixo-assinado colhendo assinatura e na hora de forma esse conselho,
o houve pessoas interessadas em querer formalizar [...] (Entrevista 11).
É possível justificar tal falta de interesse pela ausência de práticas inerentes
à constituição do poder local que consoante Texeira (2002) é sempre visto como
centro de atraso e mandatismo aparece hoje, em alguns municípios como cenário
de inovações, seja como novos agentes políticos, seja como movimentos e
organizações da sociedade civil. Porquanto, este mecanismo de participação
precisa ser apreendido pelas comunidades para, então, fazer parte de seu cotidiano,
de sua cultura nos dizeres de Santos (1987).
Em síntese, pode-se afirmar que a participação no Programa Esporte na
Comunidade é demarcada pelo ideário da participação popular como mecanismo
pedagógico. Entretanto, pelas falas dos diferentes atores sociais que atuam nele, é
possível considerar que esta se propunha a ser bem mais que isso, no sentido de
que tinha como finalidade última a organização das comunidades não somente em
188
torno do programa, mas tamm no sentido delas interpelarem o Estado que, ao
mesmo tempo, seria a única instituição capaz de garantir seu direito ao esporte e ao
lazer.
Por outro lado, -se que eram impostos dois limites para a participação
política”, quais sejam: o modo como o Estado se estrutura, que tem como escopo a
ineficiência de seus órgãos e a burocratização no que tange, respectivamente, à
construção e manutenção de equipamento de esporte e lazer e aos recursos
orçamentários, isto é, a viabilização de condições objetivas para o funcionamento
dos núcleos; e a carência dos atores e das organizações sociais de experiências
norteadas por este princípio, que de certa forma impediriam o avanço do debate
em torno da soberania popular da comunidade naquele momento.
Pelo exposto se pode apontar que a participação política como princípio da
democracia participativa, além de representar um avanço no que diz respeito à
garantia de acesso e à democratização do esporte e lazer, é de suma importância
para a obtenção de condições subjetivas e objetivas de consolidação do esporte e
do lazer como direitos sociais, especificamente no Programa Esporte na
Comunidade.
189
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A democracia participativa entendida como um ideal democrático que
supõe o envolvimento dos cidadãos nos diferentes níveis de participação na
sociedade se constituiu no objeto do estudo. Mediante isto, investigou-se os
princípios “acesso”, democratização” e participação política”, que
compreendem o conceito de democracia participativa, nas políticas públicas de
esporte e lazer do município de Fortaleza/CE considerando como recorte o
Programa Esporte na Comunidade. Para tanto, teve-se como problema de
pesquisa o seguinte questionamento: em que medida os princípios norteadores da
democracia participativa repercutem no quadro das políticas públicas de esporte e
lazer do governo municipal de Fortaleza/CE no período (2005-2008),
considerando como parte desta política o Programa Esporte na Comunidade?
Com base neste recorte, partiu-se para analisar as repercussões dos
princípios norteadores da democracia participativa que se faziam presentes no
programa e que estavam reportados à autonomia e auto-organização social,
buscando-se também, considerando o perfil da população atendida, a
identificação e alise das estratégias de acesso” desenvolvidas; bem como, a
verificação da consolidação dos princípios de democratização” e de
participação política” no que diz respeito ao direito ao esporte e ao lazer. Como
pressuposto se afirmou que o modelo de gestão da política municipal de esporte e
lazer, bem como as estratégias presentes em suas ações inviabilizavam e/ou eram
insuficientes para a consolidação da democracia participativa, considerando o
190
contexto específico (2005-2008) no que concerne ao Programa Esporte na
Comunidade (Fortaleza/CE).
O Programa Esporte na Comunidade desde seu surgimento, que se deu em
2005, apresentou dois modelos institucionais. O primeiro dizia respeito a um
modelo vinculado ao esporte de rendimento que estava ancorado em
acordos/questões políticas que determinavam os locais de implementação dos
núcleos, assim como os princípios e práticas de esporte (cf. entrevista 1 e 5). Este
primeiro modelo institucional persistiu até o ano de 2006, quando gestores da
área de Educação Física referenciados por uma teoria crítica tomam para si a
responsabilidade da direção do programa e criam o segundo modelo institucional,
vigente no período (2006-2009). Este foi formulado com base nas experiências da
gestão no setorial de esporte e lazer do Partido dos Trabalhadores, notadamente,
dos governos de Caxias do Sul/RS, Recife/PE e Belém/PA e no ideário político
dos atores sociais que estavam na direção da Célula de Esporte e Lazer a época
(cf. entrevista 5). Esta pasta pretendia desenvolver uma política de esporte e lazer
voltada à classe trabalhadora, estimulando as práticas participativas e
democráticas que apontassem para a transformação social, tendo por princípio a
inacessibilidade dos sujeitos, pertencentes a essa classe social, aos espaços e
práticas de esporte e lazer (cf. doc. Projeto Esporte na Comunidade, 2007).
Do ponto de vista da análise, pôde-se verificar que para o estabelecimento
do programa em questão houve conflitos de interesses no cenário potico-
partidário no interior da lula de Esporte e Lazer, culminou com a liderança do
Partido dos Trabalhadores. Esse conflito de interesses assegurou um rearranjo
conceitual e metodológico, ao passo que a visão preponderante até então se
vinculava ao esporte de rendimento e foi redefinida, passando a assumir o
conceito de cultura corporal, considerando o esporte e o lazer como direitos
sociais pelo menos sob o olhar do discurso oficial”.
191
No processo de intervenção, o Programa Esporte na Comunidade utilizou
como estratégias para aproximação e reconhecimento da comunidade a
identificação das lideranças locais (cf. entrevista 4). Nesta direção, inicialmente
(momento do surgimento do programa com base em seu segundo modelo
institucional - 2006), o grupo gestor não discutia, durante as assembléias e
reuniões com a população atendida, questões reportadas à infraestrutura e ao
funcionamento dos núcleos, mas também aspectos relacionados aos eixos
norteados, aos conceitos e às concepções do programa. Também realizava
consulta às comunidades no tocante à aceitação ou não do programa em cada
localidade. Contudo, paulatinamente as estratégias de ampliação da participação e
envolvimento comunitário foram sendo restringidas em função de aspectos
burocráticos (cf. entrevista 1 e 4), mas que nas entrelinhas pode ser analisado pela
perda da relevância do programa na gestão do Partido dos Trabalhadores.
Quanto à análise dos cleos investigados em relação à organização social
constatou-se que:
Na comunidade Planalto Universo somente um membro da associação dos
moradores atua diretamente no programa, acompanhando cotidianamente as
atividades no núcleo e mobilizando a comunidade em torno de questões referentes
à problemática comunitária no local. Na Rosalina, reconhece-se a existência de
uma organização social consolidada que é representada pela Cooperativa das
Costureiras e pela Associação Comunitária da Rosalina. Ambas atuam
diretamente no acompanhamento das atividades do programa e mantêm
interlocução permanente com o professor que é reconhecido na comunidade
como uma liderança local por manter uma relação familiar com os moradores. A
primeira organização cede espaços para o funcionamento das atividades e, a
segunda, contribui na mobilização e organização da comunidade em torno do
programa. Na Serrinha, não foi evidenciada a existência de organização social
institucionalizada que mantivesse interlocução com o programa, o que existe é a
192
mobilização de famílias que residem próximo ao núcleo em algumas ações no
sentido de solucionar demanda concernentes à infraestrutura das ruas e à
realização de festividades comemorativas. Na comunidade Presidente Kennedy
uma liga esportiva responsável pela administração do local de funcionamento do
núcleo. Ela mantém certo distanciamento do programa e por isso limita o acesso
dos participantes ao campo; na Associação Comunitária e Esportiva Presidente
Kennedy que acompanha o trabalho desenvolvido pelo programa na comunidade,
um representante da associação que auxilia o trabalho da professora. Na
comunidade João Paulo II, existem associações comunitárias no bairro e ligas
esportivas que atuam no espaço do cleo, mas não foi evidenciada uma relação
de proximidade entre os representantes das ligas e o programa. No entanto, a
comunidade é atendida por uma rede de ONG‟s que desenvolvem projetos sociais
em parceria com o governo municipal e estadual. Destaca-se na comunidade o
comprometimento do professor no tocante ao acompanhamento e auxílio
cotidiano das famílias dos adolescentes e jovens participantes do programa.
Das comunidades analisadas neste trabalho: Planalto Universo, Rosalina,
Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II; ficou evidente um paradoxo na
comunidade Rosalina, pois ao mesmo tempo em que ela apresenta a maior
problemática em relação à condição de vida das famílias e ao acesso ao programa
por não ter um local adequado para o funcionamento do núcleo, é a que se mostra
mais propícia ao desenvolvimento dos princípios da democracia participativa,
considerando a interlocução das organizações sociais com o programa. É notório
na Rosalina um movimento dos atores sociais no sentido da autogestão e auto-
organização social manifestado na ação de suas representações. Também se
reconhece que o esporte e o lazer foram democratizados na comunidade à medida
que crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos participam das atividades
oferecidas pelo programa.
193
Logo, é possível inferir que nas comunidades onde a organização social se
faz presente, o trabalho desenvolvido tem maior êxito como o visto na Rosalina.
Desta forma, há maior envolvimento das lideranças que manm relação direta
com o professor e o grupo gestor do programa, além de contribuir com
mobilização da comunidade ao passo que a divulga e a sensibiliza em relação à
importância do programa. É verdade que isto não é suficiente para a permanência
dele na comunidade quando se tem como parâmetro o aporte financeiro e humano
necessários à manutenção do núcleo e da definição de prioridades no âmbito da
Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza.
Pelos resultados obtidos em relação ao perfil da população atendida pelo
programa, constatou-se que a maioria dos participantes são crianças e
adolescentes do sexo masculino em processo de escolarização os quais residem
com os pais. A predominância de participantes do sexo masculino pode ser
explicada pelo fato do futebol ser a prática predominante em todos os cleos
investigados. Vale ressaltar que a comunidade tem autonomia na definição dos
temas da cultura corporal a serem ofertados. Assim, a escolha do futebol poderia
sugerir, como fator determinante, a influência da mídia no tocante ao
enaltecimento do esporte-espetáculo (BRACHT, 2005). No entanto, é preciso
considerar também as condições de infraestrutura para a realização das atividades
nos núcleos.
Quanto à situação de ocupação e ao salário dos pais, comprovou-se que o
pai trabalha em empresa privada com carteira assinada e recebe de R$ 90,00 a R$
800,00 situação de menos da metade dos participantes. Enquanto a mãe trabalha
em empresa privada com carteira assinada e recebe de R$ 465,00 a R$ 500,00
realidade de uma minoria dos participantes. O quadro apresentado mostra uma
reduzida participação dos pais em ocupações formais, isto se acentua quando se
refere às mães que estão em condições de inferioridade em relação aos pais. A
194
situação de exclusão social é mais agravante quando se tem como refencia a
região nordeste como mostra Pochamann et al. (2003).
Entre as famílias, a renda mensal varia de R$ 233,50 a R$ 3.720,00, média
de R$ 908,76 (confirmou-se alta heterogeneidade na distribuição da renda
familiar). Deste modo, o perfil socioecomico das famílias corresponde ao
estrato social baixo. Portanto, é possível afirmar que a intervenção governamental
em xeque atende à população correspondente a classe trabalhadora como
determina o documento de criação do programa. Logo, aponta-se que em tese isto
pode ser um aspecto favorável na perspectiva de ampliação da garantia do acesso
ao esporte e ao lazer desta população no município de Fortaleza/CE.
Constatou-se ainda que metade dos participantes teve conhecimento sobre
o programa por meio de informações oriundas de amigos. Esta evidência pode
sugerir que uma aceitação dele por parte da comunidade, o que determina sua
divulgação nos diferentes ambientes de convivência comunitária. Pouco mais da
metade dos participantes frequenta as atividades de 3 a 5 vezes por semana e m
tempo de participação de 1 a mais de 2 anos, isto demonstra o interesse pela
permanência no programa por parte destes.
Também, a maioria dos participantes tem como objetivos da prática de
esporte e/ou prática corporal aprender a jogar e continuar jogando, ser jogador de
futebol, conquistar medalhas e com isto melhorar de vida. Quase metade dos
participantes tem como motivo principal de participação no programa o gosto
pelo jogo/futebol, o aprendizado de jogar e treinar. Destaca-se aqui, a influência
do futebol na perspectiva de meio para resolução da desigualdade social e
ascensão social/profissional via esporte de alto rendimento. O que reforça a opção
da maioria dos participantes pela prática do futebol. Tal aspecto pode significar a
apropriação da concepção de esporte vigente na sociedade contemporânea que é
veiculada pelos meios de comunicação de massa e escentrada no futebol como
um esporte espetáculo (BRACHT, 2005).
195
Levando-se em consideração o Estado brasileiro que a partir de sua
estrutura organizativa limita a ampliação do direito social ao esporte e ao lazer à
medida que estes são garantidos apenas no plano jurídico-formal, é compreensível
que nos limites do programa, o argumento encontre legitimação, o que pode
impactar e limitar o acesso da população ao conjunto de ações do programa.
Diante desta situação, ressalta-se a necessidade de estabelecer novos parâmetros
de manutenção e funcionamento do Programa Esporte na Comunidade, no sentido
de ampliá-lo e qualificá-lo como ação de governo/Estado prevista no orçamento
do município e assegurada por lei. Pois somente assim, a população poderá
usufruir plenamente do esporte e do lazer como direitos sociais.
No tocante à consolidação do princípio democratização” no programa,
destaca-se a existência de canais de diálogo importantes com a comunidade, algo
que na política anterior e no início da gestão do atual governo (época de vigência
do primeiro modelo institucional) não fora identificado (cf. entrevista 4 e 5).
Estes, apesar de assumirem uma configuração diminuta e limitada no tocante ao
atendimento das demandas de esporte e lazer das comunidades beneficiadas,
sinalizam para a possibilidade de construção de um modelo alternativo de
intervenção governamental no setor do esporte e lazer no município de
Fortaleza/CE, quiçá, no Brasil. Na conformação do programa, evidencia-se a
importância atribuída ao protagonismo dos atores sociais nas intervenções que
afetam diretamente à execução e ao funcionamento das ações em cada localidade,
seja na mobilização e organização da comunidade ou mesmo na resistência ao
governo diante da imposição do programa sem uma consulta prévia à comunidade
trata-se do primeiro modelo institucional - (cf. entrevista 4 e 5). Também é
reconhecido como relevante o fato do conhecimento inerente à cultura corporal
ser garantido às comunidades atendidas.
É possível constatar que, no programa, a participação é vista como um
mecanismo de mobilização e articulação das comunidades que têm como propósito
196
último a soberania popular, seja na democratização do uso dos espaços de esporte
e lazer no próprio bairro, seja nas ações permanentes e focais de mobilização e
organização da comunidade para discutir seu modo de fazer esporte e lazer e/ou
reivindicar junto aos setores competentes as demandas de espaços, equipamentos e
materiais necessários à realização das atividades, seja no modo de fazer da prática
cotidiana nos núcleos uma prática democrática. (cf. Projeto Esporte na
Comunidade, 2007). -se, portanto, que a participação no programa é demarcada
pelo ideário da participação popular como mecanismo pedagógico, entretanto,
pelas falas do grupo gestor é possível considerar que esta se propunha a ser bem
mais que isso, no sentido de que tinha como finalidade última a organização das
comunidades não somente em torno do programa, mas tamm no sentido delas
interpelarem o Estado, única instituição capaz de garantir o direito ao esporte e ao
lazer das comunidades (cf. entrevista 1).
No quadro do Programa Esporte na Comunidade existem dois limites para
a consolidação da participação política”. Primeiro o modo como o governo se
estrutura, que tem como escopo a ineficiência de seus órgãos e a burocratização
no que tange, respectivamente, à construção e manutenção de equipamento de
esporte e lazer e à viabilização e liberação de recursos orçamentários necessários
à manutenção dos núcleos; segundo a carência das comunidades quanto às
práticas participativas, que de certa forma impediriam o avanço do debate em
torno da soberania popular das comunidades.
Embora se reconheçam, nos documentos norteadores e nas ões
evidenciadas pelo grupo gestor, pelos professores, participantes e responsáveis, e
pelas lideranças comunitárias, avanços em termos de consolidação da democracia
participativa; pode-se dizer que os resultados apresentados não apontam para a
garantia de ampliação do direito ao esporte e ao lazer de modo efetivo posto que
no período (2005 - 2008) de vigência da política em xeque, não foi verificada a
existência de melhorias em termos de condições de manutenção e seguridade de
197
suas ações, pelo contrário, houve declínio em termos de fornecimento de estrutura
material e condições salariais do professores.
Diante do exposto, é possível sugerir que no campo político-administrativo
e no âmbito da pasta de esporte e lazer do município de Fortaleza/CE existiram
desdobramentos que em alguma medida comprometeram ou reverteram a
identidade do Programa Esporte na Comunidade. São exemplos: o cenário de
correlação de forças políticas no espaço da extinta lula de Esporte e Lazer, a
transição de gestão da Secretaria de Esporte e Lazer de Fortaleza em que foi
evidenciado um estado de incerteza quanto à continuidade do programa, a
identificação dos atores sociais (grupo gestor, professores, participantes e
responsáveis, e lideranças comunitárias) com esta política que implicaria na
apropriação ou não de seus fundamentos e o histórico de organização social das
comunidades
Por fim, salienta-se que não basta uma mudança no cenário político, no
sentido de recomposição partidária, uma vez que a depender das forças políticas
presentes na arena de disputa no governo e do jogo de interesses dos grupos
envolvidos, a política (ações, programas e projetos) se mostra mais ou menos
democrática, mais ou menos participativa para que seja possível a garantia dos
princípios acesso”, “democratização” e participação política” no Programa
Esporte na Comunidade, no município de Fortaleza/CE.
Em relação ao contexto social local, a partir do município de Fortaleza/CE,
faz-se alusão a Pochmann et al. (2003, p. 26) ao afirmar que,
nesse início de novo milênio, o país continua a contar com um projeto
de nação fragilizado pelas disparidades entre as áreas que o comem.
Os „acampamentos‟ de inclusão das regiões Centro-Sul, que se
destacam em relação à „selva‟ de exclusão destas mesmas regiões -, e
das regiões Norte e Nordeste, mais do que um sinal de progresso, são a
marca do esgarçamento do „tecido‟ social. [...] o dúvidas de que a
face do país pode ser outra, em que o plano geográfico seja capaz de
apontar para a existência de uma sociedade menos desigual, ainda que
plural, diversa e democrática.
198
É neste cenário de selva de exclusão” que o desafio de constituição das
políticas de esporte e lazer, em especial o Programa Esporte na Comunidade
encontram seus obstáculos e, ao mesmo tempo, sua possibilidade de
materialização da democracia participativa.
199
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSARÉ, Patativa do. Digo e não peço segredo. São Paulo: Escrituras Editora,
2001.
BRACHT, Valter. Sociologia crítica do esporte: uma introdução. ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2005.
BEHRING, Elaine [et al.]. Política social fundamentos e história. ed. - São
Paulo: Cortez, 2008.
BOURDIEU, P. [et al.]. A profissão de sociólogo: preliminares epistemológicas.
Petrópolis: Vozes, 1999.
BRANDÃO, A. Sobre a democracia participativa: Poulantzas, Macpherson e
Carole Pateman. In: Descentralização, cidadania e participação. Serviço Social e
Sociedade. São Paulo: Cortez, n. 54, ano 18, julho de 1997.
BORON, Atílio A.. Estado, capitalismo e democracia na América Latina. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 1994.
BORON, Atílio A.. Os novos Leviatãs” e a pólis democrática: neoliberalismo,
decomposição estatal e decadência da democracia na América Latina. In: SADE,
Emir & GENTILI, Pablo [orgs]. Pós-neoliberalismo: que Estado para que
democracia? Rio de Janeiro: Vozes, 1999, p. 7-67.
CASTELLANI FILHO, Lino [org]. Gestão e política de lazer: a formação de
agentes sociais. Campinas, SP: Autores Associados, 2007.
CHIZZOTTI, Antônio. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. Rio
de janeiro: Vozes, 2006.
200
COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino da educação física. ed.
Revisada, São Paulo: Cortez, 2009.
CUNHA, Marcel Lima [et al.]. Programa Esporte na Comunidade: participação
popular e análise do diagnóstico dos núcleos. Anais do XVI Congresso Brasileiro
de Ciências do Esporte e III Congresso Internacional de Ciências do Esporte,
Salvador BA, 20 a 25 de setembro, 2009.
DEMO, Pedro. Cidadania tutelada e cidadania assistida. São Paulo: Autores
Associados, 1995.
DUMAZEDIER, Jofre. Lazer e cultura popular. o Paulo: Perspectiva, 2000.
GALLIANO, George. O Método científico: teoria e prática. São Paulo: Harbra,
1986.
GASKELL, George. Entrevistas individuais e grupais. In: BAUER, Martin W. &
GASKELL, George (editores). In: Pesquisa qualitativa com texto: imagem e
som. Rio de Janeiro: Vozes, 2002, p. 64-89.
GIL, Annio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. ed. São Paulo:
Atlas, 2007.
IANNI, Octávio. Transcrição de aula dada no curso de pós-graduação em
ciências sociais. Pontifícia Universidade Católica São Paulo, de setembro,
1986.
LIÁO Jr., Roberto. Políticas públicas de educação física, esporte e lazer no
governo do Distrito Federal, 1995 1998: tensões e desafios de um projeto
contra-hegemônico. Dissertação de Mestrado - Faculdade de Educação Física,
Universidade Estadual de Campinas, 2003.
MARCELINO, Nelson. Lazer e Educação. São Paulo: Papirus, 2004.
MARCONI, Marina de Andrade & LAKATOS, Eva Maria. cnicas de pesquisa.
5ª ed. - São Paulo: Atlas, 2008.
MASCARENHAS, Fernando. Lazer como prática da liberdade. ed. - Goiânia:
Ed. UFG, 2004.
201
_______. Entre o ócio e o negócio: teses acerca da anatomia do lazer. Tese de
Doutorado - Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas,
2005.
MILLER, Pierre & SUREL, Yves. Análise de políticas públicas. Edições
Montchrestien, Paris, 1998. (tradução livre (não autorizada)) de Elcylene Leocádio.
MINAYO, Maria Cecília [et al.]. Qualitativo-quantitativo: oposição ou
complementaridade? In: Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 9 (3), p.
239-262, Jul/Set, 1993.
NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um estado para a sociedade civil: temas éticos e
políticos da gestão democrática. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2004.
PATEMAN, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1992.
PEREIRA, Potyara A. P.. Estado, regulação social e controle democrático. In:
BRAVO, Maria Inês Souza & PEREIRA, Potyara A. P. Política social e
democracia. Rio de Janeiro: UERJ, 2008.
POUCHMANN, Márcio [et al.] (Orgs.). Atlas da exclusão social no Brasil. ed.
São Paulo: Cortez, 2003.
POULANTZAS, Nicos. O estado, o poder e o socialismo. ed. São Paulo: Paz e
Terra, 2000.
REIS, Elisa. Reflexões leigas para a formulação de uma agenda de pesquisa em
políticas. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais, fev. 2003, vol. 18, nº. 51, p.
11-14. ISSN 0102-6909.
RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. ed. São
Paulo: Atlas, 1999.
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987.
SOUSA, Celina. “Estado do campo” da pesquisa em políticas públicas no
Brasil. In: Revista Brasileira de Cncias Sociais, fev. 2003, vol. 18, nº. 51, p. 15-
20. ISSN 0102-6909.
202
SOUSA SOBRINHO [et al.]. Para celebrar a utopia: reflexões sobre o Programa
Esporte na Comunidade no município de Fortaleza-Ce, 2007:02. Texto construído
durante o I Seminário de Avaliação do Programa Esporte na Comunidade em 24 de
jul de 2006.
SUASSUNA, Dulce Maria F. de A [et al.]. Política e lazer: interfaces e
perspectivas. Brasília: Thesaurus, 2007.
VIEIRA, A. Evaldo. As políticas sociais e os direitos sociais no Brasil: avanços e
retrocessos. In: Política social e direitos. Serviço Social e Sociedade. São Paulo:
Cortez, n. 53, ano 18, março de 1997.
VIEIRA, Evaldo. Democracia e política social. Coleção polêmicas do nosso
tempo. São Paulo: Cortez, 1992.
TEIXEIRA, Elenaldo. O local e o global: limites e desafios da participação cidadã.
3ª ed., São Paulo: Cortez, 2002.
TELLES, Vera. Direitos sociais: afinal do que se trata? Belo Horizonte: Ed.
UFMG, 1999.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. ed. - Porto Alegre:
Bookman, 2005.
DOCUMENTOS:
BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Câmara dos Deputados, 1988.
_______. MINISTÉRIO DO ESPORTE. I Conferência Nacional do Esporte:
Documento final. Brasília, 17 a 20 de junho, 2004.
_______. II Conferência do esporte: coletânea de textos, versão preliminar.
Brasília, 04 a 07 de maio, 2006.
_______. Lei Zico. Lei Federal n. 8.672/1993 de 06 de julho de 1993.
203
_______. MINISRIO DO ESPORTE. Política Nacional do Esporte. Resolução
do N . 05/Conselho Nacional do Esporte de 14 de junho de 2005.
PARTIDO DOS TRABALHADORES. Carta de Princípios de uma
Administração Popular e Democrática para o Esporte e Lazer. Brasília-DF,
1994.
PARTIDO DOS TRABALHADORES. Contribuição do setorial de esporte e
lazer do PT-PE para o plano de governo da frente do Recife. Recife-PE, 2008.
PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA. Célula de Esporte e Lazer.
Projeto Esporte na Comunidade. Fortaleza-CE, 2006.
SITES CONSULTADOS:
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Estimativas
das Populações dos Municípios em 2008. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_impressao.php?id_notici
a=1215. Data de acesso: 12/03/2010.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Cidades.
Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Data de
acesso: 06/05/2010.
PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA. Notícias da Secretaria de
Esporte e Lazer. Disponível em:
http://www.fortaleza.ce.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=17
4&Itemid=239. Data de acesso: 27/12/09.
PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA. Plano Plurianual 2006-2009.
Disponível em:
http://www.fortaleza.ce.gov.br/index.php?q=%22fortaleza+em+n%FAmeros%22&
option=com_busca&cx=013371646703034318664%3A-
204
ttyok9jfw8&cof=FORID%3A11%3B&ie=ISO-8859-1#242. Data de acesso:
12/03/2010.
PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA. Habitafor. Disponível em:
http://www.fortaleza.ce.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=78
29&Itemid=12. Data de acesso: 13/03/2010.
PREFEITURA MUNICIPAL DE FORTALEZA. Projeto Rua da criança.
Disponível em:
http://www.fortaleza.ce.gov.br/esporte/index.php?option=com_content&task=view
&id=7&Itemid=59. Data de acesso: 13/03/2010.
205
ANEXOS
ANEXO I: Documento N . 1 - Projeto Esporte na Comunidade
206
Prefeitura Municipal de Fortaleza
Secretária de Desenvolvimento Econômico
Célula de Esporte e Lazer
Projeto
ESPORTE NA COMUNIDADE”
Fortaleza, 24 de Agosto de 2007
207
Sumário
1. Denominação do Projeto
2. Apresentação
3. Objetivo
3.1. Objetivo Geral
3.2. Objetivo Específico
4. Justificativa
5. Metas
6. Público Alvo
7. Local de Realização
8. Metodologia
Divulgação do Projeto
Processo de Inscrição
Proposta pedagógica
Monitoramento, Supervisão e Avaliação
9. Recursos
10. Orçamento
208
1.Denominação do projeto
Projeto esporte na comunidade”
2. Apresentação
3. Objetivos
3.1 Objetivo Geral
Garantir e democratizar o acesso ao esporte e lazer como direito social
por meio do conhecimento de temas da cultura corporal através de uma pxis
contextualizada de modo que a comunidade possa ter novos elementos para a
compreensão e reflexão da realidade social.
Potencializar a construção participativa das ações do programa em
conjunto com a comunidade entendendo-a enquanto soberana na determinação
das formas de instalação dos instrumentos de lazer e no acompanhamento das
atividades desenvolvidas.
3.2 Objetivos específicos
Oferecer novos elementos para a compreensão e reflexão da realidade
social em que se insere a comunidade através da prática contextualizada da
cultura corporal;
Problematizar a prática pedagógica do Esporte na Comunidade junto às
comunidades com temas que elucidem conceitos-chave” da cultura corporal e
da sociedade;
209
Problematizar os valores do esporte de competição, pretendendo
construir outras possibilidades de abordar o esporte, pautados na participação,
criatividade, autonomia e cooperação;
Construir com a comunidade espaços de conscientização política e
deliberativos sobre as ações dos programas como assembléias e conselhos
comunitários;
Mobilizar as representatividades comunitárias para o acompanhamento
e construção dos espaços de construção coletiva;
4. Justificativa
O esporte é um fenômeno universal e hegemônico da humanidade
revelando-se enquanto expressão da cultura corporal construída e conquistada
historicamente por homens e mulheres que o consolidaram como um direito
legítimo da sociedade, no entanto, o estado possui o dever de garantir ao povo o
acesso às manifestações esportivas que lhes são de direito. Nesse sentido a
Célula de esporte e lazer da prefeitura de Fortaleza, através do programa
Esporte na Comunidade, pretende desenvolver uma política pública de esporte e
lazer voltada para a classe trabalhadora que seja constrda de forma
participativa e democrática que aponte na direção da transformação social. O
esporte de participação é proposta chave da ação do programa esporte na
comunidade que visa à tematização do esporte voltado para as camadas
populares onde qualquer individuo possa ser incluso nas atividades,
independente de suas capacidades individuais para determinada pratica
esportiva.
210
5. Metas
O projeto atende hoje 3000 crianças jovens e adultos. A meta é que ao
final do ano de 2008 o programa atenda a 7000 crianças; 3500 homens e 3500
mulheres.
6. Público Alvo
Atender prioriatariamente crianças, adolescentes, jovens e adultos da
classe trabalhadora, visto que estas são as maiores prejudicadas em relação à
inacessibilidade aos espaços e práticas esportivas e de lazer. Partindo dessa
realidade, compreendemos a necessidade de garantir o acesso às práticas e
conhecimento do acervo da cultura corporal à classe trabalhadora,
historicamente expropriada dos direitos sociais.
7. Local de realização
O programa Esporte na Comunidade acontece principalmente em campos
e/ou praças públicas visto que é um programa de políticas públicas. Hoje o
projeto conta com 48 núcleos distribuídos pelas seis regionais de Fortaleza e
sua implantação prioriza os critérios de OP, IDH e Habitafor.
8. Metodologia
8.1 Divulgação do projeto
A divulgação do projeto contará com panfletos, cartazes, contato direto
através de assembléias comunitárias participação das lideranças e membros da
comunidade além de TV e rádio.
211
8.2 Processo de inscrição
A inscrição dos alunos realizar-se-ão no próprio cleo com o professor
de acordo com o horário do mesmo. O processo de inscrição, seleção,
contratação e lotação dos professores e estagiários do projeto será coordenado
pela célula de Esporte e Lazer da prefeitura de Fortaleza.
8.3 Proposta Pedagógica
As aulas serão diárias 4 horas por dia, de manhã, tarde ou noite
dependendo da necessidade de cada comunidade.
A metodologia e os conteúdos devem ser organizados de forma a oferecer aos
alunos uma compreensão sobre o caráter histórico da formação de nossa
sociedade, contextualizando os elementos da cultura corporal no processo
ensino-aprendizagem.
Vale ressaltar, o papel de grande importância do professor com o trato do
conteúdo de ensino, pois a construção de momentos didático-metodológicos,
são necessários para uma práxis pedagógica efetiva.Sendo assim, a aula deve
ser organizada intencionalmente com 3 momentos básicos:
a) momento:ocorre a contextualização da prática
pedagógica/problematização(com palavras geradoras)
b) momento:Relação de troca e realização das atividades selecionadas
pleo professor.(aula propriamente dita)
c) momento: avaliação, apropriação do conteúdo de
ensino/conhecimento, ação/refleção/ação, consolidando a prática
pedagógica construída com a participação dos que fazem o processo
educativo.
212
Uma reflexão crítica que venha questionar a sua prática, e elevar o nível
de consciência dos alunos para a afirmação de uma perspectiva de esporte e
lazer que prime pela participação de todos de forma igualitária. Uma ação onde
o jogo e a competição perfazem apenas mais um conteúdo do esporte e não o
seu principal objetivo da aula, enfatizando principalmente o e citados
acima, onde o diálogo passar a ter prioridade nas aulas.
A práxis pedagica não pode se descolar dos processos de formação
dos/as professores/as.Portanto são realizadas reuniões mensais,palestras,
planejamento bimestral coletivo, com a escolha das temáticas a serem
discutidas nos núcleos , sugestões de filmes ou oficinas que possam
proporcionar uma organização global das práxis pedagógicas do programa, sem
esquecer a especificidade de cada núcleo.
Partindo do pressuposto que a prática pedagógica é um ato político, há
necessidade de formatação de instâncias de participação popular, através de
Assembléias e Comissões Comunitárias de Esporte e Lazer, em que a
comunidade possa expor suas demandas em Esporte e Lazer e decidir questões
relativas ao núcleo do programa.
8.4 Monitoramento, Supervisão e Avaliação
O acompanhamento das ações do programa conta com o apoio de um
supervisor quatro auxiliares técnicos nos quais possuem a principal função de
orientar pedagogicamente os professore e estabelecer diálogos com a
comunidade.
Os regionais são os responsáveis em realizar visitas de caráter mais técnico nos
núcleos de esporte e lazer.
213
9. Recursos
Centro de Pesquisa e Qualificação Tecnológica CPQT.
10. Orçamentos.
214
ANEXO II: Documento N . 2 Para Celebrar a utopia: Reflexões sobre o
Programa Esporte na Comunidade no município de Fortaleza/CE
215
PARA CELEBRAR A UTOPIA
Reflexões sobre o Programa Esporte na Comunidade no município de
Fortaleza-CE
José Pereira de Sousa Sobrinho-
Graduado em Educação Física- UECE/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
1
Sydenham Rocha Gomes-
Graduado em Educação Física- UFC/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
3
Cristiane Sousa da Silva
Graduada em Educação Física- FIC/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
4
Andréia Pagani Maranhão
Graduada em Educação Física- UFC/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
5
Bráulio Leal
Graduado em Educação Física- UFC/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
6
Angélica Mota
Graduada em Educação Física- UNIFOR/ Prefeitura Municipal
de Fortaleza
7
Kelviane Costa de Oliveira
1
Supervisor do EnC jpssobrinho@yahoo.com.br
3
Coordenador de Políticas Públicas sydeam@yahoo.com.br
4
Assessora Técnica do EnC cris_silva50@hotmail.com
5
Coordenadora pedagógica e de formação continuada andreiapagani@yahoo.com.br
6
Coordenador adjunto de Políticas Públicas braulioleal@yahoo.com.br
7
Coordenadora de Programas e Projetos angelicamotaedf@hotmail.com
216
Graduada em Educação Física- UECE/ Prefeitura Municipal de
Fortaleza
8
Thalis Braga
Acadêmico de Administração em Marketing- FIC/ Prefeitura
Municipal de Fortaleza
8
Introdução
Nossa capital tem 2.600.000 habitantes, dos quais cerca de 40% encontram-
se abaixo da linha de pobreza, atingindo o triste índice de 16,26% de
desempregados, mais de 164 mil pessoas
1
, conseqüência de uma realidade
marcada por profundas desigualdades sociais, o que leva a existência de um
batalhão de pobres e miseráveis, expostos à violência e toda sorte de opressões,
inacessibilidade aos espaços e práticas esportivas e lazer, que m se tornado
luxo desnecessário àqueles que m aumentadas suas jornadas de trabalho, e
reduzidas suas condições de sobrevivência. Portanto, trata-se de um contexto de
completa exclusão da classe trabalhadora ao acesso dos equipamentos públicos
e práticas sistematizadas de esporte e lazer.
Partindo dessa realidade, compreendemos a necessidade de garantir o acesso
às praticas e conhecimentos do acervo da cultura corporal à classe trabalhadora,
historicamente expropriada dos direitos sociais, fazendo do Esporte na
Comunidade um
programa de políticas públicas, que visa democratizar o
esporte e o lazer numa perspectiva da participação. Uma
proposta pedagógica, sócio-educativa e cultural,
8
Assessora Técnica do AnC baskelvi@yahoo.com.br
8
Assessor Técnico do EnC
1
Os dados referentes à linha de pobreza foram pautados segundo dados do IBGE divulgados pela Faculdade
Grande Fortaleza, em seu site: http://www.fgf.edu.br.
Os dados sobre desemprego foram coletados do Jornal Diário do Nordeste, citado na bibliografia.
217
desenvolvida por professores qualificados com ações
lúdicas para a socialização do conhecimento e a formação
humana solidária; propiciando a organização das
comunidades de forma autônoma e democrática
2
”.
Uma Crítica ao modelo dominante de esporte
Para compreender as necessárias transformações pelas quais o esporte
inserido neste modelo societário precisa passar, iniciamos uma reflexão a
partir da compreensão dos limites do ideal burguês de civilidade formulado
na Revolução Francesa de 1785, na qual apontava para a famosa expressão
de igualdade, fraternidade e liberdade. A sociedade burguesa, passa afirmar
que todos os sujeitos possuem igualdade de oportunidades a partir da
intervenção do Estado, que passa a incrementar políticas públicas que criam
possibilidades de ascensão social ou o acesso a direitos básicos necessários a
sobrevivência do individuo.
Na sociedade dos desiguais a igualdade é confirmada a partir da soma de
possibilidades ofertada aos sujeitos pelas políticas blicas de Estado, assim
são compreendidas as políticas de educação e também as políticas públicas
de esporte e lazer. Esses passam a ser compreendidos como instrumentos que
proporcionam a igualdade, se não, a possibilidade de ascensão ou inclusão
social do sujeito que também é compreendida como igualdade na sociedade
capitalista.
A reflexão que buscamos realizar trata de desmistificar esse conceito de
igualdade propagado no seio da sociedade capitalista, que, a sociedade
capitalista possui nos alicerces de sua organização a produção de riqueza a
partir de acumulo de bens materiais. A consolidação desta estrutura mantém
as relações de produção entre as forças produtivas trabalho, trabalhador/a,
2
Texto construído durante o I Seminário de Avaliação do Programa Esporte na Comunidade (24/06/2006).
218
natureza, ciência & tecnologia estão subjugadas aos ditames do capital,
pela concentração dos meios de produção e pela apropriação privada da
produção. A concentração dos bens materiais nas mãos daqueles que
monopoliza a propriedade privada dos meios de produção, enquanto a
maioria da população, apenas resta vender a única propriedade que possui, ou
seja, o seu próprio corpo ou a capacidade de trabalho que este possui.
Essa reflexão coloca a imagem de uma sociedade dividida em duas
classes, os detentores dos meios de produção como a classe burguesa, e os
explorados e dominados pela mesma, como a classe trabalhadora.
O Manifesto Comunista escrito por Marx (2002, p. 40) em 1848, é a
primeira obra literária que tenta desmascarar a farsa da sociedade de classes
ao afirmar:
A historia de todas as sociedades ahoje existentes
é a historia das lutas de classes. Homem livre e escravos,
patrício e plebeu, senhor feudal e servo, mestre de
corporação e companheiro, em resumo, opressores e
oprimidos em constante oposição, m vivido numa
guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma
guerra que termina sempre ou por uma transformação
revolucionaria da sociedade inteira, ou pela destruição
das duas classes em conflito.”
É através desse processo revolucionário, que a classe burguesa derrota o
senhor feudal, e torna-se a classe dona do poder econômico, político e
ideológico. A inserção da ideologia burguesa na consciência coletiva da
classe trabalhadora passa pela educação, pelos instrumentos midiáticos e o
próprio esporte. Os conceitos, os conhecimentos dominantes de uma
219
sociedade correspondem aos interesses da classe dona do poder. Marx (2002,
p. 57), confirma essa preposição afirmar que “... demonstra que a historia das
iias senão que a produção intelectual se transforma com a produção
material? As iias dominantes de uma época sempre foram às idéias da
classe dominante”.
Os conhecimentos produzidos pela humanidade não são indiferentes à
relação de conflito que perdura na sociedade de classes. Esses conhecimentos
apresentam sempre uma reflexão que se coloca a favor de uma das classes
sociais, a neutralidade dos conhecimentos e na transmissão dos
conhecimentos é impossível. Portanto, a pratica educacional é um ato político
dentro do contexto da luta de classes, assim como nos confirma Saviani
(1992, p. 57).
(...) a prática do professor tem sempre um sentido
político em si, independente de que esse sentido político
exista para o professor, isto é, independente de que se
tenha ou não consciência de significado político da ação
educativa.”
Compreendendo que o ato educativo é um ato político, a prática
pedagógica do Programa Esporte na Comunidade se define ao lado da classe
trabalhadora. Aponta para uma ação educativa na área de esporte e lazer
comprometida com o projeto histórico da classe trabalhadora, que
corresponde à conquista de uma sociedade sem classes sociais.
O modelo dominante de esporte exerce o desserviço a história de luta da
classe trabalhadora, ao cumprir a função ideológica de adaptação da classe
oprimida e sociabilidade capitalista.
O esporte conclama em sua prática o falso conceito de igualdade de
oportunidades, o qual Valter Bracht (2005, p. 31) afirma:
220
"A igualdade formal de chances da estrutura esportiva
indica para a presumível existência de um correspondente
forma de sociedade.Tal idéia nega a fundamental
desigualdade de chances inerente à sociedade capitalista e
deva o principio esportivo da igualdade de chances a um
principio geral de sociedade".
Cumprindo sua função ideológica, o esporte assimila aspectos dominantes
da sociedade capitalista industrial incorporando-as na consciência da classe
trabalhadora.
Disciplina, respeito as regras,, concorrência, rendimento, racionalidade
técnica, organização e burocratização.A sociedade capitalista torna o homem,
a força primária do processo produtivo, um apêndice da máquina e o esporte
é mais um instrumento capaz de concretizar esse modelo de homem.
Mas no seio do movimento histórico de luta da classe trabalhadora
surgem propostas alternativas a este modelo de esporte, na qual tenta
combater o caráter acrítico e o falso caracter apotico imposto pela ideologia
burguesa.
A associação ginástica e esportivo dos trabalhadores, em vários países da
Europa criam em 1913 a "Internacional Esportiva "(Bracht, 2005). A práxis
desenvolvida por esse movimento organizado propõe-se a colocar os
conhecimentos do esporte a serviço da luta histórica da classe
trabalhadora.Na qual, o ponto inicial es conclamar o caráter histórico e
social da formação do homem, ou seja, a compreensão de que o homem é um
ser em constante construção, onde seus atos e a consciência desse ser social
são formados a partir da realidade concreta existente me determinado
momento histórico. Manacorda (2000, p. 3), nos aponta para a formação do
processo do homem torna-se homem quando afirma que:
221
"O homem não nasce homem (...). Grande parte
do que o transforma o homem em homem
forma-se durante a sua vida, durante o seu longo
treinamento por tornar-se ele mesmo, em que se
acumulam sensações, experiências e noções,
formam-se habilidades, constroem-se estruturas
biológicas, nervosas e musculares não dadas a
priori pela natureza, mas fruto do exercício que
se desenvolve nas relações sociais, graças às
quais o homem chega a executar atos, tanto
humanos, quando 'nós naturais' como falar e
trabalhar segundo um plano e um objeto".
Uma prática esportiva comprometida com a emancipação da classe
trabalhadora deve es diretamente associado a compreensão do ser
social,para partir o entendimento que o modelo de sociedade, assim como o
esporte , é uma construção humana e histórica passível de ser transformada.
A partir da compreensão desse caráter histórico Marx (apud Nozaki, 2004, p.
53) chega a:
"... conclusão de que o molde de produção
capitalista e todas as suas apologias não são
uma lei natural independente da construção
social, mas tão somente uma passagem na
história da humanidade e, portanto, passível de
transformação".
Programa Esporte na Comunidade
Por cultura corporal entendemos o amplo acervo das práticas corporais
socialmente produzidas e historicamente desenvolvidas pelo homem, ou seja,
o jogo, os esportes, as lutas, ginásticas, e entre outros. (Coletivo de Autores,
1992).
222
E como nos aponta Silva (2004, p. 28) a “... imporncia da
democratização da cultura corporal não tem um caráter „enciclopédico‟, mas
político-prático de crítica e de transformação da realidade social”.
necessidade de um projeto político-pedagógico do Programa,
compatível com essa definição. Um projeto político-pedagógico que é “...
político por que expressa uma intervenção em determinada direção e é
pedagógico porque realiza uma reflexão sobre a ação dos homens na
realidade e explicando suas determinações (Coletivo de Autores, 1992, p.
25).
O programa aponta para a necessidade de um projeto político que tenha
sua intervenção apontando para a transformação da realidade, e um projeto
pedagógico que construa uma reflexão da ão dos homens no âmbito do
lazer, ou seja, uma critica a respeito do modelo dominante de esporte e lazer.
Para a partir desta critica formularmos uma prática de esporte e lazer voltada
para a classe trabalhadora
3
. Trata-se da democratização do conhecimento das
práticas da cultura corporal, a partir da execução de um modelo que atenda
aos anseios históricos desta classe.
A construção de uma práxis de esporte e lazer voltada para classe
trabalhadora não pode limitar-se ao lazer-entretenimento, ou ao lazer-
banalizado e o lazer mercadoria, que perfazem uma perspectiva de lazer
alienada. A superação deste modelo, que possui no esporte de rendimento o
seu principal paradigma, faz-se necessária para a conquista de uma ação de
esporte e lazer onde seja possível articular uma compreensão histórica da
opressão, exploração e exclusão da classe trabalhadora (Silva, 2004).
3
Compreendida a partir da definição de COUTINHO, como sendo “a classe dominada, explorada, que
sobrevive vendendo sua força de trabalho, que traduz um conflito bipolar simplificado em uma constante guerra
civil mais ou menos oculta”.
223
A construção de uma nova perspectiva de esporte e lazer, tendo como
objetivo principal a reflexão sobre a cultura corporal aponta para uma ação
que venha contribuir para a
“... afirmação dos interesses de classe das
camadas populares, na medida em que desenvolve uma
reflexão pedagica sobre valores como solidariedade
substituindo individualismo, cooperação confrontando a
disputa, distribuição em confronto com apropriação,
sobretudo enfatizando a liberdade de expressão dos
movimentos a emancipação -, negando a dominação e
submissão do homem pelo homem” (Coletivo de
Autores, 1992, p. 40).
Tal perspectiva possibilita uma experiência de esporte e lazer que prime
pela transformação social ... não significa negar o existente, mais tomá-lo
como ponto de partida de uma atividade que deve ser crítica e
autodeterminada coletivamente” (Silva, p. 29, 2004). Portanto, não se trata da
negação dos modelos existentes que perfazem uma realidade dominante,
como as Ligas esportivas de bairros, os exemplos de astros e equipes do
esporte de rendimento, as formas de organização do jogo com titulares e
reservas, as regras heterodeterminadas, as formas de organização das equipes,
a valorização exagerada dada a execução do gesto técnico ou para execução
do plano tático, por exemplo.
A superação destas expressões dominantes no âmbito do esporte e lazer
passa necessariamente por uma reflexão crítica que venha questionar a sua
prática, e elevar o nível de consciência dos alunos para a afirmação de uma
perspectiva de esporte e do jogo que prime pela participação de todos de
forma igualiria. Uma ação onde o jogo e a competição perfazem apenas
mais um conteúdo do esporte e não o seu principal objeto da aula.
A formatação de uma alternativa de esporte e lazer voltada para as classes
populares passa necessariamente pela sua autodeterminação, ou seja, os
224
praticantes e alunos passam a tornar-se sujeitos determinantes na construção
do seu momento de esporte e lazer. O Programa Esporte na Comunidade”
não pode ser capaz de formatar uma ão de esporte e lazer voltada para a
classe trabalhadora sem a efetiva participação e determinação popular,
portanto, necessidade de formatação de instrumentos que permitam e
organizem a participação popular no interior do programa, atendendo aos
interesses das diversas comunidades no qual ele atua, transformando-o em
um programa da comunidade, e não apenas na comunidade.
Participação popular
O atendimento às reivindicações históricas da classe trabalhadora, assim
como os interesses específicos das comunidades em que este atua, não pode
ser efetuado sem a efetiva participação popular, contudo é preciso a
compreensão de que as práticas de participação popular significam a
construção de uma esfera de poder que aponta uma nova relação entre
Estado e sociedade, onde a sociedade civil possa pautar a transparência das
ações de governo, a inversão de prioridades e a abertura dos canais que
viabilizem o controle político da gestão, visando a conquista da hegemonia na
sociedade em torno de um programa socialista.
Os mecanismos de distribuição e gerência da verba pública não podem
limitar o debate em torno da participação popular. È necessário que ela seja
pautada sempre a partir das contradições da sociedade de classes, e que
aponte os nortes táticos e estratégicos para superação deste modelo
societário. Devem ser espaços fundamentalmente educativos e que
contribuam para o fortalecimento de los comunitários e consciência de
classe. É necessário que esses espaços semeiem a utopia, um vislumbre
futuro de vitória que se antepõe ao presente de lutas. É necessário que se
compreendam as variáveis, as conjunturas, as correlações de força. Mais
225
importante que tenhamos a clareza de que estamos do lado dos
trabalhadores/as neste processo, de modo que as ações de esporte e lazer
desenvolvidas pelo programa sejam definidas coletivamente pelas
comunidades envolvidas, portanto necessidade de formatação de
instâncias de participação popular, em que a comunidade possa expor suas
demandas em esporte e lazer, e exigir o seu atendimento por parte das
instituições responsáveis.
Trata-se da constituição de uma Assembléia Comunitária de Esporte e
Lazer, que no primeiro momento tem a sua intervenção limitada ao Programa
Esporte na Comunidade, ou seja, as decisões serão de questões relativas ao
núcleo do Programa.
Quando este coletivo decide pela permanência ou instalação do programa
em seu espaço de esporte e lazer, esta comunidade deve assumir a
responsabilidade pela construção e manutenção do núcleo em conjunto com o
professor e alunos/as, portanto, a solução de conflitos e problemas, assim
como a formatação de eventos e momentos culturais, passam a ser
responsabilidades tamm deste coletivo, que deve organizar-se para atender
as demandas exigidas pelo núcleo.
necessidade de uma periodicidade das Assembléias Comunitárias,
sendo este um espaço de fortalecimento da comunidade enquanto coletivo, de
mobilização e de participação popular.
A exigência de organização da comunidade para uma constante e efetiva
participação na construção do núcleo de esporte e lazer provoca a
necessidade de formação de uma instância representativa, a Comissão
Comunitária de Esporte e Lazer, formada por delegados e delegadas eleitos
na Assembléia Comunitária, que devem acompanhar e auxiliar o professor/a
em suas práticas e contribuir para a mobilização da comunidade , na tentativa
de integrar a sistemática de participação popular às práxis pedagógicas do
programa.
226
Práxis pedagógica
A pxis pedagógica e organização dos núcleos devem mediar os
processos de constituição dos sujeitos, individual e coletivamente, orientada
por uma opção político ideológica do trabalho docente voltada para educação
popular, de modo que a metodologia e os conteúdos devem ser organizados
de forma a oferecer aos alunos uma compreensão sobre o caráter histórico da
formação de nossa sociedade, contextualizando os elementos da cultura
corporal nos processos de ensino-aprendizagem, que ... a materialidade
corpórea foi historicamente constrda e, portanto, existe uma cultura
corporal, resultado de conhecimentos socialmente produzidos e
historicamente acumulados pela humanidade (...)” (Coletivo de Autores,
1992, p. 39).
A práxis pedagógica concretiza-se como um processo distinto aos
modelos tradicionais, passa por um espaço sistemático de intervenção dos
próprios alunos e interessados diretos no programa, a partir do planejamento
coletivo mensal, e do Espaço Bate Papo Legal
4
onde o professor/a assume a
tarefa de mediar o debate e organizar as iias, para que a práxis do programa
possa superar a questão da heterodeterminação.
Para a construção desta metodologia de trabalho, é necessária uma
compreensão do processo de formação no campo da educação/ educação física
na perspectiva crítico social implica em uma reflexão sobre o próprio
significado dos processos educativos, nas suas relações com os processos mais
amplos de constituição e desenvolvimento histórico-sociais do ser humano.
Desse modo, visualizamos a educação como espaço de apropriação e
objetivação que caracteriza a atividade humana (cf. Duarte 1993, p. 27). A
4
O Espaço Bate Papo legal foi pensado para abordar questões relevantes ao debate de esporte e lazer,
contextualizadas com a realidade local de cada comunidade, a partir de um círculo de convivência onde estas
temáticas são debatidas durante a aula, e produzidas oficinas de jogos e outras atividades culturais, exibição de
filmes, trabalho com textos, etc.
227
cultura humana acumula-se tanto nos objetos em si quanto na linguagem (em
suas várias formas) e nos usos e costumes. A história da humanidade se
caracteriza por processos de apropriação subjetiva e coletiva da realidade, na
forma de idéias, conhecimentos, imagens etc. e na criação de objetivações
(produtos gerados a partir dessas idéias ou de sua transformação).
A partir desta compreensão podemos articular desde os processos
pedagógicos que caracterizam o trabalho docente no EnC
5
às demais ações
políticas realizadas por outros atores sociais. A práxis pedagógica não pode se
descolar dos processos formativos dos/as professores/as.
Portanto, a formação continuada é analisada a partir do conceito de
humanização (cf. Duarte 1993, p. 57). Esse conceito possibilita uma
compreensão mais ampla e profunda dos nexos entre formação/ reflexão e
trabalho e requer, por parte de todos os atores do EnC, um espaço permanente e
sistemático de reflexão. No entanto, tendo em vista o caráter complexo e
contraditório dos processos educativos no qual los opostos como as
dimensões reprodutora e transformadora da educação, a apropriação e a criação
se complementam em lugar de se excluir, entendemos que uma reflexão
inspirada no pensamento dialético tem melhores condições de compreender a
problemática que envolve os espaços e práticas de esporte e lazer na cidade,
assim como situar no plano do debate as reivindicações imediatas, mediatas e
históricas que se referem a essa demanda da classe trabalhadora.
Para esse momento são realizadas reuniões mensais, palestras, reuniões
por regionais, Planejamento Bimestral Coletivo, com a escolha de temáticas a
serem discutidas nos núcleos, sugestões de filmes ou oficinas que possam
proporcionar uma organização global da práxis pedagógica do Programa, sem
esquecer a especificidade de cada realidade.
Existe a pretensão de que essas reuniões por regionais ocorram em locais
onde existem núcleos, escolas ou centros de cidadanias e que as decisões
5
Programa Esporte na Comunidade.
228
centrais do programa estejam próximas da comunidade, e que esta possa ter
representantes na reunião.
Competições:
As competições, torneios e amistosos como conteúdos do esporte
merecem uma atenção especial. As aulas fomentadas no interior do programa
não podem simplesmente excluir as competições do cotidiano do núcleo, e
negligenciá-la como conteúdo das atividades, visto que a competição é um
dado objetivo da sociedade capitalista e precisa ser problematizada no
decorrer do programa. Além disso, a realização das atividades competitivas
possui uma grande capacidade de mobilização e motivação dos alunos e pode
ser utilizada para abrir canais de diálogo com o público.
Os conteúdos específicos dos esportes o devem estar voltados para o
aspecto competitivo, enquanto que a capacidade que os jogos e as
competições possuem para mobilizar alunos e comunidade deve ser
dimensionada para a construção de uma consciência crítica por parte desta a
respeito do esporte e lazer. Como nos aponta Silva (2004, p. 29) Um ponto
de partida para tornar crítico um torneio de futebol realizado numa
comunidade, (...), pode ser a socialização do debate sobre as regras do jogo
para todos os jogadores, superando o modelo hegemônico, autoritário e
elitista.”
Esse momento de debate, que deve anteceder ao da competição, passa
necessariamente pela discussão de fatores determinantes ao esporte como:
regras, forma de disputa, formação das equipes, equipes mistas ou
fragmentadas por nero, forma de premiação, valores da competição x
cooperação. Todos os tópicos relevantes ao jogo devem ter a sua definição
em âmbito coletivo a partir da metodologia de círculos de convivência
formado por professores/as e participantes.
229
A questão essencial dos torneios, jogos ou competição é a sua formulação
coletiva. Tanto na formatação teórica com a participação e discussão de
todos, quanto a execução prática devem ser efetuadas por construção
coletiva. As diversas tarefas necessárias para a execução de uma competição
devem ser divididas entre os próprios participantes e integrantes da Comissão
Comunitária de Lazer.
Este seria o ponto de partida para a introduzirmos nos núcleos do
programa o trabalho socialmente útil, que segundo Silva (2004, p. 33) afirma
que:
Toda educação que persegue uma perspectiva
emancipatória não pode estar descolada da realidade
social concreta. Neste caso, o trabalho socialmente útil
deve ser elemento integrador entre a educação e a
realidade social. Portanto, a educação deve estar ligada a
vivência de uma atividade socialmente útil.
O trabalho socialmente útil deve ser valorizado no cotidiano pedagógico
do cleo como principio educativo, portanto, o professor deve ter a
iniciativa de entre os alunos organizar o trabalho coletivo para intervenção no
meio. Realizar a limpeza do ambiente de aula na forma de mutirão é um
exemplo de trabalho coletivo, o cuidado com o material, a construção ou
reforma de instrumentos de esporte lazer, cuidado com a praça, são questões
que dependem necessariamente do nível de organização e consciência do
trabalho coletivo nessas comunidades.
Mas essas atividades não podem fugir da compreensão de que as
instituições representantes do Estado o responsáveis pela construção e
manutenção destes instrumentos. Dessa compreensão, pode-se partir a
mesmo para mobilização no intuito de uma cobrança organizada e coletiva
por parte das instituições responveis do cumprimento de suas funções, o
230
que impõe um nível maior de organização e consciência potica da
comunidade.
Conclusão
A participação popular e a construção coletiva passam a ser expressões
chaves no trabalho pedagógico do professor. A formulação de uma prática da
cultura corporal, uma prática de esporte e lazer que venha atender os anseios
reais das classes populares é o grande mérito do projeto no segundo ano do
programa.
A formatação de prática pedagógica que busca democratizar o
conhecimento da cultura corporal a partir de uma perspectiva que venha
atender aos anseios históricos da classe trabalhadora que são distintos e
antagônicos ao da classe dominante.
Trazer à consciência coletiva de que todos os indivíduos são sujeitos
históricos, capazes de intervirem na realidade através de uma ação coletiva, é
um dos conhecimentos a ser conquistados em uma práxis pedagica crítica,
partindo de um coletivo menor do núcleo e da comunidade, para um coletivo
amplo da cidade de Fortaleza, onde o EnC oferece este conhecimento a
aproximadamente 4200 alunos, além de mero maior de envolvidos, entre
pais, integrantes das comunidades, que perfazem um mero maior que
possam apreender uma nova compreensão da realidade a partir do esporte e
lazer.
Nosso intuito é uma compreensão consciente por parte destes indivíduos
da necessidade de construção de uma alternativa de esporte e lazer, a partir de
uma intervenção organizada e coletiva. A compreensão da existência de uma
cultura dominante que determina as práticas da cultura corporal e a prática
pedagógica tradicional, que correspondem a uma compreensão de mundo que
atende aos interesses de uma classe dominante.
231
A formatação de um modelo alternativo de esporte e lazer e de práxis
pedagógica passa necessariamente pela participação popular, onde a
construção coletiva é o marco inicial para uma ação organizada de classe
Uma pequena transformação histórica esefetuando-se com o Programa
Esporte na Comunidade”, que este, começa a socializar o conhecimento
da cultura corporal a membros da sociedade que anteriormente não tinham
acesso a ele, podendo possibilitar a conquista na consciência coletiva da
necessidade de intervenção na realidade, o que irá propiciar uma pequena,
mas importante transformão histórica na realidade de nossa cidade.
Bibliografia
COLETIVO DE AUTORES, Metodologia do Ensino da Educação Física.
Campinas, São Paulo: Cortez, 1992.
COUTINHO, Carlos Nelson (org). Manifesto Comunista 150 anos depois.
Ed Perseu Abramo.
DIÁRIO DO NORDESTE, Desemprego é o maior em oito meses 28/04/07,
Fortaleza- CE 2007. ed. digital in http://diariodonordeste.globo.com acesso
em 28/04/07.
DUARTE, N. A individualidade para-si (contribuições a uma teoria
histórico-social da formação do indivíduo). Campinas: Autores
Associados, 1993.
MANA CORDA, Mario Alighiero. Marx e a pedagogia moderna. ed.
São Paulo: Editora Cortez, 2000
232
NOZAKI, Hajime Takeucho. Educação Física e o reordenamento do
mundo do trabalho: mediações da regulamentação da profissão. Niterói,
2004. Tese (Doutorado em Educação) Universidade Federal Fluminense.
SAVIANI, D. Pedagogia Histórico-crítica: as primeiras aproximações.
ed. São Paulo: Cortez Editora, 1992.
SILVA, Jamerson Antonio de Almeida da; SILVA, Katharine Ninive Pinto.
Círculos populares de esporte e lazer: fundamentos da educação para o
tempo livre. Recife PE, editora Bagaço, 2004.
APÊNDICES
APÊNDICE I: Documento N . 1 Questionário: Caracterização da população
e participação no PENC
Sujeitos respondentes: participantes (alunos)
Instruções para o preenchimento do questionário:
1. Não é necessário se identificar. As respostas são anônimas e as informações
serão utilizadas somente para fins de pesquisa.
2. Todas as questões que você irá responder tratam de sua participação no
Programa Esporte na Comunidade (PENC).
3. Procure responder todas as informações marcando um X” ou escrevendo
nos espaços quando necessário.
1. Informações pessoais
1.1 - Idade:
1.2 - Sexo:
1. ( ) Masculino
2. ( ) Feminino
1.3. Estado civil:
1. ( ) Solteiro (a)
2. ( ) Separado (a)
3. ( ) Viúvo (a)
4.( ) Casado (a)
1.4 Você estuda?
1. ( ) Estuda
2. ( ) Já estudou
3. ( ) Nunca estudou
1.5 Se você estuda ouestudou, qual o nível de ensino?
1.5.1 - Ensino fundamental:
1. ( ) 1º ano
2. ( ) 2º ano
3. ( ) 3º ano
4. ( ) 4º ano
5. ( ) 5º ano
6. ( ) 6º ano
7. ( ) 7º ano
8. ( ) 8º ano
9. ( ) 9º ano
1.5.2 - Ensino médio:
1. ( ) 1º ano
2. ( ) 2º ano
3. ( ) 3º ano
1.5.3 - Educação de jovens e adultos:
1. ( )Fundamental
2. ( ) Ensino médio
3. ( ) Projovem
1.5.4 - Curso de formação para o trabalho:
1. ( ) Corte e costura
2. ( ) Cabelereiro
3. ( ) Enfermagem
4. ( ) Operador de telemarketing
5. ( ) Informática e/ou computação
7. ( ) Outros, qual ou quais?
1.5.5 - Qual a última série que você cursou?
1.6 - Você estuda ouestudou em que tipo de escola?
1. ( ) Particular
2. ( ) Pública municipal
3. ( ) Pública estadual
1.7 - Você estuda ou estudou em que turno?
1. ( ) Manhã
2. ( ) Tarde
3. ( ) Noite
4. ( ) Intermediário
1.8 - Você trabalha?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
1.8.1 - Se você trabalha, que tipo de trabalho você realiza:
1.8.2 - Quanto você recebe por esse trabalho?
1.9 - Em que bairro você mora?
1.10 - Com quem você mora?
1. ( ) Com seu pai e/ou mãe
2. ( ) Com outros parentes
3. ( ) Com outras pessoas
1.11 Sua família é atendida por outro (s) programa (s) social (is) do governo?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
1.11.1 Se sua família é atendida por outro (s) programa (s) social (is) do
governo, diga qual ou quais.
1. ( ) Bolsa família
2. ( ) Outro
1.11.2 - Quanto sua família recebe por mês deste (s) programa (s) social (is
2. Situação econômica dos pais
2.1 - Seu pai trabalha?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
3. ( ) Não sei
2.1.1 Qual a profissão de seu pai?
2.1.2 - Qual o tipo de trabalho do seu pai?
1. ( ) Funcionário público
2. ( ) Funcionário de empresa privada
3. ( ) Prestador de serviço
4. ( ) Autônomo
2.1.3 - Seu pai trabalha com carteira assinada?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
3. ( ) Não sei
2.1.4 - Quanto seu pai recebe por mês?
2.2 Sua mãe trabalha?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
3. ( ) Não sei
2.2.1 Qual a profissão de sua mãe?
2.2.2 - Qual o tipo de trabalho da sua mãe?
1. ( ) Funcionária pública
2. ( ) Funcionária de empresa privada
3. ( ) Prestadora de serviço
4. ( ) Autônoma
2.2.3 - Sua mãe trabalha com carteira assinada?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não
3. ( ) Não sei
2.2.4 - Quanto sua mãe recebe por mês?
3. Grau de instrução dos pais
3.1 - Você sabe até que série seu pai estudou?
1. ( ) Nunca estudou
2. ( ) Não completou a 4ª série
3. ( ) Completou a 4ª série
4. ( ) Não completou a 8ª série
5. ( ) Completou a 8ª série
6. ( ) Não completou o ensino médio
7. ( ) completou o ensino médio
8. ( ) concluiu a faculdade
9. ( ) começou, mais não concluiu a faculdade
10. ( ) não sei
3.2 - Você sabe até que série sua mãe estudou?
1. ( ) Nunca estudou
2. ( ) Não completou a 4ª série
3. ( ) Completou a 4ª série
4. ( ) Não completou a 8ª série
5. ( ) Completou a 8ª série
6. ( ) Não completou o ensino médio
7. ( ) Completou o ensino médio
8. ( ) Concluiu a faculdade
9. ( ) Começou, mais não concluiu a faculdade
10. ( ) Não sei
4. Perfil Econômico Familiar
4.1 - Quem é o responvel pela sua família?
4.2 - Quantas pessoas moram em sua casa?
4.3 Quantas pessoas moram em sua casa e trabalham?
4.4 - Qual a renda mensal de sua família juntando o salário de todas as pessoas
(pai, mãe, irmãos etc.) que moram em sua casa?
1. ( ) até 465,00
2. ( ) R$ 466,00 930,00
3. ( ) R$ 931,00 1.860,00
4. ( ) R$ 1.860,00 3.720,00
5. ( ) Maior que R$ 3.720,00
4.5 - Quem contribui na renda mensal de sua família?
1. ( ) Pai
2. ( ) Mãe
3. ( ) Pai e mãe
4. ( ) Irmãos
5. ( ) A
6. ( ) A
7. ( ) Outros
4.6 Qual o tipo de sua moradia?
1. ( ) Apartamento
2. ( ) Casa
3. ( ) Barraco
4.7 - Quais aparelhos eletrodomésticos têm em sua casa?
1. ( ) Fogão
2. ( ) Geladeira
3. ( ) Ventilador
4. ( ) Liquidificador
5. ( ) Máquina de lavar
6. ( ) Aspirador de
7. ( ) Freezer
8. ( ) Forno microondas
4.8 Quais aparelhos eletrônicos têm em sua casa?
1. ( ) Televisão
2. ( ) Rádio
3. ( ) Aparelho de som com CD
4. ( ) Aparelho de DVD
5. ( ) Videocassete
6. ( ) Ar condicionado
7. ( ) Computador
8. ( ) Automóvel/carro
4.9 - Na sua casa tem acesso à internet?
1. ( ) sim 2. ( ) não
4.9.1 Se sua resposta foi sim, qual o tipo de acesso?
4.10 - Na sua casa tem TV por assinatura?
1. ( ) sim 2. ( ) não
5. Participação no Programa Esporte na Comunidade
5.1 Como você ficou sabendo do PENC?
1. ( ) por amigos
2. ( ) por familiares
3. ( ) pelo professor do núcleo
4. ( ) pelo líder comunitário
5. ( ) por material de divulgação (panfletos ou faixas)
6. ( ) propaganda nos meios de comunicação (rádio ou televisão)
7. ( ) Outro
5.2 Há quanto tempo você participa do PENC?
1. ( ) menos de 3 meses
2. ( ) de 3 a 6 meses
3. ( ) de 6 meses a 1 ano
4. ( ) de 1 anos a 2 anos
5. ( ) a mais de 2 anos
5.3 - Quantas vezes por semana você participa?
5.4 Quais os esportes ou atividades sicas você pratica no PENC?
1. ( ) Basquete
2. ( ) Handebol
3. ( ) Voleibol
4. ( ) Futsal
5. ( ) Futebol
6. ( ) Atletismo
7. ( ) Karatê
8. ( ) Capoeira
9. ( ) Ginástica
10. ( ) Outro
5.4 - Você participa de outras atividades do PENC além das atividades
esportivas e físicas?
1. ( ) Sim 2. ( ) Não
5.4.1 Se você participa de outras atividades do PENC além do esporte ou da
atividade física, diga qual ou quais:
1. ( ) Reuniões comunitárias
2. ( ) Passeios
3. ( ) Assembias comunitárias
4. ( ) Planejamento participativo
5. ( ) Torneios ou festivais esportivos
6. ( ) Outros
5.5 - Você é atendido por algum (s) programa (s) social (is) do governo de
incentivo à prática de esporte?
1. ( ) Sim 2. ( ) Não
5.5.1 Se sua resposta for sim, diga qual o programa:
5.5.2 Quanto recebe por mês deste programa?
5.6 Que motivos justificam sua participação no PENC?
5.7 - Quais objetivos você pretende atingir com a prática de esporte ou de
atividade física no PENC?
5.8 Quantas pessoas de sua família participam do PENC?
APÊNDICE II: Documento N . 2 - Roteiro de entrevista N . 1
Sujeito entrevistado: Participante, liderança comunitária/comunidade
1. Qual a importância do Programa Esporte na Comunidade para você?
2. Como se á relação entre a associação e a Prefeitura Municipal de Fortaleza?
3. Na sua opinião, o que poderia ser melhorado/aperfeiçoado em relação ao
Programa Esporte na Comunidade?
4. Como se dá a relação da associação com a comunidade?
5. A comunidade participa das decisões na associação? Como se este
diálogo?
APÊNDICE III: Documento N . 3 - Roteiro de entrevista N . 2
Sujeitos entrevistados: professores
Eixos Temáticos
Temas
Perguntas
Eixo I
Marco teórico do
PENC
Pressupostos teóricos que
fundamentaram a
construção do projeto e
diretrizes do programa.
1. Como você compreende a
concepção de esporte e lazer presente
no programa?
2. Como você entende a relação entre
esporte, lazer e direito social no
programa (significado e para que
serve)?
Eixo II
Intervenção do PENC
nas comunidades
3. Quais estratégias foram
desenvolvidos para a implementação e
continuidade do programa na
comunidade?
4. Quem são os atores sociais
envolvidos nas atividades do
programa na comunidade?
5. Em que área (s) o programa atua na
comunidade?
Eixo III
Acesso e
democratização
Elementos norteadores
destes princípios no
PENC.
6. Quais as estratégias e mecanismos
de acesso implementados pelo
programa na comunidade?
7. Quais os espaços de funcionamento
do programa na comunidade?
Eixo IV
Participação potica
-Mecanismos de
participação da
comunidade nas ações do
programa.
-Mobilização e
articulação da
comunidade.
8. Como a comunidade participa das
ações do programa?
9. Quais as estratégias e mecanismos
de mobilização e articulação da
comunidade? Quais atores sociais
estão envolvidos?
Eixo V -
Funcionamento
10. Em sua opinião, quais os avanços
e dificuldades do progrma na
comunidade (salário, estrutura dos
núcleos, relação com a comunidade,
recurso material, participação dos
alunos, acompanhamento da
SECEL)?
APÊNDICE IV: Documento N . 4 - Roteiro de entrevista N . 3
Sujeitos entrevistados: grupo gestor
Eixos Temáticos
Temas
Subtemas
Eixo I
Marco teórico do PENC
Pressupostos teóricos que
fundamentaram a construção
do projeto e diretrizes do
programa.
-Concepção de esporte e lazer
-Política de esporte e lazer
-Relação esporte, lazer e direito
social (qual significado? Para que
serve?)
Eixo II
Intervenção do PENC
nas comunidades
- Dinâmicas (ou estratégias) e
mecanismos
-Atores e grupos sociais
envolvidos no processo
-Áreas de atuação do programa
Eixo III
Acesso e
democratização
Elementos norteadores
destes princípios no PENC.
-Dinâmicas (ou estratégias)
-Funcionamento: estrutura, locais
Eixo IV
Participação potica
-Mecanismos de
participação da comunidade
nas ações do programa.
-Mobilização e articulação
da comunidade.
-Planejamento participativo
-Resposta da SECEL as
demandas da comunidade
-Compreensão da proposta
Eixo V - Funcionamento
-Dificuldades e avanços
-Recurso orçamentário
-Estrutura dos núcleos
APÊNDICE V: Documento N . 5 - Autorizações da Secretaria de Esporte e Lazer
À Secretaria de Esporte e Lazer da Prefeitura Municipal de Fortaleza
Coordenação do Programa Esporte na Comunidade
Eu, Ana Amélia Neri Oliveira, solicito junto a Coordenação do
Programa Esporte na Comunidade autorização para realizar a pesquisa de
campo do projeto intitulado Democracia participativa e políticas públicas de
esporte e lazer: o programa esporte na comunidade em Fortaleza” nos núcleos
das comunidades Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e
João Paulo II. O referido estudo trata de uma pesquisa de mestrado realizado
junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação sica da Universidade de
Brasília UnB, sob a orientação da Profa. Dra. Dulce Suassuna.
Atenciosamente,
Ana Amélia Neri Oliveira
Pesquisadora
Profa. Dra. Dulce Suassuna
Orientadora
APÊNDICE VI: Documento N . 6 - Carta convite: Grupo gestor
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Sr. (a) Coordenador (a),
Eu, Ana Amélia Neri Oliveira
1
, venho respeitosamente convidá-lo (a) a participar
da pesquisa Democracia participativa e políticas públicas de esporte e lazer: o Programa
Esporte na Comunidade em Fortaleza que se propõe a investigar os princípios acesso”,
democratização e “participação potica” no Programa Esporte na Comunidade, nos
núcleos das comunidades Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João
Paulo II. Esta pesquisa contribuirá para o aprimoramento das políticas de esporte e lazer e
subsidiará ações que contemplem o diálogo entre Estado e Sociedade, de modo a possibilitar
a auto-organização das comunidades que vivenciam o esporte e o lazer.
Como participante da pesquisa, o Sr. (a) passará por uma entrevista. Sua
identidade não será divulgada, de modo a garantir o anonimato previsto em lei. Esclareço,
ainda, que o lhe secausado qualquer desconforto ou prejuízo pessoal e/ou profissional.
As informações prestadas pelo Sr. (a) serão utilizadas somente para os fins da pesquisa. Caso
seja de seu interesse, poderá desistir de participar da pesquisa a qualquer tempo.
Fortaleza-Ce, _____ de _______ de 2009
Assinatura do coordenador (a)
1
Pesquisadora responsável: Ana Amélia Neri Oliveira Contato: ananerief@gmail.com - (61) 81819326
Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília-Cep_ih@unb.br
APÊNDICE VII: Documento N . 7 Carta convite: Professor
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Sr. (a) Professor (a),
Eu, Ana Amélia Neri Oliveira
1
, venho respeitosamente convidá-lo (a) a
participar da pesquisa Democracia participativa e políticas públicas de esporte e
lazer: o Programa Esporte na Comunidade em Fortaleza que se propõe
investigar os princípios acesso”, democratização” e participação potica” no
Programa Esporte na Comunidade, nos cleos das comunidades Planalto
Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II. Esta pesquisa
poderá contribuir para o aperfeiçoamento das Políticas de Esporte e Lazer que
contemplem o diálogo entre Estado e Sociedade, de modo a possibilitar a auto-
organização das comunidades que vivenciam o esporte e o lazer.
Como participante da pesquisa, o Sr. (a) passará por uma entrevista e
será observado (a) durante a realização da pesquisa. Sua identidade será mantida
em sigilo, de modo a garantir o anonimato previsto em lei. A participação na
pesquisa não lhe causará qualquer constrangimento ou prejuízo pessoal e/ou
profissional. As informações prestadas pelo Sr. (a) serão utilizadas somente para
os fins da pesquisa. Caso seja de seu interesse, poderá desistir de participar da
pesquisa a qualquer tempo.
Fortaleza-Ce, _____ de _______ de 2009
Assinatura do professor (a)
1
Pesquisadora responsável: Ana Amélia Neri Oliveira Contato: ananerief@gmail.com - (61) 81819326
Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília-Cep_ih@unb.br
APÊNDICE VIII: Documento N . 8 - Carta convite: Participante
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Aluno (a),
Eu, Ana Amélia Neri Oliveira
1
, convido você a participar da pesquisa
Democracia participativa e políticas públicas de esporte e lazer: o programa
esporte na comunidade em Fortaleza” que objetiva investiga o “acesso”, a
democratização” e a “participação potica” nos núcleos das comunidades
Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João Paulo II. Esta
pesquisa poderá contribuir para melhorar e/ou aperfeiçoar os programas de
esporte e lazer e ampliar o diálogo entre a prefeitura e a comunidade, de modo a
possibilitar a auto-organização da comunidade no setor do esporte e lazer.
Para participar da pesquisa você deverá responder um questionário
sem identificação. Informa também que você se observado durante a
realização da pesquisa. Sua identidade se mantida em sigilo, de modo a
garantir o anonimato previsto em lei. A participação na pesquisa não causará
nenhum tipo de constrangimento ou prejuízo para você e/ou sua família. As
informações prestadas por você serão utilizadas somente para os fins da
pesquisa. Caso tenha interesse, poderá desistir de participar da pesquisa a
qualquer tempo.
Fortaleza-Ce, _____ de _______ de 2009
Assinatura do aluno (a)
Assinatura do aluno (a) ou responsável
1
Pesquisadora responsável: Ana Amélia Neri Oliveira Contato: ananerief@gmail.com - (61) 81819326
Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília-Cep_ih@unb.br
APÉNDICE IX: Documento N . 9 - Carta convite: Liderança comunitária/comunidade
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Sr. (a) líder comunitário (a),
Eu, Ana Amélia Neri Oliveira
1
, venho respeitosamente convidá-lo (a)
a participar da pesquisa “Democracia participativa e políticasblicas de
esporte e lazer: o Programa Esporte na Comunidade em Fortaleza que tem
como objetivo investigar os princípios acesso”, democratização” e
participação política” no Programa Esporte na Comunidade, nos núcleos das
comunidades Planalto Universo, Rosalina, Serrinha, Presidente Kennedy e João
Paulo II. Esta pesquisa pode contribuir para melhorar e/ou aperfeiçoar os
programas de esporte e lazer e ampliar o diálogo entre a prefeitura e a
comunidade, de modo a possibilitar a auto-organização da comunidade no setor
do esporte e lazer.
Como participante da pesquisa, o Sr. (a) passará por uma entrevista e
será observado (a) durante a realização da pesquisa. Sua identidade não será
divulgada, de modo a garantir o anonimato previsto em lei. A participação na
pesquisa não lhe causará nenhum tipo de constrangimento ou prejuízo. As
informações prestadas pelo Sr. (a) serão utilizadas somente para os fins da
pesquisa. Caso tenha interesse, poderá desistir de participar da pesquisa a
qualquer tempo.
Fortaleza-Ce, _____ de _______ de 2009
Assinatura do der comunitário (a)
1
Pesquisadora responsável: Ana Amélia Neri Oliveira Contato: ananerief@gmail.com - (61) 81819326
Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília-Cep_ih@unb.br
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo