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desconhecê-los bem como a sua própria condição de titular deles; daí a sua
sugestão de criação de expedientes como a “assistência e a orientação jurídica”. No
que concerne aos serviços de “assistência e orientação jurídica”, oportuna a
transcrição abaixo, de Santos:
No imediato pós-guerra, vigorava na maioria dos países um sistema de
assistência judiciária gratuita organizada pela ordem dos advogados a título
de munos honorificum (Cappelleti e Garth, 1978: 22 e ss; Blankenburg,
1980). Os inconvenientes deste sistema eram muitos e foram rapidamente
denunciados. A qualidade dos serviços jurídicos era baixíssima, uma vez
que, ausente a motivação econômica, a distribuição acabava por recair em
advogados sem experiência e por vezes ainda não plenamente
profissionalizados, em geral sem qualquer dedicação a causa. Os critérios
de eligibilidade eram em geral restritos e, muito importante, a assistência
limitava-se aos actos em juízo, estando excluída a consulta jurídica, a
informação sobre os direitos. A denúncia das carências deste sistema
privado e caritativo levou a que, na maioria dos países, ele fosse
substituído por um sistema público e assistencial organizado ou subsidiado
pelo Estado. Na Inglaterra, criou-se logo em 1949 um sistema de advocacia
convencionada posteriormente aperfeiçoado (1974), segundo o qual
qualquer cidadão elegível nos termos da lei para o patrocínio judiciário
gratuito escolhe o advogado dentre os que se inscreveram para a
prestação dos serviços e que constam de uma lista; uma lista sempre
grande dado o atractivo da remuneração adequada a cargo do Estado. Nas
duas décadas seguintes, muitos países introduziram esquemas
semelhantes de serviços jurídicos gratuitos. Estes esquemas, conhecidos
nos países anglo-saxônicos pela designação de Judicare, uma vez postos
em prática, foram submetidos a estudos sociológicos que, apesar de
assinalarem as vantagens significativas do novo sistema em relação ao
anterior, não deixaram, contudo, de revelar as suas limitações
(BLANKENBURG, 1980; ABEL-SMITH et al, 1973). Em primeiro lugar,
apesar de, em teoria, o sistema incluir a consulta jurídica
independentemente da existência de um litígio (sic, ao contrário daqui em
que os “dativos” fazem exclusivamente o acesso ao judiciário, sic), o facto
e que, na prática, se concentrava na assistência judiciária. Em segundo
lugar, este sistema limitava-se a tentar vencer os obstáculos econômicos
ao acesso à Justiça, mas não os obstáculos sociais e culturais. Nada fazia
no domínio da educação jurídica dos cidadãos, da conscientização sobre
os novos direitos sociais dos trabalhadores, consumidores, inquilinos,
jovens, mulheres, etc. Por último, concebendo a assistência judiciária como
um serviço prestado a cidadãos de menos recursos individualmente
considerados, este sistema excluía, a partida, a concepção dos problemas
desses cidadãos enquanto problemas colectivos das classes sociais
subordinadas. Estas críticas conduziram a algumas alterações no sistema
de serviços jurídicos gratuitos e, no caso dos Estados Unidos da América,
conduziram mesmo à criação de um sistema totalmente novo baseado em
advogados contratados pelo Estado, trabalhando em escritórios de
advocacia localizados nos bairros mais pobres das cidades e seguindo
uma estratégia advocatícia orientada para os problemas jurídicos dos
pobres enquanto problemas de classe, uma estratégia privilegiando as
acçoes coletivas, a criação de novas correntes jurisprudenciais sobre
problemas recorrentes das classes populares e, finalmente, a
transformação ou reforma do direito substantivo. (CAHN e CAHN, 1964;
NOTE, 1967 apud SANTOS, 1996, pp. 171/172)