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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
DENISE MEDINA DE ALMEIDA FRANÇA
A PRODUÇÃO OFICIAL DO MOVIMENTO DA MATEMÁTICA
MODERNA PARA O ENSINO PRIMÁRIO DO ESTADO DE SÃO
PAULO (1960-1980)
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
São Paulo
2007
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
DENISE MEDINA DE ALMEIDA FRANÇA
A PRODUÇÃO OFICIAL DO MOVIMENTO DA MATEMÁTICA
MODERNA PARA O ENSINO PRIMÁRIO DO ESTADO DE SÃO
PAULO (1960-1980)
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação do
Professor Doutor Wagner Rodrigues Valente.
São Paulo
2007
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Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________
Á minha família.
Para vocês,
Por Vocês,
Por tudo que são vocês,
Denise Medina
AGRADECIMENTOS
A todos os companheiros e companheiras deste amadurecimento
acadêmico, profissional e pessoal, meus sinceros agradecimentos
pela amizade, força, carinho e emoção.
Aos meus colegas de mestrado, que têm um histórico de vida
profissional o mais diverso, respeitável e abrangente possível, e em
especial ao GHEMAT, pela generosidade e colaboração constante.
Ao meu orientador Professor Doutor Wagner Rodrigues Valente,
que como um chefe de torcida, sempre acreditou e me animou
nesta difícil jornada de concretização dos sonhos.
Aos professores do Programa, com os quais tive a honra de poder
conviver e compartilhar suas experiências, conhecimentos e de
aprender, observando e/ou participando na dinâmica de suas
produções científicas.
A todos os funcionários, do Campos Marquês de Paranaguá que,
sempre com um sorriso, procuraram atender as solicitações,
tornando o ambiente sempre agradável e acolhedor.
À banca, às sugestões e leitura crítica que fizeram por ocasião da
qualificação.
A CAPES que possibilitou minha participação no Programa de
Estudos Pós Graduados em Educação Matemática, cuja
composição é exemplo de respeito às diferenças e de convivência
com a diversidade de gênero, raça, territorialidade e religião:
brasileiros, e estrangeiros, trabalhando harmoniosamente pela
Educação na Instituição.
Agradeço a confiança e ressalto o importante papel, da
contribuição dos entrevistados: Almerindo Bastos, Lucília Sanchez
Bechara, Manhúcia P. Liberman e Ubiratan D’Ambrosio, para a
realização deste estudo.
Muito obrigada por tudo que vivi e cresci neste período.
A Autora
RESUMO
Esta dissertação tem como objetivo analisar as alterações curriculares e a
legislação de ensino que lhes deu origem, por meio dos documentos oficiais de
orientação curricular, direcionados para o ensino de matemática na escola
primária paulista no período de 1960 a 1980, pois queremos saber de que modo,
foi oficializado o Movimento para esse nível de ensino, a fim de compreender os
processos de apropriação realizados pela equipe da Secretaria Estadual de
Educação de São Paulo do ideário do MMM. Para isso, estudamos teses,
dissertações, e coletamos documentos relacionados ao tema. Selecionamos O
Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo, de 1969; os Guias
Curriculares para o Ensino de 1º Grau, de 1975; e os Subsídios para a
Implementação dos Guias Curriculares de Matemática Álgebra e Geometria
de 1981 para aprofundamento de nossa análise. O processo também englobou o
cotejamento dos documentos escolhidos com as LDB/61 e a LDB/71.
Complementando essas informações, consideramos nas entrevistas realizadas
com protagonistas do MMM, suas memórias como fontes, e por isso tratada como
um conhecimento produzido, reconstruído através da crítica e da reinterpretação
do passado, sob o olhar do hoje. Na articulação das questões, fizemos uso da
abordagem da história cultural e nos apoiamos nos conceitos de representação,
apropriação e estratégias postas por Chartier (1991) e De Certeau (1982). As
considerações teórico-metodológicas também foram apoiadas em Le Goff (1992),
que nos auxiliou nas análises; e em Faria Filho (1998) que nos amparou na
análise da Legislação educacional. Concluímos que, no período estudado, os
documentos oficiais foram utilizados como estratégia, produzida pelo Estado, de
reformulação curricular e divulgação, para implementar as novas diretivas para o
ensino de matemática, na escola primária paulista. Comprovamos também a
oficialização do ideário do MMM no Ensino Primário por meio desses
documentos, relacionando-os com as transformações na estrutura do currículo de
matemática com as normativas impostas pela LDB 4.024/61 e LDB 5672/71.
Palavras-Chave: Educação Matemática, História da Educação Matemática,
Movimento da Matemática Moderna, Ensino Primário, Documentos Oficiais.
ABSTRACT
This dissertation analyses the changes to the Curriculum for Mathematics
followed by primary schools in São Paulo between 1960 and 1980 and the
legislation which accompanied these changes. It aims to identify, by means of the
analysis of official documents presenting curricular guidelines, in what form, in the
age of the Modern Mathematics Movement (MMM), aspects of this movement
were officialised in primary teaching and hence contribute to an understanding of
the processes of appropriation realized by the team of the Secretariat of Education
for the State of São Paulo of the Movement’s though. To this end, we studied
dissertations and theses and collected documents related to the theme. We
selected the following documents for detailed analysis: the 1969 Programme for
the Primary School of the State of São Paulo, the Curriculum Guides for 1
st
Grade
Teaching (1975) and Support for the Implementation of the Curriculum Guides for
Mathematics – Algebra and Geometry of 1981. The analysis process also included
comparisons of the chosen documents with the laws LDB/61 and LDB/71.
Complementing this information, from interview material, we took into
consideration the memories of protagonists of the MMM, treated as produced
knowledge, reconstructed through a processes of critiques and reinterpretations of
the past, through today’s lenses. To articulate the questions addressed, we made
use of the historic-cultural approach and drew support from the concepts of
representation, appropriation and strategies proposed by Chartier (1991) and De
Certeau (1982). The theoretical and methodological considerations were also
based upon the work of Le Goff (1992) and his position as regards the analysis of
monuments and their transformation into documents. We also used the
perspective of Faria Filho (1998) to fundament the analysis of educational
legislation. We concluded that, in the period studied, the official documents were
used as a strategy of curriculum reform and dissemination, produced by the State,
to implement the new directives for the teaching of mathematics within primary
schools in São Paulo. We evidenced also the officialization of the MMM through
these documents, associating them with the transformations in the structure of the
mathematics curriculum according to the norms imposed the laws LDB 4.024/61
and LDB 5672/71.
Keywords: Mathematics Education, History of Mathematics Education, Modern
Mathematics Movement, Primary Teaching, Official documents.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 13
CAPÍTULO 1 ............................................................................................................ 24
CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS ......................................... 24
CAPÍTULO 2 ............................................................................................................ 33
O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA .............................................. 33
2.1 O MMM no Mundo ........................................................................................ 33
2.2 O MMM no Brasil .......................................................................................... 39
CAPÍTULO 3 ............................................................................................................ 46
O ENSINO PRIMÁRIO 1960-1980 ..................................................................... 46
3.1 Do Ensino Primário ao Primeiro Grau .......................................................... 46
3.2 O MMM nas séries iniciais e as equipes de elaboradores dos documentos 62
CAPÍTULO 4 ............................................................................................................ 93
A APROPRIAÇÃO DO IDEÁRIO DO MMM NOS DOCUMENTOS OFICIAIS .. 93
4.1 O Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo-1969 .................. 94
4.2 O Programa de Matemática ......................................................................... 109
4.2.1 Os Guias Curriculares 1975 ................................................................ 120
4.2.2 Plano de Ação para a Reforma de Ensino de 1º Grau – Matemática . 125
4.2.3 Diretrizes e Bases da Educação Nacional .......................................... 131
4.2.4 Parecer Nº 853/71 ............................................................................... 132
4.2.5 Indicação Nº 1/72 ................................................................................ 143
4.2.6 Parecer Nº 339/72 ............................................................................... 145
4.2.7 O Guia de Matemática ........................................................................ 147
4.2.8 Guias Curriculares - Matemática. Especificações de bibliografia,
instalações e equipamentos ...............................................................
165
4.3 Subsídios para a Implantação do Guia Curricular de Matemática, 1981 ..... 167
4.3.1 Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática
– Álgebra ............................................................................................
175
4.3.2 Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática
– Geometria .......................................................................................
183
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 190
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................... 205
ANEXOS .................................................................................................................. i
Anexo 1 ................................................................................................................... i
Entrevistados e sua relação com o movimento da Matemática Moderna .......... i
1- Almerindo Marques Bastos ............................................................................ i
2- Lucília Sanchez Bechara ............................................................................... i
3- Manhúcia Perelberg Liberman ....................................................................... i
4- Ubiratan D’Ambrosio ...................................................................................... ii
Anexo 2 ................................................................................................................... iii
Entrevista com Almerindo Bastos -05/dez/2006 e jan./2007 .............................. iii
Anexo 3 ................................................................................................................... xxiii
Plano de Educação de São Paulo - Documento Preliminar ............................... xxiii
Anexo 4 ................................................................................................................... xxviii
Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo, 1969 ........................... xxviii
1- Conceito de Escola Primária .......................................................................... xxviii
2- Objetivos do Ensino Primário ......................................................................... xxxi
Anexo 5 ................................................................................................................... xxxiii
Guias Curriculares do Estado de São Paulo, 1975 ............................................ xxxiii
1- Introdução dos Guias ..................................................................................... xxxiii
Anexo 6 ................................................................................................................... xxxv
Subsídios para a Implantação do Guia Curricular de Matemática ..................... xxxv
Anexo 7 ................................................................................................................... xxxvii
Cronologia .......................................................................................................... xxxvii
13
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa nasceu do contato direto com professores de 1ª a 8ª série do
ensino fundamental de Escolas Municipais de São Paulo e de seus desabafos
sobre as dificuldades encontradas em sua prática pedagógica, principalmente em
relação ao ensino de Matemática.
Sou professora de matemática desde 1986 e tenho dois cargos efetivos na
Prefeitura do Município de São Paulo. Em 2000, com a conclusão do curso de
Pedagogia, fui designada para o cargo de coordenadora pedagógica de uma
escola de ensino fundamental de 1ª à 8ª série.
No exercício do cargo como coordenadora pedagógica, tive oportunidade
de observar e problematizar algumas questões que permeiam e angustiam o
cotidiano escolar dos docentes. Constatei, em nossas reuniões diárias, suas
insatisfações em relação às suas práticas, as semelhanças em suas aflições e o
sentimento de impotência para resolvê-las, independentemente do segmento do
ensino e componente curricular ao qual pertenciam.
Procurando atender às demandas dos professores em relação aos
problemas surgidos em sala de aula, periodicamente procurava participar de
cursos de atualização e capacitação pertinentes à minha área de atuação. A
participação nesses cursos gerou alguns questionamentos que, pressuponho,
mereciam e merecem aprofundamento.
Na escola, em nossas reuniões diárias, pudemos observar que seria
ineficaz a tentativa de resolver os problemas cotidianos que obstruíam nossa
"saúde pedagógica” sem a pesquisa de suas origens, apropriações, contexto e
processo de perpetuação desses problemas, tidos como insolúveis, dentro da
cultura escolar. Era necessário um aprofundamento por meio de uma pesquisa
numa dimensão histórica, que investigasse também a ausência das vozes dos
14
professores nos processos de organização e mudanças de propostas curriculares,
com respaldo de instrumentos conceituais capturados na Universidade e em
estratégias reveladas na teoria e nas discussões que só o trabalho científico
poderia propiciar.
Quando ingressei no curso de mestrado do Programa de Estudos Pós-
Graduados em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, direcionei meu interesse para esse aspecto, na linha de pesquisa em
História, Epistemologia e Didática da Matemática, cujo objetivo é a compreensão
dos fenômenos ligados ao ensino-aprendizagem da Matemática, às relações
entre saberes científicos e escolares, e à constituição histórico-cultural da
Matemática.
Logo, percebi a possibilidade de procurar responder a questões eclodidas
na escola em nosso trabalho coletivo diário e, além disso, de contribuir com o
GHEMAT (Grupo de Pesquisa de História da Educação Matemática), na
organização, seleção e disponibilização de material referente à história da
educação matemática, colaborando na composição de um centro de referência
documental, como é a pretensão do Grupo.
Como participante do GHEMAT
1
tive oportunidade de compartilhar com o
Grupo, leituras sobre “produzir história”, o papel do historiador em educação
matemática e os objetivos e finalidades desse novo campo do conhecimento.
Nosso objetivo é a produção de fatos históricos com base em
acontecimentos ligados ao ensino de Matemática no Brasil. Esta produção faz
parte da prática do historiador contemporâneo, através do seu trabalho científico.
Não existem fatos históricos por natureza. Eles são produzidos
pelos historiadores a partir de seu trabalho com as fontes, com os
documentos do passado, que se quer explicar a partir de
respostas às questões previamente elaboradas. Assim, não há
fontes sem as questões do historiador. Será ele que irá erigir os
traços deixados pelo passado em documentos para a história, em
substância para a construção de seus fatos. (VALENTE, 2007, p.
5).
Deste modo, a pretensão do Grupo é o de ficar de posse de uma base
teórico-metodológica utilizada por historiadores da educação, para responder
1
O site do Grupo é: www.pucsp.br/ghemat.
15
coerentemente as questões por nós levantadas e tornar estas informações
disponíveis, com credibilidade e consistência históricas.
Um dos projetos desenvolvidos pelo GHEMAT e coordenados pelo
professor Wagner Rodrigues Valente, denomina-se “Estudos Sobre História da
Educação Matemática no Brasil, 1950-2000”. O projeto objetiva analisar
historicamente o percurso da educação matemática no Brasil, de 1950 até o fim
do século XX. Envolve os anos que antecedem o Movimento da Matemática
Moderna, que a partir de agora passaremos a tratar como MMM; o período de
vigência desse Movimento no Brasil, as relações que matemáticos brasileiros
estabelecem com os rumos do ensino de Matemática em nosso país e a análise
de uma proposta originalmente brasileira para educação matemática.
Com auxílio de meu orientador, Professor Doutor Wagner Rodrigues
Valente, fui elaborando um conjunto de perguntas que poderiam ser respondidas
por meio deste projeto sobre a história da educação matemática no Brasil e que
também pudessem contribuir com os trabalhos do GHEMAT.
Com o crescimento do número de informações coletadas em decorrência
da revisão bibliográfica em teses, dissertações
2
, livros e nas buscas efetuadas em
bibliotecas, constatamos poucas referências à história da educação matemática
no segmento de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental, tanto no século XX, como
nos anteriores, que pudessem nortear nossa pesquisa.
Em conseqüência dessa busca, aliada à organização do APUA (Arquivo
Pessoal de Ubiratan D’Ambrosio), discussões em nosso grupo de pesquisas e a
importância do MMM, para o ensino da matemática, ficamos propensos a alocar
nossa pesquisa no Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série, que passaremos a tratar
por Ensino Primário
3
, durante a vigência do MMM, em razão da escassez de
trabalhos sobre o tema.
Diante dessa constatação inicial, de raríssimas pesquisas relativas ao
Movimento no Ensino Primário, direcionamos nossos estudos ao esclarecimento
de algumas características da história da educação matemática nesse segmento
2
Contidas no Banco de teses e dissertações da CAPES e inventariadas pelo GHEMAT.
3
Estaremos chamando de Ensino Primário, o que hoje corresponde às quatro primeiras séries do ensino
fundamental.
16
e quais os tipos de veículos utilizados pelos defensores do MMM, para difusão do
ideário
4
do Movimento nas séries iniciais.
No decorrer de nossas procuras entre estantes de bibliotecas, percebemos
a grande quantidade de publicações oriundas de órgãos oficiais destinadas às
séries iniciais. Entre essas publicações, optamos pelos documentos oficiais, como
nossas fontes de pesquisas, pois acreditamos no seu poder de propagação das
idéias dominantes em cada época e, em grande medida, utilizados como
norteadores para a publicação de livros didáticos, além do importante papel de
divulgação, imposição e apropriação de modelos educacionais.
Com base nessas fontes, o problema de pesquisa desta dissertação é
analisar as reformulações curriculares para o ensino da matemática nas séries
iniciais, produzidas pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, no
período de 1960 a 1980, a fim de compreender as apropriações realizadas pelas
equipes da Secretaria, do ideário do MMM, que circulava dentro e fora do país.
Para isto analisarei os documentos oficiais produzidos no processo de
implementação das mudanças curriculares no estado de São Paulo.
Assim, o estudo pretende responder às seguintes questões:
- Como ocorreu a reestruturação do Ensino Primário no período entre 1960
e 1980 em São Paulo?
- Quais estratégias de reformulação curricular e divulgação, produzidas
pelo Estado foram veiculadas por meio de documentos para implementar
as novas diretivas para o ensino de matemática na escola primária
paulista?
- Como o ideário do MMM foi incorporado na produção de documentos
oficiais que buscaram parametrizar o ensino de Matemática nas séries
iniciais das escolas paulistas?
Segundo Le Goff (1992), os fatos históricos são constituídos de traços, de
rastros deixados no presente pelo passado. Logo, o nosso trabalho como
historiadora buscou levar em conta um estudo sobre esses traços, interrogar e
4
Estaremos caracterizando como ideário um conjunto de idéias que norteiam um Movimento.
17
responder as questões elaboradas anteriormente sobre os vestígios
representados pelos documentos estudados.
Além da pretensão de transformar os vestígios encontrados nos
documentos estudados em fontes, incluímos, também, um trabalho de
identificação e construção dessas fontes, que foram utilizadas para responder às
questões iniciais sobre os processos de apropriação utilizados pelos elaboradores
desses documentos, no Ensino Primário. Ressaltamos que, após esta coleta, o
acervo catalogado estará disponível a outros pesquisadores.
Cabe salientar que, em virtude destas questões, fez-se necessário um
estudo das duas LDB’s
5
em vigor no período estudado, da legislação estadual de
ensino decorrente dessas leis e os documentos oficiais produzidos para veicular
as reformas curriculares do ensino de matemática no Ensino Primário.
Ressaltamos que nosso foco de pesquisa refere-se às apropriações do
ideário do MMM pela equipe de elaboradores da Secretaria de Educação de São
Paulo, destacando a inserção de matemáticos nesse segmento de ensino, que
provocavam alterações nas metodologias e consequentemente nas bases que
fundamentavam as mudanças metodológicas propostas.
Isso implica seguir e procurar desvendar os processos de apropriação
utilizados na elaboração de três documentos por nós selecionados para
aprofundamento de nossa análise, que são: O Programa da Escola Primária do
Estado de São Paulo, de 1969; os Guias Curriculares para o Ensino de 1º Grau,
de 1975; e os Subsídios para a Implementação dos Guias Curriculares de
Matemática-Álgebra e Geometria, de 1981.
Para atingir os objetivos aqui propostos, pesquisamos estantes de
bibliotecas de universidades; no arquivo denominado Memória Técnica
Documental da Cidade de São Paulo, que se localiza na Secretaria Municipal de
Educação; no Arquivo Estadual localizado no Centro de Referência Mário Covas;
na biblioteca da Faculdade de Educação da USP, buscando documentos que
pudessem nos trazer informações referentes ao nosso problema de pesquisa.
Nessa empreitada encontramos diversos documentos produzidos pelas
Secretarias Estadual e Municipal de Educação de São Paulo, no período de 1960
5
Lei 4.024/61 e Lei 5.692/71.
18
a 1980, destinados a professores e equipe técnica dos Ensinos Primário e
Secundário. Como o nosso foco de pesquisa é o Ensino Primário de Matemática,
nos detivemos nos documentos específicos desse segmento.
Vale destacar que a seleção dos documentos a serem analisados na
dissertação se deu em função de alguns fatores eleitos por nós como
significativos:
- O fato de os elaboradores das produções analisadas terem sido
protagonistas do MMM no Brasil;
- A presença explícita, na fundamentação destes documentos de autores
como Jean Piaget
6
e Zoltan Dienes
7
;
- A hipótese de que os documentos oficiais produzidos pelo Estado tenham
sido usados como estratégia para veiculação, divulgação e
convencimento das reformas de ensino.
Desse modo, nossa análise se deterá em documentos produzidos pela
Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, que contemplam os fatores
expostos e significativos em relação ao processo de expansão da rede paulista, e
na reformulação do ensino de matemática no Ensino Primário, proveniente da
reorganização curricular proposta pelas Leis 4.024/61 e 5.692/71, alargando a
obrigatoriedade escolar para oito anos.
Nosso primeiro passo, após a construção do problema de pesquisa, foi
aprofundar teoricamente alguns elementos de nosso estudo e construir nosso
objeto de pesquisa. Começamos por um levantamento bibliográfico sobre teses e
dissertações que enfocam o MMM no Brasil. Após a leitura dos textos coletados,
procuramos desvendar regularidades de concepções e fundamentos, nos
discursos dos seus autores, a fim de tentar explicitar como essa produção
caracteriza o Movimento no Brasil.
6
Epistemólogo afirmava que havia uma forte relação entre o desenvolvimento das estruturas psicológicas do
indivíduo e a forma de ensinar matemática proposta pelos modernistas. Sua teoria reforça a utilização de
métodos ativos e de metodologia adequada para cada fase do desenvolvimento
.
7
Matemático húngaro, doutor em matemática e psicologia, que compactuava com ideário do
MMM: Era estruturalista como Piaget, tratava à matemática como uma estrutura única, porém
utilizava uma metodologia mais concreta.
19
Verificamos várias abordagens e considerações sobre o tema, o que nos
obrigou a relativizar e procurar elencar alguns elementos comuns em todas as
leituras, passando a adotar esta caracterização como referência, em nossa
pesquisa, para o ideário do MMM.
Procuramos construir nosso estudo dos documentos norteados pelas
recomendações indicadas pelo historiador da educação Luciano Faria Filho, sobre
as várias dimensões das legislações. Neste processo priorizamos a análise da
forma e do conteúdo, utilizados como instrumentos de ordenação legal, de
produção de consentimentos e de ordenação e instituição das práticas educativas
que desejam ser divulgadas pelos grupos dominantes.
A dinâmica dos procedimentos de análise revelou a urgente necessidade
de instrumentos conceituais, que viessem em nosso auxílio. Dentre os autores
contemporâneos utilizados por historiadores que mais contemplam nosso campo,
optamos por Michel de Certeau, Jacques Le Goff e Roger Chartier para auxiliarem
a responder às nossas questões de pesquisa referente à compreensão das
apropriações do ideário do MMM no Ensino Primário.
O processo dessa análise englobou o cotejamento dos documentos
escolhidos com outros documentos que, apesar de não citados explicitamente,
foram utilizados em nosso estudo, com depoimentos orais de protagonistas do
Movimento. Eles aparecem ao longo do texto e passam a fazer parte de uma
base de dados sobre a legislação brasileira durante a vigência do MMM
disponibilizada por nosso grupo de pesquisa.
Em síntese, estamos estudando as alterações curriculares e a legislação
de ensino que lhes deu origem, por meio dos documentos oficiais de orientação
curricular, direcionados para o ensino de matemática na escola primária paulista
no período de 1960 a 1980, pois queremos saber de que modo, foi oficializado o
Movimento para esse nível de ensino, a fim de compreender os processos de
apropriação realizados pela equipe da Secretaria Estadual de Educação de São
Paulo do ideário do MMM.
No primeiro capítulo, relatamos a construção de nosso objeto de pesquisa
e anunciamos os fundamentos teóricos elaborados nos estudos de historiadores
contemporâneos, como Le Goff, Roger Chartier e De Certeau, que, através de
20
suas teorias, nos auxiliaram a compreender o MMM no Ensino Primário e a
explicar os processos de apropriação nos documentos oficiais. Essas teorias
mostraram-se imprescindíveis no decorrer do trabalho, para dar coerência e
consistência às questões que pretendemos responder.
Avaliamos que o conceito de apropriação de Roger Chartier foi
fundamental para compreendermos o caminhar escolhido por matemáticos para a
oficialização do MMM no Ensino Primário, relacionando-o com os conceitos de
estratégia de Michel de Certeau. Só assim compreendemos as possibilidades de
consumo de um mesmo ideário, no caso o MMM. Ressaltamos que nessa
concepção adotada, não cabe considerar classificações do Movimento como
“fracasso” ou “sucesso” e, sim, como apropriações.
Nesse capítulo também procuramos descrever as fontes utilizadas e o
modo como foram tratadas.
No segundo capítulo, procuramos apresentar o MMM e sua proposta
educacional, analisando como ele se consolida em várias partes do mundo e
como chega ao Brasil, buscando caracterizar alguns de seus aspectos referentes
à vigência, ideário, protagonistas e mecanismos de implantação. A caracterização
por nós adotada foi fundamentada em revisão bibliográfica em leitura de teses e
dissertações referentes ao nosso campo de pesquisa.
Em seguida, discutimos o tratamento de nossas fontes de pesquisa, de
acordo com o pensamento de Faria Filho (1998), quando afirma que
necessitamos conceber a legislação não somente como instrumento jurídico, mas
como linguagem e prática social, articulando-se suas bases legais, e relações dos
arquivos com a lei propriamente dita e com a prática da pesquisa.
O capítulo também apresenta um resumo dos trabalhos inventariados pelo
GHEMAT, considerados fundamentais para a compreensão do MMM e que são
referência no campo da história da educação matemática, procurando destacar as
contribuições de cada um deles para o campo e para nossa pesquisa.
Diante das constatações evidenciadas no capítulo, afirmamos que a
escassez de bibliografia em relação ao ensino de matemática na escola primária
paulista justifica e diferencia nossa pesquisa das demais.
21
Nesse capítulo também declaramos a pretensão de contribuir com o
aprofundamento do estudo da dinâmica da estruturação do ensino nas séries
iniciais depois das Leis de Diretrizes e Bases, para podermos analisar as
estratégias de reformulação curricular e de divulgação e o processo de
adequações do currículo ao ideário do MMM, produzidos por meio dos
documentos oficiais.
Guardadas as cautelas obviamente impostas pela grande diversidade de
fatores considerados para o consumo do ideário do MMM, procuramos elucidar a
trajetória de introdução desse ideário na escola primária.
No terceiro capítulo, relatamos a necessidade de compreendermos
os
processos de modificação, organização e expansão do Ensino Primário no país,
principalmente em São Paulo,
a fim de entendermos a dinâmica das reformas
educacionais e relacioná-las com as reorganizações curriculares que levaram em
conta o ideário do MMM
. Para isto apresentamos uma breve incursão pela
História do Ensino Primário no Brasil e conjecturamos como esse ideário é
introduzido na escola primária.
A construção do panorama de expansão do sistema paulista de ensino
subsidiará nossa reflexão sobre a escola primária proposta em cada uma das
reformas governamentais compreendidas no período estudado, a fim de
encontrarmos relações do Movimento com a legislação educacional e as
repercussões dessa legislação nos impressos oficiais, analisando as apropriações
do ideário do MMM, no decorrer do processo.
De maneira geral, tentaremos mostrar, as mudanças do Ensino Primário
paulista, no período considerado, tanto do ponto de vista de sua organização
formal como de suas diretrizes gerais e política educacional.
Buscamos também, nesse capítulo, esclarecer como o MMM chegou às
séries iniciais e quais foram às estratégias de divulgação e implementação desse
ideário por meio dos documentos oficiais e seus elaboradores.
Trazemos, ainda, a trajetória de ingresso de matemáticos defensores das
reformas curriculares propostas e professores atuantes no ensino secundário, no
primário, e possíveis fatores que os levaram a estudar a aprendizagem infantil, e
sob quais circunstâncias esses sujeitos representantes do MMM se deslocam
22
para as séries iniciais, tentando adequar o currículo da matemática às novas
demandas da sociedade.
Destacamos ainda a formação das equipes que elaboraram os documentos
por nós analisados, suas relações com o Movimento, a produção pedagógica do
grupo e as inovações trazidas por eles.
Para alargar nossas possibilidades de análise, procuramos montar o
cenário de produção dos impressos oficiais, enfocando o cotidiano da produção
dos textos, sua dinâmica e bastidores.
No quarto capítulo, analisamos a apropriação do ideário do MMM nos
documentos oficiais em relação às propostas anteriores. Tudo indica que os
documentos oficiais foram considerados como estratégias do Estado para divulgar
e fazer circular as diretrizes curriculares que norteavam a reforma educacional
proposta pela LDB 4.024 de 1961 e a LDB 5.692 de 1971.
No tratamento das fontes, fazemos a crítica, e procuramos destacar alguns
vestígios na produção do material que corroborem e permitam problematizar e
discutir as apropriações presentes nos documentos.
Também relatamos algumas considerações desveladas após o trabalho de
análise dos documentos oficiais produzidos em 1969, 1975 e 1981, sobre as
apropriações do ideário do MMM, discutindo as estratégias oficiais produzidas
para a divulgação, as novas diretrizes curriculares dentro de um novo Ensino
Primário, após a Lei 5.692, e a adequação do currículo de matemática às novas
demandas decorrentes de uma sociedade em transformação.
Concluímos o trabalho com algumas considerações sobre:
- A reestruturação do Ensino Primário no período 1960-1980 e as
mudanças na escola primária paulista;
- As estratégias de reforma curricular postas pelo Estado para
implementação das novas diretivas para o ensino de matemática;
- A apropriação do ideário do MMM, pela equipe de elaboradores dos
documentos no currículo de matemática;
- As transformações na estrutura do currículo de matemática com as
normativas impostas pela LDB 4.024/61 e LDB 5672/71.
23
Confiamos que o nosso olhar sobre este tema provoque novas discussões,
e que estas sejam utilizadas como ponto de partida para outras problematizações
sobre o ensino de matemática na escola primária.
Anexamos como contribuição às novas pesquisas, uma cronologia
construída no caminhar de nosso estudo sobre a inserção do MMM nas séries
iniciais, a cópia de partes dos documentos analisados e a transcrição da
entrevista concedida por Almerindo Bastos, a fim de subsidiar reflexão sobre
futuras questões.
24
CAPÍTULO 1
CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS
O reconhecimento da escassez de pesquisas sobre o MMM no Brasil e a
inquietação provocada pelo silêncio sobre a implantação do Movimento no Ensino
Primário impulsionaram nossa busca por fontes que esclarecessem e que
pudessem nortear nossa pesquisa.
Percebemos também a urgente necessidade de instrumentos conceituais,
que viessem em nosso auxílio, tentando responder coerentemente as questões
por nós levantadas em relação ao Ensino Primário, tornando as informações
decorrentes ofertadas,fidedignas e coerentes por meio de procedimentos de
investigação, conforme metodologia científica adequada.
Nosso caminhar teve início nas orientações do GHEMAT, vinculado ao
Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da PUC-SP,
sobre como produzir História. O grupo faz esse trabalho há algum tempo e tem
para esse tipo de investigação um procedimento próprio.
Wagner Valente, em seu texto “Interrogações Metodológicas” pontua a
importância de se pensar história como uma produção. O autor busca em Michel
De Certeau (1982) elucidar o significado da prática da história, do fazer histórico,
do ofício do historiador, e considera que para encarar a história como uma
operação, devemos tentar, de maneira necessariamente limitada, compreendê-la
como uma relação entre um lugar, procedimentos de análise e a construção de
um texto.
Nesse sentido, contextualizaremos os documentos oficiais analisados,
investigando relações, para tentar explicar as apropriações do ideário do MMM,
pelos elaboradores nestes documentos.
25
O ofício do historiador se dá no processo de interrogação que faz
aos traços deixados pelo passado, que são conduzidos à posição
de fontes de pesquisa por essas questões, com o fim da
construção de fatos históricos, representados pelas respostas a
elas. O historiador da educação matemática tem, como todo
historiador, a tarefa de produzir fatos históricos. Sua
especificidade é a de elaboração de fatos históricos relativos ao
ensino de matemática. (VALENTE, 2007, p. 12).
Nessa concepção, iniciamos o estudo fazendo uma pesquisa bibliográfica
sobre o ensino de matemática no ensino primário entre 1960 e 1990 e, em
seguida, um levantamento de fontes, ou seja, de documentos oficiais,
pesquisando suas intencionalidades explícitas e implícitas e procurando relações
e influências do ideário do MMM em seus fundamentos, no discurso e
apropriações de seus elaboradores, e no processo de implementação no Ensino
Primário da época.
Compartilhamos, ainda, com as considerações elaboradas por Luciano
Faria Filho, em seu texto “Fontes e Perspectivas de Análise para a História da
Educação Oitocentista”.
Para entender (...) e podermos melhor aquilatar as dificuldades e
possibilidades provenientes de sua implementação, era preciso
(...) não apenas como ordenamento jurídico, mas também como
linguagem e prática social. (FARIA FILHO, 1998, p. 92).
O texto de Faria Filho endereça-se a ampliar os horizontes da pesquisa em
História da Educação, tratando a legislação de ensino como fonte para nortear
esses estudos.
Com o objetivo de oferecer elementos para a percepção de diferentes,
aspectos informados explicitamente ou implicitamente pela legislação, o autor
afirma que essa análise não pode ser desvinculada do conceito da legislação
como dispositivo de confrontação de idéias e dos debates sociais.
Faria Filho propõe a discussão da relação entre a educação e a sociedade
brasileira mediada pela legislação. Assim, com um enfoque menos amplo, nossa
contenta utilizou os documentos oficiais como mediadores para explicar as
modificações curriculares no Ensino Primário, ocasionadas pelo ideário do MMM
hegemônico na sociedade da época, durante as reformas de ensino propostas
pelo governo paulista.
26
O autor afirma que a legislação não representa somente a expressão
ideológica que as camadas dominantes revelam sobre educação. Para utilizá-las
como fonte, é inevitável também considerar suas várias dimensões e sua
dinamicidade, que varrem desde a política educacional até as práticas de sala de
aula (Faria Filho, 1998, p. 98).
Essa concepção nos permite configurar e compreender a legislação escolar
como um ordenamento jurídico específico e, ao mesmo tempo, relacionado a
outros ordenamentos, isto é, além de incluir na análise suas origens puramente
jurídicas, devemos atender conjuntamente sua função de legitimar novos
costumes já instalados espontaneamente e/ou outros que se quer instalar.
O autor aponta também o estudo da legislação de ensino para buscar
compreender as alterações na escola brasileira por meio da análise de elementos
antes nunca considerados como indícios. (Faria Filho, 1998, p. 99). Entre esses
novos elementos a serem considerados, podemos citar: a fundamentação,
finalidades citadas, elaboradores envolvidos na produção e bibliografia
recomendada. Segundo ele, quando consideramos as vozes, os procedimentos,
as críticas e até os anseios que perpassam pelos documentos oficiais e damos
ênfase à ação desses sujeitos, até então desconsiderados, estamos confrontando
e construindo a história. Em nosso caso, história do MMM no Ensino Primário.
É preciso ainda considerar que o MMM ocorreu num passado recente e
podemos acrescentar entrevistas com alguns elaboradores da legislação
estudada, como fontes a fim de entender transformações curriculares por eles
propostas e suas repercussões no Ensino Primário. Foram realizadas oito
entrevistas, e os depoimentos orais abordaram, de um modo geral, a participação
dos entrevistados no Movimento, a inserção e produção no Ensino Primário, o
cotidiano da produção dos documentos oficiais, e a opinião dos entrevistados
sobre o MMM no Brasil, especialmente nas primeiras séries.
Ressaltamos que, nas entrevistas, as memórias foram consideradas como
fontes e, reconstruídas através da crítica e da reinterpretação do passado, sob o
olhar do hoje. Ao pesquisador cabe dialogar, investigar essas memórias,
problematizando o processo de construção e desconstrução delas sobre os fatos
que estamos analisando.
27
Juntamente com as entrevistas, consideramos a coleta e análise da
legislação e produções normativas dela decorrentes, elementos imprescindíveis,
posto que, por se tratar de documentos oficiais, boa parte guarda informações
sobre o interesse e as prioridades da época e são fontes e indícios preciosos para
a reconstrução do processo de oficialização do MMM no Ensino Primário.
Outra referência essencial utilizada por nós foi constituída pelas reflexões
do historiador Jacques Le Goff (1992) sobre o ofício do historiador. De acordo
com ele, a partir da metade do século XX, inicia-se a ampliação da noção de
documento, o que transforma metodologicamente a prática do historiador.
Conforme Le Goff (1992, p. 537), as primeiras mudanças ocorridas na
prática do historiador, eclodiram com a criação da revista Annales d’histoire
économique e social
8
e de como a relação da História com suas fontes foi se
modificando com a ampliação dos conceitos de monumento e documento, nas
fases do fazer histórico.
Para melhor entendimento, podemos classificar em duas fases as
diferentes concepções de monumento e documento adotadas pelos historiadores.
Na primeira fase, o autor caracteriza a concepção de documento e monumento
como semelhantes.
Nesse primeiro momento, podemos definir monumento
como: obra
comemorativa de arquitetura ou escultura, um monumento funerário, atos
escritos, papel justificado ou prova histórica.
Nessa fase:
A única habilidade do historiador consiste em tirar dos
documentos tudo o que eles contêm e em não lhes acrescentar
nada do que eles não contêm. O melhor historiador é aquele que
se mantém mais próximo possível dos textos. (LE GOFF, 1992, p.
536).
Os monumentos eram as referências das relações que o homem mantinha
com o passado, tendo como característica o “ligar-se ao poder de perpetuação”,
voluntária ou involuntariamente, das sociedades históricas. Nessa época, a
8
Revista francesa, fundada em 1929, ambicionando pôr abaixo os três grandes ídolos da historiografia da
época: a biografia, a política e a cronologia. Advogavam igualmente a aproximação da história com outros
saberes, como a geografia, a sociologia, a economia, etc.
28
História ocupava-se de memorizar os monumentos do passado, transformá-los
em documentos e fazer falar seus traços. (Le Goff, 1992, p. 546).
A partir da metade do século XX, então, tudo passa a ser
monumento.
Cabe ao historiador transformar o monumento em documento, por meio de fontes
disponíveis, revelando relações, levantando conjecturas e validando-as com sua
pesquisa científica.
Podemos dizer que o que transforma o
monumento em documento é a
análise do historiador. O que antes era a decifração de traços deixados pelo
homem, tentativas de reconhecimento do que tinham dito, hoje “apresenta uma
massa de elementos que é preciso depois de isolar, reagrupar, tornar pertinente,
colocarem em relação, constituir em conjunto” (Foucault, 1969, p. 13).
Só a análise do documento enquanto monumento permite a
memória coletiva recuperá-lo e ao historiador criticá-lo
cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa. (LE
GOFF, 1992, p. 545).
Em nossa pesquisa procuramos analisar os documentos oficiais como
monumentos. Adotamos a postura esperada de um historiador contemporâneo,
isto é, cabe a ele primeiramente duvidar do documento, situá-lo em relação ao
contexto social onde foi produzido, buscando os não-ditos, os atores que não
apareceram na História, compará-los com outros documentos, desmitificá-los,
contextualizando-os no tempo e espaço, isto é, desconstruir/construir a sua
significação.
As críticas provenientes desta análise possibilitarão a construção de um
discurso consistente, a fim de convencer a comunidade da importância e
relevância de suas interrogações, e da nova interpretação construída para eles. O
monumento é o ponto de partida para conhecermos um fato histórico, por meio de
um novo olhar, ressignificando o passado, no presente, transformando-o em
documento.
Assim o pesquisador transforma seus objetos de análise (monumentos) em
documento. Nessa perspectiva, nossa pesquisa procurará indicar vestígios que
propiciem formulações de questões sobre as causas de adaptações e
especificidades na dinâmica de introdução do MMM no Ensino Primário,
29
relacionadas com as intencionalidades dos documentos oficiais, e como esse
ideário foi posto, pela Secretaria de Educação, para saber de que modo foram
prescritas alterações didático-metodológicas no Ensino Primário, e a pluralidade
de possibilidades dos seus usos.
O fato de elegermos o Ensino Primário como tema e optarmos por estudar
os documentos oficiais como estratégias produzidas pela equipe de professores
de matemática da Secretaria de Educação para implementar o ideário do MMM
na escola primária paulista, determinaram caminhos de investigação envolvendo
a análise da forma, conteúdo, condições de produção e distribuição desses
materiais.
Tomar os documentos oficiais como estratégia oficial de divulgação de
reformulação no currículo de matemática da escola primária, nas reformas
educacionais ocorridas no Brasil entre 1960 e 1980, significa tentar compreender
as condições de produção desses documentos, verificando as apropriações
realizadas com base no ideário do MMM pelas equipes de elaboradores da
Secretaria de Educação.
Na articulação das questões deste estudo, fizemos uso da abordagem da
história cultural e nos apoiamos nas reflexões que giram em torno dos conceitos
de representação, apropriação, estratégias e táticas postas por Roger Chartier
(1991) e Michel de Certeau (2002), problematizando-os em relação a:
materialidade dos documentos oficiais; estratégias que os produziram e
colocaram em circulação; e aquelas referentes às apropriações de que são
matérias.
O conceito de estratégia
9
tomado por Michel de Certeau (2002) é muito
pertinente para o aprofundamento da análise de documentos oficiais utilizados
como estratégia de divulgação oficial da reformulação do ensino de matemática
na escola primária, projetados para divulgar e fazer circular as diretrizes
pedagógicas que nortearam as reformas educacionais. A estratégia, na ótica
desse autor, refere-se a uma ação que carrega a existência de um lugar próprio,
9
Estratégia é “o cálculo (ou a manipulação) das relações de forças que se torna possível a partir do momento
em que um sujeito de querer e poder (uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição científica)
pode ser isolado”. A estratégia postula um lugar suscetível de ser circunscrito como algo próprio e ser a
base de onde se podem gerir as relações com uma exterioridade de alvos ou ameaças. (Certeau, 2002, p.
99).
30
“como algo próprio”, e ser a base de onde se podem gerir as relações com uma
exterioridade. (Certeau, 2002).
De Certeau considera que as estratégias são capazes de produzir e impor.
Desta forma, podemos problematizar quais e como os documentos oficiais foram
meios de estratégias institucionais sobre as reformas curriculares, produzidos a
partir de um lugar de poder, um lugar de previsão e antecipação, para fazer
circular o ideário do MMM. Trata-se de analisá-los com base em sua produção e
circulação como produtos de estratégias governamentais em complexa
correspondência com estratégias políticas e pedagógicas determinadas.
Diversas reflexões podem ser feitas, tomando-se de um lado, as
tendências internacionais, os discursos sobre a nova matemática a ser ensinada
nas escolas e as estratégias que elas portam ao chegar ao Brasil, e de outro, o
staff da Secretaria de Educação, encarregado de produzir documentos resultantes
de um consumo criativo, diante do ideário imposto.
Para os procedimentos de investigação dos documentos oficiais,
recorremos aos instrumentos conceituais elaborados por Roger Chartier, em que
pretendem discernir, na materialidade dos papéis analisados, os vestígios de sua
produção, circulação e usos. É um procedimento no qual não se pode dispensar a
análise da configuração do material impresso como forma produtora de sentido,
como papel, capas, diagramação, figuras, disposição do texto, tipografia, tiragem,
etc.
Segundo Chartier:
Não existe texto fora de suporte que o dá a ler e que não há
compreensão de um escrito, qualquer que ele seja que não
dependa das formas através das quais ele chega a seu leitor
(1991, p. 127).
Assim, na análise dos documentos procuramos destacar e trazer para o
texto essas características com o objetivo de propiciar reflexões sobre as
regularidades e particularidades encontradas, e elucidar as estratégias e
apropriações, considerando a circulação do produto e atentando para os usos
referentes à veiculação de reformas curriculares governamentais, pois queremos
31
compreender as estratégias de alterações curriculares produzidas pelos
documentos oficiais.
Chartier (1991) relata que, apesar de dispositivos formais - textuais ou
materiais - serem intencionalmente elaborados, carregando em suas estruturas
expectativas e competências do público a quem são destinadas e,
consequentemente, organizando-se conforme a diferenciação social, eles também
podem produzir sua própria área de atuação. Ressalta que uma história das
maneiras de ler deve identificar as disposições específicas que distinguem as
comunidades de leitores e as tradições de leituras. As variações das disposições
dos leitores, dos dispositivos dos textos e dos objetos impressos que os
sustentam devem ser considerados no estudo das práticas. (Chartier, 1991).
Do mesmo modo que não podemos separar os textos de seu suporte
material, não é possível ignorar esse suporte e falar de apropriação abstrata da
matéria de que se apropriam.
A apropriação, a nosso ver, visa uma história social dos usos e
das interpretações, referida a suas determinações fundamentais e
escrita nas práticas específicas que a produzem. Assim, voltar à
atenção para as condições e os processos que, muito
concretamente, sustentam as operações de produção do sentido
(na relação de leitura, mas em tantos outros também) é
reconhecer, contra a antiga história intelectual, que nem as
inteligências nem as idéias são desencarnadas, e, contra os
pensamentos do universal, que as categorias dadas como
invariantes, sejam elas filosóficas ou fenomenológicas, devem ser
construídas na descontinuidade das trajetórias históricas.
(CHARTIER, 1991, p. 180).
Nesse sentido, a idéia de apropriação é imprescindível para compreender a
natureza dos
documentos oficiais e a forma pela qual são produzidos a partir de
alterações e ampliações de leituras feitas pelos seus elaboradores.
Segundo Chartier (1991, p. 178), a apropriação está relacionada à
liberdade ao mesmo tempo criadora e regulada dos leitores, bem como às
múltiplas interpretações às quais um pensamento é suscetível.
É preciso considerar também que a leitura é sempre uma prática
encarnada em gestos, espaços, hábitos. No nosso caso, compreender as
apropriações realizadas pelas equipes das secretarias de educação do ideário do
32
Movimento, significa relacionar esse ideário com as propostas colocadas nos
documentos, tentando compreender as alterações curriculares propostas.
Isso nos faz tentar explicar como o ideário do MMM foi diversamente
apreendido, manipulado e compreendido pela equipe de elaboradores desses
documentos.
O conceito de apropriação é extremamente importante para os estudos da
História Cultural da Educação Matemática. Na verdade é um conceito que foi
tomado de Michel de Certeau por Chartier e nos serve para mostrar o que
significa "consumo cultural". Para entendê-lo há que se considerar que sempre as
pessoas, os grupos, as culturas, estão em posição de receber e consumir
ingredientes de outras culturas de modo criativo. Logo, constitui um utensílio
teórico fundamental para entender a produção dos documentos oficiais
elaborados para as séries iniciais, ao tempo do MMM.
Assim, esperamos, considerando as categorias postas por Chartier e De
Certeau, buscar compreender a reestruturação do Ensino Primário no período
entre 1960 e 1980, em São Paulo, as estratégias de reformulação curricular,
produzidas pelo Estado, que foram veiculadas por meio de documentos para
implementar as novas diretivas para o ensino de matemática e como o ideário do
MMM foi incorporado na produção desses documentos.
33
CAPÍTULO 2
O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA
2.1 O MMM no Mundo
No início dos anos 60, percebia-se uma tendência em dinamizar esforços
para renovação do ensino de matemática que se materializou na criação de um
Movimento de vulto internacional, chamado de “Nova Matemática” ou “Matemática
Moderna”.
No mundo, o MMM veio tentar responder às questões trazidas desde o
começo do século sobre o ensino de matemática.
Podemos perceber vestígios destas discussões já no fim do século 19, em artigos
divulgados pelo matemático Felix Klein
10
, decorrentes também da grande
evolução interna da disciplina. Muitos matemáticos já se aglutinavam em torno da
necessidade de mudanças nos currículos, tentando aproximá-los da nova
realidade.
As transformações na sociedade decorrentes da Revolução Francesa e da
Revolução Industrial já sinalizavam a carência de adaptações em todos os
campos da ciência, exigindo transformações também na escola.
No âmbito de nossas questões, consideramos a importância de um
caminhar cronológico dentro do desenvolvimento da Matemática, imprescindível
10
Felix Klein (1849-1925) - Matemático e professor, foi um dos mais empenhados a polemizar o
descompasso entre o ensino da Matemática e sua utilização como instrumento de vida. Desenvolveu a
teoria dos grupos e desejava a unificação dos vários ramos da matemática, utilizando a teoria dos
conjuntos a fim de vencer a barreiras da especialização.
34
para uma compreensão do papel desse Movimento para a história do ensino de
Matemática.
Assim, iniciaremos nossas reflexões, com a retomada de alguns fatos
referentes ao desenvolvimento da Matemática desde o início do século XX. Esse
século foi marcado por uma grande transformação interna da disciplina, uma
época promissora, em que a ciência desenvolveu-se como nunca. A Matemática
passava por um processo de descobertas, de ampliação de área de atuação em
decorrência dos avanços internos da disciplina, e era foco de cobranças pela
sociedade, o que gerava conflitos entre os matemáticos.
A sociedade exigia acesso a essas novas descobertas e obrigava
pesquisadores e professores a refletirem sobre o ensino de matemática numa
dimensão mais utilitária, com a possibilidade da compreensão da disciplina por
maior número de cidadãos, para o ingresso no novo mercado de trabalho.
Como a época era de muitas transformações, essas mudanças obrigavam
a sociedade emergente a apoderar-se dos novos conhecimentos. Esses
conhecimentos deveriam subsidiar os novos cidadãos, adaptando-os o mais
rápido possível a essa nova dinâmica da vida social.
Segundo Braga (2006), Felix Klein preocupava-se também em divulgar as
várias utilizações da matemática na produção das indústrias e no comércio. Além
da dedicação à pesquisa, continuou a lecionar e a lutar pela modernização do
ensino nas escolas secundárias. Apesar de várias controvérsias sobre suas
intenções, não podemos excluir seu importante papel de divulgador das idéias de
reformas.
Klein difundia suas idéias por meio de palestras, seminários e participação
em congressos. Em uma de suas viagens aos Estados Unidos, conheceu David
Smith, partidário de suas idéias. Durante o IV Congresso Internacional de
Matemática de Roma (1908), Smith propôs a criação da Comissão Internacional
de Ensino da Matemática, IMUK
11
(Internationale Mathematische Unterrichts
Komission) e, Félix Klein assumiu a presidência.
Como presidente, Klein teve oportunidade de divulgar suas idéias nos EUA
e alargar os limites geográficos estabelecidos pelo comitê. Além de publicação de
11
Em 1954, adotou-se a sigla ICMI de Internacional Comission on Mathematical Instruction.
35
artigos e participação em eventos, Klein ampliou a participação de educadores,
engajando professores de todos os níveis nas reflexões sobre as mudanças nos
currículos de matemática.
Com o empenho de Klein, o IMUK atuou não só como centralizador de
informações, mas também como grande divulgador das idéias de modificação no
ensino da matemática como necessária e inevitável. As primeiras modificações
propostas por Klein valorizavam a geometria e suas aplicações.
Esse grupo tinha a tarefa de estudar o ensino de matemática nos países
desenvolvidos para, em seguida, discutir as modificações pretendidas para sua
melhoria. Graças ao empenho de seus participantes, porém, as idéias foram
veiculadas em todo o mundo e aglutinaram educadores para o movimento de
mudanças e aprofundamento das discussões.
As atividades do IMUK entre 1908 e 1912 foram intensas. (Soares, 2001, p.
26). Seus participantes reuniram-se em várias partes do mundo e propiciaram a
oportunidade de algumas experiências metodológicas. Deixaram frutos e
seguidores, originando movimentos em prol da melhoria do currículo da
matemática e de sua metodologia.
Durante o período de sua existência, foi possível a socialização das
experiências em relação à educação matemática através de uma vasta
bibliografia produzida sobre o ensino. O comitê encerrou suas atividades em
1920.
Em torno de 1950, já se nota um consenso entre os educadores sobre as
dificuldades apresentadas no ensino de matemática e a necessidade de
mudanças significativas. Questionava-se a enorme diferença entre a matemática
ensinada na escola secundária e na universidade.
Podemos apontar como indícios da preocupação com o ensino a criação
de vários grupos de estudo em grande parte do mundo, incrementando as
discussões sobre o ensino de matemática e disseminando as idéias de reforma:
as reflexões promovidas pelo CIEAEM
12
, a fundação do UICSM
13
, a publicação do
primeiro livro do CIEAEM com textos do epistemólogo Jean Piaget, dos
12
Comission Internationale pour l’ étude et l’ amélioration de l’ enseignement des mathématiques.
13
University of Illinois Committee on School Mathematics.
36
matemáticos Dieudonné, Choquet e Lichnerowicz, do lógico Beth e do pedagogo
Caleb Gattegno (Burigo, 1989, p. 72).
Dentre os grupos de estudo, que mais contribuíram na fundamentação das
idéias do MMM destaca-se o grupo Bourbaki. “Nicolas Bourbaki” é o pseudônimo
sob o qual um grupo de matemáticos, na maioria, franceses, escreveu uma série
de livros onde expunham a matemática moderna, que começaram a ser editados
em 1935.
O grupo difundia, em livros e artigos, mudanças no ensino da matemática
numa concepção estruturalista e abstrata, pregando a utilização de uma
abordagem lógico-dedutiva, e defendia uma revolução interna na Matemática com
base no desenvolvimento e estudo da noção de estrutura. (Vitti, 1998, p. 55).
Para o grupo, a Matemática é única e o método axiomático
14
é o meio que
permite que se chegue à unidade da disciplina. As pesquisas feitas pelo grupo
foram interrompidas durante as guerras, mas geraram inquietações e,
continuaram instigando educadores de todo o mundo a refletir e se aglutinar em
torno das questões de aprendizagem.
Em 1939, é publicado o primeiro volume das obras de Nicolas
Bourbaki. Por trás desse pseudônimo esconde-se um grupo
fundado por ex-alunos da Escola Normal Superior, célebres pelo
prazer de se manter em segredo. O "monstro policéfalo", como o
chamava Gérad Tronel, presidente do Comitê Francês do Ano
Mundial da Matemática, retoma a disciplina em seu ponto de
partida. O objetivo é hierarquizar seu componente de acordo com
uma ordem lógica, e expô-los com uma terminologia precisa nos
Elementos Matemáticos, obra cuja redação ainda não foi
concluída. Pouco influente fora de nossas fronteiras, o grupo foi
muito poderoso na França até 1968. E, embora vários
comunicados tenham anunciado a sua morte, Nicolas Bourbaki
prossegue em sua busca: seus membros continuam organizando
um importante seminário, reunido três vezes por ano no Instituto
Poincaré de Paris (THÉVENON, 2000).
A demanda em relação à formação técnica e de cientistas, “capacitando-os
para o trabalho”, pressionava a escola: o ensino de matemática precisava
adequar-se e modernizar-se. Muitos acreditavam que a resolução dos novos
problemas sociais e econômicos surgidos com o desenvolvimento industrial viria
14
O método axiomático-dedutivo consiste em admitir como verdadeiras certas preposições (mais ou menos
evidentes) e a partir delas, por meio de um encadeamento lógico, chegar a proposições mais gerais.
(http://educar.sc.usp.br/licenciatura/2003/hm/page01.htm).
37
pelo aumento da qualidade e quantidade de cientistas e técnicos e a qualificação
mínima científica para os cidadãos comuns. O ensino da matemática deveria ser
uma ferramenta que contemplasse tais objetivos.
Nos EUA, a preocupação com o avanço tecnológico russo e a necessidade
das novas indústrias americanas foi primordial para impulsionar os investimentos
norte-americanos nas reformas do ensino de matemática. Após o lançamento do
Sputnik, pelos russos, em 1957, os americanos sentiram-se ameaçados em
perder a liderança tecnológica e investiram na promoção de uma reforma na
educação.
O fato de russos terem se favorecido primeiro do emprego da
tecnologia (e, conseqüentemente, terem saído na frente em
conhecimento matemático) foi muito mais preocupante para o
governo americano do que constatações feitas anteriormente
sobre deficiências do seu ensino, como mostravam os
matemáticos da época. (VITTI, 1998, p. 56).
Apesar da origem européia, foram os investimentos do governo norte
americano no ensino de matemática os grandes responsáveis pela divulgação do
Movimento de reforma pelo mundo, desencadeando a proliferação dos
Congressos, a formação de grupos de estudos, as experiências em novas
metodologias e agregando mais adeptos e multiplicadores.
Em 1958, iniciaram-se os trabalhos do SMSG
15
·.O grupo foi fundado a
partir de deliberações em Conferências promovidas pela NSF (National Science
Foundation), em que a baixa qualidade do ensino elementar e secundário
16
foi
apontada como um dos fatores responsáveis pela escassez de matemáticos
pesquisadores. De acordo com D’Ambrósio (depoimento oral, 2006), o SMSG
produziu textos para todos os graus de ensino, traduzidos para 15 línguas
diferentes e tiveram grande aceitação e penetração na América Latina.
Na Europa, em 1958, em conseqüência às polêmicas surgidas em relação
ao ensino e da constatação da necessidade de modificações, a Organização
Européia de Cooperação Econômica (OECE), criou um setor responsável pela
modificação do ensino de ciências e matemática, e um dos seus primeiros
15
School Mathematics Study Group.
16
Hoje correspondente ao Ensino Fundamental II e ensino médio.
38
encaminhamentos foi à promoção da Conferência Internacional de Royaumont -
França
17
.
Os temas da Conferência de Royaumont relacionavam-se com o ensino
secundário, e todos os países participantes propunham mudanças no currículo e
uma abordagem mais utilitária para a matemática.
As evidências apontadas nos registros dos objetivos da Conferência
demonstram as semelhanças e a gênese nos ideais dos movimentos para
reformulação do ensino que decorreram desta, e que mais tarde foi denominado
de MMM. De cada país participante da Conferência surgiu um nome, que ficou
encarregado de veicular as idéias do MMM, em seu país.
A partir da Conferência de Royaumont, o mundo ficou mais receptivo a
novas idéias de educadores matemáticos que defendiam a modernização do
ensino. Podemos citar George Papy (Bélgica), John Fletcher (Inglaterra),
Krygowska (Polônia), Zoltan Dienes (Canadá) e o grupo Bourbaki na França, pois
o encontro representou um ponto de culminância de alguns anos de iniciativas
isoladas. Essa Conferência, financiada pela UNESCO (United Nations
Educational, Social and Cultural Organization), incrementou a veiculação do MMM
e deu credibilidade a seus participantes.
O Movimento tentava implantar uma nova metodologia ao ensino da
matemática no secundário, baseado no desenvolvimento teórico da disciplina e
das outras ciências. Podemos dizer que a expressão “matemática moderna” veio
em reposta a várias questões surgidas em razão da evolução interna da
disciplina, contemplando as novas exigências, como já vinha sendo discutido e
reivindicado desde o século XIX.
Burigo (1989), em sua dissertação, interpreta o termo “moderna”, como
reflexo da necessidade de atualização do ensino da matemática, para adaptar-se
às novas demandas de uma sociedade em aceleração e a adequação do ensino
da matemática aos novos campos da psicologia e da didática.
17
Para Catarina Vitti (1998), foi a partir do final de 1959 e começo de 1960, com a realização das
Conferências de Royaumont - França e a de Dubrovnik na Iugoslávia, o inicio de um dos maiores
movimentos reformadores do ensino de matemática, que o mundo começou a conhecer como Movimento
de Matemática Moderna.
39
Podemos sintetizar, definindo o MMM, como uma série de movimentos de
reformas ocorridos em várias partes do mundo denotando a tendência à reflexão
e busca de alternativas para o ensino de matemática em decorrência das novas
demandas de uma sociedade em transformação.
Os defensores das mudanças pretendiam unificar o ensino da matemática
por meio da Teoria de Conjuntos, das Estruturas Fundamentais e a introdução de
novos conteúdos, sem abandonar os antigos. Dentre os conteúdos introduzidos
podemos citar: teoria dos conjuntos, conceitos de grupo, anel e corpo; espaços
vetoriais, cálculo diferencial e integral, matrizes, álgebra de Boole, funções, bases
de sistemas de números.
A idéia original do Movimento seria propiciar aos alunos instrumentos
matemáticos úteis no novo cotidiano e de acesso mais fácil aos conteúdos. Além
da linguagem da Teoria dos Conjuntos usada para a unificação dos conteúdos, os
matemáticos defendiam uma abordagem axiomática e dedutiva para a disciplina.
Assim configurado, o discurso do MMM englobava as reivindicações de
aproximação entre o ensino superior e secundário. Tentava implantar nova
metodologia ao ensino da matemática no secundário, baseado no
desenvolvimento teórico da matemática e das outras ciências.
2.2 O MMM no Brasil
No Brasil, após 1950, grandes modificações na estrutura política social e
econômica juntaram-se à multiplicidade de fatos que podemos considerar como
elementos facilitadores para a rápida disseminação do ideário do MMM no país.
Desde seu início, o MMM queria romper com o “antigo”, pregando a difusão
de uma matemática mais atual. As vozes dos modernistas eram muito afirmativas
para convencimento, prometendo em Congressos, artigos de jornais e periódicos,
uma matemática além de acessível,prazerosa, o que gerou muitas expectativas e
adesões.
Percebemos, durante nossas primeiras leituras em teses e dissertações,
muitas controvérsias em relação à dinâmica de introdução do ideário, intenções e
finalidades do MMM no Brasil. Por esse motivo, direcionamos nosso primeiro
40
olhar para um melhor detalhamento das pesquisas no campo, procurando
desvendar regularidades e singularidades nos discursos dos autores entre as
características, concepções e fundamentos do Movimento, a fim de tentar
caracterizar o ideário do MMM difundido no Brasil.
Assim, iniciamos a busca por produções que, de alguma maneira,
mencionassem o MMM, com o objetivo de abranger a pluralidade de
representações do ideário do Movimento.
Logo percebemos o número reduzido de trabalhos que têm o MMM como
tema de estudo no Brasil. Esta constatação foi possível, graças à revisão
bibliográfica sobre o campo de produção científica, utilizando como fontes,
pesquisas desenvolvidas no Brasil e inventariadas pelo GHEMAT.
O levantamento bibliográfico objetivou mapear os trabalhos considerados
como referência para a produção científica em história da educação matemática,
que procuraram problematizar o Movimento, além de levantar as atuais
discussões no campo da história do ensino da matemática e a dinâmica de sua
produção, destacando tendências e referenciais teóricos adotados.
Avaliamos ser importante destacar a tese de Beatriz D’Ambrosio,
apresentada em 1987, na Indiana University: The Dynamics and Consequences of
the Modern Mathematics Reform Movement for Brazilian Mathematics Education,
como um dos primeiros trabalhos a investigar o Movimento no Brasil e citado pela
grande maioria dos pesquisadores do campo. A autora aponta o MMM como um
processo de transferência de projetos curriculares elaborados em países
industrializados para países do terceiro mundo, apontando a forma acrítica e sem
planejamento, de como o Movimento foi divulgado no Brasil.
Também problematiza o papel das agências estrangeiras financiadoras, na
participação do Brasil em congressos internacionais, no intercâmbio de
professores brasileiros e estrangeiros, na dinâmica colonizadora dos currículos
importados, e indica alguns mecanismos de divulgação do ideário e de
protagonistas do Movimento por meio de publicações estrangeiras.
Outra referência para o campo, considerada como o primeiro esforço de
investigação sobre o Movimento realizado no Brasil é a dissertação de Elizabete
41
Burigo, de 1989, intitulada MMM no Brasil: Estudo da Ação e do Pensamento de
Educadores Matemáticos nos Anos 60.
Burigo faz um estudo do MMM, e pela análise de documentos, entrevistas
com alguns dos participantes do Movimento, contextualizando-o em relação ao
Brasil da época, para tentar explicar sua vigência, seu alcance, as limitações e
suas implicações na elaboração das propostas pedagógicas, particularmente no
ensino secundário, tentando explicar uma especificidade do Movimento em nosso
país.
A grande contribuição de Burigo refere-se, à abertura de reflexões sobre
um tema ainda ali, inédito, indicando possíveis fontes para novos estudos.
Um terceiro trabalho, essencial para a compreensão do Movimento, intitula-
se: MMM. Memórias, vaias e aplausos, tese de doutorado de Catarina Vitti,
defendida pela UNIMEP, em 1998. A autora afirma que o MMM originou-se das
primeiras idéias de transformação e experiências no ensino, geradas no século
XIX e lideradas principalmente por Félix Klein, procurando relatar a reação da
comunidade ligada à Educação Matemática perante o MMM e as mudanças
efetivas decorrentes dessas reações, verificadas e incorporadas ao ensino
secundário. A autora apóia-se em Morris Kline para elencar os pontos positivos e
negativos do Movimento.
Entendemos que a tese de Vitti, contribui com o estudo da possível gênese
do Movimento e no destaque do papel decisivo de Felix Klein no desencadear dos
movimentos de renovação do ensino de Matemática em todo o mundo.
Nesse mesmo ano, Gilda de Souza defende a dissertação de mestrado
intitulada: Três décadas de Educação Matemática: um estudo de caso da Baixada
Santista no período de 1953 – 1980, na UNESP, onde discute as relações entre
os professores e os conhecimentos matemáticos introduzidos durante o MMM e
quais deles permanecem até hoje.
A autora apóia sua pesquisa em entrevistas com professores que
lecionavam no tempo do MMM. O Movimento aparece como uma parte
incorporada na trajetória da vida profissional de cada um dos entrevistados
mostrando as características e as influências do Movimento nesses personagens,
bem como, a participação de cada um deles.
42
Souza (1998) serve-se das entrevistas e dos textos jornalísticos do jornal A
Tribuna, como fontes de pesquisa. Podemos salientar que esse trabalho se
diferencia dos demais no aspecto metodológico, mostrando um posicionamento
diferente, na medida em que lança mão da história oral como método de
pesquisa.
Podemos constatar, em síntese, que os trabalhos dos anos 90, objetivaram
o estudo do ideário do Movimento, com preocupações em explicar seu significado
e situar os grupos de estudos difusores, sem problematizações referentes ao
Ensino Primário e possíveis conseqüências da apropriação desse ideário nas
práticas pedagógicas.
Segundo Biccas (2005), a partir de 1990 ocorre um deslocamento da
historiografia da educação em direção à história, iniciando-se uma preocupação
com as fontes para a escrita de uma história da e sobre a educação brasileira.
Este fenômeno reflete-se também especificamente no campo da história do
ensino de matemática.
O exame dos trabalhos, após este deslocamento, revela a tendência de
utilização de novos tipos de fontes nas pesquisas. Uma das primeiras tentativas
de entender as conseqüências do MMM, utilizando como fontes depoimentos
orais, a imprensa e artigos pedagógicos, foi à dissertação de mestrado de Flávia
Soares: Movimento da Matemática Moderna no Brasil: Avanço ou Retrocesso?
Defendida em 2001, na PUC - RIO.
A autora relata o que foi o MMM e analisa formas de apropriação do
Movimento em quatro instituições do Rio de Janeiro, relacionando as mudanças
na educação com o contexto sociopolítico do Brasil.
O trabalho dá conta de revelar as iniciativas brasileiras de disseminação do
Movimento desencadeadas pelos grupos de estudo formados em diferentes
estados brasileiros nos tempos do MMM, bem como o papel ativo de alguns
educadores na expansão da matemática moderna.
Outra mudança significativa no campo de pesquisa em educação
matemática ocorreu depois do ano 2000, quando os pesquisadores se interessam
por novos arquivos, sua organização e disponibilização de acervos. Proliferam-se
43
os grupos de pesquisa com ênfase no trabalho coletivo, possibilitando a alteração
também nas práticas de produção científica.
Neste novo contexto destacamos as dissertações de Borges (2005), Lima
(2006), Nakashima (2007) e Silva (2007), que, dentro desta perspectiva, dialogam
com diversos tipos de fontes, para tentar compreender as práticas culturais
durante o MMM. Para tanto, utilizam novos documentos como fontes, como os
arquivos pessoais, inventariados e catalogados pelo GHEMAT.
Tanto Borges (2005), analisando os arquivos pessoais de Ubiratan
D’Ambrosio, como Lima (2006) e Silva (2007), pesquisando no APOS (Arquivo
Pessoal Osvaldo Sangiorgi) e Nakashima (2007), nos textos jornalísticos, tiveram
como objetivo estudar o MMM sob um novo ângulo, caminhando sob a história de
vida de personagens atuantes na época, suas produções e as relações que
produziram em seu tempo.
Como dissemos anteriormente, e tendo em vista essa revisão bibliográfica
sobre a produção científica referente ao MMM no Brasil em teses e dissertações
inventariadas pelo GHEMAT, constatamos a inexistência de produção com ênfase
no ensino primário.
Apesar das reformas de ensino nacionais, modificando substancialmente a
organização e distribuição curricular nas séries iniciais, ocorridas no período de
vigência do MMM e com presença de protagonistas do Movimento na elaboração
dos documentos oficiais de reformulação curricular, introduzindo várias
modificações na escola primária, não encontramos nenhuma pesquisa com esse
foco no ensino da matemática.
Essa escassez de trabalhos sobre um tema tão relevante, que aglutinou
muitos educadores, num período marcado por várias mudanças no sistema
educacional brasileiro, indica que há lacunas que precisam ser preenchidas,
principalmente em relação ao ensino primário. Além disso, as poucas referências
sobre as séries iniciais, contidas nesses trabalhos, enfocam o ideário do
movimento, sem aprofundamento nas apropriações e as conseqüentes alterações
curriculares.
Assim, podemos dizer que o diferencial do nosso trabalho para os demais,
refere-se ao estudo do MMM, investigando a reestruturação do Ensino Primário e
44
analisando as estratégias de reformulação curricular, produzidas por meio de
documentos oficiais.
Da discussão realizada, sobre os trabalhos mencionados, ficam os
vestígios de que a combinação de certezas e ambigüidades é imprescindível para
explicar o alcance de um Movimento de renovação pedagógica. Essas
ambigüidades são elucidativas e podem ser explicadas pelas apropriações do
ideário original por parte das equipes elaboradoras dos documentos oficiais onde
foram implantadas as reformas propostas pelo Movimento.
Por fim, considerando as várias abordagens, pudemos relativizar e
procuramos elencar algumas características comuns em todas as leituras,
passando a adotar essa caracterização como referência para o ideário do MMM
em nossa pesquisa.
Caracterização usada como referência:
Matemática tratada como “um sistema fechado", descontextualizada,
usando a teoria dos conjuntos como elemento unificador e com
ênfase nas estruturas matemáticas;
Matemática Moderna divulgada na imprensa como mais utilitária
ligada ao cotidiano e preocupada com a democratização do acesso
à disciplina;
A metodologia deveria ser adequada à especificidade da disciplina;
Base no estruturalismo e no rigor algébrico, na linguagem
matemática, na terminologia e simbologia;
Destaque para a unidade entre os ramos da matemática e no uso
dos conceitos unificadores, tais como conjunto e função (Bourbaki);
Matemática tratada de forma abstrata, numa abordagem lógico-
dedutiva, privilegiando o método axiomático;
Utilização da linguagem da Teoria de Conjuntos como fator
unificador no tratamento de todos os conteúdos matemáticos;
Utilização de outras abordagens para a Geometria, incluindo as
diferentes da euclidiana;
45
Introdução de novos conteúdos: teoria dos conjuntos, conceitos de
grupo, anel e corpo, espaços vetoriais, matrizes, determinantes,
função de uma variável, construção de gráficos, álgebra de Boole,
noções de cálculo diferencial e integral e estatística;
Ênfase à mudança de base, congruência, desigualdades, lógica
simbólica;
Introdução de conceitos abstratos desde as primeiras séries;
Desprezo à intuição matemática e desconsideração do processo
histórico de construção do conhecimento;
Influências da Psicologia (Piaget
18
) e da Pedagogia (Papy e Dienes).
Fundamentação na Teoria Psicogenética de Jean Piaget,
justificando algumas inovações na metodologia e na estruturação e
distribuição dos conteúdos.
Referências bibliográficas: Benedito Castrucci, Caleb Gattegno,
Charles Brumfiel, Choquet, David Hilbert, Dieudonné, Emma
Castelnuovo, Enzo Gentille, Felix Klein, GEEM, George e Frédérique
Papy, George Springer, Grupo Bourbaki, Howard Fehr, IREM
(Fiches d’Ètudes du IREM), Irving Adler, Jacy Monteiro Jean Piaget,
Leopoldo Nachbin, Lucienne Félix, Nicole Picard, Paul Halmos,
SMSG, Zoltan Dienes.
Profissionais mais atuantes no Movimento: Almerindo Bastos, Anna
Franchi, Elza Babá, Esther Grossi, Jacy Monteiro, Manhúcia P.
Liberman, Maria Amábile Mansutti, Maria Helena Roxo, Maria Luiza
do Carmo Neves, Lydia Lamparelli, Lucília Bechara, Omar Catunda,
Osvaldo Sangiorgi, Renate Watanabe, Ruy Madsen, Sylvio Andraus.
Grupos de estudos fundados no Brasil a partir do Movimento:
GEEM
19
, GEEMPA
20
, GEPEM
21
NEDEM
22
.
18
Piaget afirmava que as estruturas mentais podiam ser explicadas pelo modelo bourbakiano, pelo
fato de acreditar que estas estruturas são modelos de organização no processo de
aprendizagem. Seus testes tinham por base o pensamento do grupo. Podemos exemplificar
destacando a estrutura de ordem, construída por Bourbaki e usada por Piaget como parâmetro
nos testes de desenvolvimento mental.
19
Grupo de Estudos do Ensino da Matemática.
20
Grupo de Estudos sobre o Ensino de Matemática de Porto Alegre.
21
Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Matemática (RJ).
22
Núcleo de Estudos e Difusão do Ensino de Matemática (PR).
46
CAPÍTULO 3
O ENSINO PRIMÁRIO 1960-1980
3.1 Do Ensino Primário ao Primeiro Grau
Após a Proclamação da República, o Brasil passou por uma série de
transformações que implicaram em reivindicações por educação e conseqüentes
reformas educacionais.
Para nosso estudo sobre a reestruturação curricular no ensino de
matemática nas séries iniciais, durante o período considerado, e sobre
documentos oficiais produzidos pelo Estado, usados como dispositivos de
imposição de saberes e normatizações de reformas de ensino, é necessário,
antes, procurarmos entender os processos de modificação, organização e
expansão do ensino primário.
Para isso, precisamos definir o lugar socioeconômico, político e cultural da
produção desses documentos, as Leis federais que lhes deram origem, suas
implicações no meio onde foram produzidos, os sujeitos que participaram dessa
elaboração, tomados como circunscritos por determinações próprias, por
submissões, privilégios e particularidades.
Desta forma, é imprescindível uma breve incursão pela história do ensino
primário no Brasil, principalmente em São Paulo, objetivando compreender a
dinâmica das reformas educacionais e relacioná-las com as reorganizações
curriculares proveniente, justificadas pelo ideário do MMM.
47
Isto nos remete a buscar reflexões sobre quais mudanças estruturais de
organicidade no Ensino Primário foram significativas e provocaram mudanças na
redistribuição curricular de matemática, nas Leis de Diretrizes e Bases de 1961 e
a de 1971, e quais estratégias foram utilizadas para fazer circular as reformas
pretendidas no ensino de matemática.
No Brasil, no período republicano, esboça-se um novo perfil educacional.
Através de leis, decretos e atos institucionais que estabelecem critérios e
diretrizes para o Ensino Primário, secundário e universitário, o governo objetiva
estruturar e centralizar o sistema educacional em plena expansão.
Hilsdorf (2005) afirma que, a partir da Proclamação da Republica, começa
uma era de grandes transformações sociopolíticas e culturais, sendo estas
transformações consideradas como fatores importantes a serem levados em
conta para o entendimento da demanda por educação e expansão dos sistemas
de ensino.
O aumento da preocupação com a expansão de vagas na escola pública
inicia-se com o deslocamento do trabalho escravo para o assalariado,
determinando grande imigração para São Paulo e tornando o estado o novo pólo
econômico da Nação.
As ações governamentais para o alargamento de vagas na escola pública
não foram suficientes para abarcar toda a população em idade escolar, apesar do
crescimento das matrículas terem sido seis vezes maior que o crescimento da
população em 1920. (
Infantosi da Costa 1982, p. 7).
Antunha (1976) enumera algumas razões para não terem sido suficientes,
as iniciativas do estado nesse período:
(...) inicia-se o crescimento vertiginoso da população do Estado,
com a incorporação em proporções expressivas do elemento
estrangeiro; ativa-se a urbanização, com a introdução de
estrangeiros na Capital. No plano cultural a maior autonomia
conquistada pelo poder político local propiciaria a eclosão de
iniciativas importantes, como a criação de instituições científicas e
culturais, e no campo especificamente educacional seriam
lançadas às bases para a efetiva implantação do sistema estadual
de educação pública. (...) a criação do sistema paulista de
educação pública é contemporânea desta fase de arranque do
desenvolvimento paulista, do qual ela é um dos mais expressivos
aspectos.
48
Apesar do novo Estado delineado no Brasil a partir de 1930, no governo de
Getúlio Vargas, com as idéias de qualificação e desenvolvimento para as novas
indústrias, poucos resultados foram obtidos em relação à democratização do
ensino.
O novo Estado diferenciou-se da primeira República:
- pela centralização e maior autonomia do poder central em
relação às forças locais;
- pela atuação econômica voltada progressivamente a promover a
industrialização;
- pela atuação social tendente a proteger o trabalhador urbano,
reprimindo sua organização quando fora do controle do Estado;
- pelo papel central atribuído às forças armadas como fator de
manutenção da ordem interna e da criação da indústria de base
no país. (HILSDORF, 2005, p. 98).
O Estado passa a intervir em todos os setores da sociedade, até na
organização do ensino em todo o território nacional com difusão de idéias de
centralização, autoritarismo, nacionalização e modernização.
Surge, nessa época, a idéia do Plano Nacional de Educação, com órgãos
específicos fundados para tentar criar uma linha de diretrizes curriculares, como o
Ministério de Educação e Saúde Pública, fundado em 1930, e o Conselho
Nacional de Educação, em 1931.
Após o fim do Estado Novo, o debate educacional, conforme alguns
autores, como Romanelli e Saviani, enfoca a educação como fator para o
desenvolvimento e qualificador de mão-de-obra para as novas indústrias.
De acordo com Piletti em seu livro “História da Educação no Brasil, o fim
do Estado Novo consubstanciou-se na adoção de uma nova Constituição de
cunho liberal e democrático. Essa nova Constituição, na área da Educação,
determinou a obrigatoriedade do Ensino Primário e deu competência à União para
legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional.
São Paulo, com um grande crescimento demográfico e a urbanização
provocada pelas mudanças socioeconômicas e políticas em favor do capitalismo
industrial, originou uma demanda potencial e a procura efetiva por educação,
pressionando o governo ao alargamento do sistema educacional e impulsionando
as discussões sobre seu sistema de ensino.
49
As reivindicações por ensino público afloram com um novo proletariado
urbano e surgem políticos dispostos a defender reformas e expansão
educacional. A expansão em torno de 40%, entre 1945 e 1960, ainda não
contemplava as necessidades da população paulista.
Haidar (1998) afirma que a expansão resultou mais de pressões advindas
da ampliação da demanda e não de uma política educacional intencionalmente
definida, que procurasse adequar à estrutura escolar a uma nova e heterogênea
sociedade.
Podemos verificar esse crescimento da rede pública da escola primária no
estado de São Paulo pela tabela abaixo:
ANO MATRÍCULAS
1945 833.498
1950 730.565
1954 930.091
1960 1.271.042
1968 2.020.881
1970 2.046.736
1971 2.136.936
1972 2.212.316
1973 2.241.206
1976 2.254.206
1981 2.385.409
Tabela 1 - Nº. de matrículas iniciais em São Paulo - Fonte: Estatísticas do século XX, IBGE, 2007
e São Paulo, 1975, p. 125.
A busca de soluções que viabilizassem um rápido atendimento às
necessidades das crianças paulistas por vagas em escolas públicas não dava
conta do grande crescimento demográfico do estado.
Esse movimento de cobrança pela democratização do ensino estava
presente nas discussões em todo o país, em decorrência da política de
desenvolvimento em que as indústrias necessitavam de mão- de- obra com maior
escolarização.
50
Sposito (1984) enumera alguns mecanismos acionados pelo poder público,
na tentativa de atendimento à demanda, porém não percebemos ações que
denotassem preocupações com a qualidade desse atendimento. Podemos citar a
redução dos períodos letivos dos grupos escolares, a adoção, em 1960, da
promoção automática, a construção de galpões de madeira e a criação do ensino
público municipal em 1956.
Na esfera federal, as determinações da constituição de 1946 retomam a
orientação descentralista e liberal:
(...) À União fica incumbida de legislar sobre as diretrizes e bases
da educação nacional e de organizar o sistema federal de ensino,
de caráter supletivo, estendendo-se a todo país, nos estritos
limites das deficiências locais (artigos 5 e 170).
O Ministro da Educação, Clemente Mariani, para que os Estados
pudessem exercer o direito que a Constituição de 1946 lhes outorgava, de
organizar seus sistemas de ensino, constituiu uma comissão para propor um
projeto de reformulação geral da educação brasileira, e após 13 anos de estudos
e discussões, foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
A Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, foi considerada como um avanço
em prol da descentralização da educação, mas manteve as estruturas tradicionais
do ensino, que era organizado em: ensino pré-primário, ensino primário, ensino
médio e ensino superior.
A lei foi a primeira a tratar de todos os níveis de educação e com validade
para todo território nacional, dando passos importantes para a unificação dos
sistemas de ensino na descentralização e flexibilização curriculares. Também
inovou ao propor um planejamento educacional e a abertura de novas
experiências como os ginásios vocacionais e pluricurriculares. Pela primeira vez,
uma legislação educacional conseguia fixar diretrizes gerais para a educação
nacional.
Segundo Romanelli (1991), apesar da liberdade de ensino deliberada na
lei, para os Estados constituírem seus currículos, na prática nada mudou, pois os
menos favorecidos mantinham a educação que lhes era possível, em virtude dos
51
poucos recursos destinados à educação. Na época, ainda não havia legislação
específica sobre destinação e distribuição de recursos à educação.
Hilsdorf (2005) afirma que a discussão em torno da centralização e
descentralização desviou a atenção da sociedade do problema que os
educadores da época consideravam básico, que era como tornar acessível o
ensino aos 50% de analfabetos existentes no país. Segundo ela, a Lei foi
aprovada nos termos propostos de apoio à iniciativa privada.
A Lei não contemplou as idéias apregoadas pelos defensores da escola
pública (professores, intelectuais etc.), que defendiam um sistema público que
atendesse ao conjunto mais pobre da população brasileira.
Contrariando esses interesses, a lei aprovada e sancionada foi uma clara
vitória dos setores que defendiam os interesses privados na educação brasileira.
Ela garantia a gratuidade apenas do Ensino Primário, mas não a obrigatoriedade
e, muito menos, a organização de um sistema de ensino mais democrático e de
qualidade para todos.
Fica evidente que para um país sem recursos para atender a toda a sua
demanda educacional, era um absurdo o desvio de recursos para o setor privado
e, por este motivo, mais de 50% da população em idade escolar ficava sem
acesso à escola.
Em prosseguimento às metas governamentais pressionadas pela
sociedade e diante do exorbitante crescimento da demanda, foi criado, em 1962,
o Conselho Federal de Educação, que aprovou o Plano Nacional de Educação
para o período de 1962/1970.
O Plano consistia basicamente em um conjunto de metas quantitativas e
qualitativas a serem alcançadas num prazo de oito anos.
Dentre as metas, podemos citar no Ensino Primário: “Matrícula até a 4ª
série de 100% da população escolar de sete aos 11 anos de idade e matrícula na
5ª série e 6ª série de 70% da população de 12 a 14 anos”. (BRASIL, 1961).
Romanelli (1991) relaciona o fracasso dessas metas a dois fatores: a
impossibilidade da escola primária de atender a toda sua população e seus altos
índices de retenção. O autor pressupõe que deveriam ser priorizados os recursos
52
a este segmento de ensino e não a concessão de bolsas de estudos, o que
favorecia apenas o setor privado e aqueles que conseguissem competir dentro do
esquema seletivo vigente.
(...) De cada mil (1000) alunos que entraram na 1ª série no ano de
1963, quatrocentos e quarenta e nove (449) passam para a 2ª
série do 1º grau. (BRASIL. Ministério de Educação e Cultura,
1964).
Vindo o ano de 1964, começa no Brasil o governo militar, centralizado, com
uma política de desenvolvimentismo associado com a economia embasada na
indústria e no capital estrangeiro. Com isso, em 1965, o Plano Federal de
Educação é revisado, incluindo normas para estimular a elaboração dos planos
estaduais, pois com a criação do salário-educação, em 1964, os recursos
destinados ao Ensino Primário aumentaram consideravelmente.
De acordo com Piletti (1996), educadores passaram a ser perseguidos por
conta de posicionamentos ideológicos divergentes ao regime. O regime militar
espelhou na educação o caráter antidemocrático de sua proposta ideológica de
governo, e a promulgação do AI5 impossibilitou aos educadores posicionarem-se
em relação às leis e decretos relacionados à educação.
Verificamos a implantação da política educacional do governo militar
justificada pela necessidade de desenvolvimento do “capital humano”
23
para
adequar a sociedade brasileira aos patamares das exigências modernas da
produção internacional. (HILSDORF, 2005).
A aceleração no ritmo do crescimento econômico e na demanda social de
educação agravou a crise do sistema educacional que há muito tempo já vinha
deficiente, justificando os vários acordos de colaboração técnica e financeira entre
o MEC e a
Agency for International Development (AID). Esses acordos
objetivavam diagnosticar e solucionar problemas da educação brasileira na
perspectiva de desenvolvimento do capital humano.
A partir de orientações técnicas da USAID
24
, o governo começou a adotar
medidas para ajustar o sistema educacional ao novo modelo econômico, que
23
A teoria do capital humano foi importada dos EUA como diretrizes de política social para países
em desenvolvimento.
24
United States Agency International Development.
53
exigia melhor formação de recursos humanos em razão da expansão econômica.
Os argumentos para a nova política educacional fundamentavam-se na idéia da
necessidade de criar recursos humanos e tecnológicos, conforme o
desenvolvimento econômico.
Romanelli mostra em seu livro, “História da Educação no Brasil.
1930/1973, que esses programas de ajuda beneficiavam mais os países
assistentes do que os assistidos, pois representavam uma forma de criação ou
expansão de mercados. Os acordos, quando tomam forma de divulgação de
metodologias de pesquisa, aumentando a introdução de técnicas de ensino
mordernizantes, desviam a atenção das problemáticas e do contexto nacional.
Quanto aos conteúdos a serem trabalhados, foram supervalorizados os das áreas
tecnológicas, manifestados na predominância de treinamentos nesses setores.
Nesse período, segundo Romanelli (1991), além das medidas
centralizadoras adotadas pelo governo federal para suprir a demanda de
matrículas e expansão do ensino, foram acrescidas medidas que visavam à
estruturação do ensino, para atender às orientações dos acordos MEC - USAID.
No Brasil foram assinados 12 acordos MEC-USAID, entre 1964 e 1968,
pressionando e exigindo racionalização e eficácia na aplicação de recursos. Os
técnicos agiam segundo uma lógica empresarial, marcando toda política
educacional da época, caracterizada pelo desenvolvimentismo, produtividade,
eficiência, controle e repressão.
Os acordos para atender à demanda enfocavam a integração dos ensinos,
isto é, estavam vinculados a uma reorganização da escola fundamental. O
governo precisava colocar todos na escola, para formar mão-de-obra com alguma
educação e treinamento, ao mesmo tempo, muito produtiva e barata.
Em novembro de 1968 foi criado o FNDE (Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação). O fundo tinha a finalidade de angariar recursos e
aplicá-los em financiamento de projetos de ensino. Assim, percebemos uma
mudança na política de distribuição e aplicação de recursos da educação, agora
atreladas a um plano nacional de educação, subordinado às orientações do
governo federal em relação ao controle da política educacional, que se
54
comportava como uma reguladora entre a produção educacional e as
necessidades do desenvolvimento. (BRASIL. MEC. Lei 5.537/68).
Nesse contexto, as mudanças no ensino defendidas pelo MMM eram as
mais adequadas a esse novo contexto sociopolítico-econômico, pois prometia
uma matemática mais adequada aos novos tempos, acesso aos novos avanços
da disciplina, permitindo participação numa nova sociedade tecnológica e mais
científica.
O estado de São Paulo, em cumprimento ao Plano Nacional de Educação,
resolve efetivar as medidas deliberadas pelo governo federal, através de seus
órgãos competentes, já que possuía a maior população urbana e o maior déficit
de vagas nas escolas primárias e necessitava das verbas federais para colocar
em prática a expansão da rede no Estado.
Até então os esforços governamentais para o alargamento de vagas na
escola primária paulista não tinham sido suficientes para absorver toda a
população em idade escolar.
Estado de São Paulo - Matrículas no Ensino Primário
ANO POPULAÇÃO % DA POPULAÇÃO
ATENDIDA
1940 7.180.316 7,7%
1967 16.470.000 11,5%
Tabela 2 - População atendida. Fonte: (SPOSITO, 1984, p. 27).
O movimento de urbanização fazia crescer setores de prestação de
serviços, da pequena indústria, e o aparecimento de um proletariado no Estado,
formado tanto por imigrantes estrangeiros como vindos de outros estados. Desde
então, a oferta de educação era pauta de promessas políticas e ações
localizadas, que verificaremos, mais tarde, não terem sido cumpridas como
prometido.
Com a intensificação da demanda social em relação à escola primária e
diante da ameaça do não atendimento, o poder público começa a articular a
elaboração de um plano estadual de educação, determinado pela revisão de
1965, no Plano Nacional de Educação.
55
O processo em São Paulo, teve início em 1967, em cumprimento às
orientações do governo federal referentes à racionalização de esforços para o
desenvolvimento de um sistema de ensino, posto que a LDB/61 estabeleceu
autonomia aos estados para organizar seus sistemas de ensino.
A idéia de plano surge com a necessidade de racionalização de esforços
para o desenvolvimento de um sistema de ensino, defendida pelos técnicos dos
acordos MEC-USAID, embora o estabelecimento de um plano federal implicasse,
primeiramente, definição de uma política educacional e, conseqüentemente, a
destinação de recursos.
A LDB/61 estabeleceu as competências do CFE e dos CEE na elaboração
dos Planos de Educação e exigia a existência desses planos para todos os
sistemas de ensino.
Encontramos, na versão preliminar do Plano de Educação de São Paulo
(São Paulo, 1969), assinada pelo professor José Mario Pires Azanha, Diretor
Geral do Departamento de Educação, as concepções do Estado sobre sistemas
de ensino.
Percebemos o discurso de Azanha sendo usado como estratégia de
divulgação das determinações governamentais em relação à implantação de uma
política educacional, objetivando uma intervenção racional para a reorganização
curricular da escola primária.
O Diretor repete o discurso federal, de que a expansão do atendimento às
crianças em idade escolar e a melhoria qualitativa deste ensino, deveriam ser
pensadas conjuntamente.
Um plano de educação se define como o conjunto de medidas de
natureza técnica, administrativa e financeira - a serem executadas
num certo prazo e selecionadas e escalonadas a partir de uma
política educacional. (SÃO PAULO, 1969, p. 127).
As concepções defendidas pelo Diretor corroboram as do MEC-USAID, ao
dar ênfase ao planejamento e organização racional das atividades pedagógicas; à
operacionalização dos objetivos e ao parcelamento do trabalho, com
especialização das funções e destinação de recursos, a fim de alcançar os
objetivos por meio de racionalização, exatidão e planejamento.
56
Conforme já mencionado, o grande problema nas escolas paulistas era o
déficit de vagas, e a solução para enfrentá-lo foi colocada de maneira a obter
maior rentabilidade com maior economia de recursos, garantindo a implantação
do modelo.
Com relação à ampliação da rede, o que se necessita preliminarmente é da
coordenação de esforços desenvolvidos na aplicação de recursos estaduais,
municipais e particulares e, ainda, daqueles provenientes dos Fundos federais e
do Salário-Educação. Sem esta coordenação, a expansão da rede do Estado, se
fará sempre de modo tumultuado, ocasionando ao mesmo tempo a omissão e a
redundância, com inevitável desperdício de recursos, já por si insuficientes. (SÃO
PAULO 1969, p. 128).
A intenção do governo paulista, como em todos os estados brasileiros, para
o Ensino Primário na época, era mais a expansão do que a melhoria qualitativa.
Contudo, Azanha ressalta que essas metas só poderiam ser alcançadas se
enfrentadas conjuntamente.
Azanha critica iniciativas anteriores, executadas sem planejamento técnico,
e que demonstravam a ineficácia de ações deste tipo. Afirma que os resultados
foram visíveis em relação à deteriorização da qualidade do ensino paulista.
Denuncia o problema de déficit de vagas no Estado, sugerindo a coordenação de
recursos estaduais, municipais e particulares, associados às verbas federais,
além da mobilização da opinião pública, no sentido de que entidades particulares
cedam locais para instalação de salas de aula, para solucionar o problema.
Outro fator marcante no Plano refere-se às afirmações liberais, contidas na
LDB 4.024/61, sobre o pressuposto da primazia do direito da família, e não do
Estado, de educar seus filhos. O Plano reforça a necessidade da mudança de
concepção de Escola Primária, pois, de acordo com o governo, reservam funções
sociais inapropriadas para a escola pública, inatingíveis, gerando orientações
inoportunas e consequentemente ineficazes para sua execução e sucesso.
O Plano reafirma a necessidade da escola de se adaptar aos novos tempos
e considerar suas reais possibilidades, devendo alterar os padrões das atividades
escolares, adequando-as à estrutura da sociedade na qual a escola se insere.
57
A melhoria qualitativa do ensino é tarefa é mais complexa ainda,
porque sob essa expressão não se pode entender apenas a
renovação de métodos, mas esforço mais amplo que abranja
todas as dimensões do processo educativo. Para isso é
necessário o rompimento com uma concepção das funções
sociais da escola primária, que insiste em ver nesta instituição, a
agência realizadora de uma tarefa que, na verdade, supera as
suas efetivas possibilidades de atuação. Pretender, por exemplo,
que num contexto urbano-industrial em elevado estágio de
desenvolvimento, a escola primária forme a personalidade integral
do educando, não é, de maneira alguma, valorizar-lhe as funções.
É antes uma colocação e ingênua e até certo ponto prejudicial.
(SÃO PAULO, 1969, p. 129).
Os conceitos de De Certeau parecem ser apropriados para nos ajudar a
entender os mecanismos para implementar a reestruturação do Sistema Estadual
de ensino. O Plano produzido pelo Estado (de um lugar de poder) é utilizado
como estratégia de imposição e divulgação de suas diretivas para o ensino
primário. Esse discurso faz circular a nova política educacional fundamentada nas
idéias do capital humano, na idéia da necessidade de criar recursos humanos e
tecnológicos conforme o modelo de desenvolvimento econômico, subordinado ao
capital estrangeiro adotado no país.
Percebe-se a clara intenção de Azanha em diminuir as expectativas em
relação à escola primária. Era preciso limitar as funções conferidas à escola e,
assim, viabilizar a entrada de um enorme contingente de crianças no ensino
primário contando com os mesmos instrumentais disponibilizados até então. É
fato que a escola primária não poderia continuar com as mesmas perspectivas
com o ingresso de uma grande população heterogênea.
Da mesma forma era enfrentada a melhoria da qualidade, que estava
relacionada à reformulação de expectativas quanto à escola primária, justificada
pela diminuição de seu poder na formação da criança. Podemos perceber a
intenção do Estado de dividir com outros segmentos da sociedade
responsabilidades que antes eram suas. A demanda por vagas é tão grande que
o Estado não é capaz de cumprir com seus deveres.
O diferencial proposto refere-se à flexibilidade do Plano, com insistência na
possibilidade de existência de vários caminhos para o sucesso da reestruturação
pretendida, não sendo conveniente que o Ensino Primário se organizasse
segundo um único modelo e abrindo espaços para tentativas experimentais.
58
A reforma no currículo da escola primária nesse período baseou-se nas
orientações dos acordos MEC-USAID: rentabilidade, menos recursos, expansão e
melhoria qualitativa. Consubstanciou-se em três grandes providências:
1. modificação da seriação do ensino (Não haveria mais reprovação entre
duas séries de um mesmo ciclo);
2. reorganização do currículo e dos programas;
3. reorganização e implantação da orientação pedagógica.
Na continuidade de seu discurso, o Diretor reforça o papel da escola
primária como base para os outros níveis de ensino, devendo por isso, reformular-
se pedagogicamente, diante das novas demandas da sociedade brasileira e do
desenvolvimento das teorias de aprendizagem infantil.
Destacamos que a escola primária paulista, em 1965, atendia cerca de
10% da população total do estado, sendo o poder público responsável por 90%
das matrículas na escola elementar (Sposito, 1984, p. 27). Em 1969, conforme
relatório do Plano Estadual de Educação, 95% da demanda foi atendida.
Nesse contexto surge o primeiro documento por nós analisado: Programa
da Escola Primária do Estado de São Paulo-1969, em resposta às deliberações
federais referentes à reestruturação do sistema de ensino.
No quadro de uma política oficial de expansão acelerada e democratização
do ensino, verificamos que a taxa de escolarização entre 1964 e 1970 foi
pequena, pois 31% da população em idade escolar, ainda estava fora da Escola
(MEC - Estatística da Educação Nacional, 1960-1970).
A década de setenta do século XX, no Brasil, foi marcada por grandes
mudanças no aspecto econômico, social, político e, também, educacional, com as
facilidades à entrada de capital estrangeiro no país. O aumento da procura de
empregos, decorrentes da rápida urbanização, impeliu os empregadores a exigir
um nível de escolaridade cada vez maior. Deste modo, cresceu também a
demanda pelo ensino superior. De acordo com Piletti (1996), é no período mais
cruel da ditadura militar que é instituída a Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71.
59
A característica mais marcante desta Lei era tentar dar a formação
educacional um cunho profissionalizante. Dentro do espírito dos
"slogans" propostos pelo governo, como "Brasil grande", "ame-o
ou deixe-o", "milagre econômico", etc., planejava-se fazer com
que a educação contribuísse, de forma decisiva, para o aumento
da produção brasileira. (PILETTI, 1996).
A lei 5.692/71 concretiza a tentativa de profissionalização, e os
acordos MEC/USAID firmados na década de 70, formalizam uma
orientação tecnicista ao ensino brasileiro. Como sabemos o
Tecnicismo, se baseia em princípios de racionalidade, eficiência e
produtividade. Os professores tornam executores de medidas
tomadas por especialistas, reorganizando o trabalho educativo de
maneira a torná-lo objetivo e operacional. (Saviani, 1995, p. 23).
Se antes, a Lei 4.024/61 fundamentava-se em princípios liberais, a Lei
5.692/71 passa a enfatizar a linha tecnicista.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação 5.692/71 surgiu com o propósito
de atender à demanda por técnicos de nível médio e conter a pressão sobre o
ensino superior. Deliberou que o ensino de 1º e 2º graus, hoje chamados de
Ensino Fundamental e de Ensino Médio, teria como objetivo geral proporcionar ao
educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades:
auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício da
cidadania; criando uma única escola de 1º e 2º graus. Um primeiro grau, voltado à
sondagem vocacional e iniciação para o trabalho, além da educação geral, e um
segundo grau com vistas à habilitação profissional de grau médio.
O discurso utilizado para sustentar o caráter manifestado para a defesa da
formação de técnicos construiu-se sob o argumento da "escassez de técnicos" no
mercado, e pela necessidade de evitar a "frustração de jovens" que não
ingressavam nas universidades nem no mercado de trabalho, por não
apresentarem uma habilitação profissional.
Isto seria solucionado pelo princípio de terminalidade expresso na lei. Essa
lei reformulou o ensino em importantes aspectos, tornando obrigatória a
escolaridade para crianças entre sete e catorze anos, o Ensino Fundamental
passou a ser realizado em oito anos, com extinção do Exame de Admissão. Deste
modo, procurou diminuir um dos pontos de estrangulamento do antigo sistema,
representado pela transição do primário para o ginásio.
Assim, a educação geral definiria o princípio de continuidade, a formação
especial, a terminalidade dos estudos. A reforma instituiu a escola de 1º Grau,
60
para ministrar um curso único, seriado, obrigatório e gratuito de oito anos de
duração, resultante da reunião dos antigos grupos escolares e ginásios. A
Reforma, segundo Hilsdorf (2005), definiu o 2º grau como profissionalizante, para
formar técnicos para as indústrias, mas com o objetivo, não explícito, de diminuir
a pressão por vagas no ensino superior.
Uma das grandes mudanças propostas pela Lei 5.692/71 foi a extinção do
Exame de Admissão ao Ginásio. Este exame era constituído, entre outras, por
provas de Aritmética, e perdeu sentido ao serem extintos o antigo Primário e
Ginásio, visto que, ao serem unificados em Ensino de 1º Grau, procurou-se
eliminar a seleção de alunos para acesso à 5ª série, que era feito através desse
exame.
Em São Paulo, o Exame de Admissão foi legalmente suprimido em 1967,
antecipando uma medida que seria tomada posteriormente, com a criação da
escola única de oito anos pela reforma de 1971. (
Hilsdorf, 2005, p. 115).
A Lei 5.692/71, de 11 de agosto de 1971, cujo objetivo principal era alargar
a faixa de educação obrigatória, que até então era o antigo primário, e remodelar
o sistema educacional referente ao ensino de 1ºe 2º graus, fixando suas diretrizes
e bases, foi promulgada no período em que o ideário do MMM estava bem
consolidado no ensino primário.
O MMM era divulgado nas publicações da época
25
como uma possível
solução para os problemas educacionais, que poderiam ser solucionados com a
modernização dos métodos de ensino que privilegiassem a experimentação, a
racionalização, a exatidão e o planejamento.
De acordo com Soares (2005), a imprensa exerceu um papel de persuasão
nesse sentido. No caso específico da Matemática Moderna, as matérias
jornalísticas ressaltavam o caráter inovador e revolucionário da nova proposta de
ensino para a Matemática, apresentando-o como a solução para os problemas de
aprendizagem.
O ideário propagado pelo MMM adequava-se perfeitamente com a política
econômica adotada pelo país, e a concepção tecnicista da nova LDB - Lei
25
Artigos de periódicos brasileiros relacionados ao ensino da Matemática e Revistas de educação como a
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Revista da ANDE, AMAE Educando, entre outros.
61
5.692/71 - impulsionou o privilégio na divulgação dessas idéias nas publicações
oficiais destinadas a professores nesse período.
A tendência tecnicista implantada com a reforma pela Lei 5.692/71 surge
então com ênfase nas tecnologias do ensino. Tirando o centro do processo de
ensino-aprendizagem do professor e do aluno e focando-o nos objetivos
instrucionais e nas técnicas de ensino. Há preocupações com a economia de
pensamento, e o raciocínio rápido, demandados pela sociedade em
desenvolvimento.
Diante desse cenário, nos propusemos a analisar os documentos oficiais
originários das LDB’s e verificar as reformulações no currículo de matemática, o
que desencadeou reflexões sobre a escola primária antes e depois da Lei
5.692/71.
Hilsdorf, em seu livro “História da Educação Brasileira (2005)”, utiliza um
quadro comparativo sobre as características das LDB’s.
Lei nº. 4.024
Linha liberal
Lei nº. 5.692/71
Linha tecnicista
Autonomia do indivíduo
Qualidade
Cultura geral
Ênfase nos fins (ideais)
Adaptação à sociedade
Quantidade
Cultura profissional
Ênfase nos meios (metodologias do tipo
microensino, máquinas de ensinar,
telensino, etc.).
Tabela 3 - Tabela Comparativa.
A autora também problematiza a concepção de cultura adotada em cada
uma das reformas: Se, no início da década de 60, a cultura era concebida como
elemento de transformação econômica e social do país, após 64, o ensino foi
pensado outra vez de cima para baixo, na direção tecnicista dada pelos
interesses pretendidos com os acordos MEC-USAID.
Do ponto de vista da execução das determinações legais, a lei estava
baseada nos princípios organizacionais de uma grande empresa capitalista, com
a divisão do trabalho pedagógico, encarregados de aplicar e controlar as novas
técnicas e métodos adotados.
62
Todas essas condições políticas, sociais e econômicas podem ser
consideradas como facilitadoras para a aceitação oficial do ideário do MMM
introduzido nos currículos da escola primária em expansão.
3.2 O MMM nas séries iniciais e as equipes de elaboradores dos documentos
No cenário montado, percebemos as transformações ocorridas na escola
primária entre 1961 e 1980. Vários fatores são considerados em nossa análise
para tentar explicar como as Reformulações no ensino impactaram a
reestruturação curricular de matemática e como equipes foram formadas para
articular as reformas educacionais impregnadas com o ideário do MMM, que
defendia uma matemática acessível e agradável a todos.
Procuraremos, neste capítulo, delinear a trajetória da introdução do MMM
na escola primária paulista e o papel determinante da equipe de elaboradores dos
documentos oficiais nesse processo.
D’Ambrosio (1987) problematiza o papel das agências estrangeiras
financiadoras, na participação do Brasil em congressos internacionais, no
intercâmbio de professores brasileiros e estrangeiros, como mecanismos de
divulgação do ideário e de protagonistas do Movimento, por meio de publicações
estrangeiras. Acrescentamos que, além dos acordos MEC-USAID, que
possibilitaram grande divulgação, a rede de sociabilidade trançada entre
professores defensores do Movimento foi primordial. Isso permitiu à Secretaria
Estadual de Educação de São Paulo divulgar, por meio de documentos oficiais e
cursos para professores sua ação à toda rede de professores paulistas.
Em todas as teses e dissertações consultadas sobre o MMM, o nome do
professor Osvaldo Sangiorgi é destacado como uma das maiores personagens do
Movimento no Brasil. Procuraremos fazer uma breve incursão sobre a trajetória
desse professor e relacioná-la com a divulgação e difusão do Movimento.
Nossa base de pesquisa sobre o professor Sangiorgi é a dissertação de
Flainer Lima (2006), que utilizou o APOS
26
para seus estudos.
26
Arquivo Pessoal de Osvaldo Sangiorgi, organizado pelo GHEMAT.
63
O professor Sangiorgi licenciou-se em Física pela Universidade de São
Paulo (USP), em 1943; é mestre em lógica pela Universidade de Kansas, EUA,
desde 1961; doutor em Matemática pela Universidade de São Paulo, desde 1973;
e livre-docente pela Escola de Comunicação e Artes da USP (ECA), desde 1977.
Foi professor do magistério secundário oficial do Estado de São Paulo e da
Universidade Mackenzie. (LIMA, 2006, p.18).
Todos os professores que participaram de alguma forma do Movimento
destacam seu poder aglutinador, de liderança e de articulação. Por todas essas
qualidades, tinha livre acesso a várias esferas, conseguindo sempre que possível
as condições para execução de seus projetos em relação às reformulações do
ensino de Matemática.
Sangiorgi conseguia muitos financiamentos para organizar cursos.
Ele sempre foi uma pessoa muito política. Por isso ele ou é muito
amado ou muito odiado, como toda pessoa forte. Ele sempre foi
uma pessoa muito influente, conseguia dispensa de ponto, para
os professores da rede pública, freqüentar seus cursos. Nos
eventos que promovia, convidava autoridades, estava sempre
rodeado de políticos. (BECHARA, depoimento oral, 2006).
De volta de seus estudos em Kansas, onde participou do “Summer Institute
for High School and College Teachers of Mathematics”, no período de junho a
agosto de 1960, Sangiorgi, influenciado pelas idéias de seus professores e
entusiasmado com o novo Movimento de renovação curricular, divulga em artigos
e palestras a nova Matemática. Com isso, consegue aglutinar vários adeptos para
a formação de grupos de estudo.
Em suas entrevistas e cursos, Sangiorgi repetia o discurso do governo
sobre a necessidade de desenvolvimento de capital humano, por meio de
cooperação de instituições financeiras, a fim de viabilizar a existência no Brasil de
cursos semelhantes ao de Kansas, que atendessem aos anseios de professores e
comunidade em relação às reformas no ensino.
Aqui no Brasil, como de resto em qualquer país, onde ao
professor secundário cabe uma grande parcela na formação dos
jovens, é mister a realização de cursos análogos, que permitirão
aos docentes – para melhor desempenho de sua altruística função
– a vivência com os últimos progressos do campo educacional,
que, a nosso ver, é o mais importante de todos (SANGIORGI apud
LIMA, 2006, p. 41).
64
Ressaltamos, ainda, que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
de 1961 dava liberdade a experiências educacionais. Nesse período, Sangiorgi já
era conhecido como grande autor de livros didáticos e por suas idéias de reforma
e fazia parte da elite de professores estaduais de São Paulo. Utilizando-se de seu
talento e conhecimentos nas esferas decisórias da Secretaria Estadual de
Educação de São Paulo, articulou um convênio para um curso de matemática
moderna para professores secundários.
D’Ambrosio (depoimento oral, 2006) lembra que antes do curso para
professores paulistas, Sangiorgi promoveu em Santos, em julho de 1961, o
primeiro curso com tópicos relacionados à Matemática Moderna. Articulado e
planejado pelo professor Sangiorgi, o curso foi financiado pela CADES
27
e teve
como professores George Springer, Jacy Monteiro e o próprio Sangiorgi.
Logo após, em agosto de 1961, os professores efetivos da Secretaria de
Educação de São Paulo foram convidados a participar de um curso semelhante.
Iniciar-se-á no próximo dia 1º nesta capital, um curso de
aperfeiçoamento em Matemática para professores do ensino
secundário, com duração de oito semanas. O curso será
ministrado por professores da USP, do Mackenzie e pelo Sr.
George Springer, do Departamento de Matemática da
Universidade de Kansas, EUA. (O Estado de São Paulo, 7/7/61.
Apud NAKASHIMA, 2007).
Podemos afirmar que, a partir desse momento, foi oficializada a entrada do
ideário do MMM na rede pública de São Paulo.
Esse curso impulsionou a formação de grupos de estudo sobre as novas
idéias difundidas pelo MMM, deu oportunidade a outros profissionais de se
aglutinarem em todos os outros segmentos de ensino e possibilitou novas
experiências e metodologias.
O curso, de acordo com relato da professora Manhúcia P. Liberman, foi o
início dos estudos e a aplicação do ideário do MMM.
27
Campanha de aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário, fundada em 1953. Tinha como objetivo a
"elevação do nível e a difusão do ensino secundário no país". A instituição deveria promover cursos de
aperfeiçoamento para professores, técnicos e administradores do ensino secundário, produzir material
didático, avaliar o crescimento educacional, entre outras funções. (BARALDI, 2003, p. 152).
65
Éramos quase 30 professores. Saiu uma nota no jornal
convocando os professores em período integral, no mês de
agosto, com dispensa de ponto. Éramos poucos naquele tempo. A
escola publica era elitista. A única necessidade, é que
soubéssemos inglês... Não precisava comprovar... As aulas eram
em inglês. (LIBERMAN, depoimento oral, 2006).
Liberman descreve o curso como uma oportunidade única para os
professores de matemática, já que na época não existia mestrado ou outro tipo de
especialização para educadores matemáticos. Acrescenta que a grande adesão
ao curso deveu-se à comodidade da dispensa de ponto e à sua realização na
cidade de São Paulo
28
.
Com a repercussão e o entusiasmo dos participantes do curso, foi fundado
o GEEM (Grupo de Estudos do Ensino da Matemática), em 31 de outubro de
1961, tendo Sangiorgi como presidente e o professor George Springer como
colaborador.
A constituição e atuação desse grupo foram de extrema
importância para a implantação e divulgação do MMM no Brasil,
por meio de cursos similares aos que o professor Sangiorgi
participou na Universidade de Kansas e organizou e ministrou na
Universidade Mackenzie. (LIMA, 2006, p. 42).
A maioria dos participantes do Grupo dedicou sua vida profissional à
divulgação do ideário da Matemática Moderna. Porém focalizaremos nossa
atenção àqueles que deslocaram seus interesses para a escola primária,
produzindo livros didáticos, cursos de formação, documentos oficiais, etc.
Podemos citar: Manhúcia P. Liberman, Lucília Bechara, Renate Watanabe,
Almerindo Bastos, Maria Amábile Mansutti, entre outros.
Manhúcia P. Liberman, uma das professoras participantes do “curso do
Mackenzie” e do GEEM foi licenciada em Matemática pela Faculdade Nacional de
Filosofia do Rio de Janeiro em 1947. Prestou concurso para o magistério público
do estado de São Paulo em 1949 e assumindo aulas na cidade de São José dos
Campos.
28
Corroborando a afirmação de Liberman, verificamos que o número de ginásios públicos no estado de São
Paulo era de apenas três em 1930 e 41 em 1940. Essas poucas opções obrigavam os professores
residentes na cidade a optar por outras cidades próximas.
Só após os esforços para a expansão de vagas, no governo Jânio Quadros, foram criados, nos anos de
1956 e 1957, 61 novos ginásios, sendo 42 deles em prédios de grupos escolares já existentes. (Hilsdorf,
2005, p. 115).
66
Por motivos particulares, ficou pouco tempo nessa cidade e foi designada
para trabalhar no Serviço de Medidas e Pesquisas Educacionais com dois
professores da USP. O trabalho consistia apenas em formular e corrigir as provas
de admissão ao ginásio, para o que lhe valia o conhecimento sobre os conteúdos
abordados na escola primária.
Outra personagem bastante atuante e com muitas produções, dirigida à
aprendizagem infantil é a professora Lucília Bechara. Licenciada em matemática
pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de Campinas,
prestou concurso para professor efetivo da rede pública paulista em 1957,
ingressando na cidade de Conchas. Mais tarde assumiu a Supervisão Geral dos
Ginásios Vocacionais do Estado de São Paulo.
Em 1961 vim para São Paulo, com a Elza Baba fazer o curso no
Mackenzie, pois também queríamos saber sobre os novos
métodos de ensino. (BECHARA, depoimento oral, 2006).
A parceria nas produções de Liberman e Bechara para o Ensino Primário
iniciou-se nas reuniões do GEEM e nos cursos que ministravam.
O trabalho no setor de Medidas Educacionais do Estado proporcionou o
convite para Liberman, assumir, em 1963 a coordenação do curso de admissão
da escola experimental Peretz, na Vila Mariana, onde seu filho estudava.
Liberman declara que, primeiramente, ficou assustada por não ser professora
primária, porém, logo foi convencida pelo diretor, que argumentou sugerindo que
suas atribuições no Serviço de Medidas e Pesquisa Educacionais e os cursos que
orientava no GEEM a tornavam competente para o cargo.
A função assumida no Colégio Peretz é considerada como uma das muitas
razões que a levam a priorizar o Ensino Primário em suas produções. Apesar de
não ser professora primária, sentiu-se confiante em exercer o cargo, graças à
experiência adquirida nos cursos oferecidos pelo GEEM. Além disso, teria
possibilidade de experimentar novas metodologias e maior contato com as
inquietações dos professores primários.
Quando fui pra lá foi um “deus nos acuda”, porque as professoras
não estavam acostumadas. Nessa época, coincidentemente, o
meu 2º filho foi reprovado. A minha preocupação de mãe
juntaram-se com a didática da matemática, os cursos que estava
67
fazendo, o trabalho com as provas de admissão, a nova visão que
adquiri, participando do Ensino Primário dessa escola, as
discussões no grupo de estudo. Foi tudo um encaixe. Eu estava
pré-destinada para o primário. (LIBERMAN, depoimento oral,
2006).
O GEEM tornou-se referência em relação ao ensino de Matemática e foi
declarado um órgão de serviço público, em 1963
29
, podendo contar com apoio
oficial para seus projetos.
Desta maneira, aos professores estaduais era concedida dispensa de
ponto para freqüentar os cursos ministrados pelo GEEM. Podemos citar como
exemplo as Portarias nº. 325, de 15/10/63 e nº. 4, de 18/03/64, dispensando os
professores, onde verificamos a facilidade propiciada aos professores para
participarem dos cursos do GEEM. (NAKASHIMA, 2007).
Os componentes do GEEM tinham a facilidade de freqüentar cursos
nacionais e internacionais com bolsa de estudos e contavam com financiamentos
oficiais para cursos de capacitação de professores, o que aumentava o prestígio
do Grupo em todo o Brasil.
Nakashima (2007) afirma em sua dissertação, que, para a difusão do MMM
no Brasil, foi importante sua divulgação por meio de textos jornalísticos de
palestras e conferências promovidas pelo GEEM, pois contribuiu para sua maior
aceitação.
A partir da fundação do GEEM, parece que o Jornal Folha de São
Paulo apoiou o MMM, por meio da divulgação das atividades
desenvolvidas pelo Grupo. Manchetes chamativas foram
estampadas nesse Jornal, a fim de mostrar que o GEEM estava
realizando cursos de aperfeiçoamento de professores secundários
e primários, reuniões, palestras e conferências. Muitas
reportagens foram divulgadas elogiando os novos métodos de
ensino da Matemática. (NAKASHIMA, 2007, p. 127).
29
SÃO PAULO, Lei 2.663/63.
68
Figura 1 - Diário Popular. 03/02/65-apud Nakashima, 2007.
Os defensores do Movimento, participantes do GEEM, acreditavam que a
compreensão da matemática moderna pelos novos cidadãos facilitaria a
apropriação das novas tecnologias e contemplaria as demandas da “nova
sociedade”. Para isso uma nova metodologia para o ensino de matemática
deveria ser adotada. A matemática seria um instrumento para o desenvolvimento
da capacidade de pensar do estudante, dando-lhe subsídios para entendimento
da nova linguagem tecnológica. O MMM encontrou em Piaget fortes justificativas
para a reforma no ensino de Matemática, e foi no Ensino Primário que a sua
teoria reuniu mais adeptos.
As agências financiadoras justificavam a necessidade de investimentos,
alegando a crescente demanda da sociedade por mão-de-obra especializada,
69
cabendo à escola formar cidadãos que soubessem lidar com toda a nova
tecnologia surgida na época.
Apesar da origem européia, foram os investimentos do governo americano
no ensino de matemática os grandes responsáveis pela divulgação do Movimento
de reforma pelo mundo, desencadeando a proliferação dos Congressos, a
formação de grupos de estudos, as experiências em novas metodologias e
agregando mais adeptos e multiplicadores.
Os textos escritos por Piaget sobre a compreensão e a aprendizagem em
matemática, nos quais afirmava que a análise dessa aprendizagem era
instrumento imprescindível para pesquisa da organização do processo cognitivo
do sujeito, por fornecer elementos eficazes de seu funcionamento, foram
adotados por vários grupos de estudo.
Conforme mencionamos anteriormente, o Movimento pretendia unificar a
matemática em função de três grandes “estruturas-mãe” propostas pelo grupo
Bourbaki da França. Piaget afirmava que havia uma forte relação entre o
desenvolvimento das estruturas psicológicas do indivíduo e a forma de ensinar
matemática proposta pelos modernistas.
A teoria piagetiana e as idéias do grupo Bourbaki serviram como
sustentação teórica e de argumentação para convencimento das propostas do
MMM. Tanto Piaget como Bourbaki foram muito usados pelos modernistas para
justificar, incentivar e validar o emprego de metodologias experimentais.
Lembramos que a Lei 4.024 incentivava a criação de classes
experimentais, dando autonomia aos Estados de organizarem seus sistemas de
ensino.
Nessa perspectiva, São Paulo implantou os Ginásios Vocacionais, com
classes experimentais, regulamentados pelo Decreto 38.643/61, que também
criou o Serviço de Ensino Vocacional, para coordenar os Ginásios Vocacionais.
(São Paulo, 1963)
Os Ginásios Vocacionais foram escolas pioneiras na rede pública de São
Paulo nos anos 60. Continham uma proposta pedagógica revolucionária, com um
projeto pedagógico e uma estrutura institucional diferenciados, que possibilitaram
a implementação de uma série de inovações em relação à escola tradicional, com
70
experiências na metodologia, que proporcionavam o desenvolvimento de novos
métodos, processos de avaliação do aluno, currículo e vínculo da comunidade
com a escola. Foram extintos pelo governo militar em 1969.
Nos cursos que ocorriam no Ginásio do Brooklin, antes de ser fechado, as
idéias de Jean Piaget despertavam muito interesse, e eram muitos os cursos
relacionados à teoria do desenvolvimento cognitivo.
Por suas características democráticas e inovadoras, era lugar aglutinador
de profissionais interessados em novas experiências e divulgador de
metodologias para o ensino, principalmente no ensino de matemática.
Concomitantemente aos cursos do GEEM, ocorriam os cursos nos
Ginásios Vocacionais, que uniam, em ambiente agradável, uma elite de
professores de matemática competentes, com grande potencial criativo e
empenhado em realizar um trabalho de reformulação curricular no qual
acreditavam, desejando mudanças no ensino de matemática.
Acontecia também em São Paulo, os cursos para os Ginásios
Vocacionais. No segundo semestre, estávamos estudando
matemática moderna no curso do Mackenzie e também nos
Ginásios Vocacionais. Ficamos entusiasmados, respirávamos
MM. Nós estávamos estudando a questão do construtivismo, do
cognitivismo, líamos muito Piaget (...) Os seis estudos de Piaget.
(BECHARA, depoimento oral, 2006).
Muitas experiências metodológicas foram testadas no Vocacional e no
Experimental da Lapa, que recebia visita de professores interessados na
aplicação dos novos conteúdos.
Sangiorgi era freqüentador das reuniões, preocupado com as respostas
dos alunos às novas experiências.
O Sangiorgi aproveitava o conhecimento e a pratica do
Vocacional. Tinha um vínculo muito grande entre o Vocacional e o
GEEM. Ele discutia, perguntava muito, conversava muito comigo.
Queria saber como os alunos respondiam, do que os alunos
gostavam Nesse sentido eu achei ótimo, o interesse do Sangiorgi
e suas contribuições para nossa experiência. (BECHARA,
depoimento oral, 2007).
O ambiente criou possibilidades para o encontro de nossos protagonistas e
o início de muitas parcerias profissionais:
71
Eu fazia cursos e ministrava cursos no Experimental da Lapa,
Grupo Escolar Experimental Edmundo de Carvalho, quando a
Anna (Franchi) veio trabalhar lá. Comecei a conhecê-la e admirar
seu trabalho como professora primária. Já a Lucília (Bechara), era
professora de matemática no Experimental. Aí encontramos-nos.
(LIBERMAN, depoimento oral, 2006).
A professora Anna Franchi, professora muito atuante durante o MMM, com
muitas produções para o Ensino Primário, conheceu Liberman e Bechara nos
espaços de estudo criados pelo GEEM, Vocacional do Brooklin e Experimental da
Lapa.
Nessa época Franchi trabalhava como professora primária no Experimental
da Lapa, aplicando em sua classe as atividades criadas nos grupos de estudo.
Mais tarde licenciada em matemática pela USP, foi designada como Supervisora
de Matemática do Grupo Experimental Dr. Edmundo de Carvalho.
Os cursos preparatórios para o Ginásio Vocacional já começavam
divulgando a Matemática Moderna, com estudo e leitura de bibliografia publicada
referente às novas idéias difundidas pelo Movimento.
A ementa dos cursos variava de acordo com o interesse dos participantes,
porém eram privilegiados os assuntos referentes a novas metodologias de ensino
e as idéias divulgadas pela psicologia da aprendizagem. Os cursos eram gratuitos
para todos os professores, funcionando como uma capacitação optativa, fora do
horário de trabalho. Apesar dos cursos não serem voltados especificamente para
o Ensino Primário, estudava-se muito, os textos de Piaget, motivando alguns
professores ao aprofundamento da aprendizagem infantil de matemática.
Nos cursos, após os estudos baseados na bibliografia publicada pelo
SMSG, os professores discutiam e criavam atividades que poderiam ser aplicadas
e depois avaliadas.
O Vocacional começou em 1961, eu fui supervisora da área de
matemática de São Paulo e fazia supervisão, organizava currículo,
planejamento, orientava professores, etc. Foi o local onde
começou a MM. Eu diria que foi lá que foi implantado a MM. Nós
começamos já com a MM. Nem tinha livros, a gente fazia o que
chamávamos de bateria de atividades. Não adotávamos livros,
justamente porque nós queríamos exercitar. (BECHARA,
depoimento oral, 2007).
72
A convivência no GEEM, nos cursos do Ginásio Vocacional e Experimental
da Lapa uniu as professoras Manhucia P. Liberman, Lucília Bechara e Anna
Franchi nos estudos sobre a aprendizagem infantil e, a partir de 1963, elas
passaram a organizar e ministrar cursos em todo o país.
O primeiro curso organizado pelo GEEM, em convênio com o
Departamento de Educação do Estado, destinado a professores primários,
aconteceu em São Paulo no período de 5 a 15 de fevereiro de 1963. O curso foi
ministrado pelas professoras Liberman, Bechara e Franchi e contou com a
participação de 300 professores. O curso tinha como objetivo atualizar e introduzir
conteúdos matemáticos aos professores. (Folha de São Paulo, 06/02/1963, apud
NAKASHIMA, 2007).
Nessa fase, o GEEM consolida seu papel de formador. No exame realizado
nas atividades patrocinadas pelo GEEM, a partir de 1963, percebemos o caráter
predominantemente de formador de professores primários nos novos conteúdos,
ainda sem grande ênfase na divulgação de novas metodologias. Os cursos
objetivavam instrumentalizar os professores para as reformas pretendidas.
Tais cursos eram definidos pelo GEEM e veiculados pela imprensa como
sendo de aperfeiçoamento, visando a “dar conteúdos e treino” adequados sobre o
que de mais moderno os professores poderiam realizar em matemática em suas
escolas, a exemplo do que vinham fazendo países adiantados em educação com
seus professores. (FOLHA DE SÃO PAULO, 16/06/63).
Podemos supor que com a introdução da matemática moderna em todas
as discussões referentes à educação, a procura por formação pelos professores
primários determinou a organização de cursos e publicações que dissipassem a
insegurança desses professores.
À medida que as professoras foram organizando e ministrando cursos,
produziram muitas atividades. Muitas experiências foram realizadas no
Experimental da Lapa, coordenadas pela professora Anna Franchi em suas
classes, pelos estudos realizados nos Ginásios Vocacionais por Bechara e na
escola experimental Peretz por Liberman.
73
Podemos verificar a influência das novas idéias sobre aprendizagem infantil
através do crescimento dos investimentos destinados à educação na escola
primária. Como visto anteriormente, todas as tendências mundiais levavam para a
reforma do ensino, dando origem a acordos nacionais e internacionais que
pudessem viabilizar as modificações pretendidas.
O livro “Introdução da Matemática Moderna na Escola Primária” (1963),
destinado à capacitação dos professores, na linguagem da teoria de conjuntos, foi
à primeira produção das professoras Liberman, Bechara e Franchi. Esse trabalho
era extremamente estruturalista, explanando a teoria de conjuntos, as
propriedades estruturais e a linguagem simbólica. Um livro teórico, conceitual,
sem referências à metodologia e às práticas de sala de aula.
O ano de 1964
30
, rico em investimentos, foi marcado pelos convênios de
várias instituições com o GEEM, que patrocinou cursos em São Paulo para
professores. Podemos destacar os cursos de férias promovidos pelo IBECC, os
cursos realizados pela televisão, patrocinados pela Secretaria de Educação, USP
e Mackenzie. Todos os cursos visavam capacitar os professores nos novos
conteúdos difundidos pelo MMM.
Com a matemática moderna no centro das discussões, suas promessas
otimistas, divulgadas pela imprensa, nos livros didáticos e periódicos, e seu
ideário apoiado pelo governo por meio de financiamentos, há um aumento da
demanda por formação, nos novos conteúdos introduzidos.
Essa pluralidade de fatores impulsionava a criação de cursos de
capacitação e a participação, nunca vista, de professores primários em várias
partes do país.
Podemos contabilizar, analisando Nakashima (2007), cerca de 40 títulos na
imprensa referindo-se ao MMM e oferta de cursos pelo Grupo, que chegou a atrair
900 professores interessados em 1963. Todos os cursos ofertados a professores
primários pelo GEEM eram coordenados pela equipe formada pelas professoras
Manhucia P. Liberman, Lucília Bechara e Anna Franchi.
30
Em 1964, o acordo MEC - USAID prioriza investimentos na escola primária. É assinado um acordo para
desenvolvimento e aperfeiçoamento do Ensino Primário, que perdurou até 1968 (ROMANELLI, p. 212).
74
É possível inferir, pela análise do número de cursos oferecidos pelo GEEM,
que a crescente procura e freqüência de professores nesses cursos se devessem
à insegurança dos professores na aplicação da nova abordagem da matemática.
Com isso o GEEM tornou-se referência para o Ensino Primário passando a
respaldar todos os projetos destinados ao ensino de matemática para crianças.
Podemos dizer que a ação do GEEM, em São Paulo, foi um dos
mecanismos utilizados pelo Estado, para divulgar e fazer circular as novas
propostas de ensino e implementar as novas diretivas para o ensino de
matemática.
Os livros didáticos também começam a introduzir as novas propostas para
o ensino de matemática. Com o sucesso do livro de Sangiorgi em 1963 pela
Editora Nacional, baseado no ideário do MMM, com modelo estruturalista, ênfase
na linguagem de conjuntos e com projeto editorial inovador, a editora convida
Manhúcia P. Liberman para escrever um livro direcionado ao ensino primário.
Quem foi convidada fui eu na verdade, mas eu não quis fazer
sozinha. Primeiro porque eu não era professora primária, e achei
muita responsabilidade. Convidei a Lucília e a Anna. A Lucília era
minha colega dos cursos do GEEM e a Anna, conheci no
Experimental da Lapa. Ela era professora primária e tinha muito
pra contribuir pro tal do livro. Escrevemos primeiro o livro que
chamava Introdução da Matemática Moderna destinado a
professores primários com conteúdos divulgados pelo MMM. No
primário não tinha nem um livro feito por matemático. (LIBERMAN,
depoimento oral, 2007).
Nessa época, as autoras começam a discutir a elaboração do livro e são
apoiadas pela editora, quando decidem seguir a proposta estruturalista defendida
pelo MMM, porém com adaptações relevantes em conseqüência da faixa etária
para a qual o livro seria destinado. Partem da premissa de que no Ensino
Primário, as crianças calculam somas, diferenças, produtos, quocientes, partindo
de situações concretas e aplicando as propriedades das operações.
Comecei a trabalhar no ginásio e no meio do caminho em 63/64, a
Manhúcia me chamou dizendo que tinha uma proposta para fazer
um livro para o Ensino Primário. Era uma proposta da editora
Nacional. Então comecei a dedicar mais estudos ao primário, em
cima da proposta de escrever um livro para o Ensino Primário,
esta era a intenção. O Sangiorgi tinha um livro para o ginásio e aí
a editora queria também para o primário. Nós começamos
75
inspiradas em como vamos trabalhar os algoritmos, dentro dessa
idéia de estrutura. (BECHARA, depoimento oral, 2006).
Poucos eram os materiais disponíveis para estudo sobre a aprendizagem
infantil, o que acarretou a procura por bibliografia estrangeira. As professoras,
sentindo a necessidade de maior aprofundamento, alimentavam suas referências
com autores estrangeiros, que se destacavam em Congressos e eventos
internacionais, os quais o GEEM divulgava. Elas utilizaram muito material,
publicado pelo ISMG
31
e IREM
32
.
Começamos a ler..., a traduzir material estrangeiro, porque tinha
pouca coisa. Nós lemos muito material americano, do Biberman,
de um grupo francês e muitas publicações francesas. Estudamos
muito a Lucienne Felix, uma pessoa que trabalhou muito com
crianças pequenas. Foi com muito material de fora do país que
nós fomos construindo as nossas idéias. Não havia bibliografia,
tivemos que construir a nossa. (BECHARA, depoimento oral,
2006).
As professoras buscavam formação em relação à aprendizagem infantil,
em grupos de estudos situados fora do país. O ISMG, um grupo com grande
influência sobre os matemáticos brasileiros, que mantinha preocupações com o
Ensino Primário, foi muito consultado e utilizado por elas.
As experiências metodológicas pesquisadas sempre priorizavam a
aquisição de conceitos pela atividade da criança em jogos e a manipulação de
materiais concretos, possibilitando a descoberta, intuitivamente, sem ênfase no
rigor da linguagem.
O GEEM tornou-se referência para a educação matemática na época.
Todos os cursos oferecidos pelo grupo eram plenamente divulgados na imprensa
e valorizados pelas autoridades. O carisma das professoras que divulgavam o
MMM, no primário, encontrava receptividade em todos os setores da sociedade.
Além disso, São Paulo era lembrado como centro das inovações preconizadas
pelo ideário do MMM era para onde os financiamentos para novos cursos e
estudos eram revertidos.
31
International Study Group for of Mathematics, fundado em 1962 pela UNESCO.
32
Institut de Recherche sur L’ Enseignement des Mathématiques, França.
76
Podemos dizer que, em 1965 o GEEM já era considerado em todo o Brasil
como centro de estudos e inovações no ensino da matemática. Verificamos a
dimensão desse prestígio pelo enorme espaço dedicado na imprensa à
divulgação de suas atividades.
No auge de seu prestígio, em 1966, o Grupo coordena o V Congresso
Brasileiro do Ensino da Matemática, em São José dos Campos, cujo temário é
Matemática Moderna na escola secundária: articulações com o Ensino Primário e
com o ensino universitário. Pela primeira vez, matemáticos estrangeiros vêm a um
Congresso no Brasil.
Esse congresso contou com presença de pesquisadores internacionais
como George Papy, falando sobre “Métodos e Técnicas para explicar conceitos
novos de Matemática”, fazendo uma comparação com crianças de várias idades,
e mostrando, assim, as suas atitudes.
O livro para a 1ª série do Ensino Primário elaborado por Liberman, Franchi
e Bechara é lançado em 1966/1967, com enorme sucesso. O livro pode ser
considerado como diferente de todos os livros que circulavam nas escolas
primárias da época. As autoras contam que não havia nessa época, livro de
matemática para o Ensino Primário, escrito por matemático. Geralmente, usava-
se um livro único elaborado por professores primários ou pedagogos.
O primeiro livro que escrevemos... Era de folhas soltas, o de
primeira série. Eu fiz um livro de folhas soltas porque eu via as
professoras primárias carregadas, cheias de material para corrigir
em casa... Porém as professoras não gostaram porque tinham
que organizar as folhas. É difícil agradar a todo mundo.
(LIBERMAN, depoimento oral, 2007).
Diversas reflexões sobre essa publicação, primeira escrita por educadores
matemáticos para a escola elementar, podem ser feitas considerando as idéias
postas por Chartier (1991), chamando a atenção sobre a necessidade de
reconhecer a nova materialidade do livro.
Assim, podemos inferir algumas considerações sobre a maneira como o
livro foi publicado e veiculado com intensa divulgação na mídia. Podemos
considerar o livro como uma estratégia para divulgar as reformas propostas para
77
o ensino de matemática. Vendia a idéia de uma proposta renovadora,
fundamentada cientificamente na psicologia da aprendizagem.
Figura 2 - Capa do Primeiro livro de Bechara, Liberman e Franchi.
As inovações trazidas na publicação da Companhia Editora Nacional, tanto
na diagramação como no estilo, carregavam uma nova concepção de editoração,
diferenciando a publicação de todos os livros da época: folhas soltas, desenhos
coloridos e nova distribuição de conteúdos que, mais tarde, seria oficializada pelo
Programa da Escola Primária, de 1969, e pelos Guias Curriculares, de 1975.
O impresso carregava grandes pretensões de ser caracterizado como
moderno, prático, agradável no manuseio, com uma proposta metodológica de
bases científicas.
78
Figura 3 - Curso Moderno de Matemática, V. 1, p. 4 e 5 - colorido diferenciado para a época.
Escrevemos este livro porque, sendo professoras de escola
secundária, achamos que as crianças poderiam vir com uma
bagagem muito melhor. Vimos à necessidade de nos voltarmos
para o primário. No secundário a matemática já tinha deixado de
ser um bicho-de-sete-cabeças, era preciso fazer o mesmo com o
primário. A criança poderia aprender pensando e fazendo. Diante
da ausência de material para a criança fomos solicitadas a
escrever alguma coisa. Como dávamos os cursos, os professores
nos pediram material para trabalhar. Outra preocupação nossa é
que a criança compreenda tudo que faz, até o resultado da
tabuada. Quando apreende por memorização ela fica só no que
aprendeu pela compreensão, pode resolver nossos problemas.
(LIBERMAN, depoimento oral, 2007).
As autoras divulgaram o livro como sendo produto das experiências
realizadas em classes experimentais, abalizadas nos novos conceitos da
matemática moderna e nas idéias de Piaget. Justificam o uso de cores, de história
em quadrinhos e do diálogo com o aluno, pelas novas necessidades da criança,
em decorrência da evolução tecnológica e do conhecimento da psicologia da
aprendizagem.
79
Figura 4 - Prefácio livro Curso Moderno de Matemática.
Podemos dizer que foi o primeiro livro de matemática consumível. A idéia
era fazer um livro que facilitasse a vida do professor, numa proposta
estruturalista, aplicada aos algoritmos das operações fundamentais. Dentro dessa
idéia de estrutura, através de alguns fatos fundamentais conhecidos, construíam
novos fatos, utilizando a propriedade distributiva.
O primeiro volume era totalmente focado em fatos matemáticos, sem
grandes referências ao uso de materiais concretos.
Nos volumes posteriores, as autoras abandonaram o projeto do livro com
folhas soltas, por solicitação das professoras usuárias que, na prática,
perceberam a dificuldade das crianças menores com a organização.
Após a conclusão do volume 2 do livro, a professora Anna Franchi saiu do
grupo de autores, mas continuou no GEEM, organizando e ministrando cursos
para os professores primários.
80
A coleção “Curso Moderno de Matemática foi extinta em 1973, na 9ª
edição, quando foi reformulada e lançada como GRUEMA (Grupo de Ensino de
Matemática Atualizada), em 1974, com 8 volumes, para as oito séries do 1º Grau.
Podemos supor que as mudanças na coleção possam ter sido
determinadas pelas reformas propostas na Lei 5.692/71, referentes à extensão do
ensino obrigatório para oito anos, definindo a necessidade da redistribuição dos
conteúdos e a reformulação da coleção, agora com oito volumes, destinada a
todo 1º Grau.
As idéias do Movimento já se encontravam em sala de aula pelos livros
didáticos, mídia e pressão social, porém ainda não havia sido oficializado por
documentos oficiais no estado, para ser institucionalizado.
Com a criação do FNDE
33
(Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação), em 1967, percebemos uma política de distribuição e aplicação de
recursos na educação, agora atrelado a um Plano Nacional de Educação. São
Paulo precisava reorganizar seu sistema de ensino de acordo com o Plano
Nacional de Educação, por meio de um plano estadual de educação para usufruir
das futuras verbas oriundas do FNDE.
Cumprindo as determinações do Conselho Federal de Educação, iniciam-
se as discussões sobre o Plano de Educação do Estado, com o objetivo de
expansão e melhoria na qualidade do ensino.
Uma das primeiras providências do governo paulista foi o
Ato Nº 148, de
31/5/67, no qual são configuradas as intenções do Governo para uma política
educacional de expansão do atendimento, com o aumento substancial de vagas
para o Ensino Primário.
Com os cursos de formação, publicações e mídia discutindo as inovações
no ensino da matemática, a imprensa anuncia com entusiasmo, a composição da
equipe responsável pelos estudos preliminares, com prazo de 90 dias para
apresentar projeto para a reformulação do Ensino Primário paulista, com
promessas de melhoria e aplicação de recursos. (O Estado de São Paulo
5/10//67).
33
O FNDE tinha como principal finalidade, capturar recursos e aplicá-los em financiamento de projetos de
ensino.
81
O Ato Nº148 resolve constituir um grupo de trabalho com objetivo de
elaboração de projeto para reorganização curricular e dos programas do curso
primário no Estado de São Paulo. Esse grupo foi encarregado de elaborar o
projeto de reorganização curricular e os programas do curso primário em São
Paulo. A professora Manhúcia P. Liberman foi convidada a chefiar esse grupo, por
suas atividades no Setor de Medidas e Pesquisas Educacionais, aliado a seu
prestígio junto aos professores primários, por seus cursos de capacitação e o
sucesso como autora de livro didático.
Esse grupo de trabalho não deve preparar novo conteúdo para a
escola primária absorver (ou decorar, como é a prática
dominante). Há uma finalidade maior, muito maior: nova
concepção de escola primária e alteração de sua estrutura. (SÃO
PAULO, 1969, p. 136).
A partir da escolha da professora Liberman para chefiar a equipe, podemos
supor as intenções do Estado em oficializar as mudanças curriculares no ensino
de matemática, já que Liberman era uma das principais defensoras do ideário do
MMM.
Não fui convidada para a equipe como representante do GEEM,
eu trabalhei com o professor Cândido de Oliveira anteriormente.
Na verdade foi um convite do professor Cândido (Chefe do Ensino
Primário de São Paulo). (LIBERMAN, depoimento oral, 2007).
82
Figura 5 - Folha de São Paulo 5/10/67
São Paulo, utilizando-se da liberdade e flexibilidade sugeridas e cumprindo
o princípio de descentralização preconizado pela Lei 4.024/61, lança seu projeto
de reorganização, cumprindo determinação legal, ao mesmo tempo em que tenta
equacionar a crescente demanda por vagas no Estado.
Neste mesmo período juntamente com a reorganização do sistema de
ensino, as discussões em torno das propostas da Matemática Moderna envolviam
toda a comunidade escolar. Segundo Nakashima (2007) a mídia era receptiva às
idéias do MMM, noticiando fatos relacionados às reformulações curriculares onde
83
membros do GEEM, estivessem vinculados, contribuindo com a inclusão do tema
em todas as questões referentes à educação.
Após dois anos de discussões e reformulações, a Secretaria Estadual de
Educação publica o primeiro Guia Curricular elaborado para o Ensino Primário do
Estado de São Paulo, objetivando a reformulação curricular e a reorganização da
orientação pedagógica.
O currículo de matemática nesse Programa ainda era baseado na escola
primária de quatro anos, com conteúdo muito extenso, determinados pelos
exames de admissão e o sentido de terminalidade impregnado no currículo.
Com as pressões sociais da população paulista pela extensão do maior
número de anos de escolaridade, e as ações do governo para a essa expansão,
incluindo a extinção do exame de admissão e o alargamento de vagas no ginásio,
o Ensino Primário necessitava de mudanças para receber e preparar essa
clientela nova e heterogênea.
Com a divulgação do Programa e consequentemente a presença da Teoria
de conjuntos nos livros didáticos, o MMM torna-se alvo de periódicos.
Intensificam-se a publicações para professores, esclarecendo dúvidas sobre a
teoria de conjuntos e as possíveis metodologias para sua introdução junto às
crianças, já que documentos oficiais exigiam dos professores, esse
conhecimento.
As estratégias adotadas pelo governo perpassavam os cursos de formação
oferecidos pelo GEEM, aos professores primários, sobre as novas metodologias e
materiais didáticos empregados em sala de aula.
Esses cursos eram cada vez mais reivindicados e elogiados pelos
professores, pois descobriam que podiam entender a matemática, antes tão
temida. Bechara (depoimento oral, 2007) acredita que o entusiasmo demonstrado
pelos professores em relação à matemática pode ser explicado, pela clareza
adquirida. Nos cursos esses professores gostavam de aprender e entender
matemática, segundo essa professora.
Os cursos eram pautados na atividade constante do aluno, no caso,
professores. Tinham o objetivo de propiciar aos professores “o fazer matemático”.
84
Eles faziam as mesmas atividades que seus alunos poderiam fazer, com o uso do
material concreto, materializando os conceitos abordados.
Contudo, o tempo era pouco para a formação conceitual e metodológica de
todos os antigos professores da rede, além dos muitos ingressantes, com a
política de expansão do ensino.
Ao mesmo tempo em que esse professor primário ficava deslumbrado com
sua nova compreensão da matemática, percebia-se a angústia gerada pela
insegurança na aplicação em sua sala de aula, gerando a procura por novos
cursos.
Como as professoras não conseguiam acompanhar, nós fomos
minimizando. Então se você pegar o meu livro de 1966 e os
posteriores, vai achar grandes mudanças. Nós não tivemos tempo
hábil para ensinar para todo mundo. Foi bem na hora que abriu a
escola pública. (LIBERMAN, depoimento oral, 2007).
Como estratégia para a formação dos novos professores, nas novas
propostas curriculares, em convênio firmado entre a TV Escola, o GEEM e o
Departamento de Educação, os cursos pela televisão intensificam-se em 1968,
visando atender a um maior número de professores primários, visto que, o
conhecimento da linguagem de conjuntos tornou-se imprescindível em função da
incorporação desses conteúdos, nos modernos livros didáticos.
Com o interesse voltado para o Ensino Primário, Bechara investiga novas
possibilidades de metodologia, já divulgadas pelo mundo, e por iniciativa própria,
participa do 21º Congresso - CIEAEM, que contou com a presença de Dienes, em
1967.
O GEEM tinha a função de aglutinar e trazer idéias. Nós
viajávamos bastante. Eu quando podia ia muito aos congressos.
Em 1967 fui ao Congresso na Espanha e trouxe os livros de
Dienes. (BECHARA, depoimento ora, 2006).
Dienes compactuava com ideário do MMM: Era estruturalista como Piaget,
tratava à matemática como uma estrutura única, porém utilizava uma metodologia
mais concreta.
Conjuntos, para Dienes, era um conceito muito concreto e trabalhado com
material didático manipulativo. Criticava a maneira muito formalista usada pelos
85
modernistas. Preocupavam-se com o funcionamento das estruturas, os processos
de construção do conhecimento pelas crianças.
Suas idéias para o ensino de matemática entusiasmaram os professores
primários, que descobriam com o uso dos materiais concretos a verdadeira
estrutura dos sistemas de numeração e começaram a entender o porquê dos
procedimentos adotados nos algoritmos das operações, o que permitia que o
algoritmo, que era simplesmente uma coisa mecânica, pudesse ter significado.
Podemos confirmar o alargamento da rede estadual de ensino, por meio do
relatório da Chefia do Ensino Primário-1968, que relata a criação de 10 novas
Delegacias de Ensino, 5.000 novos cargos de professores primários e 800 novas
vagas de técnicos de Orientação Pedagógica, para início imediato, sem tempo de
orientações e adaptações. (SÃO PAULO, 1969, p. 158).
O crescimento da rede continua e, em 1970, é publicada a Lei 7.459/70 em
São Paulo, que criou mais 2.600 cargos de professores primários.
A promulgação da Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71 veio complementar
os objetivos postos pelo governo federal e estimular os acordos de
financiamentos estrangeiros em relação à expansão e reformulação dos sistemas
de ensino.
O núcleo comum, fixado pelo Conselho Federal de Educação, era
obrigatório para todo o território nacional, tendo a parte diversificada, fixada pelos
Conselhos Estaduais de Educação, e tendo como objetivo atender às identidades
locais e diferenças individuais dos alunos.
Com a implementação da Lei, muitos estados viram-se na responsabilidade
de organizar ou reformular sua estrutura de educação. É necessário, contudo,
olharmos para a diversidade e desigualdade entre esses estados, para
compreendermos a publicação de Pareceres, Indicações e Resoluções,
decorrentes das dúvidas para a implantação da lei.
Como São Paulo implementou as reformas previstas pela lei? Como o
ideário do MMM foi divulgado, visando às mudanças curriculares? Como foram
implementadas as novas diretivas para o ensino de matemática? Como ficou o
currículo de matemática, agora distribuído em oito anos?
86
As questões formuladas vão sendo problematizadas, à medida que
verificamos os documentos oficiais publicados com o intuito de fazer circular e
subsidiar as reformas pretendidas.
São divulgadas várias normatizações, tanto pelo governo federal como
estadual, com cunho elucidativo, para esclarecer os Estados sobre suas novas
atribuições quanto a seus currículos e suas responsabilidades.
Entre esses documentos, podemos citar a aprovação do Parecer nº 853/71,
em 12/11/71, pelo Conselho Federal de Educação, esclarecendo a nova
concepção de currículo adotada e fixando o Núcleo Comum para os currículos de
1º e 2º graus.
O Parecer Nº 339/72, que trata da formação especial no currículo do 1º
grau, afirma que o currículo pleno terá uma parte de educação geral e uma outra
de formação especial, sendo que no 1º grau a formação tem o objetivo de
sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho, e vem também elucidar
dúvidas quanto à organização e distribuição de carga horária.
Fica evidente que, para uma implementação desse porte, vários sistemas
de ensino precisaram de tempo, formação e novas estruturas físicas para se
adequar às suas novas incumbências.
A catalogação dos impressos oficiais destinados aos professores,
publicados a partir de 1972, revela um aumento substancial desse tipo de
impresso para elucidar lacunas deixadas pela lei.
Na educação, a Lei 5.692/71, obrigava os governantes e entidades
governamentais a assumir suas competências na orientação para a criação dos
novos sistemas de ensino e encaminhar as diretrizes do governo para a educação
nacional. Esta Lei além de fixar as responsabilidades de estados e municípios na
criação e modificação de seus sistemas de ensino, determinou competências na
Reforma do ensino da escola de oito anos.
Todo o movimento gerado pelas novas incumbências de estados e
municípios criou a necessidade de uma regulamentação mais especifica, para
nortear e esclarecer possíveis lacunas deixadas na Lei federal e auxiliar na
formação dos novos sistemas de ensino.
87
O ponto de partida para a implantação da escola pública de oito anos, no
Estado de São Paulo, firmou-se no estudo da legislação federal, e desencadeou
decretos, resoluções e pareceres referentes à construção de currículo,
subsidiando e regulamentando a nova reorganização curricular.
O primeiro documento por nós selecionado, relacionado com a reforma de
ensino do Estado de São Paulo, intitula-se: “Plano de Ação para a Reforma de
Ensino de 1º Grau, publicado em 1972, pela Secretaria de Educação do Estado.
Foi distribuído com a intenção de divulgar o plano de ação do governo paulista
para a educação.
A Secretaria trata dos objetivos do plano para uma ação política provinda
da Lei 5.692/71 e indica à construção do novo currículo como a base para a
reformulação dos sistemas de ensino. Assim, todas as medidas programadas
para a implantação do ensino de 1º grau prendem-se, primeiramente ao
detalhamento dos Guias Curriculares. Ressalta que a nova Lei 5.692/71 trouxe
um conjunto de definições políticas que deveriam orientar os novos sistemas
educacionais e, desta maneira, estudos e interpretações acerca da lei tiveram que
ser feitos antes de qualquer outra ação.
À medida que lemos o Plano de Implementação da Escola de oito anos,
percebemos seu minucioso planejamento, com sua execução dividida em quatro
etapas, partindo do treinamento legal até a capacitação de professores. O projeto
era grandioso e pretendia atender a todos os professores da rede. Sua forma
revela o modelo tecnicista adotado no Brasil, retrato da política educacional que
justificava a educação pela via da racionalização e difundia a implantação das
medidas tecnicistas de ensino.
Nesse contexto, a modernização do ensino defendida pelo MMM era a
proposta mais adequada à política educacional estabelecida pelo governo, pois
prometia uma matemática mais utilitária, com economia de pensamento, mais
lógica e científica, já que o modelo de desenvolvimento do currículo adotado
realçava a racionalidade técnica do processo-produto, ligado a uma ênfase na
eficácia e eficiência da produção.
Na pedagogia tecnicista, a ênfase está na operacionalização dos objetivos
para modelização de todo o processo educativo. A organização racional dos
88
meios, também ocupa papel principal, sendo o professor e o aluno relegados à
condição de executores de um processo cuja concepção, planejamento,
coordenação e controle ficam a cargo de especialistas.
Em meio a esse contexto, a equipe selecionada para a elaboração dos
novos Guias Curriculares de São Paulo era representante e defensora do ideário
da Matemática Moderna.
O grupo inicial era composto por professores de matemática pertencentes
ao quadro do magistério público do Estado de São Paulo, muito restrito na época.
Devido ao número reduzido de formandos saídos das Universidades e o rigoroso
processo de ingresso eliminatório, eram raros os professores pertencentes à rede
disponíveis para assumir o comando da reforma curricular do Estado, pela
implementação dos Guias. Da maneira como foi planejada, essa elaboração
exigia dedicação quase integral por um longo período.
Dentre as reduzidas opções, a equipe inicialmente era composta pelos
professores de Matemática efetivos do Estado: Almerindo Bastos, Lucília
Bechara, Benedito Antonio da Silva e Anna Franchi, todos pertencentes ao GEEM
e divulgadores das reformas propostas pelo MMM.
O Professor Almerindo Bastos é licenciado pela USP. Ingressou no
magistério público de São Paulo em 1954, e permaneceu até a aposentadoria. Foi
colega de faculdade do professor Ubiratan D’Ambrosio, que mais tarde o convidou
para a PUC-Campinas. Sua vida profissional, porém, foi dedicada ao ensino
público.
Também defensor dos novos métodos de ensino apregoados pelo MMM,
foi convidado a coordenar a elaboração dos Guias Curriculares de São Paulo e
produziu vasto material enquanto foi membro da CENP
34
.
Bastos organizou e participou de muitos cursos sobre os novos conteúdos
trazidos pelo MMM em Santos, São Paulo.
34
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas.
89
Figura 6 - Jornal A Tribuna de Santos-11-05-65-Apud Nakashima, 2007.
Em entrevista, D’Ambrosio (2006) concorda com nossas hipóteses sobre a
composição das equipes convidadas a elaborar documentos oficiais e a participar
de projetos ligados à educação Matemática. Eram quase sempre formadas pelas
mesmas pessoas, em virtude da não existência de muitos matemáticos
especialistas em educação.
Para os matemáticos interessados em educação, não havia opção nos
mestrados da época. Os que dedicavam seus estudos ao ensino de Matemática o
faziam por meio do GEEM ou se integravam a projetos ligados a Universidades,
financiados por agências governamentais.
90
Tanto os participantes do GEEM como os integrantes do PREMEM
35
trabalhavam ativamente na produção de bibliografia em seus grupos, ministravam
cursos, palestras, realizavam capacitação de professores e alguns também eram
convidados a preparar livros didáticos.
Podemos afirmar que, em grande medida, faziam parte de um grupo seleto
e comprometido com a reforma de ensino de matemática, sendo assim
configurados, como referência no Brasil na área de educação Matemática.
Todos os projetos que envolviam Educação Matemática recorriam aos
membros desse grupo, muitos também participantes do GEEM, que buscavam
subsídios e mão- de- obra especializada.
As estratégias impostas com a introdução dos novos conteúdos
matemáticos nas séries iniciais exigiam do professor uma implementação rápida e
eficaz, de acordo com os Guias Curriculares, gerando inseguranças e demanda
de subsídios e orientações para a aplicação das novas metodologias sugeridas.
O momento da realização dos
Guias originou a produção de outros
documentos, em decorrência dos movimentos dos sujeitos da escola.
Tanto o processo de escolarização quanto as culturas escolares
não são pressupostos; eles são o processo e o resultado das
experiências dos sujeitos, dos sentidos construídos e
compartilhados e/ou disputados pelos atores que fazem à escola
(...) é preciso que eu considere que os sujeitos que a constroem
guardam, eles também, diversos pertencimentos e identidades
pelas quais as culturas escolares estarão continuamente
informadas. (FARIA FILHO, 2005).
Esse movimento dos professores, insistentemente reivindicando sugestões
e formação, originou muitos outros documentos. Um dos caminhos possíveis para
concretizar a proposta defendida nos
Guias foi à formação por meio desses
documentos, que continham sugestões de atividades e subsidiavam os
professores quanto às alterações curriculares propostas.
Podemos dizer que
Os “Subsídios para a Implementação do Guia
Curricular de Matemática – Álgebra - 1ª a 4ª Séries
, com versão preliminar
35
D’Ambrosio, afirma que como professor da UNICAMP, participou do PREMEM (Programa de Expansão e
Melhoria do Ensino Médio), projeto altamente financiado e cujos integrantes juntamente com os membros
do GEEM, tinham muito prestígio na área.
91
veiculada em 1977, foi resultado desse movimento dos sujeitos da escola descrito
por Faria Filho.
Os impressos oficiais estudados revelam que as idéias de Zoltan Dienes
foram as mais difundidas no Ensino Primário, motivando várias experiências
metodológicas no ensino de matemática, difundidas na imprensa, como uma nova
alternativa de adequação da MM, utilizavam materiais concretos como os blocos
lógicos
36
.
Os blocos lógicos ensinam tudo. A metodologia de Dienes é uma
solução para os problemas de aprendizagem de Matemática
(Jogos lógicos de Zoltan Dienes, O Estado de São Paulo,
28/06/1970).
Como dissemos a abordagem matemática defendida por Dienes, na qual
os fatos matemáticos eram materializados por meio de materiais concretos,
entusiasmava professores e dava vigor ao ideário do MMM, que nessa época já
recebia críticas, até de Dienes.
Professora Lucília Bechara oferece um curso em Campos (RJ)
sobre os materiais de Dienes e atrai cerca de 600 professores.
(SOARES, 2001, p. 86).
Dienes ministrou vários cursos para professores, inclusive em Santos e em
São Paulo, empolgando educadores com as atividades demonstradas e
enfatizando as estruturas matemáticas com o uso de materiais concretos.
O momento era de reforma e expectativas em relação aos novos
paradigmas adotados. Nesse momento, podemos dizer que a escola primária
paulista priorizava a metodologia.
A necessidade de divulgação para toda a rede de Ensino Público dos
novos conteúdos introduzidos pelo MMM, juntamente com os teóricos que
fundamentavam essas propostas, levaram a proposta curricular a enfocar a
metodologia divulgada por Dienes e suas aplicações em sala de aula.
Zoltan Dienes, matemático húngaro, doutor em matemática e psicologia,
voltou seus estudos para a formação de conceitos e os processos do pensamento
36
Um jogo de blocos lógicos é um conjunto de 48 peças geométricas divididas em três cores (amarelo, azul e
vermelho), quatro formas (círculo, quadrado, triângulo e retângulo), dois tamanhos (grande e pequeno) e
duas espessuras (fino e grosso).
92
abstrato envolvendo o ensino da Matemática. Dedicou-se principalmente a
pesquisa da aprendizagem, desenvolvendo uma nova metodologia, e defendia
uma renovação do ensino de matemática logo nas primeiras séries, adequando a
aprendizagem às estruturas psicológicas de cada idade. Dienes acreditava que,
para as crianças, a axiomatização deveria ser atingida gradativamente por meio
de atividades com materiais concretos.
O trabalho de Dienes foi encarado como preenchedor de lacuna
na proposta do MMM, pois se preocupava com a metodologia
inspirada pelo suíço Jean Piaget, que tinha como foco a
construção cognitiva da criança. Acreditava-se, também, que os
trabalhos de Dienes eram uma alternativa contra os abusos que
se cometiam em nome do MMM, como um ensino sempre voltado
para Teoria dos conjuntos e abstrações que os alunos, muitas
vezes, não tinham maturidade para aprender. (Bonafé, 2007).
Finalmente, com a publicação da Proposta Curricular para o ensino de
Matemática no 1º grau do Estado de São Paulo, em 1988, notamos uma mudança
no discurso sobre a abordagem do ensino da matemática. A ausência do
conteúdo de teoria dos conjuntos e a renovação do grupo de autores participantes
da elaboração faz-nos crer que tenha ocorrido o término da hegemonia do ideário
do MMM no Ensino Primário.
93
CAPÍTULO 4
A APROPRIAÇÃO DO IDEÁRIO DO MMM NOS DOCUMENTOS
OFICIAIS
Os documentos coletados para analisar as reformulações curriculares
produzidas pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo para o ensino
da matemática, a fim de compreender as apropriações do ideário do MMM
realizadas pelas equipes dessa Secretaria foram digitalizados e catalogados
cronologicamente. Após esta primeira classificação, cada documento foi
etiquetado, sumariado e, colocado em pastas individuais. Numa segunda análise,
acrescentamos ao sumário observações referentes à materialidade do
documento, como aspectos da capa, diagramação, número de páginas, tiragem,
público alvo, equipe elaboradora, autores mais citados, assuntos tratados,
ilustrações, etc.
O objetivo dessa primeira catalogação foi fornecer subsídios para a análise
do ideário do MMM, presente nesses documentos. Buscamos vestígios desse
ideário, verificando o que na época "foi possível fazer", "como foi feito", "em que
condição foi feito", "para quem foi feito", "por quem foi feito", procurando
considerar todas as adaptações/apropriações que tornaram o consumo do ideário
possível.
A escolha dos documentos a serem analisados nesta dissertação se deu
em função de autores dessas produções terem sido protagonistas do MMM no
Brasil e à importância desses documentos para a comunidade escolar paulista
nesse período. Desse modo, em nossa análise nos ateremos a três documentos
produzidos pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, os quais
94
consideramos basilares para a reformulação do ensino de matemática no Ensino
Primário.
Dentre os documentos oficiais referentes ao ensino nas séries iniciais,
elegemos o “
Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo”, publicado
em 1969, os
Guias Curriculares para o Ensino de 1º Grau, de 1975 e “Subsídios
para a implementação do guia curricular de Matemática”, de 1981.
4.1. O Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo-1969
No âmbito de nossas questões, o primeiro documento eleito para uma
análise mais detalhada sobre o ensino de matemática e as alterações didáticas e
metodológicas decorrentes das apropriações sobre o ideário do MMM, denomina-
se "Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo". Publicado em 1969,
foi produto de um longo processo de estruturação do sistema educacional
paulista, como já visto anteriormente, e foi proposto à comunidade escolar como
sugestão. Outro aspecto considerado foi o papel exercido pelo documento,
responsável por normatizar, nortear e incorporar a reorganização e reformulação
da escola primária paulista aos professores antigos da rede. Mais ainda, a
responsabilidade de integrar 5.000 novos professores ingressantes na rede,
somente no ano de 1968, no espírito da nova Escola Primária de São Paulo.
Lembramos que, o primeiro documento utilizado como norteador da
educação primária no estado de São Paulo foi editado pela primeira vez, em
1934, pela seção de programas escolares do Departamento de Educação do
Município do Rio de Janeiro (DF), sob a coordenação de Anísio Teixeira, que na
época era diretor geral do setor
37
e recebeu o nome de ”Programas Escolares do
Ensino Primário. O documento apresenta evidências de tentativa de divulgar os
pressupostos escolanovistas que, desde 1920, vinham sendo difundidos no Brasil.
37
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília. V.80. Nº. 195. p. 253
95
Em 1949, porém, São Paulo adotou, em caráter experimental, o seu próprio
plano escolar
38
.
Consideramos os programas do Curso Primário, implantados em
1949, e da responsabilidade de doutos educadores paulistas, uma
das contribuições mais séries e importantes à educação [...] datam
de 1949 os programas escolares de Ensino Primário, em vigor, a
título experimental, há 18 anos [...]. (SÃO PAULO, 1969, p. 152).
Figura 7 - Contra Capa do Programa do Ensino Primário-1949.
Este plano foi adotado por São Paulo até 1969, quando, seguindo
recomendações do Plano Nacional de Educação, começou seu processo de
reorganização curricular.
38
Neste documento de 1949, ainda não havia a participação de professores de matemática na elaboração de
seus planos, currículos ou propostas. Conforme, o grupo de trabalho da Secretaria (1969), neste Plano de
1949, verifica-se a ausência de metodologia definida e a falta de preocupação com a didática de ensino. Os
objetivos eram apresentados de forma desvinculada ao conteúdo, pretendendo transmitir valores culturais,
distribuídos de forma lógica e não psicológica. As disciplinas eram apresentadas de forma fragmentada,
com conteúdos extensos e inatingíveis, não redutíveis a termos de comportamento. (SÃO PAULO, 1969, p.
141).
96
Nesse quadro que acabamos de traçar, permeado pela grande
necessidade de escolarização e de aumento de vagas no Ensino Primário, foi
publicado, em 1969, o Primeiro Guia Curricular elaborado pela Secretaria de
Educação de São Paulo, intitulado “Programa da Escola Primária do Estado de
São Paulo”. O “Plano de ensino para o Ensino Primário, que constitui parte do
Guia, propunha desencadear uma mudança estrutural na educação do Estado,
com a pretensão até de implantar uma nova mentalidade no magistério primário.
O documento responsabiliza-se pela renovação da escola primária de São Paulo,
dando início à implementação dos novos currículos, programas e orientação
pedagógica. (SÃO PAULO, 1969, p. 4).
Tomamos esse Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo”
como um de nossos objetos de análise por considerarmos sua importância na
história da educação matemática no Ensino Primário, em decorrência de suas
finalidades, responsabilidades assumidas, características das equipes
elaboradoras e fundamentação teórica. Nossas escolhas recaíram inicialmente
sobre a importância de São Paulo como o maior sistema de ensino do país,
sujeito para formação de opinião e gerador de inovações.
Podemos supor que O “Programa” foi utilizado como estratégia de
divulgação da reforma do sistema educacional paulista, que fez circular
amplamente suas normativas por meio dessas publicações.
Pontuamos que, em 1970, a Prefeitura do Município de São Paulo,
assumiu delegada pelo Governo Federal, parte da responsabilidade na expansão
da rede de Ensino Primário. Criou, por meio da Lei Nº 7.459/70, 2.600 novos
cargos de professores primários para juntar-se aos 3.200 existentes desde 1967 e
cumprir as metas do plano estadual de educação. Todos esses professores,
estaduais e municipais, de maneiras diversas, orientaram-se por esse documento,
que continha as diretrizes básicas para o exercício de sua profissão e direta ou
indiretamente, precisavam conhecer suas determinações.
Dentro do âmbito de nossas questões sobre o ensino de matemática no
Ensino Primário, consideramos primordial a análise aprofundada deste Plano da
Escola Primária do Estado São Paulo, por ser esse documento uma
conseqüência direta da dinâmica de implantação de uma nova concepção
97
brasileira de sociedade, posto o panorama sociopolítico e econômico da época.
Diante dessas considerações, para nós é importante investigar qual ensino de
matemática estava proposto para esse período e compreender as possíveis
apropriações do ideário do MMM nesse documento oficial.
O processo de reformulação curricular do sistema de ensino paulista inicia-
se em 1967, com o lançamento do “Plano Estadual de Educação. No Estado de
São Paulo, o ato 148 é assinado por Antônio Barros de Ulhôa Cintra, então
Secretário de Estado dos Negócios da Educação, que justifica a importância do
projeto e a criação do grupo de trabalho para reformulação curricular em razão do
papel exercido pela escola primária.
Nas resoluções, o secretário, além de nomear os membros do Grupo,
garantiu caso necessário, a assessoria de outros setores do Estado e autonomia
ao coordenador do Grupo para recorrer a outras instâncias, durante o processo
de elaboração da reorganização curricular, e determinou prazo de 60 dias para a
execução do estudo.
Em 1968, o Estado publica e veicula em todas as suas Unidades
Educacionais a versão preliminar para o nível I e II do Programa, sugerindo
discussões para reformulações posteriores.
Já nas capas das publicações preliminares, podemos observar a
concepção da nova escola primária proposta pelo governo, onde as fotografias
sugerem uma nova disposição nas carteiras, nova metodologia de trabalho em
grupo com participação ativa do aluno e procurando atender às diferenças
individuais.
Figura 8 - Capa do Programa da Escola Primário-Nível I, 1968.
98
Figura 9 - Capa do Programa da Escola Primário-Nível II, 1968.
A necessidade de divulgação e informação para toda a rede do estado foi
suprida também pelas editoras, que, em acordo com o Estado, lançaram no fim
de 1968, uma publicação resumida do Programa.
Figura 10 - Capa Programa Escola Primária Paulista, 1968.
99
Figura 11 - Contra Capa Programa da Escola Primária, 1968.
Os editores desta versão do Programa justificam na contracapa a ajuda ao
governo e aproveitam o espaço como propaganda.
O “Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo foi uma
publicação destinada a todo o Estado, no governo de Abreu Sodré, sendo produto
do trabalho realizado por um grupo designado pelo governo estadual, a fim de
projetar as reformas na estrutura e organização educacional da rede paulistana.
Nesse mesmo período juntamente com a reorganização do sistema de
ensino, as discussões em torno das propostas da Matemática Moderna envolviam
toda a comunidade escolar. Segundo Nakashima (2007), a mídia era receptiva as
idéias do MMM, e noticiava fatos relacionados às reformulações curriculares onde
membros do GEEM estivessem vinculados, contribuindo com a inclusão do tema
em todas as questões referentes à educação.
Liberman (2006), em entrevista, destaca a importância desse documento
para a história do Ensino Primário, pois, pela primeira vez no Brasil, licenciados
em matemática preocupam-se e elaboram orientações para este segmento de
ensino.
100
Esse programa foi na verdade, a primeira vez que eu saiba que
professores de Matemática, ou seja, licenciados e bacharéis,
foram mexer na Escola Primária. Porque a Escola Primária era
uma escola que ensinava aritmética, geometria,... Mas sem o
apoio de nós, professores de matemática. (LIBERMAN,
depoimento oral, 2006).
Em 1969 é lançada a versão final do
Programa, uma publicação de 239
páginas, destinada a toda a rede pública de ensino de São Paulo. Na primeira
página encontramos a equipe designada para a elaboração do projeto. São
listados os coordenadores de cada grupo de trabalho nomeados pelo
Ato nº
148/67
e o governador Abreu Sodré com sua equipe técnica.
Figura 12 - Capa versão final-Programa da Escola Primária, 1969.
O Ato de 31 de maio de 1967 é reproduzido no Programa, assim como
pronunciamentos de todas as autoridades envolvidas nessa reorganização, com
as concepções adotadas, objetivos, metas e cronograma para a reformulação
curricular.
O documento é dividido em duas partes. A “Primeira parte” trata do
programa proposto para o Ensino Primário e a "Segunda parte" é reservada a
fundamentações teóricas e legais que respaldam e legitimam o Programa do
Estado de São Paulo.
101
Na primeira parte do Programa encontramos os itens: Introdução, Nível I,
Nível II e Atividades Agrícolas e Rurais.
Lembramos que a Lei 4.024/61 previa que ao Ensino Primário seguia-se o
ensino médio, dividido em dois ciclos: o ginasial, de quatro séries anuais, e o
colegial, de três.
Conforme o novo Programa, o Ensino Primário não seria mais organizado
por séries anuais, mas em dois níveis. Os autores ressaltam a importância do
papel do professor e da escola para o sucesso do processo educativo.
O Programa sugere a organização:
GRAU PRIMÁRIO
Idade 7 8 9 10
Séries 1ª 2ª 3ª 4ª
Níveis I I II II
Tabela 4 - Tabela baseada no Programa da Escola Primária, 1969.
Convém notar que o programa fundamenta-se na Lei 4.024/61, na qual os
objetivos do Ensino Primário são tratados de maneira bem simples.
Art. 25: O Ensino Primário tem por fim o desenvolvimento do
raciocínio e das atividades de expressão da criança, e a sua
integração no meio físico e social. (BRASIL, 1962 a, p. 5).
O “Programa” é descrito pela Secretaria Estadual de Educação como um
plano que visa a imprimir um novo conceito para a Escola Primária, com
fundamentos científicos e preocupações com objetividade e realismo que
possibilitem sua execução. Os autores o caracterizam como extremamente
simples.
(...) Maior atenção a um currículo autêntico e o programa – com
características de simplicidade, objetividade e realismo - deve ser
objeto de trabalho mito flexível e experimental (SÃO PAULO,
1969, p. 146).
Na “Introdução”, o grupo de trabalho esclarece os motivos para a
necessidade da elaboração do Programa
. O Departamento de Educação,
subordinado aos órgãos superiores, tem como o maior de seus trabalhos, a
102
reformulação do Currículo e os programas do Ensino Primário, juntamente com
sua reorganização pedagógica e modificação da seriação do ensino.
A Introdução é assinada por todo o grupo de trabalho, conforme figura:
Figura 13 - Programa da Escola Primária p. 3.
Como já explanado, dentre as resoluções do
Ato nº 148 está à constituição
do grupo de trabalho, com a possibilidade de autonomia do Coordenador do
grupo em solicitar cooperação de outros Estados e entidades nos estudos. Deste
modo, podemos entender a participação do GEEM, por intermédio da professora
Liberman no
Programa de Matemática.
Em todos os relatórios e pareceres contidos no Programa, de autoria das
Chefias de São Paulo, é expressa a alarmante condição do Ensino Primário no
Estado, carecendo de providências profundas. Ressaltam que a multiplicidade de
fatores responsáveis por essa deteriorização, inviabiliza qualquer ação isolada e
empurra para a mudança de concepção sobre a escola primária.
103
Maior atenção a um currículo autêntico e o programa - com as
características de simplicidade, objetividade e realismo deve ser
instrumento de trabalho muito flexível experimental. Mais
importante, todavia, é a implantação de nova mentalidade no
magistério. (SÃO PAULO, 1969, p. 146).
Verificamos também a intenção das autoridades em desmistificar os
poderes atribuídos à escola primaria até então.
(...) é, sobretudo a renúncia de uma ilusão. A ilusão de que uma
metodologia, prolixamente explicada e uniformemente implantada,
criará condições, por si só, de uma efetiva renovação do Ensino
Primário. (SÃO PAULO, 1969, p. 8).
Assim, o novo Programa procura diferenciar-se do anterior, exprimindo um
caráter moderno e caracterizando-se como fundamentado cientificamente.
O atual Programa da Escola Primária de São Paulo imprime novo
conceito de Educação Primária, indicando objetivos de um ensino
renovado. Mais do que uma renovação de programas,
implantação de nova mentalidade – do corpo técnico, no corpo
docente, no corpo discente, na comunidade – Seus fundamentos
são científicos, traz ele a preocupação de realismo e objetividade
preocupados com o mundo em mudança. (...) Porém, é simples
ponto de referência. (SÃO PAULO, 1969, p. 157).
Após as explicações sobre as deliberações do Ato nº 148, a equipe
designada para a tarefa, relata a trajetória prevista para os trabalhos, que
começam com a análise de um documento inicial preparado pela chefia do Ensino
Primário. Em seguida, houve a aprovação de um cronograma e a análise de
subsídios preparados por todas as delegacias de ensino com as discussões sobre
todos os documentos enviados sobre a reforma. A equipe finaliza a Introdução,
ressaltando que o documento é resultado da discussão de toda a comunidade
escolar durante três semanas.
Fica evidente a preocupação dos autores em demonstrar exageradamente
a construção democrática do documento, que é posto como produto de consenso
e discussão, atitude incomum para o período: “O Programa ora apresentado é
resultado de todo esse processo de elaboração”. (SÃO PAULO, 1969, p. 5).
Percebe-se, à medida que se vai lendo o documento, grande preocupação
em justificar e respaldar teoricamente as afirmações, por meio da citação de
104
números de decretos, leis e deliberações de órgãos superiores, apesar de intitulá-
lo como um programa experimental e sujeito às devidas reformulações.
Em relação ao espírito do programa, os elaboradores afirmam que, para
contemplar os objetivos na reorganização da escola primária, não seria suficiente
apenas uma reforma curricular, mas também a mudança de concepção sobre as
funções atribuídas à escola primária, considerada como referência para esta
reorganização. Essa escola é aquela que se identifica com as idéias do povo e da
nação, devendo ser o programa singelo, com o mínimo de escolaridade
necessário para assegurar a unidade nacional, levando em conta a realidade e
recursos de cada comunidade.
O que se propõe é escola democrática; oportunidade para todos;
escola dinâmica, realista: não impede os avanços, o progresso
individual, a diferenciação - mas sem prejuízo da
homogeneização, que há de ser o alvo da escolaridade brasileira.
(SÃO PAULO, 1969, p. 137).
Quanto às implicações do Programa, os elaboradores classificam-no como
flexível, com conteúdo funcional e que propicia a pesquisa, pois é aberto a
experiências e, por isso não sugere nenhuma metodologia específica. As
metodologias serão objetos de estudo, e posteriormente divulgados para toda a
rede, possibilitando liberdade de escolha conforme a realidade de cada escola.
Percebemos, implicitamente, reivindicações dos elaboradores quanto a
outras necessidades da escola primária. Advertem que apenas a reformulação
dos currículos e programas não irá satisfazer as necessidades, tanto nos
aspectos qualitativos como quantitativos. Acrescentam que a supressão de
exames anuais para a promoção entre as séries de um mesmo nível exigirá
providências técnico-administrativas indispensáveis e novamente alertam para a
necessidade de outras medidas complementares para viabilização desses
programas: “Do que se conclui: Programas, assistência pedagógica e
providências técnico-administrativas se completam e são indispensáveis”. (SÃO
PAULO, 1969, p. 6).
Para esse auxílio pedagógico foram criados centros-pilotos, planejados
como lugar de reflexão e experimentações, com autonomia para projetos de
aprendizagem.
105
Os autores consideram a implementação do Programa como obrigatória e
imediata, porém experimental, devendo ser acompanhado por orientação
pedagógica, cursos de esclarecimento e avaliações constantes para
reformulações. Durante todo o documento, os autores alertam para as
necessidades pós-projeto e suas implicações.
No conceito de escola primária adotado pelo Programa, os elaboradores
repetem o discurso do professor José Azanha, Diretor do Departamento Geral de
Educação, sobre a necessidade de expansão e melhoria da qualidade do ensino.
Os autores caracterizam o plano como simples e comum e, portanto,
exeqüível e adaptado a cada sala de aula, sendo as adequações
responsabilidade da escola, bem como sua continuidade.
O Programa polemiza a questão da liberdade concedida ao professor.
Afirma que sem a criatividade do professor, nenhum projeto poderá ser
executado, e renuncia, em nome dessa liberdade, a uma metodologia imposta e
explicada passo a passo, ficando sob a responsabilidade do professor a indicação
metodológica mais adequada para sua comunidade escolar.
Mas devem ser conscientes de que o êxito do programa se apóia:
a) No Professor Primário: que capaz e dedicado; nem por outro
motivo toda a política educacional primária atual dá ampla
liberdade docente ao mestre e se estrutura para apoiá-lo e
contribuir;
b) No Diretor do Grupo Escolar, que deve de ser elevado à
categoria de supervisor, como autoridade técnica e dispor de
recursos de ordem material e administrativa;
c) No Inspetor Escolar, que se viu entregue à própria sorte
desassistido, desatualizado, preso a tarefas
predominantemente administrativas, de rotina e protocolares;
d) No Delegado de Ensino, a autoridade maior, de cuja
superintendência efetiva, competência, discernimento,
agressividade e a ação emanarão as forças mantenedoras de
revisores de um ensino ativo. (SÃO PAULO, 1969, p. 158).
Também propõe a divisão e participação da comunidade na implementação
do Programa, porém não cria dispositivos, nem especifica como poderá e deverá
ser feita a intervenção; muito menos, quais intervenções são esperadas, além das
financeiras já relatadas: “(...), pois nenhuma verdadeira reforma escolar se
106
implantará enquanto as comunidades se contentarem com as más escolas”. (SÃO
PAULO 1969.p. 7).
Figura 14 - Programa da Escola Primária, 1969, p. 138.
Quanto aos objetivos do Ensino Primário, o Programa suscita várias
interpretações em decorrência da maneira muito ampla e genérica em que são
redigidos: “A Escola Primária tem finalidade soberana; ensinar a criança a
pensar”. (SÃO PAULO, 1969, p. 8).
Os autores justificam a opção por um programa “simples e singelo”, com o
intuito de evitar o fracasso em sua implementação e promover a execução por
todo o Estado, independentemente das condições específicas de cada escola.
O programa possui uma base comum e uma parte prática que se
caracteriza como iniciação para o trabalho.
107
Prossegue, categorizando o ensino do nível I, como regido por seus
aspectos práticos, e a 2ª série do nível I, como a responsável pela revisão,
consolidação, aprofundamento e ampliação do conhecimento.
No nível I, correspondente ao 1º e 2º anos do antigo Ensino Primário, e no
nível II, correspondente ao 3º e 4 º anos do Ensino Primário, constam os
conteúdos e objetivos estabelecidos como os mínimos para cada série.
O nível II é responsável pela sistematização, contando agora com uma
divisão concebida por áreas de estudo: Língua Portuguesa, Matemática, Estudos
Sociais, Ciências, Saúde, Educação Física e Iniciação Artística.
O tratamento pedagógico por áreas de estudos pode ser assim sintetizado.
Categoria curricular em que existe um equilíbrio entre a
importância conferida às experiências de aprendizagem em
situações concretas e a sistematização de conhecimentos. Aplica-
se, principalmente, nas séries finais do 1º grau (DUARTE, S.G.
DBE, 1986).
A avaliação é tida como indispensável, mas não uniforme. Novamente é
ressaltado que o Programa é experimental, cabendo aos centros pilotos
acompanharem e avaliarem as experiências em sala de aula.
Não podemos esquecer que, naquela década, as publicações privilegiaram
uma abordagem que considerava a minimização dos problemas educacionais, por
meio da modernização dos métodos de ensino, discurso esse repetido pelo
Estado, que incentivava experiências nessa área e prometia divulgação das bem-
sucedidas, que passavam pela avaliação de uma lógica científica.
Na Segunda parte encontramos artigos referentes à fundamentação teórica
do Programa e algumas considerações escritas por autoridades da época.
108
Figura 15 - Programa da Escola Primária, 1969, p. 125.
Podemos identificar as influências das idéias tecnicistas reveladas nas
tentativas de um planejamento controlado, caracterizado pela fragmentação,
hierarquização, abstração, objetivação, simplificação: “O professor deve ser um
técnico. Profissional hábil e o competente. Atualizado. Líder. O estudo é seu
descanso. Um intelectual” (SÃO PAULO, 1969, p. 139).
O documento finaliza com um relatório das atividades executadas pela
equipe responsável pela reestruturação, no ano de 1968, a fim de agilizar a
implementação.
Observando as realizações, podemos perceber o enorme crescimento
físico do sistema educacional paulista. Somente em 1967, foram criadas mais 10
Delegacias de Ensino Elementar, 60 Inspetorias escolares, 150 diretorias de
Curso Primário anexas à Escola Normal, 5.000 cargos de professores primários,
42 Setores Regionais de Orientação Pedagógica, 20 Centros Pilotos de
Orientação Pedagógica, 785 funções de orientador pedagógico, entre outras.
O Programa é um retrato das recomendações técnicas MEC-USAID. O
Secretário finaliza o documento sintetizando a política educacional adotada pelo
governo.
109
No mais, a Chefia guarda uma esperança: racionalização dos
trabalhos burocráticos-só possível, com um plano de trabalho,
reestruturando toda a Secretaria de Educação. (SÃO PAULO,
1969, p. 160).
4.2 O Programa de Matemática
A proposta de Cândido de Oliveira, Chefe do Ensino Primário do estado,
para a matemática do Ensino Primário ressaltava.
A matemática se despojará de suas preocupações acadêmicas:
ela é disciplinadora do raciocínio e se apresenta com uma
linguagem que é a do dia-a-dia da criança e se confunde com a
ânsia criadora, a acolhida pela composição (oral ou escrita) e no
desenho e nas habilidades manuais. (OLIVEIRA, 1969, p. 136).
Nessa época algumas das principais questões relacionadas ao Ensino
Primário referiam-se às exigências para ingresso ao mercado de trabalho. A
impossibilidade de acesso ao ginásio colocava as crianças saídas da 4ª/5ª série
diretamente no mercado de trabalho.
Podemos considerar, de maneira geral, que a escola primária do período
compreendido entre as décadas de 50 e 60 se propunha a ensinar aritmética e
geometria, porém sem a participação de professores de matemática na
elaboração de seus planos, currículos ou propostas.
Não havia, naquela época, muitas chances de que a maioria das crianças
pudesse ter continuidade de estudos, o que obrigava a escola primária a
proporcionar o máximo de conteúdo possível, apesar das preocupações com o
desenvolvimento cognitivo.
110
Figura 16 - Exemplos de objetivos do Plano da Escola Primária, 1949, p. 70.
A equipe de matemática responsável pretendia que o ensino primário
adquirisse uma nova mentalidade sobre o que deveria ser aprendido
corroborando com as idéias de educação da época. Por outro lado, também tinha
o “dever” de instrumentalizar a criança para o trabalho, exigindo a aprendizagem
de conteúdos inadequados para a faixa etária atendida e enfraquecendo a
intenção explicitada nas propostas do Programa.
Devemos destacar que o grupo elaborador desse Programa era
majoritariamente composto por professores participantes e integrantes do GEEM
e detinham os aportes teóricos hegemônicos da época sobre o MMM.
Partindo do pressuposto que foi o primeiro programa para a escola primária
elaborado por licenciados em Matemática, podemos entender as razões de tantas
mudanças e preocupações antes não mencionadas, referentes ao
acompanhamento da implantação, conforme cronograma estipulado.
111
O programa foi definido como experimental e aberto a experiências
metodológicas. É possível observar o GEEM sendo usado como apontador de
inovações metodológicas no ensino de matemática e amplamente utilizado como
centro difusor e de assessoria, já que pela Lei 2.663/63 da Assembléia Legislativa
de São Paulo, o Grupo foi declarado um órgão de serviço público.
Na forma da lei, o enfoque central do currículo estava, em grande medida,
voltado para o ensino da escrita, leitura e cálculo, com a utilização de uma
metodologia tradicional, porém as discussões levantadas pelos defensores do
ideário do MMM, influenciados pela psicologia do desenvolvimento, levaram o
“Programa da Escola Primária do Estado de São Paulo, a sugerir a possibilidade
de outras formas de ensino para a Matemática, com a participação ativa dos
alunos, apesar de programa isentar-se de sugestões metodológicas.
O ensino da Matemática na Escola Primária tem como objeto de
estudo a formação de conceitos, o estabelecimento de relações
numéricas e espaciais, compreensão das operações com
números e fatos geométricos (...) tratados dentro de uma nova
estruturação permitem o desenvolvimento da compreensão e da
criatividade, encorajam a descoberta de idéias e generalizações.
(São Paulo, 1969, p. 19).
De acordo com o Programa, a matemática tem como objeto de estudo a
formação de conceitos, o estabelecimento de relações numéricas e espaciais, e
compreende operações com números e fatos geométricos, para que o aluno seja
capaz de abstrair, analisar e sintetizar. Prioriza a compreensão da linguagem
Matemática, que possibilita o uso claro e preciso da representação simbólica que
venha a facilitar as relações matemáticas.
Para compreendermos o contexto das idéias do Programa de Matemática,
predominantemente influenciadas pelo MMM, devemos considerar que este foi o
primeiro documento direcionado ao Ensino Primário elaborado por professores de
matemática, como já se disse que nesta época estavam totalmente envolvidos
com a enorme quantidade de informações sobre os avanços internos da disciplina
e com as novas teorias de aprendizagem baseadas na psicologia do
desenvolvimento.
Anteriormente, as propostas e orientações para esse segmento de ensino
eram resolvidas e deliberadas pelos próprios professores primários. De acordo
112
com a professora Manhúcia P. Liberman (2006), em depoimento oral, os
matemáticos desse período preocupavam-se prioritariamente com o ensino
secundário e deixavam a escola elementar a cargo dos profissionais que atuavam
nesse segmento.
Para compreender essa concepção do Programa, necessitamos lembrar
que, em 1969, estava vigorando a Lei 4.024/61 e o exame de admissão ao
Ginásio. A grande maioria da população não tinha a possibilidade da continuidade
dos estudos. Desta maneira, a escola primária deveria contemplar o máximo
possível, conteúdos matemáticos exigidos no mercado de trabalho, no qual a
maioria dos alunos prematuramente iria ingressar.
A Escola Primária naquele momento preservava o sentido de
terminalidade, confirmado pela professora Liberman:
Naquela época a Escola Primária, era obrigatória até os 14 anos
então, o Programa do curso primário das quatro primeiras séries,
de alguma maneira, envolvia juros, percentagens, regra de três,
etc. tudo isso, que não era pra ser dado pra criança daquela
idade,... Mas... Tava errado? Do ponto de vista geral, não tava
errado. Do ponto de vista piagetiano e matemático, sim. Mas do
ponto de vista da realidade não. As crianças só tinham acesso
àquela escola, e quando saíam e iam pro mercado de trabalho,
eles tinha que saber juros, porcentagens, regra de três. Não havia
naquela época, uma chance de que eles pudessem ter uma
continuidade. Não que agora tenha muita mais. Era uma tentativa.
(LIBERMAN, depoimento oral, 2006).
Vale lembrar que a matemática moderna foi buscar na teoria dos conjuntos
uma linguagem que a unificasse. Ela é a mesma matemática, só que, nesse
Programa, a abordagem era diferente da adotada no ensino secundário, porque
era para criança. É uma diferença didática.
A idéia da matemática como uma estrutura única e defendida pelo MMM é
reforçada no Programa, nas considerações iniciais, quando os elaboradores
afirmam que a matemática inclui campos variados, em cujo conhecimento a
criança deverá ser introduzida simultaneamente, mas retroagindo sempre, cada
vez com maior profundidade.
Como já dissemos, a programação era extensa, em decorrência das
circunstâncias e finalidades da escola pública nesse período, e incluía muitos
113
conteúdos que demonstravam grande preocupação com o princípio de
terminalidade adotado pela Escola Primária da época.
Os conteúdos foram dispostos em colunas paralelas, que, lidas no sentido
vertical, darão à seqüência a ser impressa; e lidas na horizontal, darão a
profundidade a ser atingida.
Os autores esclarecem que a ordenação vertical seria a seqüência,
envolvendo noções de continuidade, da sucessão ordenada de conteúdos, e a
ordenação horizontal seria o relacionamento e articulações dos diversos ramos do
conhecimento. Esse modelo de disposição foi pensado em função de uma melhor
compreensão e aplicabilidade.
Também nos objetivos propostos para a disciplina matemática, fica
configurada a influência do ideário do MMM. A compreensão da linguagem
matemática tão enfatizada pelos divulgadores do MMM, as relações numéricas e
espaciais e a compreensão das operações com números e fatos geométricos
comprovam a similaridade.
Queremos novamente enfatizar a valorização, dos conceitos de estrutura e
de relações, que se distanciavam, no entanto, do rigor na linguagem matemática
que era cobrado no “ginásio”.
Nas 1ª e 2ª séries, que a partir de agora trataremos por nível I, a ampliação
dos campos numéricos está ligada às propriedades de conjuntos, mesmo que
implicitamente, enquanto no nível II a teoria de conjuntos permeia todos os
conteúdos.
O currículo é abordado como ampliação de conteúdos, sem preocupações
com a integração deles com outras disciplinas, com ênfase nas estruturas, como
era defendida pelos modernistas. Há aplicação de propriedades estruturais e
ampliação de conhecimentos a partir de fatos matemáticos.
Dentro dessa idéia de estrutura é sugerido o trabalho que se utiliza de
“fatos fundamentais da matemática” e das propriedades para a construção de
novos fatos.
114
Podemos dizer que os elaboradores consideram fatos fundamentais como
suporte. É um conhecimento anterior que possibilita a construção do próximo. São
os fatos que já estão na memória, são os visíveis.
Podemos exemplificar, denominando a tabuada como um fato fundamental.
Dentro desse fato, procuramos selecionar fatos conhecidos, isto é, o que já foi
memorizado pela criança.
Considerando a tabuada do 2 e do 3 como fatos já conhecidos, podemos
fazer:
6 x 7 = 6 x (3 + 2 +2) = 6 x 3 +6 x 2 + 6 x 2
No Programa, os conteúdos foram divididos em sete temas,
acompanhados de objetivos específicos, sugestão na seriação, com
recomendações de avanço no aprofundamento, conforme as possibilidades da
classe. É sugerido o trabalho concomitante dos conteúdos pertencentes ao
mesmo tema, porém o aprofundamento dos conteúdos deveria estar condicionado
às diferenças individuais, ao desenvolvimento cognitivo de cada criança.
Percebe-se a intenção de fundamentação na psicologia da aprendizagem.
Contudo, não há aprofundamento, nem esclarecimento ao professor sobre essa
“nova” teoria, nem como poderia ser aplicada no ensino.
Liberman (2006), em depoimento oral, afirma que a superficialidade na
abordagem da Teoria de Jean Piaget no Programa da Escola Primária pode ser
explicada pelo pouco tempo para aprofundamento das teorias de aprendizagem e
a exigência da colocação do programa em prática rapidamente. Na época, os
professores de matemática que elaboraram o documento ainda não tinham
desenvolvido estudos mais específicos sobre a psicologia infantil e suas fases de
desenvolvimento aplicadas à aprendizagem e resolveram protelar para um outro
momento, já prevista no cronograma original, as orientações e formação dos
professores nesse tema.
115
Os Temas Propostos:
I - Conjuntos numéricos;
II e III – Operações Adição, subtração, multiplicação e divisão nos
conjuntos estudados (N e Q
+
);
IV – Fração;
V – Medidas;
VI - Geometria.
No tema I, é abordada a estrutura do sistema decimal, com suas
propriedades e relações.
Nas primeiras séries, visa-se à construção do número, as relações de
ordenação, comparação, seriação, etc.
Podemos exemplificar, apresentando a sugestão dada para o nível I.
1ª série 1ª série 2ª série 2ª série
Fazer correspondência entre conjuntos
Ordenar quantidades
Ler e escrever numerais de 1 a 9.
Identificar sem contar pequenas quantidades
Agrupar a mesmas quantidades de diferentes maneiras.
Formar grupos com um
determinado número de
elementos, especificando o
número de grupos formados
e o número de elementos
restantes. Exemplo com 5
elementos: 2 grupos de 2 e
resta 1, ou 1 grupo de 3 e
restam 2.
Dezenas – Ler e escrever
numerais de números de O
a 100.
Conceito de par e impar:
dado um grupo com um
determinado número de
elementos, verem se é ou
não possível separá-lo em
dois grupos com um
mesmo número de
elementos.
Centenas
Ler e escrever
numerais de
úmeros até
1.000.
Milhar –
Formar o
grupo de mil,
10 grupos de
100=10
centenas=100
dezenas=1000
unidades.
Milhar
Comparar números usando o símbolo “igual a” (=:) e
diferente de
Comparar
números usando
os símbolos
“maior que” e
“menor que”
Dúzia;
aplicação.
Localizar um elemento em uma série usando ordinais
Ordinais: aplicação
Ordinais até vigésimo
Tabela 5 - Quadro baseado no Programa da Escola Primária, 1969, p. 27.
116
Nas 3ª e 4ª séries, que a partir de agora trataremos por nível II, a
terminologia utilizada na teoria de conjuntos é objeto de estudo bem detalhado,
assim como todas as propriedades dos conjuntos numéricos estudados.
Percebemos nesse Programa algumas semelhanças com o ensino
secundário, em relação à abordagem estruturalista e a teoria de conjuntos como
linguagem unificadora, contudo há muito mais interesse na evolução psicológica
da criança e adequação e aprofundamento de conteúdos, do que com o rigor
matemático enfatizado no secundário.
Até aí, não havia indícios de grandes novidades em relação à metodologia
nem à introdução de materiais didáticos. O foco ainda era somente nas
estruturas, nos fatos matemáticos, nos conteúdos de ensino.
Nos temas II e III, as operações eram tratadas por meio da teoria de
conjuntos, com foco nas relações e aplicações das propriedades, nas sentenças.
Exemplo: Tema II e III - Nível I
Adição, subtração, multiplicação e divisão de números naturais.
117
Propriedade associativa da adição Propriedades comutativa e associativa da adição
Adição de três parcelas
Aplicar os sinais “igual a” e “diferente a" em
sentenças matemáticas de adição ou
subtração
Aplicar os sinais “maior que” e “menor que”
Formar todos os pares ordenados possíveis
com todos os elementos de dois conjuntos
dados.
Formar grupos com mesmo número de
elementos.
Adicionar parcelas iguais
Sentenças matemáticas de multiplicação
Conceito de multiplicação.
Nomenclatura.
Verificar que sempre é possível
multiplicar dois números, mas
nem sempre é possível dividir
exatamente dois números.
Conceito de
multiplicação.
Conceito de divisão
Separar em grupos com determinado
número de elementos.
Nomenclatura:
Verificar que sempre é possível
multiplicar dois números, mas
nem sempre é possível dividir
exatamente dois números.
Divisão.
Sentenças matemáticas de divisão.
Fatos fundamentais da multiplicação com
produto até 20, fatos correspondentes da
divisão.
Propriedade comutativa e associativa da
multiplicação - sem terminologia.
Expressar-se por meio de sentença s
matemáticas
Fatos fundamentais da
multiplicação com produto até
48. Fatos correspondentes da
divisão.
Quocientes exatos e
aproximados.
Expressar-se por meio de
sentenças matemáticas.
Propriedade comutativa e
associativa da multiplicação -
sem terminologia
Sentenças
matemáticas:
Fatos
fundamentais da
multiplicação
com produto até
81. Fatos
correspondentes
da divisão.
Quocientes
exatos e
aproximados.
Propriedade distributiva da
multiplicação em relação à
adição-.
Técnica
operatória da
multiplicação.
Tabela 6 - Quadro baseado distribuição de conteúdos, 1969, p.28.
Os temas- V e VI - Medidas e Geometria são indicados para serem
trabalhados concomitantemente aos outros temas. Todavia não encontramos
possibilidades claras de contextualização, parecendo parte fragmentada e isolada
dos outros conteúdos. A geometria é tratada axiomaticamente, num caráter
abstrato com estudo de propriedades, objetivando o reconhecimento e estudo das
relações.
118
Não há valorização da experiência acumulada, o objetivo é o
reconhecimento da terminologia, com pouca relação com a leitura do mundo
físico. É não experimental e não exploratória.
Aí ainda, a abordagem é mais de forma lógica e não psicológica.
A psicologia educacional estava mal começando nessa época.
(LIBERMAN, depoimento oral, 2007).
Da mesma forma, nas unidades de medidas são priorizados os estudos
referentes à equivalência e representação simbólica em detrimento das
aplicações cotidianas. Não há sugestão de como, onde, nem as ligações e
articulações possíveis com a realidade.
É necessário, contudo, observar ainda que os conteúdos foram elencados,
como pré-requisitos dos posteriores, determinando uma seriação rígida, cuja
intenção era a ampliação dos campos numéricos pela aplicação das propriedades
estruturais.
Novamente, a apropriação do ideário do MMM por parte dos elaboradores
pode ser mais bem compreendida quando observamos a fundamentação nas
idéias de Piaget, mas com a linguagem específica. As noções de inclusão, de
conjunto Universo, de União, diagrama de Venn, oriundas da teoria de conjuntos,
são levadas para as crianças por meio de atividades e de jogos.
Merecem ainda destaque o fato de que a preocupação central do Programa
da Escola Primária do Estado de São Paulo era com a expansão da rede, e num
segundo momento, com a melhoria da qualidade do ensino, o que coincidia com
as promessas dos modernistas, que ofereceriam uma matemática de alta
qualidade e de fácil acesso a todos. Assim, os principais protagonistas do MMM
foram incorporados pelas equipes governamentais ao grupo de elaboradores de
guias e currículos, o que levou o ideário do MMM a todas as escolas de São
Paulo.
Também convém registrar que nessa época, o ideário do MMM encontrava
receptividade nas esferas governamentais e era considerado como o mais
apropriado à nova concepção de escola e à urgência de ampliação de vagas.
119
Os protagonistas do Movimento ofereciam um discurso adequado à época
vivida pelo Brasil. Tratavam a matemática como indispensável ao
desenvolvimento técnico e científico da nação, além das promessas de fácil
aprendizagem e, ainda, respaldados pela academia de todo o mundo.
O exame dos textos contidos no Programa revela indicações de que a
Secretaria Estadual de Educação pretendia, com a sua apresentação, mais
explicitar uma referência de ensino que implementar a reforma com minúcias. E
somente a partir dessa interpretação é que se pode admitir a inexistência de uma
sistemática na sua elaboração.
Nessa ordenação de informações, é possível ver que os autores mais
citados em todo o conteúdo do Programa com relação aos novos conteúdos, são
protagonistas do MMM, e defendiam, de modo geral, a adequação de
informações produzidas pela psicologia, sociologia, entre outras áreas, para
explicar questões de aprendizagem e propor a racionalização das práticas
pedagógicas.
Algumas considerações podem ser feitas, a fim de refletirmos sobre a
escola primária da época. Nesse período verificamos, no Programa, alguns
vestígios que nos levam a considerar o Ensino Primário relacionado com o
princípio da terminalidade. A preocupação principal expressa pela quantidade de
conteúdos prevista a serem desenvolvidos em apenas quatro anos, revela que o
desenvolvimento cognitivo das crianças não era a maior das preocupações.
Podemos supor que à medida que não havia, naquela época, muitas chances de
que a maioria das crianças pudesse ter continuidade de estudos, determinava que
a escola procurasse proporcionar o máximo de conteúdo possível, no pequeno
período em que a escolarização era obrigatória e gratuita.
120
Considerações Comparativas sobre os Programas de 1949 e de 1969.
1949 1969
O professor executa o Programa. Deve
estabelecer uma graduação rigorosa de
dificuldades, abrangendo tanto a seriação, como
a repetição.
Professor executor de técnicas apropriadas de
ensino propiciando uma aprendizagem rápida e
eficaz ao aluno. Educando auto ativo.
O ensino de operações por intenso treinamento.
Ênfase a aritmética e conhecimento da tabuada.
Ensino por meio de fatos matemáticos. Ênfase
as propriedades estruturais das operações.
Conteúdo muito extenso.
Conteúdo muito extenso, apesar de esboçarem
uma preocupação com esta extensão.
Geometria tratada de forma abstrata,
enfatizando nomenclatura e propriedades.
Geometria tratada de forma abstrata, porém
apresenta preocupações com contextualização.
Memorização mecânica Privilegia a compreensão
Objetivos desvinculados do conteúdo Objetivos específicos atrelados aos objetivos
gerais
Caráter lógico na distribuição dos conteúdos Preocupação com o desenvolvimento
psicológico na distribuição de conteúdos.
Escolaridade e ensino não definidos Diferença entre escolaridade e ensino
Programa estático: elaborado e aplicado Programa dito flexível
Conteúdos estanques, não sugerindo
entrosamento entre as áreas.
Sugestão para entrosamento entre os
conteúdos e áreas.
Sistematização do conhecimento desde a 1ª
série.
Sistematização do conteúdo a partir da 3ª
série.
Nem conteúdos, nem objetivos atendem as
etapas de desenvolvimento infantil.
Sinaliza preocupações com as etapas do
desenvolvimento infantil, porém a listagem de
conteúdos não é a das mais adequadas á
idade.
Apresenta orientação metodológica. Não apresenta sugestões de atividades.
Salienta cooperação e solidariedade Sugere cooperação, solidariedade e
competição.
Não prevê continuidade Procura dar um caráter de continuidade.
Tabela 7 - Quadro comparativo entre os Programas da Escola Primária Paulista de 1949 e de
1969.
4.2.1 Os Guias Curriculares 1975
Em resposta às deliberações da Lei 5.692/71, o Estado de São Paulo viu-
se na obrigação de reformular o seu currículo, para atender às novas exigências.
121
Para isso, foram elaborados os Guias Curriculares para o Ensino de 1º Grau,
publicados em 1975. Passaremos a descrever, a seguir, seu processo de criação.
Esse documento é uma publicação composta por 276 páginas, financiado pela
quota federal do Salário Educação em convênio MEC/DEF/FNDE, com
distribuição gratuita a todas as escolas da rede pública do Estado de São Paulo,
no governo Laudo Natel, com Paulo Gomes Romeo como Secretário de
Educação.
Conforme já esclarecemos anteriormente, nessa época, o ideário do MMM
era hegemônico entre os educadores matemáticos, e as várias mudanças em
todos os campos da sociedade brasileira, inclusive na estrutura de ensino,
incrementaram e propiciaram visibilidade às reformas pretendidas pelos
matemáticos.
No decorrer da coleta desses documentos, detectamos a necessidade de
percorrer a trajetória das reformas do Sistema de Ensino e analisar a legislação
utilizada na fundamentação dos Guias, assim como dos documentos oficiais
publicados pela Secretaria de Educação para subsidiar sua elaboração. Por meio
da análise desses documentos, procuramos verificar a reformulação curricular no
ensino de matemática e compreender as apropriações do ideário do MMM pela
equipe da Secretaria de Educação.
Da maneira como foram produzidos, os documentos se constituíram como
poderosa estratégia de divulgação de modelos de estrutura dos sistemas de
ensino, de metodologias mais convenientes, de formulação de objetivos mais
adequados, chegando a minúcias como a distribuição de horas-aulas por matéria
e do número de alunos por classe.
As mudanças exigidas na Lei 5.692/71, decorrentes de todas as
transformações da sociedade brasileira nesse período, desencadearam uma
política de publicações oficiais, tanto para nortear, como para controlar os novos
sistemas de ensino criados.
Para melhor entendermos essa dinâmica das publicações, a inserção do
ideário do MMM nesses documentos e as apropriações por parte da Secretaria,
iniciamos nossa análise juntando várias publicações, que tratam do entorno da
elaboração dos Guias e determinam suas diretrizes. Esses documentos foram
122
disponibilizados pela Secretaria e enfocavam as diferentes definições de
currículo, de estrutura, matérias do núcleo comum e parte diversificada, os
objetivos do ensino, as características da educação geral e da formação especial,
as categorias curriculares e a nova ordenação curricular.
Como procuramos evidenciar, o ponto de partida para a elaboração dos
Guias Curriculares, denominado “Guias Curriculares Propostos para as Matérias
do Núcleo Comum do Ensino de 1º Grau, firmou-se no estudo de toda a
legislação referente à reformulação do ensino. Relativamente a esses
documentos, verificamos o intuito de orientar, subsidiar, deliberar, informar a
comunidade.
O processo para a elaboração dos Guias Curriculares teve início em 1972,
com a convocação dos professores efetivos da rede estadual, pela professora
Terezinha Fram, da Divisão de Assistência Pedagógica (DAP), que era vinculada
ao Ensino Secundário e Normal da Secretaria. Depois de uma reforma na
estrutura da Secretaria, essa divisão de transformou no CERUPHE
39
que, mais
tarde, recebeu o nome de Laerte Ramos de Carvalho.
A elaboração do Guia Curricular começou no tempo da DAP, quando, foi
publicada uma versão preliminar dos Guias. Depois, quando o órgão já havia sido
transformado em CERHUPE, foi publicado o texto definitivo que foi apelidado pela
rede de “verdão”.
Podemos dizer que a publicação do texto preliminar foi em 1972 e 1977 é o
ano da publicação final.
39
Centro de Recursos Humanos e Pesquisas Educacionais Prof. Laerte Ramos de Carvalho.
123
Figura 17 - Colaboradores da Análise Crítica
A edição preliminar, de 1972, realizada na semana de 23 a 27 de outubro
de 1972, por 30 professores cujos nomes constam no final da edição definitiva,
serviu de base para a Análise Crítica do Guia Curricular Proposto para
Matemática. Durante o ano de 1973, foi feita uma revisão da proposta inicial, com
base nas sugestões apresentadas nessa análise.
A primeira divulgação oficial foi publicada num papel de ótima qualidade,
colorido, e o texto impresso também em cores, numa edição reduzida.
124
Figura 18 - Guias Curriculares, capa edição de luxo, 1975.
Mais tarde, foi feita uma nova edição, num papel menos sofisticado e
impresso em preto e branco. Essas duas edições foram feitas para divulgação
junto às autoridades e também para as bibliotecas.
Constatamos um projeto editorial bem estruturado, com design moderno
para a época. Toda concepção gráfica do texto objetivava torná-lo popular,
durável e de fácil manuseio. Para isso foram utilizados vários recursos, a fim de
caracterizá-lo como próximo dos professores.
Podemos destacar, em sua formatação, a preocupação com a composição
gráfica, papel grosso de boa qualidade com várias cores, visando a tornar o
material mais acessível e agradável ao professor. Cada componente curricular é
identificado por cores diferenciadas, que propiciava acesso mais simples e rápido
quando necessário. O texto apresenta linguagem clara, logotipos grandes, letras
coloridas com destaque para os temas e subtemas.
125
Finalmente, em 1977, foi feita uma edição mais econômica para ser
distribuída à rede estadual. Os professores apelidaram a publicação “Verdão”,
talvez por ter a capa na cor verde.
4.2.2 Plano de Ação para a Reforma de Ensino de 1º Grau – Matemática
O primeiro documento por nós coletado, relacionado com a reforma de
ensino do Estado de São Paulo, intitula-se: “Plano de Ação para a Reforma de
Ensino de 1º Grau”, publicado em 1972, pela Secretaria de Educação do Estado.
Foi distribuído com a intenção de divulgar o plano de ação do governo para as
reformas no sistema de ensino paulista.
Este documento é dividido em quatro partes: Nota Introdutória, Introdução
ao Programa de Ação, Projeto de Elaboração de Guias Curriculares e o Guia
Curricular de Matemática (documento básico).
Observando a capa podemos supor que a intenção da Secretaria fosse
passar uma imagem de crescimento, tanto da quantidade como qualidade da
rede.
Figura 19 - Capa Plano de Ação, 1972.
126
Na “Nota Introdutória”, a secretária de estado de educação, Esther de
Figueiredo Ferraz, declara que, entre o tempo de desenvolvimento do projeto e a
abrangência do processo de implantação da reforma curricular, a secretaria optou
pelo segundo fator, pela repercussão em termos sociais e econômicos. E, ainda:
As medidas propostas deverão sempre atingir a totalidade da
rede, embora se ajustando às características locais de cada caso
(SÃO PAULO, 1972. Introdução).
A Secretaria trata dos objetivos do plano para uma ação política provinda
da Lei 5.692/71 e indica a construção do novo currículo como a base para a
reformulação dos sistemas de ensino. Assim, todas as medidas programadas
para a implantação do ensino de 1º grau, alargando o atendimento escolar
gratuito para oito anos, prendem-se primeiramente ao detalhamento dos Guias
Curriculares.
Ressalta que a nova Lei 5.692/71 trouxe um conjunto de definições
políticas que deveriam orientar os novos sistemas educacionais e, desta maneira,
estudos e interpretações acerca da lei tiveram que ser feitos antes de qualquer
outra ação.
Ferraz finaliza as recomendações, lembrando as exigências da lei em
relação à organização curricular, e ressalta que os Guias serão as primeiras
manifestações concretas para essa adequação.
À medida que lemos o Plano de Implementação da Escola de oito anos,
percebemos seu minucioso planejamento, que divide sua execução em quatro
etapas, partindo do treinamento legal até a capacitação de professores. O projeto
era grandioso e pretendia atender a todos os professores da rede.
Sua forma revela o modelo tecnicista adotado no Brasil, retrato da política
educacional que justificava a educação pela via da racionalização e difundia a
implantação das medidas tecnicistas de ensino.
Os professores por nós entrevistados e o estudo dos documentos
coletados confirmam a política de implementação da reforma, orientada pelas
idéias tecnicistas, planejadas minuciosamente, numa implementação controlada e
executada em etapas, sucessivas ou concomitantes.
127
Podemos tentar problematizar as razões sobre as quais a equipe de
governo se apoiava para ter certeza da implementação das reformas, que
envolveu tantas pessoas, e com a certeza de controle minucioso por parte de uma
pequena equipe com poder decisório.
Talvez inspirados pelas tendências da época, quando a demanda
representada pela necessidade de mão-de-obra qualificada para trabalhar nas
multinacionais vindas para o Brasil de 1960 a 1970 obrigou a importação do
modelo de educação tecnicista americano, uma vez que a reprodução das
relações produtivas naquela etapa monopolista determinava, além da
qualificação, via racionalização dos meios de ensino, a reprodução das idéias que
fundamentavam as relações produtivas.
Segundo Saviani (1993, p. 24), na Escola Tecnicista, introduzida no Brasil
pela Lei 5.692/71, professores e alunos são considerados como executores de um
processo cuja concepção, planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de
especialistas, habilitados, neutros, objetivos e imparciais.
Essas características são percebidas na “Introdução” do Plano de Ação. Na
perspectiva da Secretaria, a elaboração dos Guias incluía tarefas técnicas “cujo
domínio não está à disposição do professor comum” e deve ser atribuída a órgãos
especializados. Esta citação configura o que já discutimos anteriormente sobre a
ideologia tecnicista dominante na época, em que o professor era considerado
como executor e técnico de planos e metodologias criadas por especialistas.
Ao longo da história, verificamos a relação do currículo com as exigências
sociais, sejam elas econômicas, políticas ou culturais. Logo, as demandas
brasileiras originadas pela nova sociedade urbana apontavam para a exigência da
racionalização, eficácia e eficiência do ensino nesse período no Brasil.
A pressão exercida pelas agências financiadoras sobre a reformulação do
ensino, estabelecia modelos educacionais importados e difundidos como os
melhores. Nesses termos, na construção do currículo, os objetivos deveriam ser
operacionalizados, pois nessa concepção a educação destinava-se, por via do
currículo, a processar (transformar) o aluno com o máximo de eficácia e o mínimo
de custos, numa lógica empresarial, comercial ou industrial.
128
A terceira parte do Programa de ação, denominado: Projeto de Elaboração
dos Guias Curriculares é constituída por quatro etapas de desenvolvimento, como
mostra a figura.
Na primeira etapa eram especificadas as diretrizes para a construção do
novo currículo, separadas conforme cada componente curricular. A equipe de
Matemática era composta por professores com experiência no ensino de 1º e 2º
graus, assessorados por um especialista de nível superior. Faziam parte da
equipe, os professores: Almerindo Bastos, Lucília Bechara, Benedito Antonio da
Silva e Anna Franchi. Todos tinham curso superior em matemática, mas somente
a professora Anna Franchi tinha formação inicial de professora primária e já havia
lecionado para Ensino Primário.
Figura 20 - Plano de Ação. p. 51
Nas orientações para a construção do currículo do ensino de matemática
foi proposto um cronograma de trabalho, segundo o qual, os integrantes da
equipe de elaboradores, primeiro tomavam conhecimento dos textos legais, que
embasavam o currículo da escola de 1º grau (Lei 5.692/71, Resolução e Parecer
853/71 que fixa o núcleo comum, e Parecer Federal sobre o significado da Parte
de Formação especial do currículo do ensino de 1º grau).
129
Também foi prevista e ressaltada a necessidade de conhecimento das
diretrizes previstas para a elaboração do currículo, de acordo com a formulação
precisa de objetivos e a subordinação aos atributos exigidos para os Guias:
flexibilidade, coerência, objetivos bem definidos, unicidade e organicidade,
integração e ordenação de conteúdos em conformidade expressa na Lei 5.692/71.
Quanto às diretrizes para a implantação das reformas, a Secretaria cobrava
a construção de objetivos de forma operacionalizada, orientando sua elaboração
conforme autores ligados à pedagogia tecnicista do currículo, como Bloom
40
e
Mager.
O enunciado dos objetivos, que se esperam redutíveis a unidades
comportamentais, deve atender às prescrições estabelecidas por
Mager. (SÃO PAULO, 1972. p. 8).
Esses autores desenvolveram o que chamamos de taxionomias, ou seja,
um sistema de classificação que, de certa forma, padroniza a formulação de
objetivos educacionais. Defendiam que os planos escolares deveriam ser
constituídos de objetivos bem definidos, utilizando-se de verbos bem
selecionados, conteúdos acompanhados das melhores estratégias para atingi-los
e dos instrumentos de avaliação correspondentes aos objetivos propostos. Deste
modo, os objetivos educacionais foram substituídos por objetivos
comportamentais, instrucionais e operacionais.
(...) um objetivo está bem redigido se transmite claramente o
intuito do docente. Esta transmissão se obtém segundo o grau de
precisão com que se define o que poderá fazer o aluno ao final do
processo de aprendizagem. (São Paulo. Plano de Ação. p. 8).
Em suma, de acordo com Bloom, a operacionalidade de um objetivo
relaciona-se à precisão e clareza de sua redação. Dizemos que um objetivo, geral
ou específico, é operacional, ou que está redigido de maneira operacional quando
40
Taxonomia (do grego taxis, que é ordenação, e nomos, que é sistema, norma) é todo sistema de
classificação que possui três características: cumulatividade, hierarquia e eixo comum. De acordo com
Benjamin Bloom, em relação aos objetivos educacionais há uma divisão em três partes, a saber:
cognitiva, que são objetivos que destacam a lembrança de algo que foi aprendido, para a resolução de
alguma atividade mental para a qual o indivíduo tem que definir o problema fundamental, reorganizar o
material ou combinar idéias, técnicas ou métodos antecipadamente aprendidos; afetiva ou emocional, que
enfatizam as emoções e os anseios, assim como a aceitação ou rejeição, expressos em interesses,
atitudes ou valores; psicomotora, que se relacionam a habilidade muscular ou motora. (HAMZE, 2006).
130
expressa claramente um comportamento, de maneira a não permitir múltiplas
interpretações.
O Programa de Ação também é minucioso, seguindo a mesma linha
tecnicista nas orientações para a seleção e organização do conteúdo
programático, e sugere que a seleção deva ser baseada nas recomendações de
Bruner
41
e Bloom.
Quanto às diretrizes relativas à seleção de estratégias e as de avaliação,
são acompanhadas de roteiros, com a mesma característica de todo o
documento, orientando de forma técnica e impessoal o controle do processo de
execução com a finalidade de torná-lo mais rápido, eficaz, e possibilitar uma
avaliação observável e objetiva das metas pretendidas.
Cabe aqui mencionar que todas as entrevistas
42
,que nos foram concedidas
pelos elaboradores e pareceristas dos Guias confirmam a atenção dispensada ao
planejamento da dinâmica de construção e implementação.
A maneira como foi planejado, com os estudos referentes às diretrizes, a
legislação correspondente, passando pelas novas teorias de aprendizagem, do
conceito de currículo que seria adotado pela secretaria, aos procedimentos para a
capacitação e orientação do magistério paulista para a reforma proposta, denotam
não só a idéia tecnicista sobre projetos, mas também o grande comprometimento
da equipe técnica com o processo e acompanhamento de todas as etapas,
conscientes quanto ao longo tempo que seria necessário para atingir as
mudanças pretendidas.
Da mesma forma que os outros itens desse documento, o esquema
sugerido para avaliação do Plano Curricular proposto é detalhado e específico,
determinando uma avaliação centrada e partindo dos objetivos definidos.
Por fim, é apresentada a primeira versão dos Guias Curriculares de
matemática, que, numa segunda etapa, de acordo com o cronograma
estabelecido, será avaliado por grupos de professores, possibilitando adequações
e / ou modificações ao documento preliminar.
41
Bruner preocupa-se em induzir uma participação ativa do aluno no processo de aprendizagem,
contemplando a "aprendizagem por descoberta”.
42
Foram por nós entrevistados os professores: Almerindo Marques Bastos, Lucília Bechara, Manhúcia
Liberman e Ubiratan D’Ambrosio.
131
Merecem igualmente destaque algumas inovações trazidas pelo tecnicismo
ao ensino e que contribuíram para a evolução das concepções do processo
ensino-aprendizagem em nossas escolas. Podemos citar a introdução das provas
objetivas, do planejamento anual elaborado pelos professores de acordo com a
realidade de sua escola e expressos de maneira organizada, o que originou a
chamada avaliação quantitativa, que passa a ser preferida entre educadores em
relação à qualitativa.
Também ao disponibilizar as informações legais e solicitar dos educadores
o conhecimento prévio da legislação pertinente à reforma, o Estado desencadeou
um processo de socialização de informações, antes só acessível aos chamados
especialistas. Configura-se, assim, na análise dos documentos publicados para
subsidiar a reforma, a exigência de acesso à legislação educacional, por parte de
todos os professores legitimando as mudanças pretendidas.
Obedecendo ao cronograma estabelecido no Plano de Ação, e entendendo
que uma de suas metas era o acesso à legislação referente à reforma de ensino a
todos os professores, foi publicado em 1973, pela imprensa oficial do Estado de
São Paulo, um novo documento formado por uma coletânea de referenciais legais
que fundamentavam as reformas do ensino de 1º e 2º graus e os Guias
Curriculares.
4.2.3 Diretrizes e Bases da Educação Nacional
Nesse documento constam, em uma só publicação, Pareceres,
Deliberações, Indicações e resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de
Educação, juntamente com as Leis 5.692/71 e os artigos que continuavam em
vigor da Lei 4.024/61, aos quais deveriam condicionar-se quanto à forma e
conteúdo deliberado.
Anteriormente, a legislação foi utilizada pela equipe de especialistas com o
intuito de auxiliar na construção dos Guias Curriculares, elaborando-os conforme
as orientações federais decorrentes da Lei 5.692/72 e obedecendo às
determinações expressas por meio de Pareceres, Resoluções, Deliberações, etc.
132
Justifica-se a publicação do documento em razão da grande procura do
magistério público por subsídios legais para a reforma.
Figura 21 - Contra Capa Documentos Básicos, 1971.
Essa grande procura deve-se também à Resolução n. º 16, de 5/02/73, que
determinou a realização da Semana de Estudos e de Planejamento no período de
9 a 15 de fevereiro de 1973, em que os documentos oficiais que fundamentavam
as reformas nos currículos eram exigidos como material necessário ao curso.
A publicação no diário oficial – foram impressos e distribuídos
21.000 suplementos-consubstanciado igualmente, em incessantes
solicitações de novos exemplares, justifica a edição desta
separata. (SÃO PAULO, 1973, p. 3).
4.2.4 Parecer Nº 853/71
O Parecer 853/71 e a respectiva Resolução deveriam ser bem
interpretados e adotados para a elaboração dos Guias Curriculares. Fixa o
núcleo-comum para os currículos do ensino de 1º e 2º graus, e a doutrina do
currículo na lei 5.692/71.
133
O documento declara que a fixação do currículo é a primeira medida
concreta para a implementação da lei de Diretrizes e Bases da Educação
brasileira. Os pareceristas iniciam o trabalho, lembrando a função atribuída ao
CFE, pelo artigo 46 da lei 5540, de 28 de novembro de 1968, de interpretar, na
jurisdição administrativa, as disposições das leis que fixam diretrizes e bases da
educação nacional. Em seguida, explicam a dinâmica do parecer, que iniciará
com o estudo do núcleo-comum, e antes das conclusões, que serão expressas
por um Projeto de Resolução, ressaltarão algumas implicações.
O objetivo do Parecer é a apreciação da doutrina do currículo. Os
pareceristas principiam os estudos pela determinação dos conteúdos,
diferenciando o núcleo comum da parte diversificada, chegando ao estudo do
currículo pleno com as noções de atividades, áreas de estudo e disciplinas. E o
conceito legal de matéria.
Definem a função da educação geral como a de transmitir uma base
comum de conhecimentos indispensável a todos, que espelhe o Humanismo dos
dias atuais e garanta a continuidade de estudos. Já à parte da formação especial
tem como objetivo a sondagem de aptidões e a iniciação para o trabalho no 1º
grau, e de habilitação profissional no 2º grau, caracterizando a terminalidade
prescrita na lei 5.692/71.
Para melhor entendimento, procuramos sintetizar a função de cada órgão
nas determinações referentes ao novo currículo preconizado pela nova Lei.
134
RESUMO DAS COMPETÊNCIAS NA FIXAÇÃO DO CURRÍCULO
Categorias Competências
CFE
Fixa:
As matérias relativas ao núcleo comum.
Define:
Os objetivos e a amplitude dessas matérias.
Fixa:
Mínimo (de matérias) de cada habilitação profissional;
Mínimo de conjuntos de habilitações afins.
Aprova:
Outras habilitações profissionais propostas pelos
estabelecimentos de ensino, com validade nacional.
CONSELHOS
DE
EDUCAÇÃO
Relacionam:
Para os respectivos sistemas de ensino, as matérias
dentre as quais poderá cada estabelecimento escolher as
que devam constituir a parte diversificada.
Aprovam:
A inclusão, nos currículo dos estabelecimentos, de estudos
não decorrentes de matérias relacionadas para a
finalidade prevista no item anterior;
Outras habilitações profissionais diversas das fixadas na
forma dos da lei, com validade apenas no âmbito regional.
ESTABELECIMENTOS
DE
ENSINO
Escolhem:
As matérias que devam constituir a parte diversificada de
seus currículos.
Adotam:
Com aprovação do competente Conselho de Educação,
outras habilitações para as quais não havia mínimos de
currículo previamente estabelecidos.
Tabela 8 - Tabela adaptada do parecer 853/71.
Os pareceristas ressaltam que a determinação dos conteúdos seja feita em
camadas, de modo que sucessivamente se acrescentem. A primeira camada é o
núcleo comum, a segunda constitui-se de Educação Moral e Cívica, Educação
Física, Educação Artística, Programas de Saúde e Ensino Religioso (facultativo
para os alunos), a terceira camada é composta pela parte diversificada, e uma
quarta camada, somente para o 2º grau, também chamada de parte diversificada,
é constituída pelas matérias profissionalizantes.
Lembram a obrigatoriedade da inclusão de Educação Moral e Cívica,
Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos
dos estabelecimentos de 1º e 2 º graus.
O currículo constituído por essas três camadas, no 1
º grau, é chamado de
currículo pleno, composto pelas disciplinas, áreas de estudo e atividades,
relacionadas, com ordenação e seqüência.
135
Seguem definindo as concepções adotadas para matéria, área de estudo,
atividades e disciplinas. Consideram
matéria como "todo campo de
conhecimentos fixado ou relacionado pelos Conselhos de Educação, e em alguns
casos, acrescentado pela escola, antes de sua representação, nos currículos
plenos, sob a forma didaticamente assimilável de atividades, áreas de estudo ou
disciplinas". Já nas áreas de estudo, formadas pela integração de conteúdos
afins, as situações de experiência deverão equilibrar-se com os conhecimentos
sistemáticos, e nas disciplinas as aprendizagens se farão predominantemente
sobre conhecimentos sistematizados.
Tanto na seqüência de atividades, áreas de estudo, quanto nas disciplinas,
parte-se do mais para o menos amplo e do menos para o mais específico,
preocupando-se com a maneira do desenvolvimento da aprendizagem que deve
principiar com situações concretas.
Podemos dizer que a diferença proposta é referente aos fatores situação-
conhecimento. Sendo assim, nas atividades a aprendizagem deverá desenvolver-
se mais sobre experiências colhidas em situações concretas do que pela
apresentação sistemática dos conhecimentos; nas áreas de estudo, as situações
de experiências devem equilibrar-se com os conhecimentos sistemáticos e nas
disciplinas devem predominar os conhecimentos sistemáticos.
Citam Piaget e reforçam a necessidade de uma correspondência simétrica
entre os três estágios do desenvolvimento defendidos por ele. As três grandes
linhas curriculares adotadas no documento consideram também as diretrizes
divulgadas pela psicologia da aprendizagem.
As matérias do núcleo comum são tratadas no documento a partir da idéia
de linhas gerais, divididas em Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e
Ciências, sendo os Estudos Sociais elemento de ligação entre elas.
A fim de traçar uma concepção mais dinâmica de currículo, os pareceristas
sugerem que as matérias devam ser determinadas de forma integrada, com a
definição abrangente de seus objetivos e o estabelecimento de sua posição
relativa ao longo da escolarização, conforme a nova definição de amplitude, pois
a educação de qualquer cidadão, sendo baseada no conhecimento humano, não
admite divisões.
136
Assim, a Resolução do Parecer 853/71, fixando as grandes linhas de
matérias, assegura ser possível guardar a visão de conjunto ao determinar que
aspectos ou conteúdos particulares de cada uma se incluem na obrigatoriedade
atribuída ao núcleo comum: Língua Portuguesa em Comunicação e Expressão;
Geografia, História e Organização Social e Política do Brasil, em Estudos Sociais;
e Matemática e Ciências Físicas e Biológicas. As matérias, diretamente ou por
seus conteúdos particulares, devam conjugar-se entre si e com outras que lhe
acrescentem; não se omitindo as matérias prescritas na 2ª camada já descrita.
Apesar da consciência da importância dos idiomas nos dias atuais, os
pareceristas apenas recomendam a inclusão no currículo de uma Língua
Estrangeira Moderna, pois compreendem as circunstâncias adversas de alguns
estabelecimentos de ensino.
Assim, as três grandes linhas da matéria serão distribuídas nos currículo de
1º e 2º graus, da maior para a menor amplitude, do concreto para o abstrato,
constituindo-se em atividades, áreas de estudo e disciplinas, formando o currículo
pleno do estabelecimento, e tendo o sentido de educação geral.
Os pareceristas atribuem um grande valor à integração das matérias do
núcleo comum e criticam os antigos currículos em que predominava a
fragmentação e separação indevida.
Adotada essa concepção integradora para as matérias, fica clara a
definição dos objetivos de cada linha:
- Comunicação e Expressão: Cultivo de linguagens objetivando uma melhor
comunicação entre seus semelhantes e a manifestação harmônica de
sua personalidade nos aspectos físico, psíquico e espiritual, além do
estudo da Língua Portuguesa;
-
Estudos Sociais: Ajustamento ao meio, para melhor viver e conviver,
enfatizando o conhecimento do Brasil na perspectiva atual de seu
desenvolvimento;
- Ciências: O desenvolvimento do pensamento lógico e a vivência do
método científico, com ênfase nas tecnologias que resultam de suas
aplicações, tendo como função tornar o aluno capaz de explicar o seu
meio, atuando sobre ele. Ressaltam que desde cedo, o aluno deve ser
137
levado, por meio de situações concretas, a compreender as estruturas da
realidade e suas relações.
O documento reconhece a dificuldade de muitos estabelecimentos em
imprimir esse sentido à educação científica, porém, é inevitável e imprescindível
sua adequação, que deverá ser encaminhada rapidamente.
Assim, os conteúdos particulares de cada matéria, constituídos pelos
conhecimentos, experiências e habilidades inerentes a cada uma, são
considerados meios em relação às três grandes linhas em que se resolvem e,
desta maneira, são considerados mais funções que objetivos.
No Ensino de 1º grau, sem ultrapassar a 5ª série, o tratamento pedagógico
predominante deverá ser a atividade e a apresentação sob as formas de
Comunicação e Expressão, Integração Social e Iniciação às Ciências, como
educação geral, desenvolvida com duração e intensidade exclusiva nas séries
iniciais.
No inicio da escolarização, advertem os elaboradores, é aconselhável
utilizar apenas as atividades, passando para a área de estudo, conforme o
amadurecimento do aluno, e chegando-se à predominância da sistematização,
sobre cada área.
Verificamos embasamento do documento na teoria psicogenética de
Piaget, quando os pareceristas aconselham as escolas a ajustarem a ordenação,
relacionamento e seqüência de seus currículos em função do grau de
desenvolvimento psicológico de seus alunos.
De acordo com a lei, cabe ao CFE, fixar as matérias relativas ao núcleo
comum, definindo-lhes os objetivos e amplitude. E a fim de evitar controvérsias,
há necessidade de esclarecimentos em relação à amplitude, que passa a
referirem-se as matérias e não mais a programas.
Para isto, adotam um critério numérico, em termos de horas-aulas para
determinar a distribuição da educação geral e a formação especial. Sugerem, nas
séries iniciais, o percentual de 70% para a educação geral e 30% para a formação
especial.
138
Finalmente explanam a terceira dimensão do núcleo-comum, que se refere
a sua disposição ao longo do currículo, que deve ser feita de maneira que as três
grandes linhas sejam desenvolvidas nos currículo plenos durante todo o 1º e 2º
graus, da maior para a menor amplitude, constituindo atividades, áreas de estudo
e disciplina, isto é, no ensino de 1º grau, as atividades, áreas de estudo e
eventualmente disciplinas de educação geral resultantes do núcleo comum são
obrigatórias em todas as séries, admitindo variações nas respectivas cargas
horárias, devendo considerar a psicologia evolutiva.
Matemática faz parte da grande linha denominada Ciências. Seu objetivo é
o desenvolvimento do raciocínio lógico e a utilização do método científico, que,
como verificamos, era intenção predominante na sociedade, retratando as
tendências tecnicistas com a economia de tempo no pensar e, repetindo a
ideologia do MMM, com enfoque nas estruturas.
Recomendam a integração das matérias, acrescentando conteúdos
específicos ao todo do conhecimento humano e recriminam a fragmentação e o
isolamento das disciplinas nos modelos anteriormente adotados
.
Finalizam o Parecer, enumerando as implicações decorrentes dessa nova
concepção de currículo para os cursos de formação de professores, livros
didáticos, transferência de alunos, ensino supletivo e exames vestibulares, que
vão precisar se adequar.
O Presidente do CFE, Roberto Figueira Santos, tendo em vista o Parecer
853/71, homologado pelo Ministro de Educação, Jarbas Passarinho, resolve fixar
o núcleo comum para os currículos do ensino de 1º e 2º graus, definindo-lhes os
objetivos e amplitude por meio da Resolução N º 8/71.
Dentro do cenário traçado, a publicação dos Guias Curriculares do Estado
de São Paulo, em 1975, implementou uma política de produção de materiais de
orientação curricular, de sugestões de atividades e de informações sobre a teoria
de aprendizagem, direcionadas a professores primários, posto que novos
conteúdos e metodologias adotados nos guias eram desconhecidos para a
maioria do professorado paulista.
O documento é estruturado com base em um currículo centralizado nas
disciplinas e dividido em sete guias modelos, composto por: Apresentação,
139
Introdução, Considerações Gerais, Objetivos Gerais, Temas Básicos, Esquemas
de Conteúdo por temas e por séries, Especificação de Conteúdos e Sugestões de
Atividades.
No Guia estão presentes as intervenções do Secretário de Educação Paulo
Gomes Romeo; Therezinha Fram, diretora do Centro de Recursos Humanos e
Pesquisas Educacionais Professor Laerte Ramos de Carvalho e Delma
Conceição Carchedi, Coordenadora da Equipe de Currículo.
Na “Apresentação”, o então Secretário de Educação, Paulo Gomes Romeo,
considera como princípios fundamentais da escola, a unidade e continuidade.
Segundo o secretário, “Os Guias Curriculares” deveriam estar acordados à
necessidade de estruturação da escola fundamental em oito anos de
escolarização. Dessa forma, tinham como objetivo servir de elemento renovador
do ensino de 1º grau, fundamentando-se na lei 5.692/71, que consagrava a
extensão da educação básica obrigatória de 4 para oito anos.
O Secretário, fundamentado na Lei, ressalta o princípio democrático de
oferecer maior oportunidade para todos por meio dos princípios de continuidade,
gratuidade e obrigatoriedade expressos principalmente nos artigos 4, 5, e 20 da
nova LDB.
Lembramos que a Lei 5.692/71 determinou que o poder público oferecesse
oito anos de escolaridade gratuita e obrigatória, com uma duração mínima de 720
horas anuais para toda a população da faixa etária de 7 a 14 anos.
A nova organização ficou dividiu a educação básica em ensino de 1º grau e
ensino de 2º grau.
Em seu primeiro artigo, determina o objetivo geral do ensino de 1º e 2ºgrau:
Art. 1º. O ensino de 1º e 2 º graus têm por objetivo geral
proporcionar ao educando a formação necessária ao
desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-
realização, qualificação para o trabalho e para o exercício
consciente da cidadania. (BRASIL, 1971).
A Lei conferiu aos currículos um núcleo comum e uma parte diversificada.
O núcleo comum, fixado pelo Conselho Federal de Educação, era obrigatório para
todo o território nacional. A parte diversificada, fixada pelos Conselhos Estaduais
140
de Educação, tinha como objetivo atender às identidades locais e às diferenças
individuais dos alunos.
Podemos sintetizar:
Conteúdo comum
Conteúdo
diversificado
Matérias do núcleo-
comum e do Art. 7º
Matérias escolhidas
ou propostas pelo
estabelecimento
Matérias escolhidas
ou propostas pelo
estabelecimento
Educação geral
Formação
especial
Figura 22 - Quadro baseado na Lei 5.692/71.
Os currículos plenos de cada estabelecimento de ensino deveriam ser
constituídos por disciplinas, áreas de estudo e atividades, gerais e diversificadas,
sendo organizados de tal forma que, no ensino de 1º grau, a parte geral fosse
exclusiva nas séries iniciais e predominante nas finais. No 2º grau, ao contrário,
haveria predominância da parte diversificada.
O caráter profissionalizante da Lei deveria ser somente no 2º grau, salvo
exceções.
Paulo Gomes Romeo ainda salienta o importante papel do professor como
indivíduo criativo para a “revitalização da prática escolar” e consolidação do
processo de democratização da educação.
Podemos encontrar evidências da intenção do Estado em dividir
responsabilidades com o professor na implementação da nova proposta
curricular, no momento que finaliza o texto em nome da Secretaria da Educação,
confiando aos professores a tarefa de auxiliar na implantação da nova lei
educacional no Estado de São Paulo. Com essa lei, a responsabilidade do Estado
141
com a educação passou a contemplar todo o primeiro grau, com duração de oito
anos porque obrigou todo estado a investir e fazer cumprir a lei federal.
Figura 223 - Guias Curriculares, 1972, p. 4.
À medida que analisamos os documentos, ficamos convencidos da
concepção ali populista apregoada, justificada pela demanda de matrículas e o
direito de todos ao acesso à escola. Configura-se também o excesso de
responsabilidades atribuídas ao professor, dividindo com o Estado a
responsabilidade de possibilitar uma educação de qualidade, conforme a
obrigatoriedade exigida pela lei federal.
Na Introdução do documento, Therezinha Fram justifica a necessidade de
elaboração dos Guias Curriculares. Segundo ela, o Centro de Recursos Humanos
e Pesquisas Educacionais Professor Laerte Ramos de Carvalho, que de agora em
diante trataremos por CERHUPE, após estudos científicos e legais para embasar
os novos conteúdos curriculares, assumiu a tarefa de revisão do currículo com
verbas do Plano Nacional de Educação. Afirma que só após os estudos para a
caracterização da Escola de 1º Grau é que foram estabelecidas as diretrizes
gerais para a construção do currículo.
Vale dizer, que Fram enfatiza a preocupação do governo com a formação
diversificada das equipes que iriam elaborar esses Guias. Segundo ela, a
formação heterogênea da equipe, que contava com professores de todos os
níveis de ensino, possibilitou a troca de experiência por esses profissionais do
ensino, podendo assim contemplar os diferentes olhares sobre a educação
primária. Outra preocupação que ficou evidenciada na leitura do documento foi a
solicitação de consultores do ensino superior que pudessem subsidiar esse
trabalho.
142
Fram assegura que, para a análise crítica da versão preliminar,
estabeleceu-se o mesmo critério de seleção de escolha dos componentes da
equipe, sendo estes pertencentes a todos os níveis de ensino.
Ela ainda adverte que, depois de implementados, esses documentos
sofreriam críticas e necessitariam de possíveis reformulações, obedecendo ao
princípio de flexibilidade atribuído ao documento. Essa característica do
documento é evidenciada, quando delegada ao professor e a tarefa de ajustá-lo
às circunstâncias da realidade de sua escola.
À medida que se avança na leitura do documento, percebe-se o excesso
de funções delegadas ao professor: Na Apresentação, o professor é chamado a
viabilizar e consolidar a política educacional do governo. Na Introdução é
convidado a participar da elaboração, avaliação, reformulação e implementação
das reformas. Nas Considerações Gerais, sugere-se ao educador, selecionar as
atividades possíveis a sua comunidade, conforme os recursos disponíveis, além
de adequá-las ao tempo disponível e ao seu perfil profissional. De acordo com a
Secretaria, o sucesso da implementação dependerá do comprometimento
assumido, além da atualização profissional referente aos últimos estudos sobre
aprendizagem.
Delma Conceição Carchedi, coordenadora da Equipe de Currículo, nas
Considerações Gerais, enfatiza que o objetivo dos Guias é a garantia da
continuidade da escolarização ao longo dos oito anos da escola de 1º grau, com
articulações entre o primário e o ginásio, a fim de atribuir um significado de
unidade ao currículo.
A coordenadora apresenta a política curricular adotada nos Guias. Afirma
que os estudos científicos da atualidade, citando Bruner, apontam para a
importância do planejamento, objetivos operacionalizados, emprego de métodos e
técnicas de ensino apropriadas.
Podemos dizer que o discurso dos representantes da Secretaria foi
construído conforme as recomendações tecnicistas hegemônicas na época,
enfatizando um plano estruturado à base de um currículo centralizado nas
disciplinas, com objetivos gerais e específicos a serem alcançados em 720 horas
143
mínimas, composto de sete guias como referência. Cada disciplina contém:
Introdução, Objetivos, Conteúdos e Sugestões de Atividades.
4.2.5 Indicação Nº 1/72
Aprovado em 3/1/1972, o documento indica ao CEE a expedição de
normas para a elaboração do currículo pleno da escola de 1º grau.
A câmara de ensino, tendo como relatora Terezinha Fram, sentiu-se na
obrigação de propor soluções para os problemas enfrentados por seu sistema de
ensino, na adequação da escola de 1º grau, nos termos da lei 5.692/71.
Ciente de todos os fatores referentes às dificuldades que interferem nesse
processo, como defasagem de pessoal, falta de recursos institucionais e materiais
e cooperação de outras instituições que não a escola, oferece no documento
subsídios para a organização do currículo da escola de 1º grau.
A relatora fundamenta o documento em Benjamin Bloom, lembrando que,
de acordo com a definição de currículo adotada, devem ser consideradas quatro
principais questões no desenvolvimento do currículo.
a) Que fins educacionais ou objetivos deveria a escola ou curso
procurar atingir?
b) Que experiências de aprendizagem devem ser promovidas para
levar a atingir estes fins?
c) Como podem estas experiências de aprendizagem ser
efetivamente organizadas para prover aprendizagem em
continuidade e seqüência e para auxiliar o aluno a integrar o
que de outra maneira apareceria como experiências isoladas
de aprendizagem?
d) Como avaliar a efetividade das experiências de aprendizagem?
(São Paulo, 1973. p. 97).
Conforme a relatora, o currículo é a seqüência de experiências através da
qual a escola tenta estimular o desenvolvimento do aluno, e os problemas de
desenvolvimento do currículo devem ser tratados sob as formas de dimensões
filosóficas, socioantropológicas e psicológicas, sendo a definição precisa dos
objetivos educacionais a primeira etapa para a construção do currículo.
144
Diante das considerações de Fram, podemos mais uma vez, constatar a
influência da escola tecnicista, tendo Bloom como um de seus mais ilustres
representantes nos documentos da época.
Merecem igualmente destaque no documento as recomendações em
relação à estruturação do currículo.
O currículo pleno, de acordo com o documento, deve ser organizado de
modo a favorecer a continuidade de estudos (ordenação vertical), a integração
pelo relacionamento das áreas de estudo (ordenação horizontal). Deve-se
considerar a exigência da Lei de predominância nas séries iniciais de matéria
tratada sob a forma de atividade, e nas séries subseqüentes, predominância da
matéria tratada como área de estudo ou disciplina.
Quanto às classificações do núcleo comum em três grandes linhas:
Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências, a relatora afirma que
devem integrar-se na medida em que os Estudos Sociais constituem o elo a ligar
as diversas formas de Comunicação e Expressão e as Ciências, e cada uma
dessas matérias possui conteúdos particulares obrigatórios.
Conteúdo Especifico
Amplitude e Extensão
Comunicação e
Expressão
Língua portuguesa.
Acrescenta-se Educação Física,
Educação Artística tratados como
atividade, e uma língua estrangeira
quando houver possibilidade.
Para a 1ª e 2ª séries, 45% do total de horas
anuais.
Para 3ª e 4ª série, 40% e 35%, e a partir da 6ª
série 25%.
Estudos
Sociais
Geografia, História, Organização
Social e Política do Brasil.
Inclui-se Educação Moral e Cívica.
15% do total de horas anuais em todas as séries.
Nas séries iniciais sob a forma de Integração
Social e tratada como atividade
Ciências
Matemática, Ciências Físicas e
biológicas.
Para 1ª e 2ª série tratadas predominantemente
como atividades.
As percentagens reservadas para a Matemática
devem ser mais altas na 3ª e 4 ª série.
A título de sugestão: 35% para as duas primeiras
séries incluindo Matemática e Ciências; Para a
3ª e 4ª série, 15% para Ciências, e 25% para
Matemática.
Para as demais séries, 10% para Ciências e em
Matemática: 20% para a 5ª série, 15% para a
6ªsérie e 7ª série e 105 para a 8ª série.
Tabela 9 - Quadro baseado na Indicação Nº. 1/72
145
Fram, alerta que é preciso considerar que o currículo pleno deve cumprir a
solicitação legal de que nas primeiras séries do 1º grau, se dê exclusivamente a
formação geral e nas últimas séries seja introduzida a formação especial.
Quanto à distribuição semanal das aulas de Educação Física, o documento
sugere três sessões no Ensino Primário e médio, espaçados na semana.
Especificamente sobre a avaliação, o documento informa as diretrizes,
processo, sistema de aprovação e recuperação, destacando a continuidade do
processo e sua relação com os objetivos propostos.
Por fim, o documento sugere estudos referentes à capacitação de
professores e especialistas em busca de melhores alternativas, para se
adequarem à nova lei, dada a complexidade do sistema de ensino do Estado de
São Paulo.
4.2.6 Parecer Nº 339/72
O Parecer, aprovado em 6/4/72 trata da significação da parte de formação
especial no currículo de 1º grau.
O Parecer inicia sua análise, destacando que o objetivo geral da educação,
de acordo com a Lei 5.692/71, é proporcionar ao educando "a formação
necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades em três aspectos: a auto-
realização, a qualificação para o trabalho e o preparo para o exercício consciente
da cidadania".
Destaca que, dependendo do grau de ensino, esses objetivos podem ser
alcançados de diversas maneiras e profundidade, sendo o currículo estruturado a
fim de possibilitar melhor integração entre as matérias e desempenho dos alunos,
e deve ser preocupação permanente de todos e presença obrigatória em todas as
partes do currículo.
Como já vimos, em cada segmento de ensino, o currículo pleno terá uma
parte de educação geral e uma outra de formação especial, sendo que no 1º grau
a formação especial tem o objetivo de sondagem de aptidões e iniciação para o
trabalho. Também classifica o núcleo comum como a parte obrigatória em âmbito
146
nacional e essencial ao currículo, dando unidade cultural ao país. Já à parte
diversificada é o componente que atende às diferenças regionais, conforme
peculiaridades, possibilidades locais e as diferenças individuais.
Convém registrar que a iniciação para o trabalho, de acordo com o Parecer
Nº 45/72 é entendida como um conjunto de atividades desenvolvidas pelos
educandos do 1º grau, na escola e na comunidade, com o fim de orientá-los no
sentido de conhecerem os diversos campos de trabalho existentes na localidade,
na região e no país. Logo, trata-se de um processo para orientar e não ensinar.
Os pareceristas sugerem que o currículo deverá ser constituído de
matérias. Para melhor compreensão, lembramos que o significado de matéria
usado não é outra coisa senão os campos dos conhecimentos fixados pelos
Conselhos de Educação, devendo as matérias se agrupar em dois grandes
conjuntos: o núcleo comum e a parte diversificada.
Quanto à qualificação para o trabalho no ensino de 1º grau, os pareceristas
advertem que a função do ensino de 1ª grau é a generalidade, levando o aluno a
se apossar de um arquivo comum de idéias fundamentais. Considerando-se as
diferenças entre o 1º e 2º graus, ambos objetivam tanto a generalidade quanto a
terminalidade, só que em proporções diferentes. Devemos observar, porém, que
no 1º grau os objetivos a serem atingidos são referentes à sondagem de aptidões
e a iniciação para o trabalho, diferente da profissionalização.
Convém notar que a função da sondagem de aptidões é responsabilidade
não somente da escola, sendo uma tarefa conjunta com a família, orientadores e
membros da comunidade. Sua programação será fixada de acordo com as
necessidades do mercado, devendo ser apresentada na forma de atividades,
colocando os alunos em contato com experiências relacionadas com as áreas:
primária, secundária e terciária da economia, o que permitirá a professores e
orientadores melhor observar as aptidões, interesses e habilidades dos alunos.
Desta maneira fica evidente que, apesar de núcleo comum ser voltado para
a educação geral, à parte diversificada volta-se tanto para a educação geral como
para a formação especial, sendo um complemento de caracterização que
enriquece o núcleo.
147
De acordo com o Parecer, no 1º grau não se trata de profissionalizar e, sim,
preparar o aluno para uma pré-qualificação a partir das aptidões que vão se
revelando.
Finalizam, afirmando que não há regra geral para a carga horária da parte
da formação especial do currículo, mas recomendam bom senso e observância
da predominância fixada pela lei da parte geral, sendo a quantificação da carga
horária e a fixação da série inicial desses estudos de responsabilidade das
escolas.
4.2.7 O Guia de Matemática
Quanto ao Guia de Matemática, a equipe responsável pela elaboração era
composta pelos professores Almerindo Marques Bastos, Anna Franchi e Lydia
Condé Lamparelli, e contava com Ubiratan D’Ambrosio, Lucília Bechara,
Manhúcia P. Liberman, entre outros, como pareceristas. Todos, como constatado
anteriormente, protagonistas e divulgadores do MMM.
O professor Almerindo Marques Bastos, e a professora Lydia Lamparelli
foram designados para a coordenação geral do Projeto.
É interessante percorrer a trajetória dos educadores designados para a
elaboração dos Guias Curriculares, projeto integrante da reformulação do sistema
de ensino paulista e entendermos a opção dos governantes por professores em
exercício, em detrimento aos atuantes nas universidades, que gerou polêmicas e
críticas.
A Lydia Condé Lamparelli, foi à primeira pessoa a ser convidada.
Nessa época (1972) eu trabalhava no Colégio Estadual "Professor
Macedo Soares", na Barra Funda. A Dalva Fonte Indiani, era a
outra efetiva do Macedo. Ela era muito amiga da Lydia.
Escreveram um livro de Matemática para o 1º grau, junto com
outros dois professores. Quando a Lydia a convidou para
participar da elaboração do Guia Curricular ela achou que era eu,
mais indicado para a tarefa (Bondade dela! Até hoje é uma das
minhas melhores amigas, apesar de não nos vermos há muitos
anos.) e me indicou para a Lydia. (BASTOS, depoimento oral,
2006).
148
Muito se tem discutido sobre a obrigatoriedade e centralização das
propostas pedagógicas produzidas pelo governo paulista. Os Guias Curriculares
foram elaborados como uma proposta à reformulação curricular no Estado, porém
podemos supor que foi muito difícil não acompanhar suas diretrizes. Apesar de
documento ser proposto como sugestão, sendo dada ao professor, diante da
realidade de sua escola, a decisão sobre a aplicabilidade das atividades, assim
como a liberdade de ampliá-las ou modificá-las, foi muito difícil. Ficar fora dele,
alternativamente, foi quase impossível, já que concomitantemente à veiculação
dos Guias, um grande projeto de capacitação de professores foi executado.
Apesar da insistência dos elaboradores em classificar o Guia de
Matemática como sugestão e não imposição percebe-se que o documento
construiu um modelo de estrutura de planejamento, de metodologias mais
convenientes, de formulação de objetivos mais adequados, pois forçosamente
fazia parte do projeto maior "a implementação da escola de oito anos do governo
do Estado" contido no Plano de Ação e, por esse motivo, controlado e dirigido
para toda a rede.
Quando fiz o Guia Curricular de matemática, eu impus uma
condição (...) Quando fui entrevistado pela coordenadora, que era
a Adelma Conceição, eu cheguei para ela e falei que participaria
da elaboração dos Guias Curriculares com a condição de que
esses Guias não seriam obrigatórios, porque eu como um
professor secundário, me recuso a seguir uma coisa obrigatória.
Tem um programa, que eu tenho que cumprir. Mas a maneira,
como eu vou dar como vou fazer, sou eu que tenho que decidir.
Ela disse que seria apenas uma proposta curricular. Ai eu aceitei,
só que depois que os Guias estavam prontos, eles pegaram e
fizeram um treinamento para toda rede e praticamente tornaram
obrigatório. (BASTOS, depoimento oral, 2007).
As diretrizes relativas à seleção de estratégias e as de avaliação são
acompanhadas de roteiros com a mesma característica de todo o documento,
orientando de forma técnica e impessoal o controle do processo de execução,
com a finalidade de tornar mais rápido, eficaz e possibilitar uma avaliação
observável e objetiva das metas pretendidas.
Os objetivos são construídos de forma operacionalizada, como orientado
pela Secretaria de Educação no
Plano de Ação.
149
Percebemos na a formulação dos Novos Guias Curriculares, grandes
diretrizes, normas e concepções que deveriam ser obrigatoriamente obedecidas.
Porém todos os elaboradores, em entrevista concedida, relatam que todas as
diretrizes foram aceitas passiva e acriticamente, pois estas eram as tendências
educacionais da época, sendo o que de mais moderno havia em matéria de
psicologia da aprendizagem.
Nos Guias não se determinava o que deveria ser feito e como
deveria. Apenas se tentava mostrar que a Matemática é uma
coisa só, não existindo a separação entre a Geometria e a
Álgebra. Era esse o enfoque nos Guias... Muitos não
entenderam... Nós queríamos destacar a unidade da Matemática,
e muita gente não entendeu isso. (BASTOS, depoimento oral,
2007).
Na Introdução do Guia de Matemática, os autores iniciam com uma
discussão que trata das diretrizes a serem consideradas, no momento de
elaboração de um programa, para uma determinada disciplina. Alertam que,
quando se trata da disciplina Matemática, isso ainda é mais complicado.
Destacaram a polêmica em relação ao método a ser utilizado, axiomático
ou intuitivo e ao tipo de orientação a ser dada, clássica ou moderna.
1ª) Qual o método a ser utilizado: axiomático ou intuitivo?
2º) Qual a orientação a ser dada: clássica ou moderna? (SÃO
PAULO, 1975, p. 209).
Defendem que um tratamento axiomático da matemática não seria
aconselhável ao 1º grau, porém, ressaltam que o rigor, característica do raciocínio
matemático, deveria estar presente em todo o programa.
Diante das considerações, segundo os propositores, seria necessária uma
reformulação nos métodos, nas estratégias utilizadas, e os conceitos deveriam
ser obtidos por meio da participação ativa do aluno durante a manipulação de
materiais didáticos em situações predominantemente concretas, passando ao
abstrato de maneira gradativa, atendendo ao desenvolvimento cognitivo do aluno.
Fica evidente nas considerações dos autores a influência da psicologia do
desenvolvimento, remetendo à teoria piagetiana relacionada ao desenvolvimento
cognitivo. Salientam que estão atendendo recomendações de vários educadores
matemáticos do mundo inteiro.
150
Esta discussão sobre a abordagem adequada denota uma ruptura velada,
com a recomendação divulgada pelos modernistas, para a ênfase à abordagem
lógico-dedutiva.
Os autores enfatizam a importância das novas descobertas no campo da
aprendizagem e fazem alusão a educadores e Matemáticos preocupados com o
ensino, como Gategno (pedagogo), G.Papy (pedagogo), Z.P.Dienes e,
principalmente, o psicólogo Jean Piaget.
Desse modo, estaremos atendendo ás recomendações de
matemáticos de todo o mundo que, nos últimos anos, vêm se
preocupando com a Pedagogia da Matemática, tais como: Caleb
Gategno, Emma Castelnuovo, G. Papy, Z.P. Dienes, Luciene
Felix, bem como do psicólogo Jean Piaget, (SÃO PAULO, 1975, p.
209).
Esses autores foram considerados suporte teórico para a priorização das
sugestões metodológicas contidas nos Guias.
Um componente que marca muito a fundamentação metodológica dos
Guias refere-se à influência explícita das idéias de Zoltan Dienes.
Soares (2001), em sua dissertação, aponta os matemáticos citados nos
Guias, e Jean Piaget, como alguns dos principais difusores das idéias que
influenciaram a reforma do ensino de Matemática no Brasil, por meio de seus
trabalhos individuais, em razão do fácil acesso a essas idéias dos educadores
brasileiros e as várias propostas elaboradas por eles com base nesses trabalhos.
Podemos também indicar a grande referência dada a esses autores em
razão do avanço da psicologia da aprendizagem no mundo, que revelou
especificidade da aprendizagem infantil que demandavam outras formas de
ensino da matemática.
A epistemologia de Piaget é, a todo o momento, lembrada pela equipe,
reforçando as sugestões de metodologia adequada para cada fase do
desenvolvimento. Segundo Vitti (1998), a figura de Piaget surge de uma maneira
positiva, juntamente com o desejo de modernidade e utilidade, e contribuiu
decisivamente para a renovação pedagógica por instituir uma nova pedagogia da
Matemática.
151
Nos Guias Curriculares, além da discussão sobre métodos e abordagens a
serem utilizados, os autores discutem o significado que é dado à matemática
moderna e procuram situar os professores sobre o desenvolvimento interno da
matemática, que provocou uma enorme necessidade de reformulação curricular
para adaptar-se aos novos conteúdos e às novas descobertas sobre
aprendizagem.
Os elaboradores dos Guias, no decorrer do documento, afirmam que a
principal discussão não deveria ser se a matemática seria moderna ou clássica, e,
sim, sobre a necessidade de reformulação radical dos programas, para adaptá-los
às novas concepções. A orientação dada ao curso deveria ser moderna, no
sentido de haver um maior dinamismo na aprendizagem.
Cabe mencionar que, embora o documento se baseie, em grande medida,
no estudo das estruturas, na unificação da Matemática através da linguagem da
teoria de conjuntos e de funções não enfatizava a abordagem axiomática.
Consideramos de importância fundamental: o papel central
desempenhado pelas estruturas matemáticas, estruturas essas
que podem ser evidenciadas no sentido dos campos numéricos
bem como na Geometria, e o importantíssimo conceito de relação
e mais especificamente, o conceito de função. (SÃO PAULO,
1975, p. 210).
Na fundamentação do Guia de Matemática, a influência da Psicologia
aparece atrelada à epistemologia genética de Piaget. Segundo os autores, era
necessário dar uma atenção especial a dois aspectos que consideravam de
importância essencial para o programa dessa disciplina: a ênfase às estruturas
matemáticas e ao raciocínio matemático. Sempre era salientado que, ao buscar
fundir a orientação intuitiva e moderna, os programas deveriam ser elaborados de
modo a preservar a unidade da Matemática.
Podemos considerar que a preocupação dos Guias em valorizar o
raciocínio intuitivo, diferenciando-se da abordagem axiomática apregoada pelo
ideário original do MMM praticada no ensino secundário, deva-se à influência de
Dienes e de Piaget já muito difundidos e aceitos na comunidade científica nessa
época. Segundo Piaget, o conhecimento matemático resulta de uma ação
interativa e reflexiva do homem com o meio em que vive. Piaget é citado pelos
152
autores várias vezes e sua teoria passa a fundamentar fortemente as idéias
propagadas nos Guias e a justificar a metodologia sugerida.
Fica evidente que a opção pela metodologia defendida por Dienes
intencionada tornar o currículo proposto pelo MMM mais próximo das práticas do
professor e possibilitar a utilização de materiais concretos pelas crianças na
construção de conceitos abstratos introduzidos após a reformulação curricular.
Podemos dizer que, talvez, a abordagem axiomática, apesar de todas as
pressões ideológicas exercidas, não tenha proliferado nos Guias para o Ensino
Primário, pois sua operacionalização para crianças seria difícil e inapropriada,
conforme as novas teorias da psicologia da aprendizagem.
Se, por um lado, os alunos foram beneficiados por esse novo olhar sobre a
aprendizagem matemática, devido à ênfase na metodologia com utilização de
materiais manipuláveis pelas crianças, percebemos a sobrecarga de funções
atribuídas ao professor, justificada pela necessidade de cumprimento ao princípio
de flexibilidade e a consolidação do principio democrático de maior oportunidade
para todos.
Ao se referirem aos assuntos tratados no programa, evidenciam que estes
foram agrupados em quatro temas: Relações e Funções; Campos Numéricos;
Equações e Inequações e Geometria, com o objetivo de garantir a unidade da
Matemática através da linguagem da teoria dos conjuntos. A sugestão dada
abarca a possibilidade de o professor reordenar os assuntos, não prejudicando a
estrutura do trabalho e garantindo a unidade da matemática no ensino, como
apregoava o ideário do MMM, no que diz respeito ao tratamento da Matemática
como uma disciplina.
Cada tema é acompanhado de seu objetivo específico, conteúdos
sugeridos e observações sobre as possibilidades de integração dos assuntos. No
esquema de distribuição de conteúdos, sugere-se o momento supostamente
propício para que determinado conteúdo esteja sistematizado pelo aluno.
Independentemente da priorização de certos conteúdos em determinadas séries,
assinala-se que todos devam ser explanados, embora implicitamente, em todas
as séries, de acordo com o desenvolvimento do aluno.
153
Ressaltamos que o Guia de Matemática foi construído em conformidade
com as diretrizes previstas para a elaboração do currículo e de acordo com a
formulação precisa de objetivos e a subordinação aos atributos exigidos:
flexibilidade, coerência, objetivos bem definidos, unicidade e organicidade,
integração e ordenação de conteúdos expressos na Lei 5.692/71.
As orientações expressas no Plano de Ação determinavam a constituição
dos planos escolares por objetivos bem definidos, utilizando-se de verbos bem
selecionados. Os conteúdos deveriam vir acompanhados das melhores
estratégias para atingi-los e dos instrumentos de avaliação correspondentes aos
objetivos propostos. O modelo de planejamento para a implementação dos Guias,
numa implementação controlada e executada em etapas, sucessivas ou
concomitantes, retratava a fundamentação tecnicista hegemônica na época.
No documento, Matemática faz parte da grande linha denominada
Ciências, na Concepção adotada pela SME, cujo objetivo é o desenvolvimento do
raciocínio lógico, enfocando as estruturas e utilização do método científico, que,
como verificamos anteriormente, era intenção predominante na sociedade,
retratando a tendência tecnicista com a economia de tempo no pensar, e
repetindo a ideologia do MMM.
O tema I- Relações e Funções- constituído por dez conteúdos, com o
objetivo de adquirir uma linguagem e conceitos que se constituam em elementos
unificadores da Matemática para aplicá-los sempre que necessário, demonstram
a importância dada à Teoria de Conjuntos, que poderia ser explorado
implicitamente nas quatro séries iniciais. Porém, é aconselhado que Relações
seja explicitamente explorada em todas as séries.
Quanto ao conteúdo sobre conjuntos, elementos, pertinência e diagramas,
sugere-se a sistematização até a 2ª série, pois esse tema é considerado
instrumento imprescindível para as futuras aprendizagens dos alunos.
Observando o quadro abaixo, temos condições de constatar a alta
expectativa em relação ao aluno de 5ª série. Apesar do objetivo do Tema I ser
adquirir a linguagem e conceitos da teoria de conjuntos, até o final da 8ª série,
exigia-se que, ao término da 5ª série, a criança já deveria ter dominado estes
conceitos.
154
Quadro 1-Esquema de conteúdos por temas e por série.
Tema I-Relação e Funções
NÍVEL I Nível II
Conteúdo 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª
1-Conjuntos; elementos; pertinência; diagramas.
X X X
2-Igualdade e inclusão. X
3- Reunião e intercessão X
4-Partição X
5-Par ordenado, produto cartesiano. X
6-Relações.
X X X X X
7-Propriedades das relações: Reflexiva, simétrica e transitiva.
Relações de equivalência.
X X
8-Propriedade antissimétrica. Relação de ordem. X
9- Aplicações ou funções. X X X
10- Equipotência. X
Tabela 10 - Quadro baseado na distribuição de conteúdos dos Guias, 1975.
Nas observações concernentes ao Tema I, os autores demonstram
identificação com o pensamento dos modernistas, quando defendem a unificação
da disciplina através da Teoria dos Conjuntos, facilitando o agrupamento de todos
os assuntos a serem ensinados em Matemática, principalmente os conceitos de
função e relação, que devem ser sempre destacados em todas as situações.
A utilização da linguagem da teoria dos conjuntos foi sugerida no
tratamento de todos os temas, o que, segundo eles, poderia contribuir para
alcançar os objetivos do programa. Essas mesmas características são citadas por
Soares (2001) como ideais do MMM:
Os estudos das estruturas e da Teoria de Conjuntos seria um dos
pontos centrais das mudanças. Desejava-se unificar a Matemática
e proporcionar aos alunos menos capazes ferramentas que os
colocassem a par de um ensino mais fácil e atualizado. (SOARES,
2001, p. 11).
155
Para auxiliar o entendimento dos professores sobre a maneira de
tratamento da Matemática adotada nos Guias, há um esquema de conteúdos
criado pelo professor Almerindo Marques Bastos, para demonstrar a unicidade da
matemática. Esse esquema foi colocado na Proposta Curricular de Matemática
para mostrar a Matemática como uma construção única, sem compartimentos
estanques, evidenciando, dentro das limitações da proposta, que os temas dessa
disciplina estão todos relacionados entre si.
O esquema se baseia em dois temas principais: “Relações e funções” e
“Estruturas”, que estão relacionados pelos temas secundários: “Conjuntos”,
“Operações”, “Equivalência” e “Ordem”.
O tema “Relações e Funções” relaciona-se, verticalmente, com a noção
de Figuras geométricas e suas Transformações, que colateralmente,
está ligado ao estudo das Funções numéricas, que por sua vez, liga-se
diretamente ao conceito de Polinômios, através das Funções
polinomiais (em especial a função linear e a função trinômio do segundo
grau). No caso do estudo dos polinômios e das respectivas funções
surge o problema das raízes (ou zeros) e do exame do sinal dessas
funções, o que leva, diretamente, às equações e inequações. Por outro
lado, as Figuras geométricas e as Funções numéricas estão
relacionadas pelo estudo das Medidas
.
Figura 24 - Guias Curriculares, 1975, p. 219.
156
O tema Estruturas está relacionado com o conceito de Campos
numéricos: números naturais, inteiros, racionais e reais. Podemos
observar, ainda, uma relação direta entre os Números reais e o Cálculo
algébrico, e deste com os Polinômios.
Existem, ainda, as linhas externas relacionando, diretamente, as
Relações e funções, os Números reais e as Funções numéricas.
Finalmente, existem as linhas tracejadas que ligam os temas
Transformações e Números inteiros, evidenciando o conceito de Grupo.
A ligação tracejada entre Números inteiros e Polinômios mostra a
estrutura comum de Anel. Existe também uma linha tracejada,
destacando o conjunto dos Números racionais como o primeiro exemplo
de Corpo. Essa linha poderia estar ligada também ao conjunto dos
Números reais, que é outro exemplo de corpo, do qual os racionais
constituem um subcorpo.
É possível imaginar, que o esquema, apesar de auto-explicativo para
matemáticos que há muito já vinham estudando a matemática desta maneira, foi
extremamente difícil de ser compreendido pelos professores primários, que não
tinham a vivência do todo da disciplina.
A equipe de Matemática considerou importante destacar, no estudo dos
campos numéricos, o fato de que a introdução de um novo campo numérico
devesse ter ligação com o problema da impossibilidade de certas operações
serem efetuadas, sem restrições, no campo anterior.
Cabe aqui mencionar que, contrariando as idéias originais do MMM, de
acordo com a caracterização feita anteriormente, onde era recomendada a
abstração desde as séries iniciais, os autores recomendam que as propriedades
das operações devam apenas ser exploradas, preparando o aluno para que, na 5ª
série, as mesmas pudessem ser explicitadas.
Em muitos momentos temos muitos elementos da matemática moderna.
Percebemos vestígios desse ideário na abordagem dos algoritmos, extremamente
estruturalista. O trabalho com algoritmos, porém, adquiriu uma dimensão nova, ao
ser explicado pela utilização das estruturas e propriedades.
157
Assim, em várias ocasiões, são sugeridas atividades com cálculo mental,
onde as estruturas aparecem e são colocadas à tona. Por exemplo, quando é
solicitado o cálculo mental de 23 x 12, observamos sempre a sugestão de
aplicação da propriedade distributiva, isto é, (20 +3) x (10+2).
Outra inovação trazida no Guia foi a divisão americana. A equipe
argumentava ser muito mais fácil para a criança aprender e compreender o
algoritmo. Muitos professores primários, inseguros, solicitavam muitas orientações
sobre como dividir usando esse método.
Tema II - Campos Numéricos
NÍVEL I Nível II
Conteúdo
1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª
1-Conjunto dos números Naturais (N):
A. Conceito e sistema de numeração.
X X X X X
B. Estrutura de N (operações)
X X X X X
C. Potenciação
X
2-Números Inteiros (Z)
A. Conceito e estrutura de Z.
X X
B. Números primos, divisibilidade.
X
3-Números Racionais (Q).
A.Números Racionais absolutos.
X X X
B.Números Racionais. Estrutura de Q.
X
4-Números Reais (R)
A. Números Irracionais
X X
B. Estrutura de R.
X X
C. Calculo algébrico.
X X
D. Polinômios em uma variável. Expressões racionais.
X
E. Números Reais sob a forma de radicais.
X
Tabela 11 - Guias Curriculares, 1975.
158
Tema III – Equações e inequações
NÍVEL I Nível II
Conteúdo
1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª
1-Sentenças matemáticas
A. Sentenças abertas; conjunto universo e conjunto verdade. X
B. Sentenças abertas com uma variável: equações e
inequações do 1º grau.
X X
C.Sentenças abertas com duas variáveis: equações e
inequações do 1º grau
X X X
D. Sentenças compostas: sistemas de equações e
inequações.
X X
Tabela 12 - Guias Curriculares, 1975.
Embora equações e Inequações só comecem a ser estudadas formalmente
na 6ª série, é aconselhada sua inserção implícita e intuitiva desde a 1ªsérie, como
dito anteriormente.
Os objetivos são redigidos de maneira operacionalizada, devendo o aluno,
na 6ª série, reconhecer uma equação e como resolvê-la, aplicando as
propriedades da igualdade, assim como as propriedades estruturais do conjunto
onde foram definidas.
Também foi assinalado como objetivo, associar as soluções de equações,
inequações e sentenças compostas de equações ou inequações, conceitos
geométricos. Esse objetivo revela mais um dos pontos de distanciamento do
ideário original do MMM.
159
Tema IV - Geometria
NÍVEL I Nível II
Conteúdo 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª
1- Figuras geométricas
A. Noções topológicas: interior, exterior e fronteira; regiões,
conexidade.
X X X X X X
B. Noções projetivas: retas, intersecções, convexidade. X X X X
C. Noções afins: paralelismo, semelhança. X X X X X
D. Noções euclidianas: distâncias, ângulos. X X X X X X
2- Transformações geométricas
A. Conceito. Invariante. X X X
B. Transformações através de coordenadas X
3- Medidas
A. Comprimento X X X X
B.Áreas X X X X X X
Tabela 13 - Guias Curriculares, 1975.
No Guia, a Geometria é dividida em: Figuras geométricas, transformações
geométricas e medidas. Para o ensino nas séries iniciais são priorizadas noções
topológicas; em todas as séries, noções projetivas; nas 3ª e 4ª séries, noções de
paralelismo e semelhança; na 4ª série, noções euclidianas; na 3ª e 4ª séries,
comprimento e área em todas as séries.
No documento, todos os Temas ocupam igual espaço, inclusive Geometria,
que é tratada como um conhecimento imprescindível para a compreensão do
mundo físico.
Os conteúdos referentes à Geometria têm distribuição e presença em todas
as séries. Espera-se que os alunos adquiram habilidades em construções
geométricas e processos de medida e desenvolvam a intuição geométrica.
Os autores recomendam o desenvolvimento dos conteúdos propostos de
maneira totalmente intuitiva, das primeiras séries até a última série. Propõem a
construção dos conhecimentos geométricos por meio da observação e exploração
do espaço físico, com a manipulação de materiais didáticos convenientes.
Destacam a utilização da linguagem de conjuntos como um meio auxiliar na
160
resolução de problemas específicos e incentivam a experimentação de métodos,
além dos geométricos, para a resolução de problemas.
Com respeito às noções de medidas, sugerem que a introdução das
noções de comprimento e área sejam desenvolvidas pela exploração do espaço
físico, passando para a representação no papel quadriculado até a descoberta de
regularidades.
Aconselham a continuação, mesmo nas quatro últimas séries, da
abordagem intuitiva, baseada nas experiências e observação, utilizando as
noções da Teoria de conjuntos como um meio auxiliar.
Indicam que o papel do professor é propiciar aos alunos oportunidades de
empregar conjecturas intuitivas, deduzindo propriedades geométricas, sem
grandes formalismos e rigor. Os autores também demonstram a preocupação na
formação do aluno para enfrentar novas situações, sejam elas situações
problemáticas referentes ao conteúdo ou não. Para tanto, destacam a
necessidade de um programa que contemple, de forma clara, os conceitos a
serem apreendidos, sendo dada ênfase necessária a cada conceito, explícita ou
implicitamente, conforme o desenvolvimento da criança.
Justificam a supressão de alguns conteúdos, argumentando que sua
utilização em outras disciplinas seria mais bem contextualizada. As unidades de
medidas foram deslocadas para ciências, onde poderiam ser trabalhadas de
maneira mais real.
A equipe de matemática acrescentou uma coluna com sugestões de
atividades, às recomendações exigidas pela Secretaria, na formatação do quadro,
onde eram apresentados os objetivos gerais e específicos.
A DAP insistia muito na formulação precisa dos objetivos, com
muita ênfase na operacionalização desses objetivos, conforme
Bloom e Mager, muito em moda na época, e nós tinham que
seguir essa orientação. Era maior a insistência nos objetivos do
que nos conteúdos. Nos Guias, nós adaptamos aquela outra
coluna que fala de conteúdos ao lado dos objetivos. Foi difícil
elaborar os Guias dentro das diretrizes estabelecidas. Tentamos
achar uma saída, de consenso, que satisfizesse a nós e a DAP
(BASTOS, depoimento oral, 2007).
161
Paralelamente aos conteúdos e objetivos, foram introduzidas sugestões
metodológicas, que enfatizavam a ação da criança na construção do
conhecimento e a utilização de materiais concretos na aprendizagem matemática,
percebendo-se nitidamente a fundamentação dos Guias nas idéias de Dienes,
principalmente com blocos lógicos, o que evidencia uma influência decisiva desse
autor na opção metodológica dos Guias Curriculares.
Conforme dissemos anteriormente, na Introdução do Guia, o professor é
chamado a assumir diferentes papéis no processo de implementação da
proposta. Ora como deliberador dos conteúdos a serem privilegiados, ora
determinando sua seriação. Em matemática recebe mais uma incumbência, a de
abordar conceitos matemáticos, utilizando nova metodologia, de modo a permitir o
sucesso do aluno.
Os autores procuram configurar em seus discursos, presentes em todos os
Guias a concepção de construção coletiva, com participação ativa de toda a
comunidade de educadores, talvez com o intuito de não deixar transparecer um
caráter autoritário. Analisando a maneira como foram formados os grupos
responsáveis pela elaboração e implementação da reforma curricular, pode-se
constatar o papel de reprodutores de atividades e executores de nova
metodologia atribuída aos professores primários. A maioria dos membros desses
grupos era composta por especialistas e pesquisadores ligados às universidades.
Assim, podemos explicar e configurar o papel atribuído aos professores na
elaboração e implementação da reforma curricular.
Deve existir, por parte do professor, uma preocupação constante
de orientar a aprendizagem que o estudante tenha uma noção
razoável métodos e processos matemáticos. (SÃO PAULO, 1975,
p. 210).
A etapa posterior à elaboração do Guia Curricular, constituiu-se de
treinamentos para os professores na nova dinâmica da política educacional do
Estado. A mesma reduzida equipe, responsável pela reformulação curricular de
matemática, foi também encarregada dos treinamentos para cerca de 70.000
professores primários paulistas na época. (São Paulo, 1972, p. 11).
A equipe preparava professores que iriam servir de monitores nos
treinamentos efetuados nas Divisões Regionais de Ensino, para divulgação do
162
Guia na rede estadual. Todos os professores treinados receberam vasto material
com o exemplar do
Guia Curricular e as Orientações Pedagógicas, com
orientações para formulação de objetivos, a fundamentação teórica (Brunner,
Bloom, Mager), etc. Podemos dizer que praticamente todo professor da rede,
naquela época, tinha esse material.
Foram convocados inicialmente, dois ou três professores de cada uma das
18 Divisões Regionais de Ensino, existentes naquela época, no Estado, e que
vieram a São Paulo, com todas as despesas pagas para participarem do
treinamento. Além da abordagem dos novos conteúdos contidos no Guia, eram
explanadas as orientações metodológicas sobre o desenvolvimento em sala de
aula desses conteúdos, com a utilização dos materiais concretos sugeridos.
Esses professores, que foram treinados em São Paulo reproduziriam esse
treinamento nas suas divisões regionais. Eles foram treinados para servirem
como monitores nos treinamentos regionais que atingiriam todos os professores
da Rede Estadual.
Fica evidente que, para efetivar uma implementação desse porte seria
necessário o envolvimento de vários outros elementos de toda comunidade
escolar para efetivá-la. Podemos pensar que esses treinamentos introduziam
mais um elemento complicador no processo de expansão e divulgação das novas
propostas.
Convém enfatizar a grande expectativa em relação aos professores na
divulgação dos novos métodos de ensino. Esperava-se que algumas horas de
treinamento bastariam para que se tornassem técnicos em procedimentos que
facilitassem a aprendizagem.
Citamos como exemplo o tema I - Conjunto e Funções, no qual os autores
colocam, como objetivos das atividades sugeridas, a aquisição de uma bagagem
de experiências concretas, que permitam desenvolver os mecanismos presentes
no método indutivo. Advertem que essa unidade do currículo deve ser
desenvolvida exclusivamente por meio de atividades, sendo o professor
responsável em ampliar as sugestões contidas. As noções de conjuntos e suas
relações devem ser exploradas dinamicamente em situações que permitam
explicitar noções espaciais.
163
Diante de todas as considerações expostas pelos elaboradores, percebe-
se a preocupação em alertar para os exageros cometidos em nome do
Movimento, ao salientar que o professor não deveria tomar a linguagem auxiliar
da Teoria de Conjuntos como objetivo principal do ensino, e alertam para os
perigos provocados pelo exagero dessa utilização.
Algumas considerações que utilizam a distribuição dos conteúdos dos
Guias podem apontar relações entre o ideário original do MMM e o contido na
reformulação curricular divulgada nos Guias.
Na comparação com o Guia anterior, encontramos vestígios de algumas
mudanças em relação aos conteúdos. Alguns foram redistribuídos, suprimidos ou
remanejados para outras disciplinas, para adequá-los numa distribuição coerente
com o desenvolvimento da criança e às novas possibilidades decorrentes da
expansão escolar para oito anos.
Numa primeira análise desses documentos, percebemos que, apesar do
período político autoritário, não podemos negar as oportunidades para discussões
e reflexões sobre a reforma, merecendo destaque algumas inovações trazidas
pelo Tecnicismo para o ensino, que contribuíram para a evolução das concepções
do processo ensino-aprendizagem em nossas escolas. Dentre elas, como já
mencionado, a introdução das provas objetivas, do planejamento anual elaborado
pelos professores de acordo com a realidade de sua escola, e expressos de
maneira organizada, originando a chamada avaliação quantitativa, que passa a
ser preferida entre educadores .
Destacamos, também, a recomendação dos autores para o
desenvolvimento dos conteúdos propostos de maneira totalmente intuitiva, das
primeiras séries até a última série a construção dos conhecimentos geométricos
proposta pela observação e exploração do espaço físico, com a manipulação de
materiais didáticos convenientes, a utilização da linguagem de conjuntos como
um meio auxiliar na resolução de problemas específicos e o incentivo à
experimentação de métodos, além dos geométricos, para a resolução de
problemas.
Reconhecemos o caráter ideologizado dos Guias Curriculares, porém, não
significa que desconheçamos o seu papel aglutinador em torno das discussões do
164
ensino da matemática e o compromisso dos elaboradores com a defesa de suas
convicções, demonstrando profundo conhecimento e participação em todas as
etapas da elaboração.
Não obstante o documento ter sido elaborado após divulgação maciça em
livros e periódicos, de críticas referentes às propostas do MMM e seu suposto
fracasso, as evidências que apontamos nos levam à constatação de que o ideário
do Movimento continua vivo, embasando as propostas do Guia, embora com
restrições ao rigor axiomático.
Sugerem que o papel do professor seja criar oportunidades para os alunos
empregarem conjecturas intuitivas, deduzindo propriedades geométricas, sem
grandes formalismos e rigor. Também demonstram a preocupação na formação
do aluno para enfrentar novas situações, sejam elas situações problemáticas
referentes ao conteúdo ou não. Para tanto, destacam a necessidade de um
programa que contemple, de forma clara, os conceitos a serem apreendidos, com
a ênfase necessária a cada conceito, explícita ou implicitamente, conforme o
desenvolvimento da criança, em razão do avanço da psicologia da aprendizagem
no mundo, revelando a especificidade da aprendizagem infantil, que demandava
outras formas de ensino da matemática.
Mais uma vez podemos notar a responsabilidade do sucesso colocada
unicamente nas mãos do professor, quando os autores classificam como variável
imprescindível o conhecimento e criatividade do professor na confecção e
adequação do material didático às fases do desenvolvimento da criança.
Segundo os autores, a importância e utilização correta desses materiais
são fatores decisivos para o sucesso da aprendizagem. Tal foco pode ser
constatado com a publicação de um documento complementar aos Guias,
intitulado Especificações de bibliografia, instalações e equipamentos, a ser
utilizado pelos professores nas aulas de Matemática.
Uma outra constatação refere-se à importância atribuída ao uso de
materiais didáticos. Uma grande ênfase é dada ao emprego desses materiais,
além do pressuposto de que o sucesso no alcance dos objetivos propostos
dependa do uso correto dos materiais manipuláveis, possibilitando a passagem
de um nível de abstração mais elevado de forma mais segura.
165
4.2.8 Guias Curriculares - Matemática. Especificações de bibliografia,
instalações e equipamentos
A bibliografia dos Guias foi lançada mais tarde em um documento de 82
páginas, com uma relação de livros, cada um com seu respectivo sumário e uma
coletânea de equipamentos didáticos com descrição e implicações didáticas,
elaborado pela Professora Maria Luiza do Carmo Neves e Almerindo Marques
Bastos, publicado pelo CHERUPE.
Almerindo Marques Bastos, em entrevista, relata a importância dessa
bibliografia para a implementação da reforma curricular proposta. Conforme a
concepção dos Guias, o conhecimento dos materiais didáticos utilizados no
ensino de Matemática e sua adequação às fases de desenvolvimento, fatores
primordiais para o sucesso dos alunos.
Por esse motivo, com o intuito de dar continuidade ao trabalho iniciado com
o Guia Curricular, foi realizado um levantamento dos recursos existentes que
possibilitassem melhor atuação do professor.
O objetivo da bibliografia endereçada ao professor era subsidiar seu
trabalho quando da implementação dos Guias, com informações sobre a
fundamentação psicológica e sobre a didática e a metodologia da matemática.
A publicação consiste na enumeração dos equipamentos e materiais
didáticos mais comuns, seguida de algumas indicações sobre seu uso, em
conformidade com a concepção dos Guias Curriculares. Ressalta a importância
dos materiais didáticos utilizados no ensino da Matemática, e sua adequação às
fases de desenvolvimento dos alunos.
Publicamos o índice do livro, com um pequeno comentário. Em
relação aos equipamentos, procuramos listar todos os materiais
pedagógicos conhecidos com sua descrição. Descrevemos os
blocos lógicos, o material Cuisenaire, o material dourado
Montessori e outros. Nesse trabalho há uma orientação aos
professores, depois uma relação de livros, constando, para cada
livro, um sumário e um comentário sobre ele. Para montar essa
coletânea, nós percorremos todas as lojas de brinquedos, todas
as fábricas de brinquedos e as lojas de brinquedos pedagógicos
de São Paulo. Também listamos os materiais mais conhecidos
pelos professores. (BASTOS, depoimento oral, 2007).
166
Apresenta uma coletânea de livros e equipamentos com a finalidade de
esclarecer o significado da reformulação do ensino de Matemática. Procura
elucidar para o professor de 1ª a 4ª série o processo de aprendizagem, os
objetivos do ensino da Matemática e as relações entre esse ensino e as
transformações sofridas por essa ciência e pela sociedade.
O documento é constituído de uma bibliografia para o professor com
sumário dos livros; uma bibliografia para o aluno, de acordo com a série, e uma
relação de equipamentos didáticos com sua descrição e implicações
educacionais.
Outro aspecto que deve ser ressaltado refere-se à oferta de fontes sobre
as novas metodologias e materiais de ensino. Há sumário de livros, no qual os
autores se preocupam com a atividade dos alunos na obtenção dos conceitos
matemáticos, bem como, na utilização de materiais didáticos.
As obras apresentadas no documento tratam basicamente de problemas
de fundamentação psicológica, didática e metodológica.
Usando o argumento de que os blocos lógicos são facilitadores da
aprendizagem, os autores apresentam um quadro com as "capacidades e
habilidades" que podem ser desenvolvidas com o uso do material. Entre elas,
citam: linguagem, codificação, conjuntos, relações, funções, espaço,
transformações e medidas.
Toda a bibliografia é composta por protagonistas do MMM. Podemos citar,
entre os autores com livros sumariados nesse documento: Halmos, Adler, Dienes,
Piaget, Fehr, Gattegno, Papy, GEEM, Dieudonné, entre outros.
A análise dessa bibliografia confirma nossas hipóteses sobre a presença
explícita do ideário do MMM na fundamentação dos Guias e a ênfase dada à
metodologia.
Após a divulgação das idéias de Piaget e a visita de Dienes ao Brasil, o uso
do material concreto foi apontado como facilitador da compreensão dos
algoritmos e das relações matemáticas pelas crianças.
Podemos verificar a importância dada a utilização adequada dos materiais
concretos, observando a figura anexada a bibliografia.
167
Figura 25 - Quadro demonstrativo, Bibliografia dos Guias Curriculares, p. 80.
4.3 Subsídios para a Implantação do Guia Curricular de Matemática, 1981
As rápidas transformações ocorridas na sociedade paulista, impulsionando
a procura por educação e, consequentemente, determinando a expansão da rede
de ensino paulista, acarretaram o ingresso de milhares de novos professores no
mercado de trabalho em um período curto de tempo.
Podemos observar essa expansão pela análise da tabela:
Ano Nº. Docentes
1954 23.428
1960 43.806
1968 58.717
1972 66.715
1980 78.922
Tabela 14 - Nº de docentes- Fonte: IBGE, Estatísticas do séc.20 e Estatísticas básicas,
1980, São Paulo.
168
O modelo grandioso de implementação dos Guias Curriculares, financiado
por acordos nacionais e internacionais, aliado à maneira como foram divulgados,
construíram modelos de estrutura dos sistemas de ensino, de metodologias mais
convenientes, de formulação de objetivos mais adequados, com promessas de
modernidade e sucesso da aprendizagem dos alunos.
As orientações contidas nos Guias Curriculares incumbiam o professor da
responsabilidade de identificar as atividades mais adequadas à obtenção dos
resultados esperados, assim como procurar respeitar as fases do
desenvolvimento cognitivo, devendo também estar plenamente familiarizado com
as novas concepções de currículo e sua maneira científica de planejamento de
ensino.
Convém lembrar que a intenção do governo paulista, em relação ao Ensino
Primário, como em todos os estados brasileiros na época, era com a expansão e
melhoria qualitativa, conforme o Plano Nacional de Educação deliberava,
cumprindo promessas de democratização do ensino.
A concretização dessa política colocava muitos novos professores
diretamente nas salas de aula. O Relatório da Chefia do Ensino Primário, de
1968, noticiava a inclusão de 5.000 novos professores primários no Estado, e a
Prefeitura de São Paulo, na mesma época, criava mais 3.000 cargos para
ocupação imediata em seu sistema.
Previa-se, também, o acompanhamento de todos esses profissionais pelas
respectivas equipes técnicas do Estado e Prefeitura para viabilizar a implantação
das reformas.
Exigia-se dos professores ingressantes a instrumentalização nas novas
teorias. Sem tempo de consolidar as grandes transformações ocorridas nas novas
metodologias e conteúdos introduzidos no ensino de matemática, os ingressantes
deveriam adaptar-se à nova realidade educacional, que privilegiava a
experimentação, racionalização, exatidão e planejamento.
Tanto é assim que a Secretaria ofertou muitos cursos e documentos com a
finalidade de atender às reivindicações dos professores diante dos novos desafios
referentes à clientela heterogênea e às novas diretivas.
169
Lembramos que as regulações em virtude da Lei 5.692/71, decorrentes da
acomodação da estrutura de ensino às novas demandas, desencadearam uma
política de publicações oficiais, tanto para nortear como para controlar os novos
sistemas de ensino criados.
Podemos observar que após a publicação dos Guias e sua veiculação,
através de cursos de formação e distribuição de materiais às escolas, houve uma
procura por publicações que norteassem a prática em sala de aula.
Tanto Estado como Município iniciaram uma política de produção de
materiais de orientação curricular e sugestões de atividades direcionadas a
professores primários, posto que os novos conteúdos e metodologias adotados
fossem desconhecidos para a maioria do professorado paulista.
Convém ressaltar que as enormes responsabilidades delegadas ao
professor, por meio da concepção tecnicista, na qual o modelo do
desenvolvimento do Currículo adotado realçava a racionalidade técnica do
processo-produto ligado a uma ênfase na eficácia e eficiência da produção, exigia
pleno conhecimento das novidades educacionais. Nessa perspectiva, o professor
era considerado como executor e técnico de planos e metodologias criadas por
especialistas.
A nova proposta, de ensino para a matemática, já contida nos livros
didáticos, era considerada inovadora, revolucionária e solução para os problemas
de aprendizagem, devendo ser de domínio do professor.
Ao tentar seguir as sugestões de metodologia sugeridas nos Guias,
surgiram muitas dúvidas e insegurança por parte dos professores e deram origem
a uma política de publicação de subsídios e orientações.
Nos documentos estudados, publicados como complementação dos Guias
e usados como estratégia de divulgação das reformas curriculares para o ensino
de matemática no primário, observamos a intenção de dar conta da defasagem
dos professores em relação aos novos conteúdos. A teoria era explanada, muitas
vezes, implicitamente, e muitos exemplos de prática em sala de aula eram
relatados para legitimar a teoria proposta.
Dentre os impressos coletados e classificados, como material de formação
e utilizados como estratégia para essa formação, optamos pela análise, mais
170
detalhada dos Subsídios, por considerarmos ser esse o documento mais
característico da educação da época, especialmente por enfatizar de maneira
exagerada às técnicas didáticas, confirmando um momento de confiança no
controle social intermediado pela técnica cada vez mais extensiva e aperfeiçoada.
Os Subsídios foram publicados em 1977, como resultado do projeto de
capacitação dos recursos humanos pela CENP, com dois volumes referentes ao
ensino primário, um para Álgebra e outro para Geometria. A nova Coordenadora
da CENP, Professora Maria de Lourdes Mariotto Haidar, justifica terem sido feitos
os “Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática para o 1º
Grau”, pela demanda ocasionada pela utilização dos novos materiais.
Quanto às datas de publicação dos Subsídios o que eu posso
lembrar é o seguinte: eles foram elaborados no segundo semestre
de 1977. Lembro que entreguei os primeiros originais depois no
feriado de 15/11. Logo, eles devem ter sido publicados em 1978.
Os volumes restantes foram publicados em 1979, quando os
primeiro já estavam na 2ª ou 3ª edições (BASTOS, depoimento
oral, 2007).
É uma publicação com distribuição gratuita para todas as escolas da rede
pública do Estado de São Paulo, com a 1ª edição no governo Paulo Egídio
Martins e as posteriores no governo Paulo Maluf, tendo Luiz Ferreira Martins
como Secretário de Educação e financiado pelo projeto do Governo Federal:
Desenvolvimento de novas metodologias aplicáveis ao processo ensino
aprendizagem do 1º grau. Convênio MEC/DEF/SE.
A grande procura do material pelos professores pode ser percebida pela
cronologia de divulgação do material. Encontramos três edições dos Subsídios,
sendo a 1ª edição de 1977, uma reimpressão em 1978, a 2ª edição publicada em
1979, com reimpressão também em 1979, e a 3ª edição, de 1981.
A equipe de elaboração dos Subsídios era coordenada pela professora
Lydia Lamparelli, que trabalhava na ATPCE
43
, e por Almerindo Marques Bastos,
que trabalhava na CENP, onde era Assistente Técnico. Além deles, participavam
professores da rede estadual (em sua maioria), professores da rede particular e
uma representante do Instituto de Matemática da USP.
43
Assessoria Técnica de Planejamento e Controle Educacional.
171
Inicialmente foram programados oito volumes, sendo cada um deles
atribuído a dois membros da equipe, que trabalhavam de acordo com suas
possibilidades, por não serem funcionários da CENP.
Figura 23 - Contra Capa Subsídios-Geometria, 1977.
A dinâmica de trabalho consistia em momentos individuais e em grupo.
Elaborados os textos individuais partiam para as reuniões em grupo para discuti-
los. Depois de terminada a redação esses textos eram encaminhados para os
coordenadores, que davam a redação final.
172
Depois da revisão de Português, o texto voltava para mim para
uma revisão final e a seguir era encaminhada para a datilografia
final a ser encaminhada a Imprensa Oficial do Estado para
publicação. (BASTOS, depoimento oral, 2007).
Figura 24 - Contra Capa Subsídios Álgebra-3ª edição, 1981.
No caso dos Subsídios, a crítica foi feita pelos Professores Alésio João De
Caroli e Ronaldo Garibaldi Peretti, que veio falecer durante a elaboração dos
Subsídios. O período de elaboração do material, em sua fase inicial, foi de julho a
novembro de 1977.
Podemos dizer que após a visita de Dienes ao Brasil e a tradução de seus
livros, os documentos oficiais publicados revelam a consistência em relação a
essas novas teorias e demonstram o objetivo de informar os professores quanto
às novas metodologias disponíveis com uma fundamentação teórica aprofundada.
173
Para compreendermos o contexto, devemos observar a influência de
Dienes na fundamentação dos Subsídios.
O GEEM há muito já divulgava as novas metodologias empregadas por
Dienes nas atividades com materiais manipuláveis em seus cursos e palestras.
Em 1967 eu fui ao Congresso na Espanha e trouxe mais livros de
Dienes. Eu já tinha alguns livros do Dienes... Na realidade quem
trouxe Dienes, foi GEEM. (BECHARA, depoimento oral, 2007).
Dienes, em sua visita ao Brasil, em 1971, deixou uma grande quantidade
de seguidores e muito material, além de ter ministrado vários cursos. A partir de
suas idéias, o MMM começou a ter uma nova visão. Seus trabalhos foram
considerados como solução para os exageros que se cometiam em nome do
Movimento, principalmente nas séries iniciais.
Dienes ultrapassa as recomendações e sugere caminhos para a
renovação, não nos conteúdos dos programas de ensino, mas sim
na forma com que os professores os ensinavam do ensino da
Matemática logo nas primeiras séries escolares. Ele preocupava-
se com o “como” o conteúdo era ministrado ao aluno (BONAFÉ,
2007).
A inserção de Dienes no Brasil é reivindicada por quase todos os
protagonistas entrevistados, porém podemos afirmar que todos divulgaram suas
idéias e materiais nos cursos promovidos pelo GEEM e nos impressos oficiais.
Bastos (2007) relata que a primeira aplicação dos blocos lógicos ocorreu
em Santos, no Colégio Vila Rica, por sua sugestão:
Uma vez estava na livraria francesa, vendo livros de matemática e
encontrei três volumes de matemática moderna, blocos lógicos.
Achei interessante, trouxe esse livro para Santos, e dei para as
professoras Maria Luiza do Carmo Neves e Maria Helena Roxo,
examinarem. Não existia nada aqui no Brasil sobre o Dienes. Elas
estudaram o livro em francês e acharam muito interessante. Uma
delas tinha um tio que era muito bom marceneiro, e elas, pelo
tamanho da mão da criança, nas fotografias daquele livro,
reproduziram o material e começaram a aplicar no Colégio Vila
Rica. Depois esse material foi difundido pelo Brasil inteiro, pelo
pessoal de São Paulo, do GEEM que pegou e começou a
introduzir. Porém, a primeira aplicação dele, foi aqui no colégio
Vila Rica. (BASTOS, depoimento oral, 2007).
174
A imprensa noticiava os materiais didáticos como uma revolução no ensino
da matemática, e sua utilização, imprescindível por todo professor Lucília
Bechara, em entrevista para o Estado de São Paulo, em 1º/7/1970, afirma que a
matemática não deveria mais ser ensinada como se fossem compartimentos
estanques e, sim, por meio de jogos que procurassem desenvolver a capacidade
de raciocínio. Os blocos lógicos são definidos pela professora como um material
que permite a execução de atividades, visando à formação de conceitos e
passando, em seguida, ao estudo dos próprios conceitos. (Nakashima, 2007).
Na imprensa, podemos contabilizar, analisando Nakashima (2007), cerca
de 90 títulos, no período de 1963 a 1971, referindo-se ao MMM, e oferta de
cursos pelo grupo, que chegava a atrair 900 professores interessados em 1963.
Todos os cursos ofertados a professores primários pelo GEEM eram coordenados
pela equipe formada pelas professoras Manhúcia P. Liberman, Lucília Bechara e
Anna Franchi, que também elaboraram ou participaram como pareceristas nos
Subsídios.
Considerando os aportes teóricos postos por Faria Filho (2005), podemos
tentar compreender os desdobramentos como prática social da publicação dos
Guias Curriculares.
Segundo ele, devemos analisar os documentos, considerando e
distinguindo dois momentos fundamentais: o momento da produção e o momento
da realização, sempre observando que a produção da legislação escolar é, já,
realização de outras.
O momento da realização dos Guias originou a produção de outros
documentos, em decorrência dos movimentos dos sujeitos da escola.
Tanto o processo de escolarização quanto as culturas escolares
não são pressupostos; eles são o processo e o resultado das
experiências dos sujeitos, dos sentidos construídos e
compartilhados e/ou disputados pelos atores que fazem à escola
(...) é preciso que eu considere que os sujeitos que a constroem
guardam, eles também, diversos pertencimentos e identidades
pelas quais as culturas escolares estarão continuamente
informadas. (FARIA FILHO, 2005).
Esse movimento dos professores, insistentemente reivindicando sugestões
e formação, originou muitos outros documentos. Um dos caminhos possíveis para
175
concretizar a proposta defendida nos Guias foi a formação por meio desses
documentos, com sugestões de atividades, que subsidiassem os professores
quanto às alterações curriculares propostas.
4.3.1 Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática –
Álgebra
Podemos dizer que o “Subsídios para a Implementação do Guia Curricular
de Matemática–Álgebra - 1ª a 4ª séries”, com versão preliminar veiculada em
1977, foram resultado do movimento dos sujeitos da escola, inseguros com as
mudanças propostas pelas reformas de ensino.
Figura 28 - Capa Subsídios-álgebra, 1979.
176
Reforça a visão estruturalista da matemática, defendida pelo MMM, que
tinha como pilares: a teoria dos conjuntos, o conceito de funções e relações,
porém, foi priorizada a demonstração das várias utilizações dos materiais
manipuláveis. Percebe-se a preocupação dos autores em produzir um texto que
não enfatizasse a linguagem simbólica.
O estudo da materialidade do objeto nos revela grandes intenções de
divulgação das novas metodologias. Com relação às características físicas,
podemos dizer que o projeto editorial foi bem estruturado, com design simples,
moderno e de fácil compreensão para a época, graças a sua nova configuração
lingüística. Toda concepção gráfica do texto objetivava torná-lo popular, durável,
com capa dura, de fácil manuseio, determinando caracterizá-lo como próximo dos
professores.
Os conteúdos mais simplificados dirigiam-se ao professor e apresentavam
os novos recursos didáticos, contextualizando-os com os objetivos propostos.
O documento é estruturado a partir do conceito de relações e funções,
sendo a teoria de conjuntos norteadora para a organização dos conteúdos. A
distribuição desses conteúdos tinha como base a ampliação dos campos
numéricos, por meio da aplicação das propriedades estruturais.
Organiza-se em sete capítulos, divididos por série, contendo em cada
capitulo, os objetivos, o material necessário para as atividades sugeridas e
sugestões de atividades.
Outra constatação nos Subsídios refere-se à presença de uma justificativa
embasada na teoria da aprendizagem para cada atividade proposta. As atividades
sugeridas eram sempre justificadas pelos avanços da Psicologia, da Sociologia,
da Filosofia, da Pedagogia, da História, entre outras áreas comumente
mencionadas.
O documento foi assim estruturado:
177
SUMÁRIO
Prefácio
Advertência
Capítulo 1 - Introdução
1ª Série
Objetivos
Material
Atividades com blocos lógicos, com barrinhas de Cuisenaire.
Capítulo 2 - Estudos dos números
naturais menores que 10
1ª Série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Estudos dos números até 5
Estudos dos números de 6 a 10
Capítulo 3 – Ordenação dos números Naturais
1ª a 4ª Série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Capítulo 4 - Sistema de
numeração decimal
1ª a 4ª Série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Capítulo 5 – Adição e subtração de números naturais
1ª a 3ª série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Capítulo 6 – Multiplicação e
divisão de números naturais
Multiplicação-1ª a 3ª série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Divisão-1ª a 4ª série
Objetivos
Pré-requisitos
Material
Atividades
Capítulo 7 – Números Racionais
A) Números Racionais - Introdução
3ª série
Objetivos
Pré - requisitos
Material
Atividades
B) Números Racional-Forma Fracionária-Operações
3ª série
Objetivos
Pré- requisitos
Material
Atividades
C) Números Racionais - Forma Decimal
3ª série
Objetivos
Pré - requisitos
Material
Atividades
D) Números Racionais - Forma Decimal
4ª série
Objetivos
Pré - requisitos
Material
Atividades
E) Números Racionais - Multiplicação e divisão de números
representados na forma decimal
Objetivos
Pré – requisitos
Atividades
F) Números Racionais – Porcentagens
Objetivos
Pré – requisitos
Atividades
Tabela 15 - Quadro baseado na distribuição de conteúdos dos Subsídios, 1979.
178
No Prefácio, os elaboradores ratificam as idéias tecnicistas sobre
planejamento. Ressaltam a importância da formulação dos objetivos de forma
operacionalizada, num trabalho em moldes científicos, considerando as fases do
desenvolvimento mental do aluno, a fim de que a aprendizagem seja efetivada.
O documento delega ao professor a responsabilidade de selecionar as
atividades mais adequadas e necessárias, de modo a agilizar as chances de
sucesso no alcance dos objetivos propostos.
Indicam que o trabalho planejado do professor é imprescindível para a
aprendizagem dos alunos, e que essa aprendizagem deve ser controlada com
atividades que possibilitem aos alunos demonstrarem ter conseguido alcançar os
objetivos inicialmente fixados pelo professor.
A elaboração deste material tem como objetivo fornecer ao
professor elementos que permitam resolver o problema de
identificar as atividades necessárias à obtenção dos resultados
esperados, permitindo, assim, a efetiva implementação das
propostas curriculares. (SÃO PAULO, 1981, p. 11).
Deste modo, procuram apresentar informações e sugestões de atividades
para operacionalizar os conteúdos propostos em cada unidade, e assim, tornar a
ação pedagógica mais eficaz para a consecução dos objetivos.
Apesar de ser nomeado como subsídio ao professor, como contribuição ao
seu trabalho e não como imposição, devemos lembrar que as novas metodologias
apregoadas pelo MMM já eram unanimidade entre os educadores, presentes em
todos os livros didáticos, motivo de curso de capacitação e noticiado na mídia
como solução dos problemas de aprendizagem, não sendo permitido ao professor
desconhecimento ou opção por uma aula apenas discursiva.
Seguindo as diretrizes tecnicistas dos Guias, o material apresenta um
grande número de atividades, considerando os pré–requisitos de cada uma, com
tarefas múltiplas e progressivas a serem executadas pelos alunos e que deveriam
ser supervisionadas pelos professores. O planejamento de cada conteúdo inicia-
se com a formulação dos objetivos, seguindo-se da descrição dos materiais
didáticos a serem empregados e das formas de utilização desses materiais e
observações referentes a fatores que condicionassem o uso do material,
179
relacionados ao aluno, à disponibilidade de recursos didáticos e à própria
programação.
Os autores finalizam o Prefácio, reafirmando que a matemática é única.
Procuram mostrar a Matemática como uma construção única, sem
compartimentos estanques, sem aquelas divisões habituais do ensino da matéria:
Aritmética, Álgebra, Geometria, etc., cabendo ao professor escolher a ordem que
será desenvolvida assim como a distribuição por série, mediante um
planejamento elaborado conforme as recomendações prescritas nos Guias.
Assim configurado, o discurso dos autores traduz uma ilusão de que uma
metodologia prolixamente explicada e uniformemente implantada instituirá
condições, por si só, para uma efetiva e eficaz renovação no ensino de
matemática.
É preciso, ainda, considerar que os autores advertem sobre alguns
exageros cometidos anteriormente em nome do Movimento. Algumas questões
levantadas referem-se à utilização de uma linguagem apropriada às crianças e às
diferenças regionais, bem como a adequação das atividades ao desenvolvimento
infantil e o papel ativo do aluno na construção dos novos conceitos.
Considerando o estudo e análise dos Guias e dos Subsídios, verificamos,
nos Subsídios, a presença de Dienes e, consequentemente, maior preocupação
com os métodos de ensino, esboçando apropriações do ideário original. Ainda
observamos preocupações com a participação ativa do aluno na construção do
conhecimento, a sugestão de confecção de outros materiais mais acessíveis,
utilização de dobraduras, liberdade no uso da intuição e relaxamento no rigor da
linguagem simbólica.
No capítulo I - Introdução, os autores apresentam atividades que
desenvolveriam as habilidades necessárias à exploração do conceito de número,
e sugerem que isso deve ser feito com a manipulação de objetos, citando vários
materiais disponíveis no mercado para esse fim.
Apresentam os blocos lógicos para os professores, descrevendo-o e
propondo substituições mais baratas para seus atributos, como furos na cartolina,
em lugar da espessura, por exemplo.
180
No que diz respeito à sua utilização, indicam o material como mais
apropriado para iniciação à lógica e para desenvolver as noções elementares da
teoria de conjuntos.
Figura 29 - Exemplo de sugestão de atividades
Também são apresentadas as réguas de Cuisenaire, como facilitadoras na
aprendizagem das operações com números naturais, para a introdução de
números racionais e para iniciação à geometria.
Em seguida são tratados vários modelos de atividades, que podem ser
realizadas com os materiais descritos.
181
Figura 30 - Exemplo de sugestão de atividades
Dienes e Piaget são lembrados no decorrer do documento, justificando as
atividades sugeridas.
Dienes trabalhava as estruturas de ordem e construía classificações e
seriações, usando os blocos lógicos. Com esse material estruturado, com todas
as variáveis presentes, como forma, tamanho e espessura, podemos classificar, e
construir uma gama de seriações, até chegar às estruturas do sistema de
numeração.
182
Quando Dienes traz o trabalho dele para o Brasil, ele traz uma
crítica à maneira como foi implantada a MM porque não se
gostava da matemática moderna, porque era muito formalista. A
matemática moderna está relacionada em tornar vivas as
estruturas matemáticas e ai ele vem com os materiais, mas foi
muito criticada. Foi até mais criticado que a MMM. (BECHARA,
depoimento oral, 2007).
No capítulo 2, o estudo dos números naturais é explorado com base nas
estruturas de ordem, relações de correspondência, seriação, comparação, e
aplicação de algumas propriedades estruturais. A maneira como foram dispostas
as atividades nesse capítulo, demonstram o cuidado em introduzir as noções
abstratas sobre bases intuitivas mais simples e mais sólidas, a fim de torná-las
mais bem compreendidas.
Os jogos sugeridos foram justificados também pela necessidade da
realização de estudos preliminares sobre conjuntos, relações e funções. Faziam
parte desses estudos, as relações de pertinência, inclusão, as representações de
conjuntos, operações de conjuntos, pares ordenados, produto cartesiano,
relações binárias, propriedades das relações, desenvolvidas ao longo das quatro
séries.
De acordo com a equipe, só a partir desses estudos preliminares, poderia
ser estudado o sistema de numeração em diferentes bases observando a relação
de inclusão existente e suas propriedades estruturais.
Percebe-se também a preocupação dos autores em produzir um texto que
não priorizasse o rigor da linguagem, observada na maioria dos livros do ensino
secundário.
Nos capítulos 3 e 4 - ordenação dos números naturais - Sistema de
Numeração Decimal, os autores ressaltam a importância da relação de ordem em
matemática e seus variados tipos. Introduzem a propriedade distributiva como
característica principal dessa relação. Reforçam que o entendimento do processo
de agrupamento, num sistema de numeração, é indispensável para o estudo do
sistema de numeração decimal e para a compreensão da técnica das operações.
Isso pode ser observado nas atividades existentes da época, com várias bases,
enfatizando as estruturas de Anéis e Corpos nos sistemas de numeração nas
diferentes bases.
183
Nos capítulos 5, 6 e 7 – Operações com Números Naturais e Introdução
aos números Racionais. As sugestões eram em forma de jogos com os blocos
lógicos e o material de Cuisenaire. Priorizavam a metodologia, com o estudo do
funcionamento dos algoritmos, com participação ativa dos alunos.
4.3.2 Subsídios para a Implementação do Guia Curricular de Matemática –
Geometria
Como já dissemos anteriormente, o estudo dos documentos oficiais nos
levou a desconstruir algumas representações sobre a ação do MMM no Ensino
Primário, principalmente as relacionadas com vigência e abrangência.
A quantidade de conhecimentos está crescendo tão rapidamente
que o ensino nas escolas tem que se restringir, inevitavelmente, a
poucas informações sobre os mesmos. É, portanto, imperativo
que a escola desenvolva no aluno habilidades propícias a dar-lhe
independência para a aquisição de mais informações, de outras
que se reformulam e de outras que se acrescentam ao acervo dos
conhecimentos. (SÃO PAULO, 1978).
Essa fala da Secretaria nos Guias Curriculares pode configurar as
mudanças curriculares pretendidas, posto que o Estado já devia prever não dar
conta da nova clientela recebida com a democratização do ensino, com base no
antigo modelo de escola primária.
Assim, os documentos decorrentes das modificações curriculares
propostas procuravam subsidiar e convencer o novo professor sobre as
alterações necessárias.
O documento de Geometria entra nesse perfil de propor outras estratégias
de ensino de matemática para atender ao novo perfil de aluno. Contém 66
páginas, com o mesmo formato do volume referente à álgebra, talvez
indiretamente usado como estratégia de recomendar o tratamento da matemática
como única, devendo ser trabalhada conjuntamente, sem privilégios para
quaisquer conteúdos.
A versão preliminar foi veiculada em 1977, juntamente com o Subsídio de
Álgebra, em conformidade com a concepção dos Guias Curriculares, ressaltando
184
principalmente a importância do conhecimento dos materiais didáticos utilizados
no ensino de Matemática e sua adequação às fases de desenvolvimento para o
sucesso dos alunos.
Figura 31 – Capa Subsídio-Geometria
O estudo da materialidade do objeto pode denunciar a estratégia da
Secretaria na divulgação da reforma curricular, segundo o qual o uso dos
materiais concretos deveria ser enfatizado. As características físicas revelam uma
diagramação simples, com textos curtos e de fácil compreensão para os
professores.
Faz-se necessário ressaltar que o documento analisado pertence à 3ª
edição. A procura por formação ocasionou várias reedições do mesmo
documento, com sua utilização em cursos de formação de professores, já que
fazia parte da bibliografia dos concursos da época.
185
Podemos observar, porém, que o exemplar de Álgebra, foi mais procurado,
o que demandou duas reimpressões, talvez por conter várias sugestões de
atividades com os blocos lógicos e outros materiais concretos. O Subsídio de
Geometria teve sua 1ª edição publicada em 1977, a 2ª edição, em 1978, e a 3ª,
em 1981, sem reimpressões.
Bastos (2006) ressalta que enquanto em algumas escolas esses impressos
nem chegavam a ser tirados do pacote, em outras, era disputado pela sua
divulgação em periódicos e faculdades.
A equipe de elaboradores repete a mesma organização adotada para os
Subsídios de álgebra: 6 capítulos divididos por série. Cada capítulo contém os
objetivos, os pré-requisitos, o material necessário para as atividades sugeridas e
observações para os professores, com esclarecimentos sobre os conteúdos que
irão ser desenvolvidos no capítulo. Incluem também o mesmo texto do Prefácio e
Advertências e a planificação de alguns sólidos.
SUMÁRIO
Prefácio
Advertência
Capítulo 1 - 1ª Série
Objetivos - Reconhecer as superfícies fechadas simples; reconhecer que
uma superfície fechada simples determina, no espaço, três conjuntos:
interior, exterior e fronteira; reconhecer os principais sólidos geométricos;
discriminar os vários tipos de sólidos geométricos.
Pré-requisitos, Material, Atividades.
Observações: informações para o professor sobre os conceitos de prisma e
pirâmide.
Capítulo 2 – 2ª Série
Objetivos - Reconhecer curvas abertas,
fechadas, simples e não-simples; identificar
pontos que estão: reconhecer pontos que
estão: dentro de uma curva fechada simples,
fora de uma curva fechada simples, na própria
curva; reconhecer que uma curva fechada
simples determina, no plano, três conjuntos de
pontos: interior, exterior, fronteira.
Pré-requisitos, Material, Atividades.
Observações para o professor sobre os
conceitos de região, vizinhanças simétricas,
conjunto aberto e convexo.
Capítulo 3 – 3ª série
Objetivos - Diferenciar os principais tipos
de sólidos geométricos e seus
elementos; reconhecer intuitivamente
que para os poliedros estudados se
verifica a relação de Euler; planificar
sólidos geométricos, através da
montagem e desmontagem de modelos.
Pré–requisitos, Material, Atividades.
Observações para o professor sobre os
conceitos de planificação.
186
Capítulo 4-3ªSérie
Objetivos - Identificar segmentos de reta e reta; Reconhecer um polígono como uma
curva fechada simples especial; Identificar os lados e os vértices de um polígono;
Classificar polígonos; Discriminar retas secantes e paralelas; Reconhecer retas
perpendiculares, através de dobraduras; Identificar ângulos formados por duas retas
perpendiculares; Classificar paralelogramos, retângulos, losangos, quadrados;
Reconhecer uma região poligonal como a reunião de um polígono com seu interior;
Discriminar regiões quadradas e retangulares.
Pré–requisitos, Material, Atividades.
Observações: Esclarecimentos para os professores sobre conceitos de reta secante,
paralelas e perpendiculares; ângulos e quadriláteros.
Capítulo 5- 4ª Série
Objetivo-Processo de medir; comparar dois segmentos de reta, determinar várias
medidas de um mesmo segmento utilizando várias unidades de medida; identificar numa
régua graduada o centímetro e o milímetro, relacionar as unidades do sistema métrico
decimal; selecionar uma unidade de medida adequada à grandeza a ser medida; fazer
estimativas; determinar o perímetro.
Pré–requisitos, Material, Atividades.
Observações: Esclarecimentos para os professores sobre transformações de medidas.
Capítulo 6-4ª Série
Objetivos - Comparar regiões poligonais; determinar várias medidas de uma mesma
região poligonal, usando unidades diferentes; reconhecer que quanto é menor a unidade,
maior é a medida; determinar a área de uma região poligonal cujos lados coincidam com
as linhas de um quadrilátero; estimar a área de uma região plana; utilizar as unidades
padrão de área, mais usuais.
Pré–requisitos, Material, Atividades.
Observações: Esclarecimentos para os professores sobre unidades de medida de área.
Tabela 16 - Sumário Subsídios Geometria
A Geometria é tratada dentro de uma visão estruturalista da matemática,
com base na linguagem da teoria dos conjuntos, o conceito de funções e
relações, conforme o ideário do MMM recomendava. Observamos as
apropriações do ideário por parte da equipe, quando recomenda a ênfase na
abordagem intuitiva e o relaxamento no rigor da linguagem.
O impresso enfatiza que, coerentemente com os Guias Curriculares, as
atividades devem permitir o desenvolvimento das estruturas e relações
matemáticas, sendo a nomenclatura introduzida gradativamente.
187
A geometria não foi abandonada, a geometria adquiriu um olhar
novo com a questão da classificação. No caso do primário quando
classificávamos as figuras em sólidos, em sólidos redondos e
depois fazíamos subclassificações àquela classificação dos
quadriláteros. (...) quadriláteros que têm todos os lados iguais, que
tem 2 lados iguais, os quadriláteros que têm 2 lados paralelos, e
que dá aquela intercessão, isso tudo é um trabalho que ate hoje
permanece com formas diferentes, e dava uma agilidade mental,
uma capacidade de definição (BECHARA, depoimento oral, 2007).
Podemos supor que a repetição das justificativas para a aplicação das
atividades propostas intencionem convencer os professores da sua eficácia, já
comprovada cientificamente. Sugerem que a Matemática pode contribuir com
ofertas de atividades que promovam o desenvolvimento intelectual, quando leva
as crianças à criação de soluções originais, que envolvem criatividade e
pensamento lógico.
A equipe defende a inclusão da Geometria como uma área de estudo no
currículo de Matemática da escola de 1º Grau, pois acreditam na sua contribuição
para o desenvolvimento mental da criança, já que os conceitos geométricos são
partes integrantes da natureza e podem fazer a interação entre a Matemática e o
mundo físico.
Assim, os elaboradores defendem a abordagem adotada para a Geometria,
na qual cada atividade coloca o aluno em interação com objetos concretos,
orientando-o gradativamente para as análises lógicas.
Recomendam ao professor o aproveitamento de todas as situações
cotidianas para propor atividades que o levem ao desenvolvimento do
pensamento lógico e à reflexão.
A distribuição de conteúdos baseava-se nos três pilares que
fundamentavam o ideário do MMM: conceito de conjuntos, relações e funções.
Primeiro formavam-se os conjuntos e, dentro dos elementos desses conjuntos,
faziam-se as relações e, finalmente, as funções. A abordagem da Geometria era
feita como conjunto de pontos, procurando mostrar a distinção entre os vários
conceitos geométricos: topológicos (interior, exterior, etc.), projetivos (retas,
intersecções, convexidade), noções afins (paralelismo, semelhança) e noções
euclidianas (distância, ângulos), além do uso das noções de transformação e de
invariantes.
188
Também tiveram o cuidado em pluralizar as possibilidades de utilização
dos materiais apresentados, reforçando a liberdade do professor em aceitá-las e
ampliar seus usos, conforme as diferenças da comunidade escolar onde seriam
aplicadas.
A propósito ainda das metodologias sugeridas, podemos dizer que as
orientações têm influência explícita de Dienes.
Quando Dienes traz o trabalho dele para o Brasil, ele traz uma
crítica à maneira como foi implantada a MM. Porque havia críticas
a matemática moderna. Porque era muito formalista. A
matemática moderna está relacionada em tornar vivas as
estruturas matemáticas e ai ele vem com os materiais.
(BECHARA, depoimento oral, 2007).
Preocupam-se ainda em expor alternativas para a falta de recursos para
compra dos materiais sugeridos. Propõem a substituição desses materiais pela
exploração e uso de recursos como dobraduras, espelhos, papel quadriculado,
geoplanos, para a construção intuitiva dos conceitos geométricos.
Ao longo do texto, percebemos a preocupação com a formação do
professor nos conteúdos de Geometria abordados. Esse documento também
pode ser visto como textos de apoio destinados à formação de professores nos
novos conteúdos propostos.
Figura 32 - Observação para professores. Subsídios Geometria
189
Observamos que a estrutura de ordem nesse capitulo tem o objetivo de
classificar os sólidos geométricos, usando as propriedades conseguidas por meio
da percepção visual e tátil. Os elaboradores também indicam que todas as
atividades exploratórias permitem a execução de pequenas demonstrações, sem
preocupação excessiva com o rigor e linguagem matemática.
Podemos inferir após a análise do documento, que a busca por novas
alternativas de ensino, dentro das concepções do MMM, impulsionou a introdução
dos materiais concretos e a preferência por uma abordagem mais intuitiva para a
Geometria, com participação ativa dos alunos nas situações de aprendizagem.
190
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste trabalho de pesquisa que realizamos foi analisar as
reformulações curriculares para o ensino de matemática nas séries iniciais,
propostas pelo governo no período estudado. Os documentos oficiais produzidos
pelo Estado, como dispositivos de imposição de saberes e normatizações e como
estratégia de divulgação, circulação e implantação das reformas no sistema de
ensino de São Paulo foram utilizados para o presente estudo.
O aprofundamento do estudo da expansão e reestruturação do Ensino
Primário no período entre 1960 e 1980, em São Paulo, possibilitou problematizar
as condições de introdução do ideário do MMM nos currículos de matemática,
apontando as estratégias de reformulação curricular e divulgação, produzidas
pelo Estado, foram veiculadas por meio de documentos para implementar as
novas diretivas para o ensino de matemática, na escola primária paulista e as
apropriações realizadas pela equipe de elaboradores desses documentos.
Essas reformas, por sua vez, estavam ligadas essencialmente a uma
realidade em que era necessária a modernização do ensino de matemática, para
adequar às novas exigências da sociedade e à nova clientela que passou a ter
acesso à escola pública.
Podemos observar, a partir do Plano Estadual de Educação, iniciado em
1967, a nítida opção do estado pelas estratégias de reformulação curricular e
divulgação, veiculadas por meio de documentos, para implementar as novas
diretivas para o ensino de matemática e, assim, tentar atender ao maior número
de professores em menor tempo, conforme compromisso de democratização do
ensino assumido pelo governo. Desta forma, os documentos podem ser
caracterizados, também, como estratégia indireta de formação de professores em
serviço.
191
Como alargar o número de vagas, contratar novos professores, normatizar
o currículo, conforme determinações oficiais, dentro de um Plano Estadual de
Educação que previa a inclusão de 95% da demanda por vagas, com recursos
determinados, em apenas 10 anos?
No período compreendido entre 1960 e 1980, todos os esforços da
Secretaria de Educação visavam à expansão da rede, com racionalização e
eficácia na aplicação de recursos, numa lógica empresarial caracterizada pelo
desenvolvimentismo, produtividade, eficiência, controle e repressão, obedecendo
a regras determinadas, conforme as orientações dos técnicos indicados pelos
acordos MEC-USAID, e seus princípios tecnicistas.
Podemos relacionar as reestruturações curriculares propostas pelo governo
paulista às mudanças ocorridas nos anos 60 (demanda social,
desenvolvimentismo, novos conteúdos, tecnicismo), em que a matemática vem
com novas idéias e tentativas de adequar o currículo a uma nova demanda da
sociedade, com a valorização dos conteúdos das áreas tecnológicas, manifestada
na predominância de financiamentos e treinamentos por parte do governo.
Ao relacionar as idéias de desenvolvimento a qualquer custo, num curto
tempo, a necessidade de democratização do ensino leva-nos a tentar
compreender por que as mudanças no ensino, defendidas pelo MMM foram
eleitas como as mais adequadas a um novo contexto sociopolítico-econômico, na
medida em que o MMM prometia uma matemática mais ajustada aos novos
tempos, acesso aos novos avanços da disciplina, oferecendo instrumentos para o
acesso a uma nova sociedade tecnológica e mais científica.
Pudemos começar nossas observações sobre as reformulações
curriculares no sistema de ensino paulista, que acarretaram mudanças no
currículo de matemática e pontuar as características do primeiro Programa da
Escola primária de São Paulo, datado de 1949.
Esse Programa foi adotado em caráter experimental, com concepções
ainda baseadas em uma escola elitista, preocupada em ensinar conteúdos de
aritmética, geometria e destreza de cálculo. Não encontramos nesse programa
reflexos diretos da pressão exercida pela nova burguesia instalada na região
urbana por acesso à educação.
192
Isso nos leva a supor que, nesse período, ainda não havia ações efetivas
governamentais para ampliação de vagas, pois, as taxas de reprovação escolar e
evasão eram muito altas: “De 100 alunos da primeira série, 40 continuavam a
segunda; 20 concluíam a quarta”. (SÃO PAULO, 1969, p. 136).
O Programa de 1949 não foi elaborado por matemáticos e o ideário do
MMM não estava presente. O conteúdo era distribuído de maneira lógica, sem
preocupações com o desenvolvimento psicológico da criança. A estrutura seriada
e previa provas de promoção a cada ano. A listagem de conteúdos era muito
extensa e enfatizava o ensino de operações por intenso treinamento e o
conhecimento da tabuada, não prevendo a continuidade de estudos ao ginásio.
Podemos inferir que o currículo era entendido apenas como uma listagem de
conteúdos, separados por série, que deveriam ser ministrados no tempo
estipulado.
Tudo leva a crer que as deliberações governamentais decorrentes da
pressão da sociedade por acesso à educação foram majoritariamente enfocadas
na expansão, sem expressar metas para a melhoria da qualidade desse
atendimento.
Podemos citar, por exemplo, entre as medidas governamentais, a adoção,
em 1960, da promoção automática, a redução dos períodos letivos dos grupos
escolares, o aumento do número de alunos por classe, a construção de galpões
de madeira e a criação do ensino público municipal em 1956. (Sposito, 1984).
Nesse quadro político de expansão e pressão da sociedade por aumento
de vagas, foi-se traçando um cenário propício a reformulações e estruturação do
sistema público de ensino paulista. Como o ideário do MMM foi incorporado na
produção de documentos oficiais que buscaram parametrizar o ensino de
Matemática nas séries iniciais das escolas paulistas?
Com o Plano Estadual de Educação, São Paulo dá início às reformas
necessárias. O estado, obrigado a ampliar sua rede de ensino, incorporou cerca
de 25.000 novos professores entre 1960 e 1970. Só na capital, em 1968, foram
contratados 5.000 professores que deveriam assumir imediatamente as novas
salas de aula. (São Paulo, 1969, p. 156).
193
Como integrar todos os novos profissionais inseridos na rede de ensino
estadual e ainda oferecer alternativas de propostas de ensino para reflexão? Não
havia tempo hábil para execução da emergente reforma e expansão do ensino e,
ao mesmo tempo, treinamento e capacitação para os novos mestres.
Assim, o Programa da Escola Primária de São Paulo, lançado em 1969,
trouxe as novas diretrizes governamentais de democratização da escola primária
paulista e, também, a “nova matemática” defendida pelo MMM, tanto que a equipe
da Secretaria responsável pela elaboração era formada exclusivamente por
membros do GEEM.
É fato que o ensino de matemática, até meados da década de 1950,
preocupava-se com os conteúdos de aritmética e geometria. Contudo a mudança
interna na disciplina e na sociedade impeliu o deslocamento rápido do foco e
abordagem, para tentar trabalhar a matemática na nova concepção, como uma
estrutura única, tentado contemplar todos os novos conceitos de maneira não
compartimentada.
Uma reflexão sobre as questões eminentes de expansão, a necessidade
de modernização do ensino de matemática, capaz de atender ao novo perfil de
aluno, aliada à percepção sobre a concepção da escola primária delineada no
Programa de 1969, pôde ser ressaltada, a fim de entendermos o currículo de
matemática da época.
Apesar das idéias de modernização do ensino de matemática, verificamos
no Programa alguns vestígios que nos levam a considerar o Ensino Primário
relacionado com o princípio de terminalidade. A quantidade de conteúdos prevista
para ser desenvolvido em apenas quatro anos revela esse princípio.
Com base nessa idéia de terminalidade expressa no currículo proposto,
podemos inferir que o desenvolvimento cognitivo das crianças não era a maior
das preocupações. Simultaneamente podemos supor que, à medida que não
havia, naquela época, muitas chances de maioria das crianças continuarem os
estudos, era determinada à escola a responsabilidade de procurar proporcionar o
máximo de conteúdo possível, no pequeno período no qual a escolarização era
obrigatória e gratuita.
194
Em síntese, o Programa de Matemática de 1969, o primeiro programa de
matemática para o Ensino Primário elaborado por matemáticos, trazia
modificações influenciadas pelo ideário do MMM, que circulava dentro e fora do
país. Foram introduzidos novos conteúdos referentes à Teoria de Conjuntos e à
Geometria. Quanto à distribuição, os conteúdos foram dispostos conforme as
orientações do ideário do MMM, priorizando os fatos matemáticos e as
propriedades estruturais das operações. Também percebemos algumas tentativas
de alterações metodológicas no tratamento de conteúdos de geometria, porém
não há ainda discussões sobre o uso de materiais concretos.
O diferencial constatado em relação ao currículo de matemática, do
Programa de 1949, foi o deslocamento da prioridade da aquisição do maior
número de conteúdos em menor tempo para a compreensão dos algoritmos das
operações, com redução considerável da ênfase na aritmética.
É possível observar a fundamentação psicológica do Programa em Jean
Piaget, como apregoado pelo ideário do MMM, porém com muitas limitações,
faltando elementos de maior aprofundamento das reflexões desse autor. Isso,
para além da análise dos documentos, é corroborado pelas lideranças
pedagógicas da época. .
Uma das críticas recorrentes de "nossos protagonistas" refere-se à falta de
aprofundamento dos textos sobre aprendizagem matemática escritos por Piaget.
A teoria do desenvolvimento de Jean Piaget justificava muitas ações durante o
MMM, mas, apesar de estruturas fundamentarem o ideário do Movimento, eram
pouco estudadas. Em grande medida, essas teorias chegavam aos professores
através de várias releituras e interpretações, dificultando a reflexão e gerando
incompreensões.
Liberman (2007) tenta explicar tal fato, relembrando que na época da
elaboração do Programa, a maioria da Equipe da Secretaria tinha pouco
conhecimento dos estudos de Piaget e, portanto, preferiram apenas mencionar o
autor para depois, num segundo momento, contemplar esse estudo. Diante disso,
muitos educadores focavam a aprendizagem apenas na execução das tarefas,
não explorando as estruturas matemáticas.
195
Muitas condições podem ter favorecido a oficialização do MMM por meio
dos documentos oficiais. Podemos supor que as condições do Brasil na década
de 70, com sua política de desenvolvimento econômico dependente do capital
estrangeiro, que obrigava as indústrias brasileiras à associação com esse capital,
propiciaram também a importação de modelos educacionais.
O sistema educacional apresentando sinais de crise há muito tempo
deficiente, faz com que o governo adote medidas para ajustar o sistema ao novo
modelo econômico, que exigia melhor formação de recursos humanos em razão
da expansão da economia. Os argumentos para a nova política educacional
fundamentavam-se nos modelos importados, na idéia da necessidade de criar
recursos humanos e tecnológicos, conforme o desenvolvimento econômico.
Nesse cenário é proclamada a nova LDB 5.692/71, com suas
características tecnicistas, na tentativa de atender à demanda por técnicos de
nível médio e conter a pressão sobre o ensino superior, e tornando obrigatória a
escolaridade de crianças entre sete e quatorze anos, passando o Ensino
Fundamental a ser realizado em oito anos. As características da Lei também
tiveram reflexos o ideário propagado pelo MMM, que se adequava perfeitamente
ao quadro, tendo o privilégio de divulgação nas publicações oficiais destinadas a
professores.
Quais modificações reais puderam ser notadas no currículo de matemática,
agora estendido para 8 anos? Como o ideário do MMM foi incorporado na
produção dessas reformulações curriculares que buscavam parametrizar o ensino
nas séries iniciais?
O clima favorável ao MMM, que levava por vezes à sua adesão acrítica,
sem questionamentos consistentes sobre o embasamento teórico e clareza dos
fundamentos do Movimento, resultou da conjugação de vários fatores.
Diversas reflexões sobre a inserção do ideário do MMM nas reformas
curriculares propostas para o Ensino Primário, puderam ser geradas ao
considerar que esse ideário já era conhecido pelos professores, por meio dos
cursos de formação oferecidos pelo GEEM, em convênio com o Estado, ou pela
grande divulgação nos livros didáticos.
196
É fato que a imagem do Movimento divulgada em publicações
44
da época,
que mostrava uma abordagem de que os problemas educacionais poderiam ser
solucionados com a modernização dos métodos de ensino, que privilegiassem a
experimentação, racionalização, exatidão e o planejamento, foi um dos vários
fatores facilitadores para a oficialização do ideário do MMM.
O papel das agências estrangeiras financiadoras como mecanismos de
divulgação, possibilitou a participação do Brasil em congressos internacionais, o
intercâmbio de professores brasileiros e estrangeiros, respaldando e divulgando
assim o ideário.
Destacamos como primordial a rede de sociabilidade trançada entre os
professores defensores do Movimento, com o patrocínio da Secretaria Estadual
de Educação de São Paulo, adotando-o como discurso oficial, por meio de
documentos e cursos para professores, a toda rede de ensino paulista.
Todos ambicionavam mudanças e toda nova experiência em educação
matemática com a “grife” do MMM era aceita sem maiores contestações. Talvez a
grande passividade/receptividade pelos professores tenha sido propiciada pela
falta de alternativas de oposição, e a necessidade de “pertencimento” a um
Movimento que buscasse identidades e valorização da profissão, o que poderia
ocorrer na integração e adesão a um movimento de vulto mundial. Devemos
ainda considerar que a imprensa exerceu um papel de persuasão nesse sentido.
No caso específico da Matemática Moderna, as matérias ressaltavam o caráter
inovador e revolucionário da nova proposta de ensino.
A participação de protagonistas do Movimento, como as professoras Anna
Franchi, Lucília Bechara, Manhúcia P. Liberman, entre outros, na elaboração de
Guias, deliberações e normatizações para o Ensino Primário, incrementou a
aceitação das propostas pelos professores primários, posto que elas eram muito
conhecidas e respeitadas nesse segmento de ensino. Em todos os cursos e
palestras, procuravam sempre ressaltar a importância da adequação dos
conteúdos as fases de desenvolvimento da criança, enfatizando a abordagem
estruturalista da matemática.
44
Artigos de periódicos brasileiros das áreas de educação Matemática. Como Revista Brasileira de Estudos
Pedagógicos, Revista da ANDE, AMAE Educando, entre outros.
197
Logo, a opção mais viável foi adotar o modelo defendido pelo MMM, já
presente nos livros didáticos e nas bibliografias referentes ao ensino de
Matemática.
Assim, o Guia Curricular do Estado de São Paulo, distribuído em 1975,
retrata as correntes ideológicas hegemônicas da época e é fruto das exigências
das tendências tecnicistas na educação brasileira.
Quanto às mudanças curriculares, percebe-se a ampliação da concepção
de currículo, que não significa mais apenas uma listagem de conteúdos,
linearmente encadeados. O currículo é concebido conforme as orientações
tecnicistas de autores como Bloom e Mager, com objetivos gerais e específicos
escritos de maneira operacional, além de orientações metodológicas e sugestões
de avaliação.
Os conteúdos saem de seu formato habitual, com abordagens não
tradicionais e ênfase nas orientações metodológicas.
Comparado com o currículo anterior do primário, de 1969, verificamos a
mudança da concepção de terminalidade para a de continuidade, conforme o
princípio expresso na Lei 5.692/71, ao custo de diluição, supressão ou
deslocamento dos conteúdos, com o privilégio das disciplinas tecnológicas em
detrimento das áreas humanas.
No currículo de matemática, a diluição do conteúdo para oito anos foi
justificada pela abordagem estruturalista, com ênfase nas funções e relações,
tratando a matemática como construção única e, assim, permitindo a flexibilização
no aprofundamento dos conteúdos, de acordo com as diferentes clientelas a
quem os Guias eram destinados.
Em decorrência do alargamento da obrigatoriedade de escolaridade,
muitos conteúdos foram deslocados para o 2º grau, de modo a tornar exeqüível a
nova escola de oito anos, democrática, com uma nova clientela heterogênea, que
exigia modificações na metodologia do ensino de matemática para melhor
contemplar as diferenças individuais.
Podemos dizer que o privilégio dado à metodologia nos Guias e Subsídios
se relaciona com a democratização do ensino. A introdução de muitos alunos com
198
um novo perfil, e com necessidades diferentes dos atendidos antes pela escola,
exigia outras práticas de respeito às fases do desenvolvimento cognitivo.
As orientações contidas nos Guias enfatizavam essa necessidade de
atendimento a uma nova clientela, fundamentando-se no ideário do MMM. Os
modelos de atividades sugeridos demonstravam preocupação com adequação,
participação do aluno, utilização de material concreto e respeito aos tempos e
espaços necessários para a construção da axiomatização. Logo, é possível
afirmar que a especificidade do ensino nas séries iniciais propiciou maior atenção
às atividades precedentes às abstrações.
Convém notar que, em relação às modificações na distribuição de
conteúdos, constatamos a importância dada à Geometria, ocupando igual espaço,
diferentemente do ocorrido nos livros didáticos do Ensino Secundário, durante a
vigência do MMM.
Outra constatação, tanto nos Programa de 1969 como nos Guias de 1975,
é a pouca referência ao entrosamento da Matemática com outras áreas, uma vez
que continuou a tendência de tratamento da matemática como disciplina isolada.
Apesar da referência sobre a necessidade da aplicação da matemática em outros
campos, os elaboradores não instrumentalizam o professor sobre os
procedimentos para contemplar a meta.
Apesar da insistência dos elaboradores em classificar o Guia de
Matemática como sugestão e não imposição, o documento construiu um modelo
de estrutura de planejamento, de metodologias mais convenientes, de formulação
de objetivos mais adequados, pois forçosamente fazia parte do projeto maior, "a
implementação da escola de oito anos do governo do Estado", contida no Plano
de Ação, e, por esse motivo, controlado e dirigido para toda a rede, agora com
uma clientela muito heterogênea e desconhecida dos professores.
Além da incumbência de formação de professores nos novos conteúdos, os
Guias também divulgavam a nova teoria de aprendizagem de Piaget e
apresentavam os novos materiais manipuláveis utilizados por Dienes no ensino
de matemática.
Também observamos que grande parte da bibliografia publicada para o
Ensino Primário durante a vigência oficial do MMM, como periódicos,
199
comunicações em Congressos, cursos de capacitação, entre outros, priorizava os
relatos de experiência sobre novas metodologias e sugestões de atividades para
a introdução dos novos conteúdos e utilização do material concreto.
Muitas limitações acompanharam as estratégias oficiais de reformulação do
ensino do estado de São Paulo. Apesar de contar com recursos financeiros do
Governo Federal e dos acordos internacionais para a implementação das
reformas pretendidas, além de meios de dispositivos de orientação e controle, o
Plano de implementação contava com várias hipóteses não tão viáveis como
concebia a equipe da Secretaria.
Entre as limitações encontradas nos Guias e Subsídios, podemos citar a
concepção de professor adotada. A equipe de matemática da Secretaria
pressupunha o professor como intelectual, dono não só dos novos conteúdos
introduzidos, mas também do processo de construção do conhecimento pelo
aluno, em cada fase de seu desenvolvimento cognitivo. Consequentemente essa
hipótese indicava a extrema necessidade da formação continuada desses
profissionais. Porém, como já vimos, com a democratização do ensino no Estado
e a súbita expansão da rede, a Secretaria não deu conta dessa formação.
Sobre a concepção inovadora proposta nos Guias, e mais tarde nos
Subsídios, há que se considera-la muito complexa para professores formados
conforme as antigas diretrizes. Isso levava a muitas distorções. A linguagem
matemática muito rebuscada e técnica, utilizada para explicar os itens abordados,
também gerava necessidade de maiores detalhes e originou vários documentos
com orientações e esclarecimentos para os docentes.
A necessidade de construir para os professores a nova concepção adotada
pelo Estado perpassava antes, por uma formação sobre as novas teorias de
aprendizagem que fundamentavam o novo currículo. Para isso, era preciso
passar de uma lógica teórica a uma perspectiva de interpretação nas práticas
escolares, o que muitas vezes suscitava interpretações equivocadas.
Verificamos na fala de todos os entrevistados, a concordância na hipótese
de que não havia clareza, para a maioria dos professores, das propostas gerais
do Movimento. No entanto, os participantes eram unânimes em defender as
mudanças no currículo e no ensino da matemática.
200
É preciso ainda considerar que a reforma curricular proposta pelos Guias
Curriculares foi marcada pelo descompromisso com a realidade regional. Parece
importante também lembrar que, em cada um dos países onde o Movimento
vigorou, a dinâmica foi diferenciada. O processo de apropriação do ideário foi
adaptado às necessidades de cada momento e cultura. Cada país, usando a
oportunidade e licença conquistada pelo MMM, experimentou, transformou,
ampliou e criou propostas de modificação no ensino de matemática.
A dinâmica de introdução das metas do MMM nas séries iniciais, de
maneira geral, foi beneficiada pelo uso e ênfase dos materiais manipuláveis
usados na introdução dos novos conteúdos. Auxiliaram também os já avançados
estudos de Piaget sobre a aprendizagem infantil e as experiências bem-sucedidas
de Dienes nas atividades com materiais concretos, priorizando a metodologia e
descartando os excessos cometidos, até então, no ensino secundário. Tudo isso,
possibilitou maior aceitação do ideário.
Dessa forma, é possível que nas séries iniciais tenha sido privilegiado em
experiências educacionais, e juntamente com o entusiasmo de educadores, com
a versatilidade e simplicidade dos novos materiais utilizados para a aprendizagem
por descoberta, tenha sido desencadear mudanças substanciais na metodologia.
Podemos ressaltar, também, que a estratégia de divulgação das reformas
governamentais, por meio dos documentos, deu origem a uma grande
preocupação com a metodologia e um fazer individual que gerou muitas
experiências intuitivas.
Assim, analisando os documentos oficiais que normatizavam o Ensino
Primário no período estudado, é possível imaginar que algumas experiências
propostas para o ensino da matemática foram mais bem-sucedidas na escola
elementar, em decorrência da melhor observância das recomendações de Piaget,
que alertava sobre a inutilidade da axiomatização precoce e a necessidade de
atividades concretas antes da abstração.
As evidências que apontamos nos levam a inferir que, apesar do
Movimento ter primeiramente dado ênfase ao ensino secundário, a preocupação
com o Ensino Primário também esteve presente desde o início do Movimento no
Brasil.
201
Convém registrar que, no ensino secundário, os defensores do MMM
procuraram fundamentação que relacionava as idéias de Bourbaki com a teoria
de Piaget para ensinar a matemática, com base nas estruturas fundamentais,
numa abordagem lógico-dedutiva. Acreditavam que a compreensão dessas
estruturas levaria ao entendimento de todo o resto de uma maneira natural.
Porém, nos Guias destinados às séries iniciais, os autores defendem a
construção intuitiva do conhecimento.
Podemos dizer que, a abordagem axiomática, apesar de todas as pressões
ideológicas exercidas, talvez não tenha proliferado nos Guias e Subsídios para as
séries iniciais, pois sua operacionalização para crianças seria difícil e
inapropriada, conforme as novas teorias da psicologia da aprendizagem.
Ao procurar compreender as possíveis causas da grande quantidade de
publicações para subsidiar os professores primários sobre os novos conteúdos e
métodos propostos, podemos dizer que estavam relacionadas com a insegurança
dos professores em entender a nova abordagem e as novas técnicas.
Os cursos de formação oferecidos, tanto pelos grupos de estudos
existentes, como pelas Secretarias de Educação, foram uma tentativa de adequar
de maneira a mais rápida e cômoda, os professores ingressantes na rede,
complementando sua formação com as novas idéias sobre aprendizagem infantil
e uso de materiais manipuláveis com destreza e eficiência.
Como o ideário do MMM era hegemônico na época, todas as diretrizes
oficiais e os cursos oferecidos aos professores eram nele fundamentados, não
parecendo haver outras alternativas. Consequentemente, era esta matemática
moderna cobrada nos concursos, nos livros didáticos e nas escolas. Logo os
professores não tinham outra bibliografia acessível senão a da matemática
moderna, que era imprescindível para o exercício da profissão.
Outro componente que mostra apropriações do ideário e caracteriza o
Movimento no ensino nas séries iniciais é a presença explícita das idéias de
Zoltan Dienes na fundamentação da metodologia proposta.
Podemos observar um diferencial nas propostas dos modernistas para o
Ensino Primário, após a visita de Dienes ao Brasil e a tradução de seus livros. Os
documentos oficiais publicados revelam a consistência em relação a essas novas
202
teorias e demonstram o objetivo de informar os professores as novas
metodologias disponíveis. As alterações metodológicas decorrentes são
evidenciadas em toda estruturação lingüística dos documentos subseqüentes e
são usados seus termos que sempre estão presentes no discurso do educador.
Mudanças substanciais são percebidas logo no discurso da equipe da
Secretaria, na Introdução dos Subsídios. As apropriações realizadas podem ser
verificadas, quando priorizam a metodologia em detrimento dos conteúdos
matemáticos:
Apesar das críticas referentes à imposição da Matemática Moderna nos
currículos oficiais, não podemos deixar de reconhecer sua importância para a
história da educação matemática e considerá-lo como um dos fatores
responsáveis pela aglutinação de educadores, originando os atuais profissionais
preocupados com a aprendizagem matemática e em relação às reflexões
referentes à aprendizagem infantil. Sendo assim, podemos afirmar que o
Movimento abriu um novo campo para os educadores matemáticos, que
anteriormente restringiam sua atuação profissional ao ensino secundário.
Uma das grandes conquistas do Movimento foi a modernização e
consolidação do mercado editorial de livros didáticos para o Ensino Primário,
tendo professores de matemática como autores. Pela primeira vez no Brasil,
matemáticos dedicaram sua atenção à elaboração de livros didáticos para
crianças, antes escritos por pedagogos ou professores ligados às séries iniciais.
A avalanche de informações sobre as mudanças propostas, a inserção de
milhares de professores na rede em um curto intervalo de tempo e a nova
clientela, antes elitista e agora heterogênea, pediam estratégias rápidas de
divulgação e circulação das novas propostas. Sendo assim a equipe de
elaboradores apropriou-se do que era possível, elencando um rol de prioridades
sobre o que realmente poderia ser inserido em sala de aula.
A reformulação curricular proposta pelo governo paulista, e o uso dos
Guias como estratégia desencadeou a publicação de inúmeros outros
documentos, destinados aos professores primários, com orientações
metodológicas, sugestões de atividades e formação dos professores com os
novos conteúdos propostos.
203
A pesquisa em impressos da década de 70 revela a predominância de
orientações aos professores, podendo ser vistos como textos didáticos destinados
à formação de professores nos novos conteúdos propostos, principalmente na
Teoria de Conjuntos, conteúdo novo para a grande maioria de professores.
No Brasil, de acordo com os professores entrevistados, o MMM no Ensino
Primário estava mais ligado a uma proposta mais experimentalista, segundo a
qual o aluno deveria permanecer em atividade constante durante a construção do
conhecimento, por meio de situações de aprendizagem com materiais concretos.
O professor deveria assumir o papel de orientador das descobertas primeiramente
intuitivas, que seriam sistematizadas e formalizadas gradativamente, sem grandes
preocupações com a simbologia.
Tudo leva a crer que o tema “matemática moderna” nas escolas primárias
teve características peculiares relativamente aos outros segmentos de ensino e
que afligiam os professores, que tiveram que adotar os novos conteúdos e
metodologia considerada a única “verdade” e solução para os problemas de
aprendizagem na época.
O movimento dos professores, insistentemente reivindicando sugestões e
formação, originou muitos outros documentos. Um dos caminhos possíveis, como
já se disse, para concretizar as reformas curriculares foi a formação, por meio de
documentos com sugestões de atividades, que subsidiassem os professores
quanto às alterações propostas.
Podemos concluir que os documentos foram os responsáveis pela
oficialização do ideário do MMM no Ensino Primário. Os Subsídios podem ser
vistos como a oficialização das alterações metodológicas, quando introduz e
enfatiza as orientações que Dienes preconiza. Podemos caracterizá-lo como
instrumento divulgador da metodologia com utilização de materiais concretos,
exemplificando passo a passo as atividades a serem realizadas.
Em suma, no Ensino Primário, as reformulações curriculares, por meio dos
documentos, oficializaram alterações didático-metodológicas no currículo de
matemática nas séries iniciais. Diante de todas as modificações metodológicas
propostas para o ensino de matemática no primário, a Secretaria foi pressionada
204
a adotar uma política de formação dos professores por meio de documentos
oficiais.
De certa forma, nos documentos estudados, percebe-se a clara intenção,
justificada por teorias científicas, em diminuir as expectativas em relação à escola
primária. Talvez para melhor cumprir as metas de expansão de matrículas foi
preciso limitar as funções conferidas à escola e, assim, viabilizar a entrada de um
enorme contingente de crianças no ensino das séries iniciais contando com os
mesmos instrumentais disponibilizados até então. É fato que a escola não poderia
continuar com as mesmas perspectivas elitistas, com o ingresso de uma grande
população heterogênea, mudando toda sua estrutura e limitando a qualidade no
atendimento.
Há muitas outras questões, não tratadas no presente estudo, referentes ao
processo de implementação dos Guias que merecem aprofundamento em outras
pesquisas. Há necessidade de estudos que abordem a recepção da produção
oficial do MMM na prática de sala de aula:
Finalmente, após tantos anos dedicados ao magistério na rede pública,
acreditando firmemente na possibilidade da melhoria da educação matemática da
maioria da população, gostaríamos de poder contribuir com este estudo para
reflexão e incentivar novas pesquisas, tendo como tema o Ensino Primário, a fim
de encorajar mudanças necessárias.
205
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i
ANEXOS
ANEXO 1
ENTREVISTADOS E SUA RELAÇÃO COM O MOVIMENTO DA MATEMÁTICA
MODERNA
1-Almerindo Marques Bastos
Professor de matemática licenciado pela USP. Ingressou da rede estadual
de ensino de São Paulo em 1955, trabalhando em várias escolas até ser efetivado
na CENP. Coordenou a elaboração dos Guias Curriculares do Estado de São
Paulo, e os Subsídios de Álgebra e Geometria. Também participou da elaboração
de vários documentos oficiais de orientações a professores, além de organizar e
ministrar cursos referentes ao ideário do MMM.
2-Lucília Sanchez Bechara
Professora de matemática licenciada pela Universidade de Campinas.
Ingressou na rede pública paulista em 1957. Mais tarde assumiu a Supervisão
geral dos Ginásios Vocacionais do Estado de São Paulo.
Sócia fundadora do GEEM, com grande produção para o Ensino Primário,
principalmente divulgando a idéias de Dienes. Organizou e ministrou cursos para
formação de professores, além de escrever livros didáticos. Também participou
da análise crítica dos Guias Curriculares do estado de São Paulo.
3- Manhúcia Perelberg Liberman
Professora de matemática ingressou no magistério público do Estado de São
Paulo em 1949, assumindo na cidade de São José dos Campos. Trabalhou no
Serviço de Medidas e Pesquisas Educacionais do Estado.
ii
Foi sócia fundadora do GEEM, onde organizou e ministrou vários cursos
para professores primários. Dedicou sua vida profissional ao Ensino Primário,
com a publicação de livros didáticos, sendo coordenadora do grupo de
matemática que elaborou o primeiro Programa da Escola Primária do Estado de
São Paulo em 1969.
4- Ubiratan D’Ambrosio
Prêmio Internacional de Educação Matemática,
medalha FELIX KLEIN.
Licenciado em Matemática pela USP em 1955. Sempre atuante no campo da
educação matemática, participou da análise crítica dos Guias Curriculares do
Estado de São Paulo.
iii
ANEXO 2
Entrevista com Almerindo Bastos -05/dez/2006 e jan./2007
.
Denise: Faço parte da prefeitura de SP. Tenho dois cargos. Em um deles, sou
coordenadora pedagógica e no outro, professora de matemática. Estou afastada
da coordenação pedagógica, para estudar, licença sem vencimentos e essa
pesquisa que estamos desenvolvendo... O tema é a Matemática Moderna do
Brasil. Nosso foco é o ensino primário.
Almerindo: Vocês já entrevistaram alguém antes?
Denise: Já sim,... Manhúcia.
Almerindo: Eu ia falar que elas são mais indicadas do que eu... Porque elas já
trabalharam com o ensino primário e têm livros escritos para esse nível. Também
tem a Ana Franchi. Ela também participou, se não estou enganado, da elaboração
do livro citado. A Profa. Maria Amábile Mansutti, que é professora primária,
também trabalhou nessa área. Ela participou da elaboração dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, junto com a Célia Maria Carolino Pires. Escreveu um livro
de Matemática para o ensino primário junto com a Lydia Condé Lamparelli e
também colaborou em alguns trabalhos no CERHUPE (que depois foi
transformado na CENP).
Marytta: sei.
Marytta: eu estou trabalhando com o Dienes, têm alguns que falam “Dienes”,
alguns falam “Dines”.
Almerindo: Ele é húngaro e parece que nessa língua a pronúncia é “Dienés”,
mas como ele viveu na Alemanha e a produção dele foi divulgada na França, uns
chamam de “Dienes” e outros o chamam de “Diènes”. Cada um usava uma das
pronúncias utilizadas para o seu nome.
Marytta: então, eu estou trabalhando com as coisas dele, da época que ele veio
para o Brasil para ministrar curso para professor.
iv
Almerindo: Ele esteve aqui em Santos. Naquela época eu estava bem envolvido
com o ensino da matemática e eu assisti à palestra dele. Também participei do
curso que ele deu em São Paulo promovido pelo GEEM (Grupo de Estudos do
Ensino da Matemática). Havia um colégio, aqui em Santos, chamado Vila Rica,
que trabalhava com o material do Dienes, mas durou pouco tempo. Era um
colégio que realmente se dedicava aos alunos. Era orientado por duas
professoras, uma de matemática, que era a Maria Luiza do Carmo Neves e outra,
que já faleceu, Maria Helena Roxo, que era professora primária. Elas escreveram
um livro sobre matemática, que era direcionado para o curso normal e tratava do
ensino da Matemática no primário. Se eu não me engano chamava-se Didática
Viva da Matemática no Ensino Primário. Eu tinha esse livro, mas, quando mudei
para este apartamento, ele se extraviou.
O professor fala sobre a perda de seus arquivos
Até uns doze anos atrás, eu morava, com meus pais, num apartamento de
três quartos e quando meus pais me faleceram resolvi mudar. Os meus livros
estavam todos lá. Livros, muitos documentos meus, alguns manuscritos, etc.
Quando fomos vender o apartamento, meu sobrinho achou que devia ser pintado.
Eu organizei, na sala, livros e papéis que deveriam ser doados e os que eu já
tinha separado e que eu deveria trazer para a nova residência. Porém quando o
pintor começou seu trabalho misturou tudo e ao retirarem as coisas que seriam
doadas, levaram tudo.
Denise: ah, que pena...
Almerindo: O pouco que sobrou eu dei para o Carrera (Antonio Carlos Carrera
de Souza). Ele é casado com a Gilda, que se interessou pelos documentos que
eu tinha.
Denise: sei...
Marytta: esses documentos o senhor doou para quem? Para esses aí?
Almerindo: Não. Os documentos perdidos foram doados para uma casa de
caridade, faz tanto tempo que nem lembro qual, mas o que eu consegui salvar
está com o Carrera e a Gilda.
v
Denise: Professor, a minha parte específica, no projeto do GHEMAT são
documentos oficiais. Observo que o senhor sempre aparece como coordenador,
não sei se o senhor lembra disso...
Marytta: com a parte técnica...
Denise: Pra começar, gostaria de saber como o senhor ingressou na
carreira?Fala um pouquinho sobre sua trajetória...
Almerindo: Eu sou formado pela USP, em 1954. Em 1955 fiz concurso para o
magistério secundário, ingressei e comecei a trabalhar nesse nível e no curso
colegial. Trabalhei durante 22 anos em escolas da rede estadual.
Almerindo: Em 1959, o Prof. Ubiratan que foi meu colega de faculdade, e que
lecionava na PUC de Campinas, foi nomeado professor da Faculdade de Filosofia
de Rio Claro.
Marytta: então eu tenho aula com ele
Almerindo: Ele precisava de um substituto e me convidou para trabalhar na PUC.
Trabalhei lá no Curso de Matemática, de 1959 até 1965, com exceção do ano de
1963, pois nesse ano estava em tempo integral na Faculdade de Filosofia de
Araraquara, onde trabalhei nos anos de 1962 e 1963.
Denise: Trabalhava também nas escolas estaduais de São Paulo?
Almerindo: Na época em que lecionei em Campinas, eu trabalhava lá duas vezes
por semana, mas podia lecionar na escola estadual (Na época no Ginásio
estadual “Prof. Eurico Figueiredo”, no bairro da Jaçanã.).
Lá eu lecionava no período da noite, pois, naquela época era muito difícil
conseguir escola estadual em São Paulo durante o dia. E depois eu me afastei do
Estado durante 2 anos, enquanto estava em Araraquara como professor
Catedrático Contratado. Trabalhei durante dois anos, porém, como eu não estava
satisfeito com o trabalho, saí. Naquela época, estava me preparando para fazer
doutorado na área de Matemática. O que me atrapalhou foi a “bendita revolução
de 64”. Eu estava afastado, em comissão, e devido aos Atos da “revolução” os
afastamentos foram cancelados e tive de reassumir meu cargo no ensino
secundário. No trabalho que estava fazendo iria tentar aplicar os métodos da
Topologia no estudo da Lógica.
vi
A implicação é uma relação de ordem parcial entre as proposições e dá para
definir uma topologia, muito fraca, num conjunto parcialmente ordenado.
Pelos motivos expostos acima fui obrigado a desistir da tese. Quem se interessou
pelo assunto foi o Prof. Mario Tourasse, que era um grande professor da
Faculdade de Filosofia de Rio Claro. Eu até emprestei a ele o livro no qual estava
estudando e no qual eu pretendia basear a minha tese. Quando o afastamento foi
cancelado voltei a lecionar na faculdade de Campinas onde fiquei até o fim do
ano. Depois me decepcionei, pois estava habituado com um tipo de aluno e era
um professor muito rigoroso. Basta dizer que o curso de análise dado naquela
época, hoje é de pós-graduação. Nenhum professor hoje dá um curso daquele
nível. Muitos dos meus alunos lá da Faculdade de Filosofia de Campinas foram
professores do Instituto de Matemática da Unicamp.
Denise: Nossa, era rigoroso mesmo.
Almerindo: Eu era rigoroso e tinha alunos muito bons: o Mario Matos, o Mauro
Bianchini, o Eduardo Sebastiani Ferreira, a Ítala Maria Lofredo, a Maria Luiza Fini,
que mais tarde também trabalhou em Educação Matemática, para só citar alguns.
Marytta: não conheço
Almerindo: Ela participava desses Congressos de Educação Matemática.
Também lecionei na Faculdade Sedes Sapientiae, matérias de que eu não
gostava: Geometria Analítica, Geometria Projetiva e Descritiva. A Geometria
Descritiva eu lecionava procurando levar os problemas para a Geometria no
Espaço e depois de resolvê-los voltar para a Descritiva.
Denise: os alunos acompanhavam naquela época?
Almerindo: Acompanhavam. Hoje, a diretora da faculdade me mandaria embora.
Marytta: infelizmente...
Almerindo: Por isso eu parei de lecionar em Faculdades. Não concordo em
baixar o nível.
Em 1972 fui chamado para participar da elaboração do Guia Curricular de
Matemática, juntamente com a Ana Franchi, a Lydia Condé Lamparelli e mais um
professor que ficou pouco tempo, o Benedito Antonio.
vii
Elaboramos o Guia Curricular de Matemática e depois preparamos
professores que iriam servir de monitores nos treinamentos efetuados nas
Divisões Regionais de Ensino para divulgação, na rede estadual, do Guia.
Mais tarde a nova Coordenadora da CENP, Profa. Maria de Lourdes
Mariotto Haidar, resolveu fazer os Subsídios para a Implementação do Guia
Curricular de Matemática para o 1º Grau.
Nessa época é que fui trabalhar na CENP, como funcionário, pois até então
éramos contratados. Éramos professores do estado, e esse órgão nos contratava,
por tarefa. De vez em quando precisavam e nos convocavam: trabalhávamos lá,
ficávamos dois, três dias e às vezes uma semana, treinando professores.
Denise: ah, então vocês eram contratados por tarefa?
Almerindo: Só depois, em 1976, é que eu fui para a Secretária de Educação, e
saí de sala de aula. Trabalhava na Secretaria da Educação, na Assessoria
Técnica de Planejamento e Controle Educacional (ATPCE), um órgão complexo,
encarregado de muitas coisas na Secretaria. Nesse órgão havia uma Equipe
Técnica de Análise de Ensino (ETAE). A Lydia Condé Lamparelli era a
coordenadora dessa equipe e me convidou para ir trabalhar com ela, em 76. Em
77, a Professora. Maria de Lourdes precisava de alguém para coordenar a
elaboração dos Subsídios. Lydia não podia ir, e fui no lugar dela. Fiquei um ano
emprestado, até que houve uma mudança e fui para um cargo na CENP.
Denise: a CENP publicou muito material. Eu queria voltar um pouco... Por
exemplo. Eu tenho aqui, uma pesquisa sobre os concursos de professores para o
magistério. Os aprovados eram muito poucos, porque de acordo essas
dissertações, em cada concurso passavam apenas 16, 40, 20 professores.
Almerindo: Num deles, eu e Lydia éramos da banca. Foi um dos que reprovou
mais... Mas o que você esperava? Com o nível dos candidatos, o resultado só
poderia ser aquele!
Marytta: verdade se vai lecionar e não sabe demonstrar
Almerindo: Havia 2 partes na prova, uma era de testes e a outra de
demonstrações. Na dissertação da Lydia em que ela estuda o resultado desses
viii
concursos, ela analisa to o sistema de provas. Havia cada coisa... Ela analisa
todas as questões. Havia respostas de questões que era um negócio pavoroso.
Denise: então, os professores que passavam faziam parte de uma elite. Os
professores, que em 1972 foram chamados para fazer os Guias, como eles foram
selecionados? Quem convidou o senhor para participar?
Almerindo: Foi a Lydia Condé Lamparelli, que foi a primeira pessoa a ser
convidada. Mas quem dava a palavra final era a professora Terezinha Fram.
Naquele tempo existia a Divisão de Assistência Pedagógica (DAP), que era
vinculada ao Ensino Secundário e Normal da Secretária. Foi feita, então uma
reforma que transformou essa divisão, no CERUPHE
45
(Centro de Recursos
Humanos e Pesquisas Educacionais, que depois recebeu o nome de Laerte
Ramos de Carvalho). A elaboração do Guia Curricular começou no tempo da
DAP. Quando já estava na fase final, foi publicada uma versão preliminar dos
Guias, ainda pela DAP. Depois, quando o órgão já havia sido transformado em
CERHUPE, foi publicado o texto definitivo que foi apelidado pela rede de
VERDÃO.
Mais tarde, em 1976, foi publicado um decreto que reestruturou toda a Secretaria
da Educação (Decreto 7510/76), que criou a CENP, e ao criar a CENP, ele
extinguiu o CERHUPE.
Denise: Mas o Senhor, conhecia a Lydia anteriormente, ela fazia parte da banca
com o senhor e trabalhavam juntos?
Almerindo: Eu conheci a Lydia da época do Movimento da Matemática Moderna.
Ela esteve aqui, em Santos, fazendo palestras. Quando eles vinham aqui em
Santos, os professores daqui, que formavam um grupo de estudos, geralmente
pediam que eu os acompanhasse. Esse Grupo de Estudos de Santos promoveu
vários cursos de Matemática que eram patrocinados pelo jornal A Tribuna, através
do seu Departamento Cultural, dirigido na época pelo Prof. Luiz Fernandes
Carranca, que também era professor de Matemática. O primeiro desses cursos
foi ministrado pelo GEEM. Quem dava as aulas desses cursos eram os
professores Oswaldo Sangiorgi e Benedito Castrucci. Os seguintes fui eu que
45
Centro de Recursos Humanos e Pesquisas Educacionais Prof. Laerte Ramos de Carvalho
ix
ministrei. Quando eu participei da Banca do Concurso de Ingresso com a Lydia
nós já tabelávamos na Secretaria da Educação.
Marytta: tem um foto aqui que pode ser um desses exemplos, inclusive o Dienes
está nela.
Almerindo: Esta aqui é a professora, Maria Helena Roxo, que trabalhou no Vila
Rica e já faleceu. Esse eu não me lembro quem era, acho que era um dos donos
do Vila Rica. Este é o Sangiorgi e este o professor Sylvio Andraus, que era um
professor muito conhecido em Santos, que deu aula no Colégio Canadá, autor de
livros didáticos. O Dienes, e eu... Aonde vocês conseguiram essas fotos?
Marytta: Foi o professor Wagner...
Almerindo: Eu tenho muitas outras... Tenho que procurar onde estão. Nessa
dissertação da Gilda existem muitas... Depois o Sangiorgi não quis mais vir dar os
cursos aqui em Santos, e propôs que eu e a Maria Helena o substituíssemos, pois
nós tínhamos muito contato com os professores daqui.
Almerindo fala da dissertação da Gilda...
Parte 2
Denise: Professor,... Voltando... De quem partiu o convite para a
coordenação
(substituir por elaboração) dos Guias Curriculares?
Almerindo: Nessa época (1972) eu trabalhava no Colégio Estadual "Prof.
Macedo Soares", na Barra Funda (rua Vitorino Carmilo, esquina de Albuquerque
Lins). A Dalva Fonte Indiani, era a outra efetiva do Macedo (como nós o
chamávamos). Ela era muito amiga da Lydia. Escreveram um livro de Matemática
para o 1º grau, junto com outros dois professores. Quando a Lydia a convidou
para participar da elaboração do Guia Curricular ela achou que era eu, mais
indicado para a tarefa (Bondade dela! Até hoje é uma das minhas melhores
amigas, apesar de não nos vermos há muitos anos.) e me indicou para a Lydia.
Denise: De quando é a primeira publicação?
Almerindo: O Guia Curricular de Matemática foi elaborado em 1972. Foi feita
uma edição preliminar que serviu de base para a Análise Crítica do Guia
x
Curricular Proposto para Matemática, realizada na semana de 23 a 27 de outubro
de 1972, por 30 professores, cujos nomes constam no final da edição definitiva.
Durante o ano de 1973, foi feita uma revisão da proposta inicial, com base nas
sugestões apresentadas nessa Análise.
Crítica. A redação definitiva foi então encaminhada para publicação.
Marytta: é porque o que nós temos é de 75, professor.
Almerindo: A publicação do texto preliminar foi em 1972, 1977 é a publicação
final.
Denise: mas foi veiculado em 75.
Marytta: o que ele está falando, por exemplo, é que teve versão preliminar.
Denise: Como foi esse caminhar, começou em 72, com uma versão preliminar, e
depois?
Almerindo: essa daí é a versão que não é dos professores (1974), a dos
professores é tal de Verdão (1977). Essa daqui é com um papel mais
“vagabundo”. Eles publicaram um, mais tarde, inclusive ininteligível, que era com
um papel que era muito bom, colorido.
Almerindo: A primeira divulgação oficial do Guia foi publicada num papel de
ótima qualidade, numa edição reduzida, com um papel colorido e o texto impresso
também em cores.
Denise: esse eu conheço.
Almerindo: Aquilo era praticamente ilegível.
Denise: A parte de matemática é laranja com azul.
Almerindo: Mais tarde, foi feita uma nova edição, num papel menos sofisticado e
impresso em preto e branco. Essas duas edições foram feitas para divulgação
junto às autoridades e também para as bibliotecas.
Finalmente, foi feita uma edição para ser distribuída na rede estadual, que os
professores chamavam de Verdão, talvez por ter a capa na cor verde.
Marytta: eu estou entendendo, de 72 até 75. Foi esse o processo de formulação.
xi
Denise: Quanto aos cursos em Santos, que foram dados pelo Senhor e pela
professora Maria Helena Roxo, a convite do professor Sangiorgi. O que era dado
nesses cursos?
Almerindo: Algumas noções elementares sobre Teoria dos Conjuntos, que
realmente foram introduzidas nos livros didáticos. Essa parte era dada nos cursos
do GEEM pelo Prof. Castrucci. O Sangiorgi dava a parte de introdução à Lógica
Matemática: as proposições, as operações entre elas, etc. Os cursos eram tanto
para professores secundários como para professores primários. Eu dei um curso
para professores primários, com todos esses conteúdos adaptados para esse
nível... Quem oferecia esses cursos em Santos, era o jornal A Tribuna. Havia um
professor de Matemática aqui, chamado Luiz Fernandes Carranca, que era diretor
do Departamento Cultural do jornal A Tribuna. Ele promovia cursos em todas as
áreas, não só em Matemática. Foi ele que promoveu esses cursos de Matemática
Moderna.
Denise: Quem financiava?Qual era a participação do GEEM?
Almerindo: A Tribuna promovia e financiava, porém era o GEEM quem
ministrava os cursos, que eram realizados no auditório do jornal e os professores
eram pagos pelo jornal A Tribuna, que também fornecia todo o material.
Denise: Onde está esse material?
Almerindo: Quando os professores Benedito Castrucci e Osvaldo Sangiorgi
deram o curso de Matemática Moderna aqui em Santos, várias professoras
fizeram anotações muito boas. Com base nessas anotações eu redigia apostilas
que eram revistas pelos professores Castrucci e Sangiorgi e depois
mimeografadas e distribuídas aos participantes do curso. Era uma apostila sobre
Introdução à Lógica e outra sobre Teoria dos Conjuntos. O Prof. Sangiorgi depois
aproveitou essa apostila, ampliou e usava nos cursos que dava. Na introdução ele
mencionava que era baseada na apostila elaborada em Santos. O Prof. Castrucci
utilizou a apostila para escrever o livro dele sobre teoria de conjuntos. Ele
modificou várias coisas, ampliou o texto e publicou um texto bastante conhecido
na época. Talvez exista na Biblioteca da PUC.
Marytta: nesses cursos que o senhor deu, por exemplo, ensino primário usando
essa linguagem de conjuntos, já falava no Dienes.
xii
Almerindo: Nesses primeiros cursos o material Dienes ainda não era usado. A
primeira vez que eu tomei conhecimento desse material foi na Livraria Francesa,
procurando livros de Matemática. Nesse dia achei os três volumes de Matemática
Moderna, no qual eram apresentados os blocos lógicos.
Marytta: aquela coleção dos primeiros passos?
Almerindo: Sim. Achei interessante, trouxe esses livros para Santos, e dei para
as professoras Maria Luiza do Carmo Neves e Maria Helena Roxo examinarem.
Não existia nada aqui no Brasil sobre o Dienes. Elas estudaram o livro em francês
e acharam muito interessante. A Maria Helena tinha um tio que era um ótimo
marceneiro. e elas, pelo tamanho das mãos das crianças, nas fotografias daquele
livro, reproduziram o material e começaram a aplicar no Colégio Vila Rica, aqui
em Santos.
Marytta: nossa que legal!
Almerindo: Foram elas que reproduziram o material e foram elas que
começaram a aplicar, no colégio Vila Rica. Depois esse material começou
a ser difundido pelo Brasil inteiro. A turma que fazia parte do GEEM
começou a trabalhar com esse material. Porém a primeira aplicação dele
foi aqui no colégio Vila Rica. Eu simplesmente fui responsável pela
descoberta dos livros, mas quem aplicou realmente o material foram elas
duas...
Marytta: olha que interessante!
Almerindo: A primeira escola a aplicar o material foi o Colégio Vila Rica. Na
época eram usados os blocos Dienes e as barrinhas Cuisenaire. Existia até um
livro, me parece que era de um argentino (Juan F. Arias), ou então era publicado
na Argentina. Ele estudava o material Cuisenaire de ponta a ponta. Esse material
era estudado pelos professores nos cursos. Nós procurávamos sugerir algumas
aplicações do material. Eu mostrava para os professores como podiam justificar,
não demonstrar, o teorema de Pitágoras, você conhece?
Marytta: não, não conheço essa demonstração não. As barrinhas eu conheço.
Almerindo: Existem muitas aplicações, usando esse material.
xiii
O professor mostra várias utilizações das regüinhas de Cuisenaire.
Marytta: é porque Dienes trabalhava muito no concreto né?
Almerindo: Como motivação é ótimo para as crianças. Não como demonstração.
Nos treinamentos, nós fazíamos muitas brincadeiras para motivar os professores.
Com a criançada, antes de introduzirmos os blocos de Dienes, fazíamos muitas
brincadeiras... Faz tempo que eu não trabalho com isso.
Almerindo: A criançada faz de tudo com esse material. Entregávamos os blocos
para que eles, primeiramente reconhecessem o material. Geralmente a primeira
coisa que elas faziam eram bonecos... Veja... Você conhece a diferença entre um
homem e uma mulher?.
Denise: não.
Almerindo: A criança tem muita criatividade... Eles formavam uma mulher e
mudando apenas uma peça representavam um homem. Veja... Era uma
brincadeira..., Depois disso, é que entravam realmente nas atividades
preparatórias para a Matemática, para as noções sobre os conjuntos.
Começavam a usar os diagramas de Venn, os jogos com os atributos das peças. .
O que houve com a Matemática Moderna foi o exagero, ela teve suas qualidades
e seus defeitos. Infelizmente as coisas foram mais para o lado dos defeitos do
que das qualidades.
Marytta: Em todos os livros do Dienes, encontramos muita coisa boa no ensino
da matemática. E às vezes eu fico me questionando porque não foi para frente...
Almerindo: Foram muitos interesses, principalmente das editoras... Eles teriam
que modificar muito as estruturas dos livros didáticos.
Quando participei da elaboração do Guia Curricular de Matemática, ao ser
entrevistado pela coordenadora geral do trabalho, que era a Delma Conceição
Carchedi, impus uma condição: eu só participaria da elaboração do Guia
Curriculares com a condição de que não fosse obrigatório. Como professor
secundário, me recusaria a seguir alguma coisa que fosse obrigatória. Existe um
programa, que eu devo cumprir, mas a maneira como eu vou dar, como vou fazer,
sou eu que tenho que decidir. Ela concordou, afirmando que seria proposta
xiv
curricular. Então aceitei. Porém, após a publicação dos Guias, eles fizeram um
treinamento para toda rede e praticamente o tornaram obrigatório. Aí as editoras
reclamaram, porque os Guias Curriculares não estavam de acordo com os livros
didáticos.
Uma das coisas mais inusitadas, naquela época, foi a colocação dos números
relativos na primeira serie, atual quinta série, logo após a subtração.
Isso não era idéia de Matemática Moderna, era, na verdade, idéia de um
professor americano chamado Murnaghan. Foi ele que praticamente inaugurou o
departamento de matemática do ITA, de São José dos Campos. Esse professor
escreveu um livro em que falava sobre como deveria ser ensinada a Matemática
no ensino secundário e no colegial e questionava porque não ensinar os números
relativos logo após a subtração, o que era uma coisa natural. Inclusive hoje, em
Matemática, se apresentam os números relativos por simetrização da adição. A
adição é uma operação simetrizável. Dessa forma passamos de um semi-grupo,
para um grupo. Existe aí uma idéia profunda de matemática, que não tem nada a
ver com a chamada Matemática Moderna. É simplesmente um conceito
matemático. Os autores dos livros didáticos brigaram muito...
Denise: eu me lembro que os livros didáticos de São Paulo eram diferentes dos
livros de outros estados. Na capa aparecia à advertência: De acordo com os
Guias Curriculares de São Paulo...
Almerindo: Quando eles foram elaborados, não era para ser obrigatório...
Inclusive isso está bem claro na Introdução do Guia.
Denise: Foi o Senhor, sozinho, que escreveu a Introdução?
Almerindo: A redação é minha, mas a idéia geral é da equipe. Se essa
introdução for lida com atenção, em algum lugar está faltando uma palavra. Eu
não me lembro agora onde é, porque faz muito tempo que eu não a leio. Eu acho
que logo na primeira página está faltando uma palavra. Na revisão isso passou
despercebido, mas não me lembro agora.
Marytta: eu tenho aqui o de primeira à quarta série.
xv
Marytta: Está escrito: ..., são meras sugestões, visam o subsidiar a tarefa do
professor, a este cabe em última instância, diante das condições de trabalho
decidir sobre a conveniência em aceitar as sugestões.
Denise: Além da Introdução, que outras partes, o senhor escreveu sozinho?
Almerindo: Existe um esquema. Muita gente criticou... Leram e não
entenderam... O esquema de conteúdos. Eu procurei relacionar a Álgebra e a
Geometria.
Marytta: então porque o que eu estava falando era isto, se a gente olhar o
esquema, se a gente olhar o prefacio, parece que a gente está vendo uma
discussão de hoje, não é professor?
O professor fala sobre os percalços da matemática moderna no Brasil
Almerindo
: Muitas coisas que a Matemática Moderna fez foram criticadas e
abandonadas. Porém, hoje, percebemos que muita delas permanecem. Nos
livros didáticos, alguns conceitos introduzidos, na época da MM, foram
incorporados. Podemos citar, entre esses, algumas noções sobre conjuntos (não
tão pesadas, como eram naquele tempo).
Um dos erros do MMM, que considero significante foi a insistência no estudo
dos sistemas de numeração em bases não decimais. Isso foi culpa da
insistência na representação em diferentes bases, como era feito nos livros
didáticos, principalmente nos do Prof. Sangiorgi. Eu acho um erro aquela
historia de metade de 8 é 3... A distinção muito acentuada entre numeral e
número. Não há necessidade de tanto rigor em um conceito... Eu já fazia isso
antes do Movimento da Matemática Moderna, só que eu não chamava de
numeral, chamava de algarismo. Quando abordava, no Ginásio, os “critérios de
divisibilidade”, nunca falava “a soma dos algarismos”. Falava: a “soma dos valores
absolutos dos algarismos”, pois algarismo não tem valor, é apenas um símbolo.
Tudo isso já existia enrustido no ensino da Matemática. A Matemática Moderna
destacou algumas coisas e exagerou em outras... Esse foi o grande erro desse
movimento. O exagero em determinados aspectos. Uma grande contribuição da
MM foi a insistência do ensino de Álgebra Linear. Qual é a faculdade de hoje que
xvi
não aborda noções de Álgebra Linear. Por exemplo, você pode desenvolver
toda a Geometria por meio da Álgebra Linear.
Marytta: hum... É verdade.
Almerindo: Aliás, nos Subsídios a Geometria já é tratada assim. Podemos
observar que, no livro de Geometria para o Grau - a Séries -
Informações para o Professor, uma parte trata da Geometria usando um
método axiomático, baseado no livro Les fondements de la géométrie, de
Bela Kerékjartó. A outra parte é uma tentativa de mostrar que a geometria pode
ser desenvolvida por Álgebra Linear. Tudo isso está bem esclarecido na
introdução àquele volume dos Subsídios.
Marytta
: é.
Almerindo: Nos Guias não se determinava o que deveria ser feito e como
deveria. Apenas se tentava mostrar que a Matemática é uma coisa só, não
existindo a separação entre a Geometria e a Álgebra. Era esse o enfoque nos
Guias... Muitos não entenderam... Nós queríamos destacar a unidade da
Matemática, e muita gente não entendeu isso.
Denise: Durante o processo de elaboração, quais foram as recomendações
dadas pela SEE?
Almerindo: Eles nos deram muitas orientações em relação à forma dos Guias.
Recebemos uma série de documentos que davam as diretrizes dos órgãos
da Secretaria da Educação sobre o assunto.
O professor fala dos documentos publicados pela SEE com as orientações e
fundamentação legal adotada.
Eram documentos preparatórios. A DAP insistia muito na formulação precisa dos
objetivos, com muita ênfase na operacionalização desses objetivos, conforme
Bloom e Mager, muito em moda na época, e nós tínhamos que seguir essa
orientação. Era maior a insistência nos objetivos do que nos conteúdos. Nos
Guias , nós adaptamos aquela outra coluna que fala de conteúdos ao lado dos
objetivos. Foi difícil elaborar os Guias dentro das diretrizes estabelecidas.
Tentamos achar uma saída, de consenso que satisfizesse a nós e à DAP.
xvii
Denise: na bibliografia dos Guias, consta esse material usado como norteadores
da elaboração? Houve textos que não foram em frente?
Almerindo: Não sei se na bibliografia existia isso, eu não me lembro. Eles deram
uma orientação para todos os funcionários, com toda a fundamentação legal que
respaldava as reformas na Secretaria de Educação. Para nós existia um
documento que era publicado sob forma mimeografada com tudo o que devia
constar e o que não deveria (baseado no documento “Diretrizes para a
reforma”, SEE, 1972).
Após a publicação dos Guias, quando nós trabalhávamos, ainda na época do
CHERUPE, a Lydia, a Maria Helena Roxo e eu, fizemos um trabalho, que era uma
complementação dos Guias Curriculares. Tratava-se de um texto, explicando aos
professores como avaliar se os objetivos tinham sido atingidos ou não.
Mostrávamos vários exemplos, de como formular os objetivos de forma
operacionalizada. Em seguida, sugeríamos questões com comentários sobre
quais objetivos estavam sendo avaliados por meio das questões propostas.
Não sei o motivo da não publicação desse material. Procurei muito, mas sumiu...
Varias vezes eu procurei e não consegui achar...
Marytta: Deve está guardado...
Almerindo: Existe um outro documento, muito interessante, complementar do
Guia, publicado pelo CHERUPE, Guias Curriculares para ensino de 1º grau de
Matemática, especificações de bibliografia, instalações e equipamentos.
Foram elaboradas pela Professora Maria Luiza do Carmo Neves e por mim.
Consiste numa coletânea contendo especificações de bibliografia para alunos e
professores, juntamente com os equipamentos que poderiam ser utilizados nas
aulas de Matemática. Esse material foi amplamente divulgado, em todos os
treinamentos do CERHUPE e da CENP. Foi distribuído com os Guias. Todos os
professores da rede recebera. Continha todos os todos os livros que julgávamos
interessante divulgar, com seu respectivo sumário. Publicávamos o índice do livro,
com um pequeno comentário. Em relação aos equipamentos, procuramos listar
todos os materiais pedagógicos conhecidos com sua descrição. Descrevemos os
blocos lógicos, o material Cuisenaire, o material dourado Montessori e outros.
Nesse trabalho há uma orientação aos professores, depois uma relação de livros,
xviii
constando, para cada livro, um sumário e um comentário sobre ele. Os livros do
Dienes estão quase todos nesse trabalho Para montar essa coletânea, nós
percorremos todas as lojas de brinquedos, todas as fábricas de brinquedos e as
lojas de brinquedos pedagógicos de São Paulo. Também listamos os materiais
mais conhecidos pelos professores como flanelógrafo, cartaz de pregas,
imantógrafos, porta gravuras, moldes para recorte, etc. Depois havia uma relação
com outros equipamentos que considerávamos mais difíceis para toda escola ter
como: projetor de diafilmes, copiadora termo-fax (naquela época não havia xérox
com tanta facilidade), mimeógrafo, fotocopiadoras, uma porção de coisas...
Tudo estava listado...
Denise: e a bibliografia para o aluno?
Almerindo: Nessa bibliografia além dos livros didáticos, citávamos outros com
divertimentos matemáticos, que hoje poderíamos chamar de paradidáticos.
Citávamos até o Almanaque do Tio Patinhas. (Eu acho que nem existe mais, ele é
de 1967). Era da Editora Abril e o título da historinha era “Donald na
Matemagicalândia...” Era uma coisa interessante.
Marytta: nossa que trabalho rico esse professor...
Almerindo: Havia também a bibliografia da quinta à oitava série que era
constituída pela maioria dos livros didáticos então existentes e, no fim, havia uma
bibliografia suplementar (o professor cita vários livros presentes nessa
bibliografia).
Denise: Como foi a distribuição desse material?
Almerindo: Todos os professores que foram treinados receberam essa
publicação. Fazia parte do material do treinamento, além do exemplar do Guia
Curricular, e das orientações de pedagogia, aquela parte de formulação de
objetivos, a fundamentação teórica (Brunner, Bloom, Mager), etc. Podemos dizer
que praticamente todo professor da rede, naquela época tinha esse material. Só
que a maioria nem leu... Quem deve ter essa publicação é a Professora Gilda, de
Rio Claro, pois quando eu perdi o meu exemplar ela me mandou um. Ela tem
vários exemplares, não só desse impresso, mas também dos Subsídios, que eu
dei para ela quando mudei de residência... Esse material foi o que achei mais útil
para o professor da rede estadual.
xix
Denise: professor, depois que o senhor, e a equipe receberam as orientações,
para a elaboração dos Guias, o que foi feito? Como era esse processo? Onde
eram realizadas as reuniões?Todos da equipe estavam sempre presentes?
Almerindo: Já falei isso... O Guia Curricular de Matemática foi elaborado em
1972. Foi feita uma edição preliminar que serviu de base para a Análise Crítica do
Guia em outubro de 1972, por 30 professores. Durante o ano de 1973, foi feita
uma revisão da proposta inicial, com base nas sugestões apresentadas nessa
Análise... Ele foi publicado em 75, mas ele foi elaborado em 72 e a publicação foi
financiada com recursos de 74. Em 75 é que houve a distribuição do Guia.
Depois da equipe formada, dividimos o trabalho. Eu não ia opinar sobre a parte
do Guia referente às quatro primeiras séries. Pois não tinha experiência quanto
a esse nível de ensino. Nós elaborávamos já mais ou menos na forma de Guia,
para podermos discutir alguma coisa concreta... Nós nos reuníamos nas
dependências da DAP ou na casa da Lydia... Discutíamos e depois decidíamos
que devia ser reformulado para receber a forma mais ou menos final. Com
base nessas discussões montamos uma versão preliminar do Guia.
Almerindo: No fim do Guia Curricular há uma relação de 30 professores que
participaram da critica da versão preliminar do Guia. Eles foram convocados para
as reuniões que aconteceram na DAP, durante uma semana. Eles discutiram
muito, fizeram painéis sobre os vários assuntos, e fizeram uma serie de
sugestões. Ao final da semana, recolhemos todas as sugestões anotadas. Todas
as que a equipe considerou pertinentes foram incorporadas. A Lourdes de
la Rosa Onuchic, que foi minha colega na Faculdade e que era professora
universitária, também participou dessa semana.
Denise: mas, depois desse lançamento e distribuição, Como foi o processo de
treinamento? Quais os professores que foram treinados?
Almerindo: Houve um treinamento para 2 ou 3 professores de cada Divisão
Regional de Ensino. Eram 18, naquela época, hoje não existem mais. Eles foram
a São Paulo, com todas as despesas pagas e participaram de um treinamento.
Nesse treinamento, além da abordagem feita no Guia para os diversos
conteúdos, nós dávamos orientações sobre como eles poderiam ser
xx
desenvolvidos em sala de aula. Muitos professores primários, por exemplo,
não sabiam o que era divisão americana, que havia sido adotada no Guia,
pois é muito mais fácil para a criança aprender. Aí nós dávamos explicações
sobre como dividir usando esse método...
Denise: Então eram 2 ou 3 professores de cada regional... Podemos dizer que
foram treinados cerca de 40 professores, e o resto dos professores?Como foi o
treinamento da maioria dos professores?
Almerindo: Esses professores, que foram treinados em São Paulo,
reproduziram esse treinamento nas suas divisões regionais. Eles foram
treinados para servirem como monitores nos treinamento regionais que
atingiram todos os professores da Rede Estadual.
Denise: O senhor participou ativamente de cada treinamento... Como Dienes, foi
introduzido na fundamentação dos Guias?
Almerindo: Alguns professores já usavam a técnica, a Ana Franchi, usava não no
ensino, mas nos treinamentos, nós estávamos bem envolvidos com o material
do Dienes, naquela época.
Marytta: Foi isso que provocou a vinda dele?
Almerindo: Não. Foi o GEEM que promoveu a vinda dele, ele veio antes do
Guia.
Denise: ele veio em 73 não foi?
Almerindo: Ele veio em 1971, antes da elaboração do Guia Curricular, que é
de 1972. .
Marytta: Então eram 2 professores de cada divisão e esses professores eram
responsáveis por difundir, e não aconteceu isso direito.
Almerindo: Na multiplicação dos treinamentos houve algumas distorções
que não foi possível evitar dada a magnitude da rede.
O sistema de trabalho era diferente na elaboração do Guia Curricular e na
dos Subsídios.
No caso do Guia, como nós trabalhávamos contratados por tarefa, era
feita uma reunião com os membros da equipe na qual cada um ficava
xxi
encarregado de realizar uma parte da tarefa. Tenho a impressão que cada
um de nós escrevia a sua parte nas horas de folga do seu trabalho nas
escolas. No meu caso particular eu redigia a minha parte à noite e,
também, nos fins de semana. A seguir eram feitas reuniões para discutir o
que foi feito. Após a discussão o texto era reformulado, de acordo com o
que ficara decidido na reunião. As reuniões eram realizadas na Divisão de
Assistência Pedagógica e, às vezes, na casa da Lydia. Todos os membros
da equipe estavam sempre presentes, pois as reuniões eram marcadas de
comum acordo. Quanto aos textos a disposição da equipe é muito difícil
precisar depois de tanto tempo. Entretanto você pode ter uma boa idéia
nas Especificações de Bibliografia publicados posteriormente para
divulgação junto a Rede Estadual. Foi feita uma edição preliminar do Guia,
que foi submetida a uma Análise Crítica realizada durante uma semana na
Divisão de Assistência Pedagógica, de 23/10 a 27/10/72, num total de trinta
horas. Os nomes dos participantes dessa crítica constam no fim do Guia
Curricular de Matemática. Quanto ao tempo de duração é difícil precisar.
Mas deve ter sido de junho a setembro de 1972.
No caso dos Subsídios, a Lydia trabalhava na ATPCE e eu na CENP,
onde eu era Assistente Técnico. A Equipe de Elaboração dos Subsídios
era coordenada por nós dois e era formada por professores da rede
Estadual (em sua maioria), por professores da rede particular e por uma
representante do Instituto de Matemática da USP. Foram programados oito
volumes. Cada um deles foi atribuído a dois membros da equipe que
trabalhavam de acordo com suas possibilidades, por não serem
funcionários da CENP. Elaborados os textos, havia reuniões para discuti-los
e depois de terminada a redação esses textos eram encaminhados para
mim, que dava a redação final. Essa redação era submetida a uma revisão
por uma equipe de professores de Língua Portuguesa, que trabalhavam
junto ao Serviço de Documentação e Publicações da CENP. Depois disso
voltava para mim para uma revisão final e a seguir era encaminhada para
a datilografia final a ser encaminhada a Imprensa Oficial do Estado para
publicação. No caso dos Subsídios a crítica foi feita pelo Professor Alésio
João De Caroli. O Prof. Ronaldo Garibaldi Peretti, que também participava
xxii
dessa crítica, faleceu durante a elaboração dos Subsídios. Ele era
professor da rede e co-autor de livros didáticos de Matemática junto com
o Professor Benedito Castrucci. O período de elaboração dos subsídios,
em sua fase inicial, foi de julho a novembro de 1977.
ANEXO 3
PLANO DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO - DOCUMENTO PRELIMINAR
xxiii
xxiv
xxv
xxvi
xxvii
xxviii
ANEXO 4
PROGRAMA DA ESCOLA PRIMÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO-1969
1-Conceito de Escola Primária
xxix
xxx
xxxi
2-Objetivos do Ensino Primário
xxxii
xxxiii
ANEXO 5
GUIAS CURRICULARES DO ESTADO DE SÃO PAULO, 1975.
1-Introdução dos Guias
xxxiv
xxxv
ANEXO 6
Subsídios para a Implantação do Guia Curricular de Matemática
xxxvi
xxxvii
ANEXO 7
CRONOLOGIA
Esta cronologia foi construída a partir da necessidade de orientar e
contextualizar nossa pesquisa no Ensino primário. Foi originados da coleta em
dissertações, teses, periódicos, documentos oficiais e publicações destinadas ao
ensino primário, onde pudéssemos perceber alguma influência do ideário do
MMM.
Ressaltamos que esta cronologia ainda está em construção, se tomarmos
os instrumentos intelectuais disponibilizados pelos teóricos, escolhidos para
embasar nossa pesquisa.
1931
Fundação do Conselho Nacional de Educação. (Decreto Nº 19.890
de 18/04/31).
1949
São Paulo adota em caráter experimental, o seu próprio Plano
Escolar para a Escola Primária (SÃO PAULO, 1969, p.152).
Manhúcia Liberman ingressa no quadro de professores efetivos da
rede pública de São Paulo.
1953
Criação da CADES (Campanha de aperfeiçoamento e Difusão do
Ensino Secundário). O Decreto Nº 34638/53 institui a CADES, atribui
seus objetivos, como sendo a "elevação do nível e a difusão do ensino
secundário no país".
Realizaram-se cursos introduzindo alguns conceitos de teoria de
conjuntos, para professores de didática da matemática e professores
primários, na Associação de professores católicos brasileiros do RGS,
orientado pela professora Joana Bender. (Anais V º Congresso, 1966, p.
14).
xxxviii
1955
Publicado o primeiro livro do CIEAEM com textos do epistemológico
Jean Piaget, dos matemáticos Dieudonné, Choquet e Lichnerowicz, do
lógico Beth e do pedagogo Caleb Gattegno (BURIGO, p.72).
1957
Acontece o II º Congresso Nacional de Ensino da Matemática em
Porto Alegre, com um setor dedicado ao Ensino Primário, Normal e
Rural, e a divulgação do primeiro livro do CIEAEM com textos do
epistemológico Jean Piaget.
1958
Fundação do SMSG (School Mathematics Study Group) nos EUA.
O grupo objetivava a melhoria do ensino da Matemática, elaborando um
currículo que oferecesse aos alunos não somente habilidades básicas, mas que
entendessem as estruturas matemáticas. Os livros produzidos pelo SMSG, foram
traduzidos para o português e tiveram grande aceitação no Brasil. (SOARES, p.
38).
As professoras Liberman e Bechara afirmam que pesquisaram sobre o
ensino primário na bibliografia publicada pelo grupo.
1959
Acontece o III Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática com a
participação de cerca de 500 professores, no Rio de Janeiro.
Esse congresso contou com uma comissão responsável pelo temário do
Ensino Normal e Primário, tendo a preocupação de discutir: a matemática nos
cursos de formação de professores, nos institutos de educação, a articulação
entre o ensino primário e o curso secundário e a matemática no ensino primário
relacionando com a criança e suas características.
Dentro desse temário, podemos destacar a apresentação do Prof.
Waldecyr Araújo Pereira que expôs “os materiais manipuláveis” no ensino de
matemática, referindo-se a suas experiências na Bélgica com Gattegno e Dienes
(apud Congresso, 1957, p.131) e a Tese defendida e inserida nas conclusões do
xxxix
Congresso: pelo Prof. Roberto Peixoto “A Matemática no Ensino Primário da
criança e suas características”, denotando vestígios de sua fundamentação na
Psicologia do desenvolvimento:
Conferência de Royaumont, na França.
Acontece na França, com apoio da OEEC (Organization for European
Economic Cooperation). A conferência foi um marco para o início das discussões
referentes à reformulação do ensino da Matemática.
1961
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei 4024
46
, de 20
de dezembro de 1961. É a primeira a versar sobre todos os níveis de
educação e com validade para todo território nacional
Não estabeleceu um currículo fixo e rígido para todo o território nacional,
dando liberdade aos Estados na construção de seus currículos.
No Rio Grande do Sul, no Instituto de Educação “General Flores da
Cunha” aconteceu um curso intensivo sobre iniciação á teoria de
conjuntos para professores primários. (II Conferência Nacional de
Educação, 1966, p. 142).
Criação dos Ginásios Vocacionais em São Paulo, com classes
experimentais. (Decreto nº. 38643/61).
Sangiorgi promoveu em Santos em julho de 1961, o primeiro curso
com tópicos relacionados à Matemática Moderna. Articulado e
planejado pelo professor o curso foi financiado pela CADES, tendo
como professores George Springer, Jacy Monteiro e o próprio
Sangiorgi.
Encontro das professoras Lucília Bechara e Manhúcia Liberman nos
cursos realizados no Ginásio Vocacional, dando início a grande parceria
nas produções para o ensino primário.
Professores efetivos da Secretaria de Educação de São Paulo, em
agosto de 1961, foram convidados a participar de um curso, em
46
Brasil. Leis, decretos, legislação e normas: ensino de 2º grau. V. 1. p. 17-22.
xl
convênio financeiro entre a Universidade Mackenzie, a Secretaria
Estadual de Educação, o Departamento de Matemática da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e National
Science Foundation, permitindo a vinda do professor George Springer,
da Universidade de Kansas. EUA
Criação do GEEM, em 31 de outubro de 1961, tendo Sangiorgi como
presidente, e o professor George Springer como colaborador.
1962
Visita da pedagoga Lucienne Felix ao Brasil, trazida pelo GEEM.
Criação da International Study Group for of Mathematics- ISMG, pela
UNESCO.
O grupo preocupava-se com o ensino primário, e organizou conferências
em Stanford (EUA) em 1964, Paris (França), em 1965 e em Hamburgo em 1966.
(Soares, p.30).
Fundação do Conselho Federal de Educação, aprovando o seu
plano nacional de educação para o período de 1962/1970.
1963
Lei 2663/63 da Assembléia Legislativa de São Paulo.
Por esta Lei, o GEEM foi declarado um órgão de serviço público, podendo
contar com apoio oficial para seus projetos.
Lançamento do Programa de Emergência para o Ensino Primário e
Médio. Convênio da USP e o IBECC incrementando as experiências
com materiais didáticos e conseqüentemente o interesse de
professores pelo primário. (BURIGO, p.108).
Primeiro curso organizado pelo GEEM, em convênio com o
Departamento de Educação do Estado, destinado a professores
primários aconteceu em São Paulo no período de 5 a 15 de fevereiro de
1963. O curso foi ministrado pelas professoras Liberman, Bechara e
Franchi, com a participação de 300 professores e tinham como objetivo
xli
atualizar e introduzir conteúdos matemáticos aos professores. (Folha de
São Paulo, 06/02/1963, apud NAKASHIMA, 2007).
Publicação, pelo GEEM, do livro "Introdução da Matemática
Moderna na Escola Primária" de Anna Franchi e Manhúcia
Liberman, dedicado a professores.
Liberman assume a coordenação do curso de admissão da escola
experimental Peretz, na Vila Mariana, passando a conhecer o currículo
do ensino primário. Convite da Editora Nacional à Manhúcia Liberman
para a elaboração de uma coleção de matemática dirigida ao ensino
primário.
1964
Inicia-se na Inglaterra o Projeto Nuffield para os alunos de 5 a 13
anos, com a participação de Edith Biggs, defensora da renovação do
ensino primário britânico durante os anos 50.
Com ligação às idéias de Piaget e de Dienes, as atividades e o conteúdo
proposto estavam baseados mais em experiências nas salas de aula do que nos
conceitos teóricos. A professora Manhúcia Liberman convida Lucília Bechara e
Anna Franchi para participar da elaboração da coleção Introdução da Matemática
Moderna na Escola Elementar.
Convênio MEC-USAID – para aperfeiçoamento do ensino primário.
(Romanelli, p.212)
Curso sobre a introdução da teoria de conjuntos com duração de 1
ano para professores primários, no RS, organizado pela Associação
dos professores e pesquisadores da Matemática do Rio Grande do Sul.
(II ª Conferência Nacional de Educação, 1966, p. 142).
Na França, Nicole Picard inicia suas atividades na “Ècole
Èlementare”, influenciada pelas idéias de Dienes e Papy.
1965
Palestras televisionadas, ministradas por Dienes, ensinando Teoria
de conjuntos e topologias no Ensino Primário.
xlii
Acordo MEC/USAID para dar continuidade e suplementar com
recursos e pessoal o primeiro acordo para o ensino primário.
(Romanelli, p.212).
1966
GEEM coordena o V Congresso Brasileiro do Ensino da Matemática,
em São José dos Campos, cujo temário é “Matemática Moderna na
escola secundária; articulações com o ensino primário e com o ensino
universitário”.
Esse congresso conta com presença de pesquisadores internacionais
como George Papy falando sobre “Métodos e Técnicas para explicar conceitos
novos de Matemática”, fazendo uma comparação com crianças de várias idades,
e mostrando assim as suas atitudes.
Também destacamos nesse mesmo congresso a sugestão da implantação
de classes experimentais para o ensino da matemática moderna no ensino
primário e relato de algumas experiências
Iº Seminário de Matemática Moderna do ensino primário,
patrocinado pelo departamento nacional de educação, patrocinado pelo
Departamento Nacional de Educação.
Participação de Professores de vários estados representantes de órgãos
educacionais. O seminário aprovou uma comissão para elaborar o texto “Ensino
de Matemática Moderna na Escola Primaria - experiências e resultados obtidos”
Participaram desta comissão: Jairo Bezerra, Manhúcia Liberman, Ana Franchi,
entre outros. (Correio da Manhã, 26/06/66, apud Nakashima, 2007).
Publicação do 1º volume de “New Trends in Mathematics Teaching”,
pela UNESCO, com textos de diversos autores e divulgação de
Simpósios na área, voltados para países em desenvolvimento.
Acordo MEC-INEP—CONTAP-USAID-
Aparece pela primeira vez no texto destes acordos, entre seus objetivos, o
de elaborar planos específicos para melhorar entrosamento da escola primaria
com a secundária e superior. (Romanelli, p. 213).
xliii
1967
ATO 148 31/5/67.
Constitui o grupo de trabalho com objetivo de elaboração de projeto para
reorganização curricular e dos programas do curso primário. No Estado de São
Paulo, tendo. Manhúcia Liberman como participante (DO 1/6/67 p. 20).
O grupo de trabalho encarregado de elaborar projeto de reorganização
curricular e programas do curso primário em São Paulo. A profª. Manhúcia
Liberman participou como representante do GEEM desse trabalho que norteou as
novas diretrizes para o ensino primário.
Acordo MEC –USAID – SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de
Livros).
Aos técnicos do USAID caberia todo o controle sobre a editoração de livros
didáticos brasileiros. (Romanelli, p.213)
Realização pelo GEEM, de cursos para professores primários, pela
televisão Cultura de São Paulo. (BURIGO, p.153)
Início do Processo de elaboração do Plano Estadual de Educação
de São Paulo.
Criação do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação) com a finalidade de capturar recursos e aplicá-los em
financiamento de projetos de ensino. Percebemos uma mudança na
política de distribuição e aplicação de recursos na educação, agora
atrelado a um plano nacional de educação, subordinado as orientações
do governo federal.
Publicação do 1º volume da coleção ”Curso Moderno de Matemática
para a Escola Elementar” de Anna Franchi, Manhúcia Liberman e
Lucília Bechara.
21ºCongresso – CIEAEM, que decorreu em abril de 1967, tendo
como tema: The teaching of the mathematics, em Gandia, Espanha,
com a presença de Dienes. A professora Bechara participa e
entusiasma-se pelas idéias de Dienes.
xliv
1968
Divulgação do Programa da Escola Primária do Estado de São
Paulo, contando com a participação de Manhúcia Liberman, umas das
difusoras do MMM no ensino primário.
Percebemos nos objetivos do setor destinado a Matemática grande
presença do ideário do MMM, onde um dos objetivos é relacionado á
compreensão da “linguagem matemática, possibilitando o uso claro e preciso da
representação simbólica que lhe é pertinente”. (São Paulo, 1969.)
No Brasil iniciam-se publicação de documentos oficiais introduzindo a
teoria de conjuntos no ensino primário, bem como o MMM torna-se alvo de
periódicos esclarecendo os novos conteúdos para professores do ensino primário.
Manhúcia Liberman assume a coordenação do curso primário no
colégio Experimental Peretz, dando início a experimentações em novas
metodologias e maior contato com as inquietações dos professores
primários.
1969
Divulgação da versão final do Programa da Escola Primária do
Estado de São Paulo, distribuído para todas as escolas da rede.
Manhúcia Liberman coordenou a equipe de elaboradores do documento.
1º Congresso internacional do ICMI, com a presença de Dienes.
(França).
São Paulo impulsionado pela ampliação de sua rede de ensino,
incorporara de uma só vez, 5000 novos professores que deveriam
assumir imediatamente as novas salas de aula. (SÃO PAULO, 1969,
p.156).
A Revista Educação Atualizada - SP dedica suas publicações de
1969, aos novos conteúdos introduzidos nos programas da Escola
Primária A Teoria de conjuntos é apresentada aos professores como a
nova linguagem da matemática que atende as estruturas mentais da
criança. Também sugere atividades a serem aplicadas em sala de aula.
xlv
1970
Bechara Influenciada pelas idéias de Dienes, começa a divulgar sua
metodologia com os blocos lógicos nos trabalhos desenvolvidos pelo
GEEM nos cursos para professores.
A professora Manhúcia Liberman vai aos EUA, participar de cursos
cujos objetivos são a observação de atividades de preparação de livros-
textos e elaboração de Guias e manuais para professores e de
diretrizes para o ensino elementar. (BURIGO, p. 165).
O Estado de São Paulo noticia: Jogos lógicos de Zoltan Dienes.
O jornal coloca os blocos lógicos e a metodologia de Dienes como uma
solução para os problemas de aprendizagem de Matemática. (Jogo Lógico de Z.
Dienes, O Estado de São Paulo, 28/06/1970).
Professora Manhúcia Liberman, oferece um curso sobre blocos
lógicos, em São Paulo, atraindo muitos professores primários.
Professora Lucília Bechara oferece um curso em Campos (RJ) sobre
os materiais de Dienes e atrai cerca de 600 professores. (SOARES,
p.86).
Publicação da Lei nº. 7459/70, em São Paulo criando 2.600 cargos
de Professor Primário, acrescentando aos 3.200 existentes desde 1967.
1971
Promulgação da Lei de Diretrizes E Bases 5692/71.
A nova LDB suprimiu o exame de admissão, tentando tornar livre o
caminho para o prosseguimento dos estudos além da escola primária.
Parecer nº. 853/71, aprovado em 12/11/71, pelo Conselho Federal
de Educação, fixa o núcleo comum para os currículos do ensino de 1º e
2º graus, conforme a Lei 5692/71.
A Prefeitura de São Paulo divulga: Programas de implementação da
escola municipal de 1º Grau de São Paulo.
O Município implementa a escola municipal de oito anos de
escolaridade obrigatória.
xlvi
Em Porto Alegre é fundado o GEEMPA, coordenada pela professora
Esther Grossi.
Visita do professor Zoltan Dienes, com a finalidade de ministrar
curso para professores do ensino primário trazido pelo GEEMPA.
Dienes ministrou vários cursos para professores, inclusive em Santos e em
São Paulo, empolgando educadores com as atividades demonstradas,
enfatizando as estruturas matemáticas, com o uso de materiais de concretos.
Publicação de um Planejamento de Ensino da área de matemática
para as primeiras séries do curso fundamental, da equipe de
educadores do grupo escolar – ginásio experimental “Dr. Edmundo
Carvalho” sob a orientação da especialista em matemática Anna
Franchi, divulgando a nova metodologia para o ensino de matemática.
Bechara é convidada a organizar cursos para os professores do
Colégio Vera Cruz sobre a metodologia apregoada por Dienes.
1972
A Secretaria Estadual de Educação inicia o processo de
reestruturação de seu sistema de ensino, com a publicação dos Temas
básicos: objetivos gerais e esquema de conteúdos da Secretaria
Estadual de Educação de São Paulo.
O importante é destacar, em uma situação examinada, tudo que
há de matemática na mesma, chamar a atenção para o que é
aceito como válido (...). Recomendações de matemáticos que vêm
preocupando com a Pedagogia da matemática, tais como: Caleb
Gategno, Emma Castelnuovo, G. Papy, Z. P.Dienes, Luciene
Felix. (SÃO PAULO, 1972, p. 171).
A Prefeitura de São Paulo oferece o Curso “Fundamentação
Psicológica para o ensino de aprendizagem da Matemática” para com o
objetivo de esclarecer as idéias de Piaget, para os professores da rede.
Howard Fehr apresentou na USP o trabalho “Why school
Mathematics should be taught in a contemporary setting’”, enfatizando o
aspecto prático do ensino da matemática, o que era considerado
contraditório com o discurso original do MMM. (BURIGO, p., 210)
xlvii
Divulgado o Parecer Nº339/72, que trata da formação especial no
currículo do 1º grau, afirmando que o currículo pleno terá uma parte de
educação geral e uma outra de formação especial, sendo que no 1º
grau a formação tem o objetivo de sondagem de aptidões e iniciação
para o trabalho.
Indicação Nº. 1/72. Aprovada em 3/1/1972.
O documento indica ao CEE, a expedição de normas para a elaboração do
currículo pleno da escola de 1º grau.
São Paulo lança seu Plano de Ação para a Reforma de Ensino de 1º
Grau-1972 Matemática
O Plano de Ação para a Reforma de Ensino de 1º Grau, publicada em
1972, pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, foi distribuído com a
intenção de divulgar o plano de ação do governo Paulista para a expansão de seu
sistema de ensino.
Designada a equipe de elaboradores dos Guias Curriculares do
Estado de São Paulo.
Almerindo Bastos coordenou a equipe formada pelas professoras Anna
Franchi e Lydia Condé Lamparelli e mais o professor Benedito Antonio, que ficou
pouco tempo.
O Guia Curricular de Matemática foi elaborado em 1972. Foi feita uma
edição preliminar que serviu de base para a Análise Crítica do Guia Curricular
Proposto para Matemática, realizada na semana de 23 a 27 de outubro de 1972,
por 30 professores, cujos nomes constam no final da edição definitiva. Crítica. A
redação definitiva foi então encaminhada para publicação.
Início do projeto no Colégio Vera Cruz, coordenado pela professora
Lucília Bechara, baseado nas idéias de Dienes.
São formadas duas classes experimentais, com uma programação de
lógica, conjuntos e relações.
As professoras regentes das classes experimentais foram treinadas em
reuniões onde todas as professoras participavam com o objetivo de sensibilizar e
engajar toda a escola no projeto.
xlviii
1973
O projeto do Colégio Vera Cruz, com o entusiasmo do ano anterior,
ampliou o atendimento a crianças da 5ª e 6ª séries, e para as do Jardim
de infância A programação das classes experimentais, foi motivo de
avaliações e reformulações.
O grupo já contava com 60 professores do Vera Cruz e mais alguns
professores de outras escolas interessados pelo tema.
Os professores vindos de outras escolas eram convidados a primeiro
discutirem sobre As seis etapas do processo de aprendizagem em Matemática,
de Dienes, para depois participarem da elaboração das atividades.
Participação de Lucília Bechara, como representante do GEEM, no
curso desenvolvido por Dienes sobre construções dos Números Inteiros
e Racionais, em Porto Alegre.
As professoras do colégio Vera Cruz participam do curso de Dienes,
em Porto Alegre e, estagiaram em classes pilotos, orientadas pelo
GEMPA, onde eram desenvolvidas atividades baseadas nas idéias de
Dienes.
Revisão da Proposta Curricular inicial do Guia Curricular de
Matemática, com base nas sugestões apresentadas na Análise Crítica.
Publicado nos EUA livro Why Jonnhy can’t add: The failure of the
New Math (O Fracasso da Matemática Moderna) de Morris Kline
47
.
Desde seu início o MMM recebeu várias críticas, sendo Kline um dos seus
maiores opositores. O livro traz muitas críticas aos “exageros” cometidos ao
ensino de matemática em razão das mudanças nos currículos e metodologias
durante o MMM.
As críticas de Kline foram veiculadas por todo mundo, encontrando, cada
vez mais, respaldo pela grande inconsistência e erros de interpretações nas
idéias originais propostas pelo MMM.
47
Matemático e professor norte Americano. Foi um dos maiores opositores ao MMM.
xlix
As maiores críticas referem-se aos exageros cometidos na implementação
das idéias do MMM. Algumas das principais críticas giravam em torno da ênfase
na abordagem dedutiva, no privilégio a Teoria dos conjuntos, na grande
quantidade de terminologia e simbolismo, na inadequação de alguns conteúdos
propostos, o ensino de abstrações prematuramente, o isolamento da realidade e o
despreparo dos professores em relação aos novos conteúdos.
Contudo no Brasil observamos o crescimento de publicações oficiais
destinadas a professores primários impregnado do ideário do MMM, contrariando
a tendência de críticas ao MMM, provocadas pela publicação do livro de Kline.
GEEM oferece curso de férias sobre os blocos lógicos.
O curso era apresentado por Anna Franchi, Elza Babá e Lucília Bechara
(BURIGO, P.204).
Publicação de “Documentos Básicos para a implantação da Reforma
do ensino de 1º e 2º graus.”, pela Secretaria de Educação do estado de
São Paulo.
O documento reúne em uma só publicação Pareceres, Deliberações,
Indicações e resoluções dos Conselhos Federal e Estadual de Educação,
Juntamente com as Leis 5692/71 e dos artigos que continuavam em vigor da Lei
4024/61.
O documento justifica sua publicação pela grande procura por subsídios
legais para a reforma do ensino, pelo magistério público.
Extinção da coleção Curso Moderno de Matemática na 9ª edição,
quando foi reformulada e lançada como GRUEMA (Grupo de Ensino de
Matemática Atualizada), em 1974, com 8 volumes, para as oito séries
do 1º Grau.
1974
Dienes volta a São Paulo para cursos e conferências (BURIGO,
p.205), em 1974 e 1975.
O colégio Vera Cruz, amplia o número de classes experimentais.
São acrescentadas atividades envolvendo os sistemas de numeração
l
em diferentes bases, e nas segundas séries, começam a ser
introduzidas atividades de geometria.
O colégio Vera Cruz oferece para 30 professores, um curso sobre os
diferentes sistemas de numeração baseado no estudo do livro de
Dienes: As seis etapas do processo de aprendizagem em matemática.
1975
Publicação dos Guias Curriculares do Estado de São Paulo com
enorme influência de todo ideário do MMM.
Lucília Bechara ministra o curso de especialização Operações e
Estruturas Algébricas e As seis etapas do processo de aprendizagem
em matemática, organizado pela PUCSP, para professores primários.
Publicação, pela SEE: Matemática. Especificações de bibliografia,
Instalações e equipamentos.
A publicação consistia na enumeração dos equipamentos e materiais
didáticos mais comuns, seguidas de algumas indicações sobre seu uso. Com o
intuito de dar continuidade ao trabalho iniciado com os Guias Curriculares. Foi
realizado um levantamento dos recursos existentes. Para subsidiar o trabalho do
professor com a nova metodologia sugerida
Projeto de Implementação do Currículo, pela Secretaria Municipal de
Educação de São Paulo.
Trata-se de um Projeto de Implementação do Currículo com atividades
centradas em Língua Portuguesa – Português e Matemática, visando atingir
alunos de 2ª à 8ª séries da RME, com origens nas dificuldades observadas na
Escola de Primeiro Grau com a finalidade de diminuir dificuldades dos alunos e
promover treinamento e aperfeiçoamento de professores. Justificam a
necessidade do projeto, em razão das dificuldades dos professores, na utilização
das novas metodologias, adotando materiais concretos, em atividades de
Matemática referentes à Teoria de Conjuntos.
A prefeitura justifica o documento, reportando-se ao Artigo 38 da Lei
5692/71, que prevê a atualização constante de especialistas e professores, e
prevê capacitação.
li
O documento fundamenta-se em pesquisa realizada na rede municipal de
ensino para explicar o privilégio em relação às disciplinas de Português e
Matemática para os cursos de capacitação.
Indica que o alto índice de retenção dos alunos do 1º grau, a dificuldade
dos alunos e dos professores na aplicação da nova metodologia exigida pela
sociedade e a falta de integração entre os vários componentes curriculares como
componentes decisivos, que devem ser tratados conjuntamente para a melhora
da qualidade de ensino no Município de São Paulo.
Continuam justificando a necessidade do curso em decorrência das
dificuldades dos professores, no emprego das novas metodologias, adotando
materiais concretos, em atividades de Matemática referentes à Teoria de
Conjuntos.
(...) As dificuldades didáticas constatadas, ocorrem devido a
deficiências no preparo do professor. (SÃO PAULO. SME,
1975.p.3).
Diante destes motivos, resolvem estabelecer como prioridade para o triênio
(76/77/78), orientar a equipe escolar quanto a aspectos didático-metodológicos
específicos da Língua Portuguesa e Matemática.
Publicação da tradução brasileira do livro de Dienes: ”As seis etapas
do processo de aprendizagem em matemática”.
1976
Decreto 7510/76 - SEE-SP
O decreto trata da adequação das antigas escolas primárias e ginásios à
escola integrada de 8 anos e reorganiza administrativamente a secretaria de
educação.
lii
O decreto possibilitou a reativação dos concursos de ingresso e acesso
aos cargos docentes do magistério público de 1º e 2º grau, desativados desde
1969, em decorrência da necessidade de reorganização administrativa provocada
com a promulgação da lei 5692/71.
1977
Publicação de uma edição dos Guias Curriculares do Estado de São
Paulo, para ser distribuída na rede estadual, que os professores
apelidaram de Verdão, talvez por ter a capa na cor verde.
Divulgação do Projeto dos Subsídios para a implementação do Guia
Curricular de matemática – Álgebra e Geometria- para o primeiro grau
1ª á 4ª série-onde destacamos a presença da professora Anna Franchi.
1978/1979
Publicação do Plano de curso, pelo do Departamento de
planejamento, orientação e controle divisão de orientação técnica da
Prefeitura de São Paulo.
As oito séries do 1º grau e mais o Jardim de Infância do colégio Vera
Cruz, já participam do projeto coordenado pela professora Lucília
Bechara, utilizando a metodologia ativa, defendida por Dienes.
1979
Curso de Treinamento para Professores de Matemática, oferecido
pela Secretaria Municipal de Educação.
O documento objetivava subsidiar os cursos promovidos pelo município de
São Paulo para professores e para divulgar as propostas de reformulação
curricular. Podemos dizer que “É uma cópia dos Guias curriculares do Estado de
São Paulo”
O documento procura discutir e justificar as propostas defendidas pela
Secretaria.
Discute as idéias do MMM, como a “teoria mais moderna no ensino de
matemática”, e afirma atender as recomendações de matemáticos de todo o
liii
mundo, que nos últimos anos vêm se preocupando com a pedagogia da
matemática (Dienes, L.Felix, Gategno, Papy, etc.).
Publicação; pela Secretaria Municipal da Educação de São Paulo,
do documento: Considerações básicas para o ensino da matemática O
documento procura esclarecer o professor sobre o papel que o termo
conjunto, representa na fundamentação da teoria da matemática
moderna, bem como a importância do material concreto para o aluno
chegar á simbolização.
Tradução e resumo da coleção de Dienes Primeiros passos em
Matemática, pelo departamento municipal de ensino: divisão de
orientação técnica.
Neste ano podemos perceber um grande número de publicações de
documentos oficiais relacionados a subsídios, orientações, sugestões de
atividades e metodologias para o professor do ensino primário, com relação à
matemática. Destacamos a presença da professora Maria Amábile Magote,
personagem de destaque na divulgação da utilização dos materiais manipulativos.
1981
Divulgadas as Programações de Matemática para o Município de
São Paulo – 1ª á 8ª série, com Maria Amábile Mansutti, na coordenação
da equipe.
Nesse ano notamos a riqueza de documentos e publicações sobre o ensino
da matemática moderna, enfocando as novas metodologias com materiais
concretos.
Os artigos da revista AMAE educando de Abril e Maio exploram os
estágios de desenvolvimento segundo Piaget. .Destaque para o artigo
Piaget no domínio da Matemática.
Publicação da 3ª edição dos Subsídios para a implementação do
Guia Curricular de matemática – Álgebra para o primeiro grau, 1ª a 4ª
série.
liv
1982
Criação do projeto do centro de formação e aperfeiçoamento do
magistério. (CEFAM)
Tanto nesse ano quanto no ano seguinte, destacam-se a
preocupação com os cursos de capacitação de professores de
matemática de 1ª á 4ª série.
1988
Com a publicação da Proposta curricular para o ensino do 1º grau de
Matemática, do Estado de São Paulo, notamos a mudança no discurso
sobre a abordagem do ensino da matemática e a ausência do conteúdo
de teoria dos conjuntos. Há renovação do grupo de autores
participantes da elaboração, onde destacamos Nilson José Machado.
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